25 março 2015

Narcisismo baiano impede desenvolvimento cultural (3)



A Bahia que pensávamos conhecer (como lembrou bem o economista Armando Avena) e cuja
liderança econômica estava solidamente centrada o setor industrial (gerava 48% do PIB, tendo a indústria de transformação 35% desse percentual) era uma ficção. A verdadeira Bahia é um Estado terciário, fortemente vinculado ao setor de serviços, que gera 60% do Produto Interno Bruto, enquanto a indústria de transformação detém apenas 16% do produto. Essa é a Bahia que está a merecer uma ampla discussão sobre suas prioridades, planos e projetos sobre seu futuro.

A Bahia é o terceiro Estado brasileiro com o maior número de parlamentares donos de emissoras de rádio e televisão. O que se convencionou chamar de “coronelismo eletrônico”, ou seja, utilização pelo político de uma concessão estatal para usar veículo de comunicação para influenciar a opinião pública. Apenas Minas Gerais (16) e São Paulo (11) estão à frente da Bahia. Paraná e Piauí, como nove, vão na sequência. Na Bahia, 65 emissoras (radio e TV) estão nas mãos de políticos no exercício de cargo elegível.

A nossa faixa litorânea, geograficamente privilegiada, passou por um processo de ocupação
desordenada com as barracas de praia. Os governantes buscaram enfrentar a favelização da nossa orla, tão prejudicial ao turismo e à geração de emprego e renda da cidade. A prefeitura investiu no Programa de Requalificação da Orla de Salvador. Retirou a publicidade irregular, e dos entulhos da praia. Falta retirar as barracas irregulares para a liberação das praias para os banhistas contemplar as belezas dos nossos 51 quilômetros do litoral em sua plenitude. 

Precisamos cuidar melhor das nossas paisagens, manter limpa as ruas, monumentos e patrimônios culturais. Revitalizar os locais que envelhecem ou deterioram, como é o caso das igrejas centenárias da capital, ou mesmo a Lagoa do Abaeté que está abandonada. É preciso melhorar setores como o trânsito e a segurança para que os turistas circulem confortavelmente. É preciso também que os órgãos do setor de turismo façam campanhas para que os moradores de Salvador compreendam a importância do turismo. A cidade tem potencial para aumentar o número de turistas, que devem ser bem tratados.

É preciso melhorar a paisagem de Salvador. Há um grande número de imóveis inacabados que a
deixa muito feio. 

Muitos sem reboco dão um aspecto de favelização permanente. 

Esses imóveis muitas vezes são construídos sem projeto urbanístico, mostrando um empobrecimento visual por falta de variações arquitetônicas.




“A impressão que eu tenho de Salvador é uma cidade devastada pela `alegria`. Você pode fazer tudo, lutar contra um esquema onde a impressão que temos é a de que todo mundo está contra você, parar o seu trabalho como eu parei durante dez dias consecutivos na Pinacoteca; se dedicar mais de um ano ao projeto; manter contatos com fotógrafos que liberaram os royalties das obras para viajar com seguro insignificante; ter a compreensão do diretor da Pinacoteca, Marcelo Araújo, de abraçar o projeto, trazer sete exposições, reunir dez artistas, além de Pierre Verger, que foi uma parceria com a Fundação homônima. A sensação que eu tenho é a de não ter provocado nenhum tipo de reflexão para a cidade. Será que, na próxima edição, teremos que alugar Naomi Campbel para `dar visibilidade internacional` para o Agosto, como foi feito no último Carnaval? Miss Campbel subiu no trio elétrico para `simbolizar` uma harmonia entre as nossas questões de perda de memória e as questões afrodescendentes. Cicatrizes não se curam com `simbolismos`.”. Esse foi o desabafo do curador Diógenes Moura para a revista Muito (07/09/2008, pags 14 a 17)  que sofreu com a falta de apoio oficial, do setor privado e a mídia para dar visibilidade às exposições do Museu de Arte Moderna de Salvador ( MAM) - num estado que tem servir de ícone para o Brasil, haja vista ser a capital cultural do país. "Precisa-se oxigenar o olhar da Bahia, por isso a necessidade de trazer gente de fora".
 
A Bahia é um lugar para amar e odiar com a mesma intensidade. Pode ser mãe e também madrasta.
Nas duas vezes que a arquiteta e curadora italiana Lina Bo Bardi esteve em Salvador, defendeu o resgate da “alma popular” da cidade e a valorização dos artesãos. Ela via a arte popular não como folclore, mas uma realidade criativa. A cidade não entendeu com o resgate da dessemelhante e triste Bahia antiga e continuou cada vez mais descaracterizada culturalmente.

A 85ª edição da Muito traz na capa o artista visual e curador Emanoel Araújo. Ele foi o responsável pela criação do Museu Afro Brasil, em São Paulo, além de ter devolvido aos paulistanos a Pinacoteca do Estado de São Paulo, um dos mais importantes centros de arte do País.  Crítico feroz da política cultural brasileira, Emanoel Araújo não esconde o descontentamento com a Bahia de hoje. Para ele, tudo aqui se transformou em folclore. “A Bahia não precisa dessa folclorização que estereotipa tudo, da baiana de acarajé aos capoeiristas.  Acabou a arte aqui.  Onde está a memória de Genaro de Carvalho, de Jenner Augusto, de Mario Cravo? A Bahia trata mal seus artistas”.

(Esse texto foi escrito em 2008 e não mudou nada de lá até aqui
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