29 julho 2011

Henrique Fleiuss e o advento da caricatura política (2)

“Esse índio criado por Fleuiss – branco, feições europeias, inocente, jovial e ingênuo, robusto e bem nutrido, com penas e cocares como jamais as usaram nossos silvícolas reais – será imitado por todos os chargistas desse final de Monarquia, inclusive pelo próprio Agostini, que também desenha sua própria versão idiossincrática de índio como representação simbólica do país. Fleiuss também foi o primeiro chargista a introduzir um personagem fixo, o Dr. Semana, como seu alter ego com a função de satirizar o cotidiano político da cidade. Agostini, por sua vez, tanto na Revista Ilustrada de 1876, quanto na Dom Quixote de 1895, também introduz personagens fixos e fictícios como o Dr. Beltrano e o Dom Quixote. A diferença entre eles está no fato de que o boneco de Fleiuss era imaginário, ao passo que Agostini caricaturava a si próprio nos personagens que criava” (p. 8 e 9).


E ele encerra esse seu primeiro capítulo (Precursores) afirmando:

“Com seu traço pesado e ´germânico`, forjado na ortodoxia do desenho de anatomia humana das velhas academias europeias, Henrique Fleiuss como chargista não se sobressai entre seus pares. Suas charges se prolongam por quadros sucessivos, acompanhadas por longos textos, como era moda no romantismo da época. Entretanto, são essas características – personagens fixos, pluralidade de quadros e textos verbais – que as tornam precursoras de HQ, sobretudo em relação aos Comics Books americanos, cujos primeiros números só surgem em 1934! Durante toda a Monarquia, as charges criaram e mantiveram uma linguagem gráfica semelhante à estrutura narrativa de HQs, o que nos autoriza a classificá-las hoje como legítimas e autênticas precursoras desse gênero, bem antes que americanos e europeus as inventassem `oficialmente`!”. (p.9).


A filosofia da Semana Illustrada resumia-se no lema “Ridendo castigat mores”, o que numa tradução livre pode ser tomada como “(A sátira) rindo corrige os costumes”. Era o que vinha escrito na capa, no alto do frontispício. Logo em seguida, em primeiro plano, apareciam as popularíssimas figuras do Dr. Semana e seu fiel companheiro, o infalível Moleque. O primeiro, de aparência atarrancada, com vasta cabeçorra, lápis em riste e acionando uma lanterna mágica, comentava os principais fatos da atualidade com o Moleque. Este se apresentava sempre a posição irreverente, fazendo alguma apreciação maliciosa a respeito.


Trajando a caráter, aparecia de libré, como era comum aos pequenos escravos, que serviam de pajens às casas ricas da Corte. Mais tarde, Fleuiss ainda incorporou à dupla um terceiro personagem, dona Neguinha, esposa do Moleque. Ao que tudo indica, o Dr. Semana era uma adaptação dr Dr. Sintaxe, tipo crítico criado pelo caricaturista inglês Thomas Rowlandson, em 1798. Tanto Dr. Semana quanto Moleque se transformaram em símbolo da crítica dos costumes, das fraquezas e dos cacoetes políticos da época.


Na concepção de Fleiuss, a prática do jornalismo bem humorado, compreendia também o exercício de uma função cívica e de caráter pedagógico, no sentido de orientar o cidadão quanto as suas ações no espaço público. Fatos como a crise bancária de 1864, provocada pela bancarrota da Casa Souto criticava a falta de controle sobre os bancos emissores de papel moeda e de títulos (Semana Illustrada nº.197, 18/09/1864). Consciente de seu papel de formador da opinião pública, o semanário estampou charges em prol do alistamento voluntário, logo que se iniciou o conflito com o Paraguai (1865). Longe dos campos de batalha, a Semana Illustrada promoveu campanhas que mobilizaram a população. Abraçou a causa da lei do ventre livre, apoiando o projeto do ministério Rio Branco (Semana Illustrada nº.537, 26/03/1871).


Considerado um pioneiro da imprensa ilustrada humorística no Brasil1, Fleiuss manteve por 16 anos um hebdomandário bem diferente dos que à época alcançava maior destaque social2. Seu formato era pequeno, com oito páginas, quatro de texto e quatro com ilustrações. Publicava poesias, crônicas, contos. Pela Semana Illustrada passaram os mais conhecidos escritores e jornalistas da época: Machado de Asis, Quintino Bocaiuva, Pedro Luis, Joaquim Manoel de Macedo, Joaquim Nabuco, Bernardo Guimarães. Até o n.10, a Semana Illustrada foi totalmente desenhada e litografada por Fleiuss, recebendo, daí por diante, a cooperação de H. Aranha, Aristides Seelinger e Flumen Júnior. No seu último ano, teve também a colaboração de Aurélio de Figueiredo3.


O traço conservador na caricatura, aliado à timidez na sátira política, certamente contribui para o rápido fim da Semana Illustrada, tão logo teve que enfrentar a concorrência da arte brilhante de Ângelo Agostini, que garantiu o sucesso imediato da Revista Illustrada4. Alguns comentários sobre Fleuiss encontra-se na obra de Herman Lima, Historia da Caricatura no Brasil5, e na de Nelson Werneck Sodré, História da Imprensa no Brasil6. Ambas, contudo, defendem a imagem de um artista limitado na arte da caricatura e nas críticas sociais, pois o pioneirismo de sua revista perderia o valor ao deparar-se com outras desenhadas por estrangeiros de “punho mais ácido”, como Ângelo Agostini, Rafael Bordalo Pinheiro e Luigi Borgomainerio.

Referências:

ARAGÃO, Octávio. Henrique Fleiuss, a Semana Illustrada e o advento da caricatura política. 170 anos da Caricatura no Brasil. Rio de Janeiro: Jornal da ABI. Edição extra (322), Outubro de 2007.

FONSECA, Joaquim da. Caricatura. A imagem gráfica do humor. Porto Alegre: Artes e Ofícios, 1999

LAGO, Pedro Corrêa do. Henrique Fleiuss. In: Caricaturistas Brasileiros 1836-1999. Rio de Janeiro: Sextante Artes, 1999

LIMA, Herman.Henrique Fleiuss in: História da Caricatura no Brasil. Vol.2. Rio de Janeiro: José Olympio, 1963

SODRÉ, Nelson Werneck. História da Imprensa no Brasil. São Paulo: Martins Fontes, 1983

TEIXEIRA, Luiz Guilherme Sodré. O traço como texto. A história da charge no Rio de Janeiro de 1860 a 1930. Rio de Janeiro: Fundação Casa de Rui Barbosa. Coleção Papéis Avulsos nº38, 2001

1LIMA, Herman. “Henrique Fleiuss” in: História da Caricatura no Brasil. Vol.2. Rio de Janeiro: José Olympio, 1963, p.745

2Dentre os jornais da corte com maior tiragem na década de 1860 destacam-se, sobretudo, o Jornal do Comércio, Correio Mercantil, e o Diario do Rio de Janeiro. Nenhum periódico ilustrado havia conseguido se firmar.

3FONSECA, Joaquim da. Caricatura. A imagem gráfica do humor. Porto Alegre: Artes e Ofícios, 1999, p.217.

4LAGO, Pedro Corrêa do. “Henrique Fleiuss”. In: Caricaturistas Brasileiros 1836-1999. Rio de Janeiro: Sextante Artes, 1999, p.24

5LIMA, Herman. Op.Cit.

6SODRÉ, Nelson Werneck. História da Imprensa no Brasil. São Paulo: Martins Fontes, 1983

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28 julho 2011

Henrique Fleiuss e o advento da caricatura política (1)

O artista alemão Henrique Fleiuss (1823-1882) chegou ao Brasil aos 35 anos de idade. Gozando da proteção imperial ele fundou, no Rio de Janeiro em 1860 o primeiro periódico ilustrado humorístico que teve uma existência duradoura: a Semana Illustrada (1860-1876), cuja vida prolongou-se por quase 16 anos, quando foi superada pela novidade e qualidade superior da Revista Illustrada, lançada por seu rival de maior talento, Ângelo Agostini, em 1876.


E para despertar a curiosidade do público leitor, Fleiuss produziu o primeiro cartaz-anúncio ilustrado de que se tem notícia no Brasil (Ernesto da Cunha de Araujo Vianna, “Das artes gráficas no Brasil em geral e na cidade do Rio de Janeiro em particular”. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, 78 (132) p.579, 1015). O apelo publicitário surtiu o efeito desejado. Ao ser lançado, o semanário tornou-se um sucesso de venda. Pioneiro da imprensa ilustrada no Brasil, inclusive das histórias em quadrinhos, Henrique Fleiuss desenhou e litografou a Semana Illustrada até o número dez. Daí em diante passou a contar com a colaboração de diversos artistas.


Iniciando um estilo de publicação até então inexistente no Brasil, Fleiuss criou não apenas o formato que todas as revistas semelhantes seguiriam, como também inovou ao introduzir um personagem central que comentava as notícias na capa da revista: o Dr. Semana. Sempre acompanhado por um menino negro (Moleque) com quem contracenava, o Dr Semana logo caiu no gosto popular. O desenho de Fleiuss visava ao melhor resultado na litografia e o máximo que se permitia em termos de caricatura era exagerar o tamanho da cabeça com relação ao corpo. Na verdade, preferia retratar com bastante precisão os traços das celebridades da época, sem deformá-los, e alcançava a qualidade fotográfica que o público esperava então num jornal ilustrado. Apesar de não ser o primeiro a efetivamente publicar esse tipo de trabalho no Brasil, Henrique Fleiuss o fez com uma boa regularidade ímpar, num veículo de bom alcance e com periodicidade inconteste.


Formado em Belas Artes na Alemanha, Fleiuss cria uma topografia que Pedro II transforma em Imperial Instituto Artístico, inspirando assim essas relações promíscuas, às vezes ambíguas, em todo caso sempre perigosas, entre intelectuais e o poder público. O curioso é que seu ofício – o traço como sátira política – se caracteriza, essencialmente, pela permanente crítica e sistemática oposição a todo poder constituído. Essas relações de amizade e apoio à Monarquia, de resto, custarão caro ao alemão, que será alvo, por todo esse período, de ácidas críticas dos demais chargistas, sobretudo do principal deles, o italiano Ângelo Agostini.

O pesquisador Octavio Aragão nos 170 anos da caricatura no Brasil escreveu: “Informado a respeito dos últimos sucessos europeus em termos de ilustrações, no afã de alcançar popularidade, Fleiuss não hesitava em adaptar e até copiar caricaturas estrangeiras, para horror de seus colegas, Ângelo Agostino deu-se ao trabalho de desenhar uma página dupla – As Apoquentações do Dr. Semana – satirizando a falta de originalidade do colega, publicando-a na Vida Fluminenses. Agostini subtitulou a saga do Dr. Semana, como Desenho Para Crianças, Por Angelo (Que Não Copiou de Nenhum Jornal Allemão) fazendo alusão direta ao gosto de Fleiuss pelas criações de Wilhelm Busch, autor dos personagens Max und Moritzz (Juca e Chico)” (ARAGÃO, 170 anos da Caricatura no Brasil. Rio de Janeiro: Jornal da ABI, Outubro de 2007, p.4).


Em seu trabalho de pesquisa intitulado “O traço como texto”, Luiz Guilherme Sodré Teixeira informa que o Dr Semana é anterior ao Max und Moritz, publicado em 1865 por Wilhelm Busch e ao Yellow Kid, de Richard Outcault em 1895. “Entretanto, tal como os de Fleiuss, esses personagens são escassamente citados, precariamente reconhecidos, quando não solenemente ignorados pelos estudiosos do gênero, que reproduzem as mesmas datas e personagens pelas culturas hegemônicas” (p.2). E diz mais:


“Se um personagem como o Dr. Semana não é original, não deixa de surpreender a figura do Moleque, bem apessoado e capaz de ironizar a política da Corte. Monaquista convicto e amigo pessoal de Pedro II, Fleiuss produzia uma charge ´de adesão`, francamente favorável ao imperador, sendo, por isso, alvo da sátira de chargistas como J. Mill no Bazar Volante, Bordalo Pinheiro em O Mosquito e, sobretudo, Agostini, em Arlequim e Vida Fluminense. Contudo, essa posição politicamente conservadora não o impede de colocar em 1864 o Moleque discursando no Parlamento, nem de `alforriá-lo´ em 1866. Atitude surpreendente, pois nessa década, a Abolição – como ideia ou movimento – mal engatinhava no país” (TEIXEIRA, O traço como texto. Rio, Fundação Casa de Rui Barbosa, 2001, p. 7 e 8).


E o estudioso escreveu mais: “Entretanto, a ideia mais original de Fleiuss é a representação do índio como símbolo da nacionalidade brasileira, misturando a idealização do país com um ingênuo naturalismo, centrados na ideia da natureza como ´pura´e do índio como intrinsecamente bom – o Paraíso, enfim, como lugar da inocência – cujas origens remontam às teses do bom selvagem de Rouseau, populares entre a elite europeia do século XIX”.

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27 julho 2011

Sisson é um dos pioneiros dos quadrinhos brasileiros

“(...) Somos ainda hoje uns desterrados em nossa terra. Podemos construir obras excelentes, enriquecer nossa humanidade de aspectos novos e imprevistos, elevar à perfeição o tipo de civilização que representamos: o certo é que todo o fruto de nosso trabalho ou de nossa preguiça parece participar de um sistema de evolução próprio de outro clima e de outra paisagem”.


Esse texto é de Sérgio Buarque de Holanda em sua obra Raízes do Brasil (Editora José Olympio, 1936). É preciso colocar um pouco de história real na história oficial. Esse sofisticado instrumento de apreensão crítica do real que chamamos charge é a raiz da HQ. Ambas surgem no interior dos jornais e revistas que tinham a sátira como veículo privilegiado de sua comunicação e que inundam, a partir da segunda metade do século XIX, a escassa sociedade letrada do país. Ambas se confundem num mesmo discurso gráfico articulado por imagens que têm o texto verbal como suporte narrativo. Com o tempo, entretanto, a charge tende a abandonar esse texto (à medida que amadurece a sua estrutura interna, isto é, a linguagem específica de seu traço) ao passo que HQs mantêm um perfeito equilíbrio entre um e outro ao longo de toda a sua história.


Por outro lado, ao contrário de HQs que procuram desenvolver aqui um estilo a partir de uma temática ficcional própria, mas acabam subjugadas pela penetração massiva de HQs americanas, a charge consegue fincar raízes entre nós por dois motivos principais: eleger a política como objeto privilegiado para a expressão de sua forma e manifestação de seu conteúdo. Em consequência, a eficácia de seu discurso está organicamente ligada à sociedade na qual se insere.


SISSON


Sébastien Auguste Sisson, conhecido também como Sebastião Augusto Sisson e S. A. Sisson, (1824 - 1898) foi um litógrafo, desenhista e biógrafo francês radicado no Brasil. Trabalhou em Paris e radicou-se no Brasil em 1852, no Rio de Janeiro, onde abriu ateliê no centro da cidade, dedicando-se sobretudo a retratos. Trabalhou para importantes revistas da época e sobressaem em sua lista de trabalhos o Álbum do Rio de Janeiro Moderno, com cromolitografias e a Galeria dos Brasileiros Ilustres, redigida em fascículos a partir de 1857. Cessou sua atividade no fim da década de 1870.


Sisson teria sido, segundo o pesquisador Heman Lima (em História da Caricatura no Brasil, 1963, volume I, página 94) o criador da primeira história em quadrinhos do Brasil, chamada “O Namoro, quadros ao vivo, por S… o Cio”, publicada na revista Brasil Illustrado (1855) para satirizar os costumes sociais de meados do século XIX.


Em 1882, foi nomeado cavaleiro da Imperial Ordem da Rosa.


Referências:

LIMA, Herman. História da Caricatura no Brasil. Editora José Olympio, Rio de Janeiro, 1963.

MENEZES, Paulo Roberto de Jesus. Sociedade, Imagem e Biografia na Litografia de Sebastião Sisson. Dissertação de Mestrado (Programa de Pós-Graduação em História Social, PPGHIS) – Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2008.


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26 julho 2011

Primeira charge brasileira

O aparecimento relativamente tardio da caricatura na nossa história é revelador da demora que a imprensa levou para chegar até nós. Embora no período colonial o Brasil tenha sido privado da imprensa por determinação real, a caricatura já se manifestava de outras formas como expressão do povo nas festas de carnaval, de bumba-meu-boi, na malhação de Judas, e através de bonecos e fantasias que satirizavam pessoas e costumes da época. Foi em 1837 o ano da primeira caricatura brasileira.

Pintor, arquiteto, autor dramático, poeta e diplomata, Manoel de Araújo Porto-Alegre (1806-1879), depois Barão de Santo Ângelo, tão logo volta ao Brasil, tratou de divulgar a arte desenvolvida nos seus anos no exterior, publicando em dezembro de 1837 a primeira charge brasileira no Jornal do Commercio, que satiriza Justiniano José da Rocha, político de relevo da época.


Com a vinda para o Brasil da família real portuguesa e a abertura dos portos, em 1808, é que estabeleceram aqui as primeiras oficinas gráficas. Começou, a partir daí, o desenvolvimento da impressão de livros e periódicos. Os jornais, no entanto, eram apenas tolerados, e quem se manifestava contra o governo sofria as sanções da censura e da perseguição. Os jornais, até então, não publicava caricaturas. Estas circulavam apenas como estampas avulsas, ainda de forma tosca e sem qualidade. As inovações técnicas, chegadas ao Brasil em meados do Século XIX, permitiram o advento da gravura e, consequentemente da caricatura, na imprensa brasileira, causando considerável impulso, assegurando novas condições à crítica e ampliando sua influência. Nesse sentido, o texto humorístico foi precursor da caricatura, que somente apareceu quando as técnicas da gravação permitiram conjugar as palavras coim a atração visual do desenho e da imagem.

A primeira caricatura brasileira, atribuída a Manoel de Araújo Porto Alegre (1837), apareceu como uma estampa avulsa e foi exibida pelo Jornal do Comércio do Rio de Janeiro, nº277, de 14 de dezembro de 1837. A caricatura, mais propriamente a charge, tratava de uma crítica às propinas recebidas por um funcionário do governo relativas ao Correio Oficial.


O aparecimento da caricatura passou a dar à imprensa recursos de enorme amplitude e a anunciava uma mudança que iria justificar o processo político. Era uma época de grandes mudanças, marcadas pela extinção do tráfico negreiro (lei de 1850), perla Guerra do Paraguai (1864-1870) e pela consolidação do Império.


A profusão de imagens nas mídias emergentes (jornais, cartazes, estampas e espetáculos teatrais) constitui uma revolução visual. São sinais de uma consciência da cidade em transformação. A imprensa ilustrada provoca um impacto no imaginário, nos costumes, na consciência dos fatos do tempo vivido, na percepção da cidade. As evoluções técnicas tipográficas, como a da gravura em bois de bout (“em madeira de topo”), fazem com que texto e imagem possam se associar na mesma página, barateando a produção de jornais, que se sucedem: La Silhouette (1829-1830), La Caricature (1830-1835, que une o romancista Honorpé de Balzac ao editor Charles Philipon), Le Charivari (1832-1872), Le Magasin PittoresqueLe Musee pour Rire mostram a vida social e comercial do momento entremeada pela sátira à política. (“enciclopedia popular”, a partir de 1833, com tiragem de 100 mil exemplares),


O texto inclui imagens e, o que é mais interessante, dialogo e se confunde com elas, chegando a tornar-se imagem como no caligrama em forma de pêra que evoca o contorno do rosto do Rei Louis-Philippe, na célebre edição da lei da censura, no La Caricature, em 1835. A imagem subjuga o texto ou faz dele seu comentário, abolindo as regras de composição tradicionais. (SALGUEIRO, 2003, p.32).


Philipe Hamon (HAMON, 2001, p.11) lembra que o século XIX provocou uma modificação profunda e radical na relação texto-imagem ao aperfeiçoá-la tecnicamente, ao industrializá-la, ao fazer circular amplamente e em proporções outras uma nova imagerie, constituída de novos objetos e novas práticas cotidianas. O agenciamento, a complementariedade texto/imagens constitui, pois, uma inovação do século XIX, que inaugura também “o livro ao alcance de todos” e, por extensão, novas formas de lei (CHARTIER,1990).


Os métiers de editor, livreiro, impressor, jornalista, romancista, ilustrador se confundem. O crescente mercado da literatura ilustrada, o romance-folhetim, os clássicos reeditados com figurinhas e vinhetas, os livros de bolso, os livros de viajante, os anúncios, os cartazes, enfim, a comunicação visual e a publicidade facilitados pela reprodução mecânica que caracteriza esse tempo de leitura “a vapor”, quando o livro muda de estatuto, rompendo os laços com os sistemas de representações anteriores.


Assim, a imprensa ilustrada não é um fenômeno isolado, ela é indissociável do universo do teatro de boulevard e da caricatura dos costumes

Referências:

CHARTIER, Roger e Henri-Jean Martin. Histoire de l´Édition Française. Les temps des éditeurs. Du Romantisme à la Belle Époque, tomo III, Paris: Fayard/Cercle de la Librairie/CNL, 1990

HAMON, Philippe. Littérature et Image au XIXº Siècle, Paris: José Corte, 2001

SALGUEIRO, Heliana Angotti. A Comédia Urbana: de Daumier a Porto-Alegre. Catálogo coordenado e redigido por Heliane. Fundação Armando Alves Penteado. São Paulo: Museu de Arte Moderna Brasileira – MAB. FAAP, 2003

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25 julho 2011

Pulp, uma paixão pela leitura (4)

O folhetim radiofônico teve seu papel na integração entre mídias visuais e auditivas. O elemento de ligação entre elas foram os textos. É Patati & Braga (2006) que constata que personagens como Batman tem uma dívida enorme para com o folhetim radiofônico. No caso específico, com o Sombra (que inspirou o Homem Morcego), aquele que “conhece o mal que se esconde nos corações humanos”. O Sombra se trajava de modo misterioso, terno sóbrio desaparecia embaixo de uma capa comprida, de um chapéu de abas largas e de suas infalíveis pistolas calibre 45. No rádio, seu caráter misterioso era sublinhado por uma gargalhada sinistra, que gelava o sangue dos bandidos e do público.


Tanto Batman como o Sombra ostentam identidades secretas de playboys internacionais. O que Batman acrescenta é um signo identificável, um ícone para demarcar seu mistério: o morcego. Um totem mais visual que o Sombra. Esse flerte das HQs com aventuras escritas e ouvidas tinha um apelo popular. Como a narração vocabular é muito mais antiga que a visual, a fabulação popular dos folhetins forneceu modelos preciosos para o início dos textos de gibis. Outro exemplo marcante dessa interação entre mídias está no personagem Superman. “É um pássaro? Um avião? Não! É o Superman!”, o bordão de rádio, mídia à qual a popularidade do personagem logo o alçou. Depois veio a série de TV, aventuras no cinema, nos games e no computador.


Foi em 1935 que um escritor de pulps, major Malcolm Wheeler-Nicholson, imaginou a ideia de publicar uma revista com novas histórias e personagens, em vez das reedições dos jornais. Ele intitulou sua revista de New Fun Comics, e sua segunda revista New Fun Comics mais tarde More Fun Comics e New Adventure Comics. O único título que vingou foi Detective Comics, a primeira revista em quadrinhos a se especializar em um assunto, lançada em março de 1937. E em junho de 1938 surgiu Action Comics prometendo aos leitores algo único e inteiramente diferente do que vinha sendo publicado.


Os dois jovens judeus Siegel & Shuster “ao invocar um messias”, e quando ele veio alimentado que foi pela leitura contumaz de folhetins de ficção científica que grassavam na imprensa popular chegou trajando capa e utilizando superpoderes. O caldo de cultura no qual nasceu o SupermanGladiator, de Philip Wylie. Super homem foi a gênese de uma série interminável de super-heróis. é confessamente devedor do folhetim


Dos anos 1940 até os 60 a ficção popular nos EUA passou por grandes mudanças. Os pulpspulps, tornaram-se respeitáveis. A ficção científica, outrora considerada sub-literatura, ganhou em popularidade e tornou-se matéria prima do mercado editorial dos livros de bolso, embora somente na década de 70 o gênero finalmente tinha se tornado aceito como literatura. O que foi considerado um gênero ordinário, um lixo, em 1940, tornou-se ficção reconhecida nos anos 50, exceto os gibis. Mas aí é outra história... aos poucos se tornaram livros de bolso. Histórias de mistério com detetives durões, uma das fontes dos


Referências:


JONES, Gerard. Homens do amanhã. São Paulo: Conrad Editora do Brasil, 2006.

KNOWLES, Christopher. Nossos deuses são super-heróis: a história secreta dos super-heróis das revistas em quadrinhos. São Paulo: Cultrix, 2008.

PATATI, Carlos; BRAGA, Flávio. Almanaque dos quadrinhos; 100 anos de uma mídia popular. Rio de Janeiro: Ediouro, 2006.

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22 julho 2011

Pulp, uma paixão pela leitura (3)

George C. Jenks (sob o pseudônimo de Frank S. Lawton) escreveu O Sombra, heroi destemido e misterioso que combate o mal ajudado por uma equipe de especialistas. Um programa de rádio aproveitou o personagem e o levou aos lares norte-americanos com suas histórias de mistério e suspense. A gargalhada sinistra e a voz cavernosa que dizia “quem sabe o mal que se esconde no coração dos homens? O Sombra sabe...” espantaram os norte-americanos. O Detetive Fantasma, O Aranha, Tarzan, Fu Manchu, G-8 e o Capitão Futuro agradavam ao público leitor. Assim, a mitologia explorada pelos pulps é tão forte que impregnou o cinema, o rádio, os quadrinhos e a imaginação de milhares de pessoas no mundo todo.


Por mais que o riso tenha sublinhado a eclosão das HQs na imprensa norte-americana do começo do século XX, é com a ênfase aventureira e o foco posterior desta nos super-herois que o quadrinho norte-americano ocupa todos os espaços da mídia. O modelo aconteceu de modo planetário. A expansão do mercado pedia histórias longas e estilizações drásticas no traço, assim como narrações elaboradas, para além dos limites espaciais da piada de uma página ou de três quadros com três tempos da narração.


O combustível dessas novas histórias veio de escritores como Dickens e O. Henry até Walter B. Gibson, o criador do Sombra, e Sax Rohmer, o criador de Fu Manchu. O folhetim foi resposta para a busca de argumentos e estruturas narrativas na HQ. O grande modelo da HQ que se expandiu mundo afora foi esse folhetim aventureiro sensacionalista norte-americano. As façanhas super-humanas (Doc Savage) e os personagens envoltos em mistérios inexplicáveis (O Sombra, Fu Manchu) em um sentido muito literal, foi a matéria-prima dos gibis.

Antes do estouro dos gibis na década de 30, os pulps foram a fonte de entretenimento para os americanos pobres e divulgadores da ficção científica, gênero literário que transformaria o entretenimento. E dessas raízes pulps surgiram os gibis de super-herois. O principal modelo dos quadrinhos em sua expansão pela imprensa do planeta é o folhetim popular de aventura, escrito e ilustrado com paixão por autores marginais e editores ocupados em não quebrar. Duas das mais longevas e conhecidas séries de HQs de aventuras são adaptações de folhetins: Buck Rogers (Philip Nowlan foi contratado por John F. Dille para adaptar seu Buck Rogers, nascido nos pulps, para os quadrinhos com desenhos de Dick Calkins), de 1929, e Tarzan (de Edgar Rice Burroughs, adaptado a princípio por Hal Foster e realizado em toda a sua majestade por Burne Hogarth), em 1931.


Os dois personagens tinham público entre os leitores de folhetins, nos EUA conhecidos como pulps. Essa literatura barata popularizou personagens e autores com relativa rapidez. Tarzan, a criação do escritor Edgar Rice Burroughs, surgiu pela primeira vez no romance Tarzan of the Apes, que foi publicado na pulp The Argosy, em 1912. A história se tornou tão popular que levou a inúmeras sequências em pulps, em seguida adaptada para uma série de filmes e, finalmente, em uma tira de quadrinhos de jornal. Buck Rogers, foi personagem principal de um conto, Armageddon 2419, escrito por Philip Francis Nowlan e publicado no número de agosto de 1928 de Amazing Stories, a primeira pulp somente de ficção científica. A partir do sucesso dessa história, no ano seguinte Francis Nowlan, junto com o desenhista Dick Calkins, transformou-a em tiras de quadrinhos diárias.


A grande popularidade das tiras de quadrinhos em 1933 convenceu editores a lançar coletâneas mensais com reedições. Essas primeiras revistas em quadrinhos, intituladas Famous Funnies, Popular Comics e King Comics eram dirigidas a leitores que queriam preservar suas tiras favoritas em forma de revistas. Também ajudavam leitores que haviam perdido episódios em tiras publicadas no mês anterior. Essas reedições foram as primeiras revistas em quadrinhos mensais, mas nenhuma delas trazia material novo.


Inspirados em folhetins de ficção científica tosca, ou que narravam peripécias em terras estranhas, nasceram as HQs de aventuras, e elas proliferaram com rapidez. Basta falarmos em Brick Bradforfd (de William Ritt e Clarence Gray) e de Flash Gordon (de Alex Raymond), quanto ao modelo “astronáutico”, diversos outros personagens assemelhados são derivados de Buck Rogers, assim como Jim das Selvas (Alex Raymond) e Fantasma (Lee Falk e Ray Moore) são derivados do Tarzan. Isto, não por inclinações dos autores, mas de seus editores, que entenderam ser cada qual adequado a uma tendência de público.

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21 julho 2011

Pulp, uma paixão pela leitura (2)

Para os judeus do início do século XX a rota mais curta para a fama era através do entretenimento para as massas, áreas nas quais os norte-americanos tradicionais não estavam interessados em trabalhar, seja por preconceito, esnobismo ou provincianismo. Na década de 1920, os norte-americanos começaram a comprar revistas como nunca. Tecnologia de impressão barata, distribuição na era dos automóveis, dinheiro para gastar e uma fome de informações sobre um mundo que mudava a cada dia conspiraram para tornar a banca de revistas uma das principais arenas da cultura nacional. No início da década havia nas bancas mais de dois mil títulos. Os americanos passavam mais tempo lendo revistas do que em qualquer outra atividade de lazer.


O elo comum em toda ficção pulp não era violência, sangue ou mesmo vingança. As histórias eram escritas para entreter, e por cinco décadas eles agradaram milhões de leitores. Centenas de diferentes revistas lotaram as bancas. De 1920 até 1930 os pulps foram o lar da maior parte da literatura de ficção científica e fantasia dos Estados Unidos. E dessas raízes pulps surgiram os gibis de super-herois. Tiras de quadrinhos de aventuras para crianças e adultos eram publicadas em forma de seriado há décadas nos jornais. No início dos anos 30, Tarzan e Buck Rogers emergiram dos pulps.


As revistas de crime geraram muitos títulos e revelaram um dos maiores escritores norte americanos: Dashiell Hammett, autor de O Falcão Maltês e criador do romance noir. As revistas de ficção científica revelaram nomes como Isaac Assimov e Ray Bradbury. E o que marcou a maioria das pessoas foram os personagens criados para essas publicações. Além de Tarzan, desfilaram pelas páginas dos pulps O Sombra, Doc Savage, Capitão Futuro, Conan, Buck Rogers, Fu Manchu e muitos outros. Os personagens foram sucessos em sua época, e atravessaram os anos em livros, quadrinhos e cinema, fossem como adaptações dos mesmos ou como influência na criação de outros personagens.


Duas editoras de pulps tornaram-se depois importantes editoras de gibis – a Dell, fundada por George Delacorte, e a Fawcett, de Wilford e Rascoe Fawcett. Os pulps estabeleceram o pano de fundo para a expansão dos quadrinhos, difundiram os “fãclubes” (a comunidade fandom, fusão das palavras fan –fã – e kigdom – reino) organizados, que se formavam em torno de títulos, gêneros e herois. As páginas onde eram publicadas as Cartas dos Leitores tornaram-se sedes de fato desses clubes. Os editores de pulps compensavam a má qualidade do papel e da impressão estampando em suas capas ilustrações coloridas e que chamavam a atenção. E é Christopher Knowles em seu livro sobre a história secreta dos super-herois das histórias em quadrinhos que conta:


Os pulps não surgiram no vácuo. A cultura popular americana sempre esteve às voltas com sua herança puritana. Em 1919, a 18ª Emenda constitucional proibiu a venda de álcool numa tentativa de inibir a rápida expansão de liberalismo social e cultural que surgiu após a Primeira Guerra Mundial. A Lei Volstead, como ficou conhecida, teve uma reação explosiva, expressada no jazz, nas bebidas ilegais e em ficção de conteúdo sexual explícito. Como regra, os pulps tornaram-se o veículo para toda sorte de expressão proibida, inclusive para temas ocultistas. Muitos escritores de pulps, como Talbot Mundy, estavam ativamente envolvidos no ocultismo; outros se encantavam com ele. Os heróis do pulp viviam no limite do que seria culturalmente correto, e pareciam se deleitar ao porem à prova as normas sociais (KNOWLES, 2008, p. 94 e 95).


Entre os herois dos pulps estavam o aristocrático detetive Nick Carter (1886), o nobre selvagem livre da corrupção da civilização Tarzan (1912), de Edgar Rice Burroughs, o poderoso The Gladiator (1930) de Philip Wylie, o misterioso O Sombra (1930), de Walter Gibson, o invencível Doc Savage (1933), de Lester Dent. Seguiram o Whisperer, o Avenger, o Spider, Detetive Fantasma, Black Hood, Captain Satan entre outros. Todos esses herois mascarados existiam na periferia da sociedade convencional que eles procuravam salvar – as máscaras eram feitas para bandidos, não para homens da lei. Os super-herois dos pulps eram perigosos, em marcante contraste com os super-heróis das revistas em quadrinhos que surgiram depois, todos íntegros. Os pulps não só proporcionaram aos quadrinhos a maioria de seus herois e temas, como também proporcionaram à indústria a maior parte de sua equipe, dentre os quais os mais notáveis foram Harry Donenfeld, padrinho da DC Comics, e Martin Goodman, fundador da Marvel Comics.


Lester Dent (que assinava sob o pseudônimo de Kenneth Roberson) criou Doc Savage, mestre da mente e do corpo. A história “O Homem de Bronze” foi o título que acabou sendo incorporado no nome do personagem nas edições seguintes. Ele falava qualquer língua deste planeta, possuía conhecimentos avançados em física, química, psicologia e mecânica, tinha resistência física excepcional e muitas vezes se isolava na Fortaleza da Solidão (lembrou-se do Super Homem?), sua base secreta localizada no Ártico, onde planejava sua próxima empreitada.

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20 julho 2011

Pulp, uma paixão pela leitura (1)

O progresso na tecnologia de impressão criava novos tipos de entretenimento de massas. As “folhas largas” (broadsheets), tabloides ingleses com ênfases nas ilustrações feitas com xilografia e que tratava de assuntos e fofocas da época, dirigem-se a um público que era predominantemente analfabeta. Esses tabloides evoluíram e se tornaram “folhas de histórias” (story sheets), prosa fictícia sensacionalista impressa em uma única folha de tamanho gigante. E estes, por sua vez, transformaram-se nos “terríveis de um centavo” (penny dreadfuls), assim chamados por causa do seu baixo custo e de sua qualidade editorial. Os “terríveis de um centavo” apareceram em algum momento da década de 1830, tinham oito páginas e eram vendidos para um público operário.


Os pulps, chamados assim por causa do papel de baixa qualidade no qual eram impressos, eram descendentes diretos dos “terríveis de um centavo” e dos romances de dez centavos. De fato, a expressão “pulp fiction” passou a definir o gênero de ficção de baixa qualidade em geral. Revistas em quadrinhos, filmes “B” e programa de TV de conotação chauvinistas têm raízes temáticas nas revistas pulp. A “revista de polpa de madeira” chamada The Golden ArgosyArgosy) surgiu em dezembro de 1882. Na época os romances de dez centavos também eram o formato preferido para histórias de aventuras, mas os pulps tinham a vantagem de poder ser enviado por remessa postal de segunda classe, mais econômica. O novo formato evoluiu rapidamente para se tornar uma revista padrão de 128 páginas, com lombada grampeada ou colada e uma capa de papelão envernizado. Os primeiros pulps apresentavam histórias de faroeste ou de detetives, e algumas com temas de guerra ou de grandes aventuras. (mais tarde, apenas


Assim, há 128 anos surgia uma revista de ficção com formato de 17 por 25cm, papel descartável, custando apenas um centavo e que fez muito sucesso. Trata-se da Argosy, editada por Frank Monsey. Preço baixo e grande tiragem eram a receita de sucesso dos pulps até meados do século passado. Os pulps surgiram como uma opção de leitura e diversão para uma grande massa de trabalhadores que emigrava do campo para a cidade, formando o que seria chamado de sociedade de massas. Monsey foi além, ele lançou a célebre All Story Magazine que em 1912 publicou o conto “Sob as Luas de Marte”, de Edgar Rice Burroughs, que pouco tempo depois escreveu Tarzan dos Macacos.


As publicações eram grossas e baratas, impressas em uma tinta de um tom marrom escuro, com centenas de páginas de ficção em cada número. As capas eram coloridas, pintadas para inspirar terror, excitação, desejo e curiosidade. Os enredos eram cheios de brutamontes, orientais sinistros e namoradas seminuas de gangsteres. Algumas eram destinadas ao público adulto, mas a maioria visava garotos de oito a 14 anos – a idade dos herois como um editor a chamou. Não era possível encontrar essas revistas em biblioteca escolar e poucos pais as compravam. Mas os garotos tinham sede dessas revistas. A ficção científica era uma invenção perfeita para a América no final da década de 1920. Os horrores da industrialização e o inferno tecnológico da Primeira Guerra já se apagaram da memória. Rádios, carros e correio aéreo facilitavam a comunicação de forma imediata e davam ao desenvolvimento industrial um rosto novo e humano. A geração dos anos 1920 acreditava no progresso científico e no individualismo competitivo.

No início da década seguinte a fonte principal de entretenimento, tanto para jovens quanto para velhos, era a leitura. Para eles, havia os pulps, revistas baratas de ficção que foram publicadas aproximadamente de 1900 até 1955, e lidava com todo tipo imaginável de ficção, de western a romance, passando por esportes e mistério, até ficção científica. Eles juntavam seus trocados para poder comprar as revistas, e depois elas passavam de mão em mão até que a encadernação não aguentasse mais e as folhas caíssem. No livro Homens do Amanhã, Gerard Jones conta a história do império das comunicações nos EUA a partir do pulp: “A ficção científica era uma invenção perfeita para a América no final da década de 1920. Os horrores da industrialização e o inferno tecnológico da Primeira Guerra se apagavam da memória. Rádios, carros e correio aéreo facilitavam a comunicação de forma inédita e davam ao desenvolvimento industrial um rosto novo e humano. Uma economia de produção, que valorizava a parcimônia e a acumulação de capital, era pouco a pouco substituída por uma economia de consumo, baseada em gastos, crédito, autogratificação e culto às novidades. Em 1927 Charles Lindbergh foi endeusado quando, sozinho, usou uma máquina moderna para conquistar os ares. [...] Políticos, publicitários e contadores de histórias populares louvavam o mundo dos negócios, a invenção, a América, o indivíduo sem culpa e o futuro. Pela primeira vez os americanos passaram a ver a busca do novo como dever social e prova do heroísmo individual” (JONES, 2006, p. 55).

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