30 novembro 2009

Bahiano

Cantor. Nascido em 05 de dezembro de 1887, em Santo Amaro da Purificação, na Bahia, Manuel Pedro dos Santos ganhou fama ao se tornar cançonetista com o apelido de Bahiano. Especializado em modinhas e lundus, ele cantava acompanhado de violão e teve a chance de se tornar conhecido e ganhar lugar definitivo na história da música popular brasileira e do samba em particular, ao gravar para a Casa Edison o considerado primeiro samba levado ao disco, o Pelo Telefone, em 1917. Foi o primeiro samba a alcançar sucesso nacional. Para tanto, influíram vários fatores. A letra jocosa e provocativa sobre a “jogatina” na cidade (“O chefe da polícia/pelo telefone/mandou me avisar/que na Carioca/tem uma roleta/para se jogar...”) era de fácil assimilação e foi sem dúvida o estopim para a difusão maciça do samba. Nas gravações, a letra foi alterada (“O chefe da folia/pelo telefone/manda me avisar/que com alegria/não se questione/para se brincar//Ai,ai,ai/deixa as mágoas para trás/ó rapaz!/ai,ai,ai/fica triste se és capaz/e verás//Tomara que tu apanhes/pra nunca mais fazer isso/tirar amores dos outros/e depois fazer feitiço...”). Não faltaram também os aproveitadores, que na esteira do êxito da gravação de Bahiano correram atrás dos lucros. Nas ruas, e nos jornais da época, o samba vingara com inúmeras versões e acirrada polêmica, contribuindo definitivamente para a fixação do gênero como música de carnaval.

O batuque é a célula-mãe da manifestação musical popular mais importante do país e dele surgiram ramos, afluentes, tendências, que se espalharam por todo o território. Sob nomes mais diversos, ganharam estilos e andamentos próprios, sotaques regionais, assumiram caráter romântico, jocoso, boêmio, patriótico. Na união dos africanos, com baianos e imigrantes italianos surgiria música naturalmente. Do batuque passou para calundus e calhandos, seguiram-se fofa, lundu e fado (ambiente urbano) e jongo, samba e coco (rural), passando pela modinha, lundu-canção, maxixe e choro até chegar na vertente atual do samba, seja samba-canção, samba-enredo, samba de roda, samba de breque, samba funk ou samba reggae.
Com a gravação de Pelo Telefone, o samba dava o primeiro passo para abrir a porta de saída do gueto negro e ganhar as ruas. Parodiando jocosamente, usado como veículo publicitário, assobiado nas ruas e cantado nas festas ricas e pobres, o primeiro samba cumpria seu papel de pioneiro desde a primeira vez em 1916, quando foi notado por um público maior que aquele frequentador do casarão comandado por Tia Ciata, a mãe do samba. No ano seguinte foi gravado e abriu um capítulo novo na história da música popular brasileira, provocando uma série de imitações - quando não plágios - de tímidos seguidores. Gradativamente fez escola, tomou forma, criou estilo, empolgou poetas populares e mesmo eruditos, trouxe músicos da melhor qualidade para seu redor, deixou de ser considerado marginal ganhando respeito como arte popular e status de gênero musical por meio do qual o mundo reconhece o Brasil.
A carreira de um dos mais celebrados intérpretes da música popular brasileira não ficou perdida graças a introdução do fonógrafo no Brasil. O fonógrafo foi responsável por ser possível avaliar a obra do cantor Bahiano, logo após a implantação do aparelho no Brasil. Quando em 1903 Fred Figner, o proprietário da Casa Edison, fez editar o primeiro catálogo comercial de discos de sua fábrica, quem encabeçava a lista das primeiras 73 gravações era exatamente Bahiano, por ele contratado - junto com Cadete, outro intérprete popular - para ser o primeiro a gravar comercialmente no Brasil. Em 1904 o jornal Echo Phonographico, de São Paulo, estampava uma foto e prestava uma homenagem ao cantor Bahiano, “primeiro cançonetista brasileiro”.


Primeiro cantor a se profissionalizar no Brasil, gravou também o primeiro disco, que substituiu os cilindros gravados, como de hábito na época, em apenas uma das faces. Esse registro foi feito com o lundu de Xisto Bahia, Isto É Bom, no selo Zon-O-Phone nº10.001. Entre 1902 e 1904, Bahiano gravou três discos: a canção Ave Maria (letra de Fagundes Varela), a cançoneta Art Nouveau e a modinha Querida Flora. Sendo o artista mais popular de seu tempo, Bahiano fez sucesso até meados dos anos 20, gravando composições consideradas clássicas entre as centenas de sua discografia. A modinha Perdão Emília, de Eduardo das Neves, o tango de Arthur Azevedo, As Laranjas da Sabina, e a toada Cabôca de Caxangá, de Catulo da Paixão Cearense e João Pernambuco, são exemplos.

O samba Quem Vem Atrás Fecha a Porta, de Caninha, foi gravado com sucesso por Bahiano em parceria com a cantora Izaltina. Ao lado de Maria Marzulo ele gravou O Casaco da Mulata. Bahiano cantou sobre muitos motivos de sua terra, e uma de suas características era falar de si próprio em algumas canções que gravava. Um bom exemplo disso é o lundu Baiano Dengoso em que a figura do baiano é citado na música nada mais é do que o próprio cantor. Sua autoria é anônima: “Sou baiano/sou cabra dengoso,/sou baiano de todos querido,/sou baiano, sou forte e manhoso,/sou baiano, sou bem decidido.//Sou baiano que tenho capricho,/é notório por todos sabido,/sou baiano e não quero rabicho,/pois rabicho é tempo perdido”... Outro lundu gravado por Bahiano tem como título A Farofa. Música de melodia alegre traz em seus versos um pouco de malícia. Ele também gravou Ai Seu Mé, Goiabada, Luar de Paquetá, Tatu Subiu no Peru e Chora, Chora, Choradô. No final da carreira grava Quem Eu Sou, lamentoso e autobiográfico: “Quem eu sou?/Um baiano atirado/Nessas vagas soberbas do mar/Já sem leme, bem perto da rocha/Desse abismo que vai me tragar”- e fecha com uma fala inesperada: “Canto há tantos anos e nunca arranjei nada. Finalmente, consegui um empregozinho nesta casa, com o que vou vivendo, graças a Deus”. Bahiano morreu no dia 15 de julho de 1944, no Rio de Janeiro. Sua carreira chegou ao fim como começou, humilde. E hoje poucos se lembram dele.
--------------------------------------------------------------------------------------
Quem desejar adquirir o livro Bahia um Estado D´Alma, sobre a cultura do nosso estado, a obra encontra-se à venda nas livrarias LDM (Piedade), Galeria do Livro (Boulevard 161 no Itaigara e no Espaço Cultural Itau Cinema Glauber Rocha na Praça Castro Alves) e na Pérola Negra (ao lado da Escola de Teatro da UFBA, Canela) E quem desejar ler o livro Feras do Humor Baiano, a obra encontra-se à venda no RV Cultura e Arte (Rua Barro Vermelho, 32, Rio Vermelho. Tel: 3347-4929)

27 novembro 2009

Música & Poesia

Pequeno Dicionário do Amor (Brega'n'bass do Amor) letra de Marcos André

O amor flagela,
o amor migalha,
o amor congela,
o amor navalha.
O amor desarma,
o amor guerreia,
o amor corre nas veias,
o amor joga na vala.



O amor semeia,
o amor desmata,
o amor permeia,
o amor te mata.
O amor é sacrilégio,
o amor não tem colégio,
o amor te sacaneia,
o amor te desampara.


O amor, de amor austero,
amor de amor perfeitinho,
é amor de amor sem destino,
é amor de amor sem elo.
O amor, de amor imperfeito,
amor de amor paralelo,
é amor de amor no peito,
amor de muito carinho.


O amor supera o sonho,
o amor, sonhando, embarca,
o amor chuta a canela,
o amor dá de trivela,
o amor é farofeiro,
o amor é magnata.
O amor come poeira,
o amor rompe o silêncio,
o amor é conseqüência,
o amor é contra-senso.


O amor é indefeso,
o amor sucumbe ileso,
o amor começa e pára,
o amor sobe à cabeça,
o amor desce a porrada.


O amor, de amor austero,
amor de amor perfeitinho,
é amor de amor sem destino,
é amor de amor sem elo.
O amor, de amor imperfeito,
amor de amor paralelo,
é amor de amor no peito,
amor de muito carinho.


O amor é lindo,
o amor é love,
o amor é índio,
o amor é rock.
O amor é black,
o amor é blue,
o amor é vinho,
o amor é cool.
O amor é leve
o amor é trash,
o amor é sério,
o amor é riso.
O amor é paraíso,
o amor é infernal,
o amor é impreciso,
o amor é pontual.


O amor é night,
o amor é dia,
o amor noite,
o amor é fria.
O amor é loucura,
o amor é tesão,
o amor é fissura,
o amor é solidão.
O amor é luta livre,
o amor é ioga,
o amor tem sinusite,
o amor advoga.
O amor é bicha,
o amor é machista,
o amor é futurista,
o amor não marca hora.


O amor, de amor austero,
amor de amor perfeitinho,
é amor de amor sem destino,
é amor de amor sem elo.
O amor, de amor imperfeito,
amor de amor paralelo,
é amor de amor no peito,
amor de muito carinho.



Eros e Psique (Fernando Pessoa)


Conta a lenda que dormia
Uma Princesa encantada
A quem só despertaria
Um Infante, que viria
De além do muro da estrada.


Ele tinha que, tentado,
Vencer o mal e o bem,
Antes que, já libertado,
Deixasse o caminho errado
Por o que à Princesa vem.


A Princesa Adormecida,
Se espera, dormindo espera,
Sonha em morte a sua vida,
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera.


Longe o Infante, esforçado,
Sem saber que intuito tem,
Rompe o caminho fadado,
Ele dela é ignorado,
Ela para ele é ninguém.


Mas cada um cumpre o Destino
Ela dormindo encantada,
Ele buscando-a sem tino
Pelo processo divino
Que faz existir a estrada.


E, se bem que seja obscuro
Tudo pela estrada fora,
E falso, ele vem seguro,
E vencendo estrada e muro,
Chega onde em sono ela mora,


E, inda tonto do que houvera,
À cabeça, em maresia,
Ergue a mão, e encontra hera,
E vê que ele mesmo era
A Princesa que dormia.

---------------------------------------------------------
Quem desejar adquirir o livro Bahia um Estado D´Alma, sobre a cultura do nosso estado, a obra encontra-se à venda nas livrarias LDM (Piedade), Galeria do Livro (Boulevard 161 no Itaigara e no Espaço Cultural Itau Cinema Glauber Rocha na Praça Castro Alves) e na Pérola Negra (ao lado da Escola de Teatro da UFBA, Canela) E quem desejar ler o livro Feras do Humor Baiano, a obra encontra-se à venda no RV Cultura e Arte (Rua Barro Vermelho, 32, Rio Vermelho. Tel: 3347-4929)

26 novembro 2009

Há mais de dois anos, a Bahia perdia Guido Guerra, nosso Papagaio Devasso

Numa quarta-feira triste do dia 7 de junho de 2006, silenciava, aos 63 anos, o jornalista e escritor baiano Guido Guerra. Ocupando a quinta cadeira da Academia Baiana de Letras (ABL), durante 40 anos este homem presenteou a Bahia e o Brasil com uma vasta obra literária. Chamado pelo colega Jorge Amado de “Papagaio Devasso”, Guido Guerra escreveu 12 livros, desde a Dura Realidade, até a sua última inspiração A noite dos coronéis.

Dono de um texto ousado e de um olhar irreverente, Guido Guerra foi o criador de mundos e criaturas, aquele que aprendeu através do diálogo bem tecido, da voz do outro, a dar voz a si mesmo. Guerra ficou conhecido como um dos maiores críticos do regime militar. Durante os chamados anos de chumbo, ele respondeu a 17 inquéritos e interpelações da ditadura. Como jornalista, ele atuou nos extintos jornais Diário de Notícias, Jornal da Bahia, Bahia Hoje, semanário Folha da Bahia (fechado no golpe militar de 1964) e no Tribuna da Bahia.

Entre suas principais obras estão romances, contos, ensaios, dos quais podemos destacar As Aparições do Dr. Salu e Outras Histórias; Com o céu entre os dentes; Ela se chama Joana Felicidade; Vicente Celestino - o Hóspede das Tempestades; Quatro Estrelas no Pijama; Lili Passeata; O Último Salão Grená; Vila Nova de Raimunda Doida; Auto Retrato, Percegonho do Céu Azul, entre outros.

MARGINAIS - Guerra dava voz a personagens marginais, cujas peripécias eram relatadas aos leitores em uma linguagem pouco recatada. Considerado acintoso pelos mais pudicos, seus escritos não raro serviam de estopim para denúncias à polícia, o que gerou sucessivas demissões e readmissões nos veículos de comunicação baianos.

O Papagaio Devasso costumava dizer que não era escritor, mas “um jornalista que cresceu com o ofício literário”. Guido, nascido em Santa Clara, alto sertão baiano, era mesmo um homem de Guerra. Fazia parte da geração que, ao mergulhar de cabeça no jornalismo de esquerda, incomodava pela sutileza, irreverência e perspicácia analítica com que narrava fatos e criava crônicas.

Em 2006 amigos, familiares e imortais da Academia de Letras da Bahia se reuniram para prestar uma homenagem ao Língua de Trapo (como ficou conhecido). Segundo o poeta Ruy Espinheira Filho que conheceu Guido nos anos 60, ele foi uma figura singular. Além de escritor e jornalista, define, era uma pessoa com uma capacidade para se relacionar com o ser humano muito grande: “Em pouco tempo que entrou para a Academia, desempenhou um papel de liderança”.

ANJO TORTO - “Ele era temido. Como são temidas as mordidas das cobras, os ventos encarnados, as assombrações e as más-línguas. Era um daqueles a quem um anjo torto disse: 'Vai Guido, ser Guerra na vida'. E ele foi o irreverente guardião dos maus costumes”, lembra o grande amigo Cid Seixas. Mas, Guido também era um sujeito extrovertido e brincalhão, nunca bebia, era capaz de virar a noite em companhia dos amigos sem colocar uma única gota de álcool na boca.

“A entrevista me fascina pela possibilidade de provocar o entrevistado, fazê-lo revelar mazelas que talvez não confesse nem ao espelho. O papel do repórter é este: desnudar suas personagens”, disse Guido Guerra em uma entrevista em 2005. Sua literatura é focada em tipos populares, seres da noite, no universo interior. Um mundo imaginário, com traços de realidade, que encantou leitores e que, por meio do criador, cativou amizades sinceras. É, de fato estamos mais pobres sem nosso Guido Guerra.

Guido Guerra foi um do títulos que inaugurou a coleção Gente da Bahia que a Assembléia Legislativa lançou no dia 28 de janeiro de 2009. A obra, com 198 páginas resgatou a trajetória do escritor e jornalista baiano, e foi escrito por Luíza Torres.

-----------------------------------------------------------------------------------------
Quem desejar adquirir o livro Bahia um Estado D´Alma, sobre a cultura do nosso estado, a obra encontra-se à venda nas livrarias LDM (Piedade), Galeria do Livro (Boulevard 161 no Itaigara e no Espaço Cultural Itau Cinema Glauber Rocha na Praça Castro Alves) e na Pérola Negra (ao lado da Escola de Teatro da UFBA, Canela) E quem desejar ler o livro Feras do Humor Baiano, a obra encontra-se à venda no RV Cultura e Arte (Rua Barro Vermelho, 32, Rio Vermelho. Tel: 3347-4929)

25 novembro 2009

Erudito e popular

É preciso se aprofundar mais a dimensão geográfica e espacial das culturas erudita e popular, que se reconheçam os diferentes entrelaçamentos do temporal com o espacial e seus efeitos estéticos. Afinal, culturas das cidades e as percepções estética e social de espaço que elas produzem são fundamentais para colocar em discussão. A própria distinção erudito-popular, em sua metaforicidade espacial, pode ser ligada pragmaticamente aos diferentes espaços urbanos de produção e consumo urbano, tais como a rua, o bairro, o museu, a sala de consertos e a ópera, o local turístico e o shopping center.

A tão propalada globalização em curso não tem colocado (ainda) a fusão criativa de erudito e popular como alguns imaginaram em décadas anteriores. A cultura erudita como cimento que dava identidade de classe e coesão nacional está ultrapassada. Muitos estudiosos preferem introduzir outras distinções em termos de gosto ou hábito.

Houve uma época em que erudito e popular eram definidos com bastante clareza em sua separação. Erudito estava codificado pelo museu universal, a academia, o sistema de galeria, o filme de arte. Já o popular era visto como entretenimento de massa, esportes de audiência, rock e música country, romances baratos, histórias de detetives e ficção científica, filmes de Hollywood, televisão e histórias em quadrinhos.

Enquanto o erudito gozava da solidez do arquivo (obras ambiciosas e originais que valiam ser incorporadas na tradição), o popular representava as produções efêmeras, sujeitas aos ditames da moda e assegurado por um sistema de repetição e reprodução.

A produção de cultura erudita se caracterizava pela baixa velocidade de giro do arquivo, ou seja, baseada antes em acumulação lenta. Já a produção de cultura popular ou de massa, por outro lado, sempre esteve sujeita à alta velocidade de giro de uma sociedade de consumo, seus prazeres passagens e sua necessidade de renovar constantemente.

Essa dicotomia rígida da divisão erudito-popular tanto refletia uma visão política e social do mundo como tinha a ver com critérios ilusórios de julgamento e qualidade estética. Esse binário foi abolido por uma nova lógica de circulação cultural produzida por tecnologias de mídia. Mas isso não quer dizer que a diferença entre arte erudita e cultura de massa não existe mais. Ela continua a existir em sociedades ocidentais ou em outros lugares. Sempre restarão diferenças em qualidade e ambição entre produtos culturais, diferença em complexidade, conhecimento por parte do consumidor, etc. O que mudou foi a divisão vertical que se tornou, nas últimas décadas, uma zona fronteiriça horizontal de trocas e pilhagens e todos os tipos de intervenções híbridas.

È preciso prestar mais atenção às maneiras pelas quais práticas e produtos culturais se ligam aos discursos do político e do social em constelações locais e nacionais específicas. É preciso focar as operações e funcionamento de culturas públicas e o papel cambiante da crítica dentro delas. As hibridizações de todos os tipos acontecem agora, cada vez mais sob o signo do mercado. O que é preciso é observar esses mercados que tendem a domesticar e igualar as arestas brutas e inovadoras da produção cultural, pois prefere a fórmula de sucesso em vez de encorajar o ainda desconhecido, a experimentação e modos incomuns de expressão artística.

A filósofa e professora da Faculdade de Letras e Ciência Humanas da USP, Marilena Chauí, em sua obra “Conformismo e resistência” (1987) demonstra a distinção entre cultura de massa e cultura popular: “Para usarmos uma expressão de Foucault, a Comunicação de Massa se insere no campo de tecnologias de disciplina e vigilância (donde a busca de transparência para garantir que tudo pode ser dito e mostrado), regulando-se pelo ideal panóptico do olho que tudo vê, ou pelo olhar de sobrevôo, na bela expressão de Merleau-Ponty. Em contrapartida, as ações e representações da Cultura Popular se inserem num contexto de reformulação e de resistência à disciplina e à vigilância. Nela o silêncio, o implícito, o invisível são, frequentemente, mais importantes do que o manifesto”.

Modernistas e tradicionalistas quiseram construir objetos puros. Os primeiros imaginaram culturas nacionais e populares “autênticas”. Procuraram preservá-las da industrialização, da massificação urbana e das influências estrangeiras. Os modernistas conceberam uma arte pela arte, um saber pelo saber, sem fronteiras territoriais, e confiaram à experimentação e à inovação autônomas suas fantasias de progresso. As diferenças entre esses campos serviram para organizar os bens e as instituições. O artesanato ia para as feiras e concursos populares, as obras de arte par os museus e as bienais.

Essa compartimentação maniqueísta começa a perder espaço. Para o estudioso Néstor Garcia Canclini (Culturas Híbridas: estratégias para entrar e sair da modernidade) a modernização diminui o papel do culto e do popular tradicionais no conjunto do mercado simbólico, mas não os suprime. Redimensiona a arte e o folclore, o saber acadêmico e a cultura industrializada, sob condições relativamente semelhantes. O trabalho do artista e do artesão se aproximam quando cada um vivencia que a ordem simbólica específica em que se nutria é redefinida pela lógica do mercado.
-------------------------------------------------------------------------------
Quem desejar adquirir o livro Bahia um Estado D´Alma, sobre a cultura do nosso estado, a obra encontra-se à venda nas livrarias LDM (Piedade), Galeria do Livro (Boulevard 161 no Itaigara e no Espaço Cultural Itau Cinema Glauber Rocha na Praça Castro Alves) e na Pérola Negra (ao lado da Escola de Teatro da UFBA, Canela) E quem desejar ler o livro Feras do Humor Baiano, a obra encontra-se à venda no RV Cultura e Arte (Rua Barro Vermelho, 32, Rio Vermelho. Tel: 3347-4929)

24 novembro 2009

Quem disse que gosto não se discute? (2)

Assim o autor (Pierre Bourdieu) se dedicou a relacionar os gostos de cada classe com seu capital escolar (determinado pelos diplomas) e com sua origem. Para ele, quanto mais anos de estudo, mais uma pessoa se distancia do gosto popular, para adquirir um gosto legítimo em relação à música. Não só ela passa a apreciar mais compositores menos populares como também o conhecimento do nome de compositores aumenta substancialmente. O gosto musical, ainda mais que outros, sofre uma variação a depender da diferença de anos de estudo, visto que este é um dos campos do conhecimento considerado mais legítimo. As áreas também são hierarquizadas. Por exemplo, o conhecimento de música clássica e de pintura é um conhecimento legítimo, o conhecimento sobre jazz e histórias em quadrinhos, em vias de legitimação.

Diplomas escolares asseguram a nobreza cultural, valorizando o capital cultural de uma classe mais alta e estigmatizando aquele de uma classe mais baixa. Assim, a escola influencia não só nos gostos ligados ao mundo escolar, mas em toda a vida cultural de uma pessoa. E não só influencia como também garante competências culturais muito maiores do que as ensinadas na escola.

Há alguns postos – segundo Bourdieu – ligados à origem social do que ao capital escolar, como no caso de mobília e vestuário, muito mais relacionados a percepções vindas desde a infância do que a aprendizagem nos livros escolares. A escola tende a referendar o capital herdado pela classe alta. Portanto, parte do capital de pessoas da classe média ou de frações mais baixas da classe alta nunca vem a ser aprovado pela cultura legítima. Nesse contexto, muitos buscam domínios diferentes de investimento cultural, domínios menos legítimos, como o jazz.

POSIÇÕES

As disputas por posições hierarquizam, igualmente, as oportunidades estatutárias das classes em matéria de valores e concepções políticas. Isso leva a crer que mesmo a fração da classe popular com maior capital cultural está submissa às normas e valores dominantes. Os agentes menos competentes (pela perspectiva da cultura legítima) estão à mercê dos efeitos da imposição do campo de produção ideológico influente, acarretando tomadas de posições ligadas às representações “legítimas” do mundo social. Falta-lhes capital escolar, diria Bourdieu, mas que é compensado no blefe inconsciente de uma linguagem que disfarça, sobretudo, posições políticas “desencontradas”, “ingênuas” ou “ignorantes”.

Ao diploma escolar é reservado um elevado poder simbólico transformando a escola em uma das instâncias sina qua non da manutenção da ordem social. A obtenção do diploma fixa as disposições dominantes. Desapossa e separa os menos competentes em favor dos mais competentes; os menos instruídos em favor dos mais instruídos.

A Distinção foi o livro que mais irritou alguns dos intelectuais porque se pensava que, indiretamente, este livro destruiria a aura (para falar como Walter Benjamin) da criação intelectual, da produção estética, remetendo-a a prática de consumo que se vinculavam as condições econômicas, posições sociais, vontade, distinção etc.

O consumo cultural e o deleite estético são acionados como forma de distinção, ou seja, a familiaridade com bens simbólicos traz, consigo, associações como “competência”, “educação”, “nobreza de espírito” e “desinteresse material”. Essa divisão da sociedade entre “bárbaros” e “civilizados” acaba tendo consequências políticas: justifica o monopólio dos instrumentos der apropriação dos bens culturais por parte desses últimos.

A estrutura social é vista como m sistema hierarquizado de poder e privilégio, determinado tanto pelas relações materiais e/u econômicos (salário, renda) como pelas relações simbólicas (status) e/ou culturais (escolarização) entre os indivíduos.

As instituições familiar e escolar seriam as responsáveis pelas novas competências culturais ou gostos culturais. Assim, a distinção entre esses dois tipos de aprendizado, o familiar e o escolar, refere-se a duas maneiras de adquirir bens da cultura e com eles se habituar. Essas duas formas de aprendizado seria uma dimensão do habitus de cada um.

----------------------------------------------------------------------
Quem desejar adquirir o livro Bahia um Estado D´Alma, sobre a cultura do nosso estado, a obra encontra-se à venda nas livrarias LDM (Piedade), Galeria do Livro (Boulevard 161 no Itaigara e no Espaço Cultural Itau Cinema Glauber Rocha na Praça Castro Alves) e na Pérola Negra (ao lado da Escola de Teatro da UFBA, Canela) E quem desejar ler o livro Feras do Humor Baiano, a obra encontra-se à venda no RV Cultura e Arte (Rua Barro Vermelho, 32, Rio Vermelho. Tel: 3347-4929)

23 novembro 2009

Quem disse que gosto não se discute? (1)

Há 30 anos chegava ao público A Distinção (1979), o best seller de um dos mais combatentes sociólogos francês, Pierre Bourdieu (1930-2002). A obra estabelece que as práticas culturais juntamente com as preferências em assuntos como educação, arte, mídia, música, esporte, posições políticas, entre outros, estão ligadas ao nível de instrução, submetidas ao volume global de capital acumulado, aferidas pelos diplomas escolares ou pelo número de anos de estudo e, secundariamente, à herança familiar. Trata-se de desmistificar afirmações da ardem do senso comum quando se assevera que o gosto sobre determinada matéria não se discute. O gosto classifica e distingue, aproxima e afasta aqueles que experimentam os bens culturais.

Bourdieu mostra a maneira que as preferências culturais dos agentes são estruturadas – através de transmissão do capital cultural incalculado na escola e aquele herdado pela família, efetuado de maneira precoce ou através do aprendizado tardio. As práticas culturais incentivadas por essas duas instâncias distinguem aquilo que será reconhecido como gosto legítimo burguês, de classe média ou popular.

O gosto ou as preferências manifestadas através das práticas de consumo é, então, o produto dos condicionamentos associados a uma classe ou fração de classe. O gosto, dirá Bourdieu, é a aversão, é a intolerância às preferências dos outros. È percebida desta forma que a reprodução moral, ou seja, a transmissão dos valores, virtudes e competências, maneira de ver o mundo simbólico, serve de fundamento à filiação legítima de habitus distintos e desiguais, fortalecendo e intensificando a hierarquia do culturalmente aceito ou execrável, do autêntico ou do inautêntico.

A distinção desnuda e explica, ao mesmo tempo, os estudos sobre linguagens, grupos sociais, política, educação, arte ou comunicação, pois oferece uma análise do mundo social de maneira coerente e instigante. A distinção é a obra mais conhecida e mais prestigiada de Pierre Bordieu, e traz em boa parte de sua exposição as preocupações decorrentes de anos de estudos sobre a elaboração de uma teoria geral das classes sociais. Ele fez de sua vida acadêmica e intelectual uma arma política e de sua sociologia uma sociologia engajada, profundamente comprometida com a denúncia dos mecanismos de dominação em uma sociedade injusta.

HABITUS

Bourdieu identifica como habitus “pequeno burguês ascendente” a prática do relaxamento e a preocupação com uma alimentação light, que contrasta com o gosto popular pela agitação e comidas mais consistentes. A prática social não resulta, assim, necessariamente de uma escolha, mas de gostos (e de desgostos) profundamente enraizados no corpo. A essa lógica prática está associado um conhecimento prático, intuitivo, um “senso prático”.

Este saber prático incorporado vem alimentar um velho debate filosófico e sociológico sobre a relação entre a reflexão e a ação. A teoria da ação proposta por Bourdieu parte de uma crítica às leituras intelectualistas da ação, isto é, às visões que tendem a reduzí-la ao ponto de vista reflexivo daquele que observa, em detrimento do ponto de vista prático daquele que age.

O trabalho desse sociólogo incomodou muita gente porque ele interpretou os fenômenos sociais de maneira crítica. Na questão da formação do gosto cultural de cada um de nós, ele interpretou o jogo de poder das distinções econômicas e culturais de uma sociedade hierarquizada. Para ele o gosto cultural é produto e fruto de um processo educativo, ambientado na família e na escola e não fruto de uma sensibilidade inata dos agentes sociais.
------------------------------------------------------------------------------
Quem desejar adquirir o livro Bahia um Estado D´Alma, sobre a cultura do nosso estado, a obra encontra-se à venda nas livrarias LDM (Piedade), Galeria do Livro (Boulevard 161 no Itaigara e no Espaço Cultural Itau Cinema Glauber Rocha na Praça Castro Alves) e na Pérola Negra (ao lado da Escola de Teatro da UFBA, Canela) E quem desejar ler o livro Feras do Humor Baiano, a obra encontra-se à venda no RV Cultura e Arte (Rua Barro Vermelho, 32, Rio Vermelho. Tel: 3347-4929)

20 novembro 2009

Milton Santos, o mestre visionário, foi um dos maiores pensadores da nossa história

A Bahia está sempre surpreendendo o Brasil e o mundo, e não se está falando aqui de música, dança, Carnaval e outras expressões culturais do gênero – ainda que estas sejam nossas matizes mais fortes e que merecem igualmente a devida valorização. Mas, o estado baiano é mais que isso, e uma das maiores provas é um nome: Milton Santos. Negro, nascido no interior da Bahia, em Brotas de Macaúbas, este geógrafo, doutor honoris causa por 20 universidades de sete países, teve mais de 40 livros publicados em diversos idiomas e se tornou um dos maiores pensadores da história recente do Brasil. O mestre visionário baiano morreu aos 75 anos, defendendo a tese de que é pelas idéias que se irá alcançar a transformação social.

Ainda criança, Milton Santos desenvolveu o gosto pela álgebra e pelo francês. Seu “forte” foi a matemática, tanto que aos 13 anos dava aulas no ginásio em que estudava. Aos 15 anos passou a lecionar Geografia e aos 18 prestou vestibular para Direito em Salvador. Enquanto estudante secundário e universitário marcou presença com militância política de esquerda. Formado em Direito, não deixou de se interessar pela Geografia, tanto que fez concurso para professor catedrático em Ilhéus. Nesta cidade, além do magistério, desenvolveu atividade jornalística, estreitando sua amizade com políticos de esquerda.

“o sonho obriga o homem a pensar”
TRAJETÓRIA & RECONHECIMENTO - Apesar de ter se graduado em Direito, desenvolveu trabalhos em diversas áreas da Geografia, em especial nos estudos de urbanização do Terceiro Mundo. Foi um dos grandes nomes da renovação na geografia brasileira ocorrida nos anos 1970. Embora pouco conhecido fora do meio acadêmico, Milton Santos alcançou reconhecimento fora do Brasil, tendo recebido em 1994, o Prêmio Internacional Vautrin Lud, uma espécie de prêmio Nobel da Geografia, conferido por universidades de inúmeros países. O geógrafo foi dos poucos cientistas brasileiros que, expulsos durante a ditadura militar (naquilo que foi conhecido por êxodo de cérebros), voltaram depois ao país, sendo disputado por diversas universidades.

Sua obra “O espaço dividido”, de 1979, é hoje considerado um clássico mundial, onde desenvolveu uma teoria sobre o desenvolvimento urbano nos países subdesenvolvidos. Sua idéias de globalização, esboçadas antes que este conceito ganhasse o mundo, advertia para a possibilidade de gerar o fim da cultura, da produção original do conhecimento - conceitos depois desenvolvidos por outros. “Por uma Outra Globalização”, outro livro seu escrito dois anos antes de morrer, é referência atual em cursos de graduação e pós-graduação em universidades brasileiras. Traz uma abordagem crítica sobre o processo perverso de globalização atual na lógica do capital, apresentado como um pensamento único.

Na visão dele, esse processo, da forma como está configurado, transforma o consumo em ideologia de vida, fazendo de cidadãos meros consumidores, massifica e padroniza a cultura e concentra a riqueza nas mãos de poucos. Durante toda a vida buscou métodos e visões diferentes para encarar seus temas de estudo. França, EUA, Canadá, Tanzânia, Milton Santos lecionou em diversas universidades mundo afora em seu exílio durante a ditadura militar no Brasil. Também lecionou na Venezuela e no Reino Unido. Regressou ao Brasil em 1977, onde anos depois, finalmente, cursou geografia na Universidade Católica de Salvador.

O renomado baiano Milton Santos nasceu em Brotas de Macaúbas
ABORDAGEM INOVADORA - Durante seus 13 anos de exílio, seus contatos com inumeráveis profissionais em diversos países, e, sobretudo sua capacidade de elaborar teorias, a partir de variadíssima leitura, por diversos campos do saber, impulsionaram seu esforço de escrever, de compor sua obra considerada como monumental. A ditadura lhe impôs sofrimento em função de suas idéias. Realizou forte defesa de uma Geografia mais crítica, com abordagens da teoria marxista.
A obra de Milton Santos é inovadora ao abordar o conceito de espaço. De território onde todos se encontram, o espaço, com as novas tecnologias, adquiriu novas características para se tornar um conjunto indissociável de sistemas de objetos e sistemas de ações. As velhas noções de centro e periferia já não se aplicam, pois o centro poderá estar situado a milhares de quilômetros de distância e a periferia poderá abranger o planeta inteiro. Daí a correlação entre espaço e globalização, que sempre foi perseguida pelos detentores do poder político e econômico, mas só se tornou possível com o progresso tecnológico.
Para contrapor-se à realidade de um mundo movido por forças poderosas e cegas, impõe-se, para Milton Santos, a força do lugar, que, por sua dimensão humana, anularia os efeitos perversos da globalização. Estas idéias são expostas principalmente em sua obra “A Natureza do Espaço”, publicada em 2002. Ele recebeu em 1997 o prêmio Jabuti pelo melhor livro em ciências humanas: A natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção. Em 1998, o geógrafo foi homenageado pelo Jornal do Brasil, recebendo o título de Homem de Idéias. Um ano depois, foi contemplado em concurso nacional pela Revista Isto É como um dos 20 cientistas do século.

Ainda em 1999 recebeu o Prêmio Chico Mendes por sua resistência. Foi condecorado Comendador da Ordem Nacional do Mérito Científico em 1995. Hoje, o geógrafo tantas vezes laureado empresta seu nome ao Prêmio Milton Santos de Saúde e Ambiente, criado pela Fundação Oswaldo Cruz. Milton Santos nunca participou de movimentos negros – acreditava que deveria conquistar reconhecimento em atitudes como, por exemplo, ingressar na universidade. “Minha vida de todos os dias é a de negro”, declarou. “Mantenho com a sociedade uma relação de negro. No Brasil, ela não é das mais confortáveis”.

----------------------------------------------------------------------------------
Quem desejar adquirir o livro Bahia um Estado D´Alma, sobre a cultura do nosso estado, a obra encontra-se à venda nas livrarias LDM (Piedade), Galeria do Livro (Boulevard 161 no Itaigara e no Espaço Cultural Itau Cinema Glauber Rocha na Praça Castro Alves) e na Pérola Negra (ao lado da Escola de Teatro da UFBA, Canela) E quem desejar ler o livro Feras do Humor Baiano, a obra encontra-se à venda no RV Cultura e Arte (Rua Barro Vermelho, 32, Rio Vermelho. Tel: 3347-4929)

19 novembro 2009

Antropólogo diz que estudos não são jogo de cartas marcadas a favor de índios

A identificação de áreas indígenas desperta reações contrárias da classe produtiva. Em Mato Grosso do Sul, onde 45 mil índios reivindicam mais espaço, os fazendeiros taxam como “viciado” o trabalho dos especialistas responsáveis pelos estudos. O antropólogo Rubem Thomaz de Almeida, que há 30 anos estuda a região, garante que os levantamentos feitos para embasar as demarcações pelo governo federal não são um jogo de cartas marcadas a favor dos indígenas. Ele atribui a “desconhecimento de causa” as críticas dos ruralistas. “É necessário que eles [fazendeiros] entendam que o estudo não vem definido. Em estudos passados, inclusive, deixamos de incluir área porque não tínhamos argumentos nem dados suficientes para colocar espaços como terra indígena. É fundamental realizar os estudos para que o governo possa atuar e decidir um problema social gigantesco, que são 45 mil índios que estão ali sem terra, sem ter onde plantar”, afirmou Almeida.
“Temos atrás da gente a academia. Somos vinculados à Associação Brasileira de Antropologia e, se a gente incorrer em desvios na nossa produção científica, haverá facilidade em derrubar [os laudos]”, acrescentou. Almeida diz ser contrário à “criminalização” dos fazendeiros e reconhece que eles deveriam ser recompensados pelo governo para deixar a terra, em valor além das benfeitorias. “Dificilmente essa coisa vai resolver sem negociação com os produtores rurais. Não podemos criminalizar os fazendeiros, dizer que são todos bandidos. Ficará muito difícil dar conta do problema se não houver mecanismo para se pagar a terra aos fazendeiros”, ressaltou. Entretanto, o antropólogo classifica de “absurdos” os argumentos que tentam vincular a luta dos índios pela terra a interesses estrangeiros.

“São 45 mil pessoas que têm uma história, tradição, e sabem exatamente onde vivem e o que querem. Não tem Cimi [Conselho Indigenista Missionário], antropólogo nem estrangeiro, absolutamente ninguém. Eles não vão deixar de reivindicar a terra. O fazem por sua conta. Quem fala o contrário é para jogar fumaça e não enfrentar o problema”, criticou. Pesquisa da década de 80 já alertava o governo para a necessidade de reconhecer mais áreas indígenas em Mato Grosso do Sul, após o processo de colonização que resultou no confinamento de índios em aldeias delimitadas pelo próprio governo. Hoje o sudoeste do estado é apontado por estudiosos e pela própria Fundação Nacional do Índio (Funai) como o espaço mais problemático da questão indígena no Brasil. Para Almeida, o país já poderia ter superado o quadro.
“Faltou um pouco de decisão política e de ânimo do governo para dar conta antes do problema. É necessário que o governo pegue esse touro a unha e decida levar adiante primeiro os estudos e depois as decisões [de demarcação e homologação de áreas]” , defendeu o antropólogo. A expectativa dos profissionais envolvidos no trabalho de identificação em Mato Grosso do Sul é concluir a fase dos estudos em abril de 2010. O antropólogo entende que as críticas de parte da população de Mato Grosso do Sul à vida dos índios em áreas homologadas, como a aldeia de Panambizinho, a 25 quilômetros de Dourados, deve-se a uma percepção equivocada da cultura tradicional. Na região, áreas antes produtivas viraram mato e os índios trabalham apenas com agricultura de subsistência.
“Não podemos esperar que os guarani vão produzir como nós produzimos. Eles têm um viés cultural e se mostram abertamente contra a produção em larga escala. Eles têm uma relação cosmológica importante com o mato. Buscam o mato, porque lá tem que ter bicho e tem que proteger a água. Mas eles também têm plena consciência de que quem não trabalha não come.” Se os estudos na região confirmarem as reivindicações indígenas, os antropólogos calculam que o problema fundiário das comunidades tradicionais estará resolvido para pelo menos três gerações, cabendo aos indígenas se organizarem futuramente para viver ali. Durante os estudos antropológicos, as equipes deverão ser acompanhadas por representantes do governo estadual e de proprietários rurais na vistoria em fazendas, além de receberem escolta policial. No ano passado, quando os estudos começaram, especialistas foram seguidos e fotografados por desconhecidos. “A presença da polícia é um modo de a gente entrar nas áreas que precisam ser verificadas”, disse Almeida ao destacar a importância do estudo para o processo de demarcação. (Agência Brasil.04/11/2009)

SENADO

O Senado Federal recebeu no dia 11 de novembro de 2009, uma série de sugestões para garantir o cumprimento da lei que tornou obrigatória a inclusão de conteúdos relativos à história e à cultura indígenas no currículo oficial da rede de ensino. Na opinião de quatro debatedores que participaram de audiência pública na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), os parlamentares devem incentivar a formação dos professores e a produção de material didático sobre a história e a cultura indígenas e criar espaços para que as lideranças indígenas participem efetivamente do processo de discussão do ensino dessas matérias e dos demais temas de seu interesse.
Durante o debate, episódios de discriminação e repressão foram relatados por dois representantes de povos indígenas. Álvaro Tukano, idealizador do projeto Séculos Indígenas no Brasil, contou, por exemplo, que, no colégio de padres salesianos em que estudou, os índios perdiam a merenda se falassem suas línguas. E a técnica de educação da Fundação Nacional do Índio (Funai) Mariléia Taiua, do povo Kurâ-Bakairi, relatou que o primeiro animal que seu pai aprendeu a desenhar na escola foi um elefante, e que as línguas e os rituais indígenas eram proibidos:
André Ramos, historiador indigenista e educador da Funai, afirmou que a educação contribuirá para pôr fim à visão dualista que há na sociedade a respeito dos povos indígenas, com os estereótipos do "mau selvagem" e do "bom selvagem". Outra distorção, segundo ele, é o de que os índios são inimigos do progresso. Há também a crença de que há muita terra para pouco índio: “O primeiro desafio é rompermos esses estereótipos. Os povos indígenas são povos contemporâneos da sociedade brasileira, que enfrentam todos os problemas e desafios da modernidade. Não se consegue ver os povos indígenas como aliados do futuro do país, um país politicamente correto do ponto de vista ambiental e da sociodiversidade.”
---------------------------------------------------------------------
Quem desejar adquirir o livro Bahia um Estado D´Alma, sobre a cultura do nosso estado, a obra encontra-se à venda nas livrarias LDM (Piedade), Galeria do Livro (Boulevard 161 no Itaigara e no Espaço Cultural Itau Cinema Glauber Rocha na Praça Castro Alves) e na Pérola Negra (ao lado da Escola de Teatro da UFBA, Canela) E quem desejar ler o livro Feras do Humor Baiano, a obra encontra-se à venda no RV Cultura e Arte (Rua Barro Vermelho, 32, Rio Vermelho. Tel: 3347-4929)

18 novembro 2009

Índios querem mais respeito pelos seus direitos e autonomia política

O Brasil possui aproximadamente 230 povos indígenas e mais de 190 línguas faladas. De acordo com informações do Governo do Estado, na Bahia são encontrados atualmente 20 propriedades de terra, distribuídos em 136.512 hectares com uma população estimada de 11.781 indígenas. As principais localidades estão situadas em reservas nos municípios de Prado, Porto Seguro, Muquém do São Francisco e Santa Cruz de Cabrália, no Extremo Sul; em Glória, Paulo Afonso e Rodelas, no território de Itaparica; Ribeira do Pombal, Banzaê e Euclides da Cunha, no Semi-Árido e em Ibotirama e Bom Jesus da Lapa, região do Velho Chico.

Diferente das incontáveis análises sobre a história dos negros, existe no Brasil um pequeno acervo na historiografia indígena, sendo disponibilizado apenas alguns espaços secundários nos livros escolares, espaços estes que tratam desrespeitosamente a cultura como um mero discurso folclórico, e em caráter universitário pouco se tem avançado. No Brasil ainda existe uma folclorização sobre o que é ser Índio. Para antropóloga Vanessa Caldeira no artigo intitulado “O que é ser índio”, a imagem para muitos dos brasileiros sobre o que é ser índio recaí uma idéia de aproximadamente 500 anos. “Essa imagem de índio – corpo nu, cabelo liso e preto, habitante das matas, falante de língua exótica – recai como forte cobrança para os povos indígenas contemporâneos”.

QUE TRIBO É ESSA? - “Se Deus quiser/Um dia quero ser índio/Viver pelado pintado de verde/Num eterno domingo/Ser um bicho preguiça/Espantar turistas/ E tomar banho de sol”. Qual foi a tribo em que a roqueira Rita Lee se inspirou para fazer a composição da música Baila Comigo, de sua autoria? Licença poética à parte, os índios contemporâneos brasileiros ao invés de ficar “tomando banho de sol” nas tribos, eles possuem uma ação política forte no país. São eles, agentes responsáveis por ações de preservação da cultura, de território, e da luta pelo direito da propriedade de terras.

De acordo com a Constituição Federal de 1988, art. 20, inciso XI, são bens da União, “as terras tradicionalmente ocupada por índios” o que reserva ao direito federal através do art. 49, inciso XVI “autorizar, em terras indígenas, a exploração e o aproveitamento de recursos hídricos e a pesquisa e lavra de riquezas minerais”. A Constituição determinada que o Governo Estadual é o responsável pelos territórios demarcados em suas limites de terras estaduais. Tramita no Supremo Tribunal Federal, há 27 anos, um processo de propriedade de terra entre o Governo Estadual e o Povo Pataxó Hã-Hã-Hãe que possui uma população estimada de 3.200 indígenas. A justificativa é que o Governo da Bahia se apossou de 54.100 ha do território dos índios. Nessa luta pela devolução territorial, muitos representantes indígenas foram assassinados desde 1983 quando houve a primeira morte por disputa de terras.

REIVINDICAÇÕES DO POVO - Outras reivindicações são levantadas pelo povo Hã-Hã-Hãe, que defende entre diversas propostas a construção, reforma e ampliação de escolas indígenas e a autonomia administrativa e financeira dessas escolas para a implantação de educação diferenciada. Na área da saúde, os índios querem a implantação de postos de saúde e de redes de esgotamento sanitário nas áreas indígenas, a execução dos programas de saúde do governo federal e a criação de laboratórios para a produção de remédios fitoterápicos.

Por meses, manifestantes de grupos indígenas Pataxós e Tupinambás do sul da Bahia se queixam com o descaso da Fundação Nacional da Saúde, FUNASA, que para eles, o órgão federal é o responsável pelo aumento da mortalidade na região. Eles reclamam que há muito tempo está faltando médicos, ambulâncias e medicamentos nas aldeias do sul do Estado.

Sociedade precisa respeitar auto-determinação dos povos indígenas
PARQUE MONTE PASCOAL - Em 1943 o Governo do Estado criou o Parque Nacional Monte Pascoal, localizado em Porto Seguro. De forma irresponsável e sem projetos de preservação os índios que moravam na região foram expulsos e não receberam terras para remanejamento. Em 1961, o Governo do Estado da Bahia repassou o território do parque para a União. Com uma área de 22.500 ha, o Monte Pascoal é um dos principais pontos históricos brasileiros, pois foi essa a primeira porção continental avistada pelos Portugueses, ainda em 1500. Além da importância histórica, esta Unidade de Conservação é uma das que reúne uma diversidade de ecossistemas, como a Floresta Ombrófila Densa, regiões alagadiças, restinga, mangue e praia.

Em 1997 foi demarcada o território Coroa Vermelha, que passou a ser chamada de Terra Indígena Pataxó de Coroa Vermelha, onde os remanescentes da área do parque se juntaram para recuperar a identidade cultural que agrega as aldeias de Coroa Vermelha, Mata Medonha, Corumbauzinho e Craveiro. Nos dias 21 e 22 de agosto no município de Santa Cruz de Cabrália, no extremo sul, foi realizado o Encontro Regional de Povos Indígenas. A iniciativa integra um plano de ação da Companhia de Desenvolvimento e Ação Regional (CAR) visando garantir uma ampla participação, mobilização, capacitação e fortalecimento dessas populações.

------------------------------------------------
Quem desejar adquirir o livro Bahia um Estado D´Alma, sobre a cultura do nosso estado, a obra encontra-se à venda nas livrarias LDM (Piedade), Galeria do Livro (Boulevard 161 no Itaigara e no Espaço Cultural Itau Cinema Glauber Rocha na Praça Castro Alves) e na Pérola Negra (ao lado da Escola de Teatro da UFBA, Canela) E quem desejar ler o livro Feras do Humor Baiano, a obra encontra-se à venda no RV Cultura e Arte (Rua Barro Vermelho, 32, Rio Vermelho. Tel: 3347-4929)

17 novembro 2009

Revisando o índio brasileiro (2)

O governo encaminhou em agosto de 2009 ao Congresso o novo estatuto do índio, que prevê o fim da tutela do Estado sobre os povos indígenas e regulamenta a exploração mineral em suas terras, hoje proibida por falta de legislação. Pelo projeto, os índios poderão ser responsabilizados penalmente por qualquer crime, como os demais cidadãos. Um laudo antropológico irá embasar a decisão do juiz, que vai avaliar se o ato cometido pelo indígena é aceitável e está no contexto de sua comunidade. "[Com o estatuto] outorgamos a plena capacidade civil, responsabilidades, sem agredir a sua origem cultural e os direitos territoriais", disse o ministro Tarso Genro (Justiça).

Quanto à mineração em terras indígenas, já tramita na Câmara um projeto de lei com basicamente o mesmo conteúdo do estatuto. A atividade deverá ser autorizada pelos próprios índios, que vão receber parte do faturamento bruto com o comércio do produto explorado. É na Amazônia que a regulamentação terá mais impacto, já que 25% dos minerais da região estão em terras indígenas.

DENOMINAÇÃO - Os habitantes das Américas foram chamados de índios pelos europeus que aqui chegaram. Uma denominação genérica, provocada pela primeira impressão que eles tiveram de haverem chegado às Índias. Mesmo depois de descobrir que não estavam na Ásia, e sim em um continente até então desconhecido, os europeus continuaram a chamá-los assim, ignorando propositalmente as diferenças lingüístico-culturais. Era mais fácil tornar os nativos todos iguais, tratá-los de forma homogênea, já que o objetivo era um só: o domínio político, econômico e religioso.

As populações indígenas são vistas pela sociedade brasileira ora de forma preconceituosa, ora de forma idealizada. O preconceito parte daquele que convive diretamente com os índios: as populações rurais. Dominadas política, ideológica e economicamente por elites municipais com fortes interesses nas terras dos índios e em seus recursos ambientais, tais como madeira e minérios, muitas vezes as populações rurais necessitam disputar as escassas oportunidades de sobrevivência em sua região com membros de sociedades indígenas que aí vivem. Por isso, utilizam estereótipos, chamando-os de "ladrões", "traiçoeiros", "preguiçosos" e "beberrões", enfim, de tudo que possa desqualificá-los. Procuram justificar, desta forma, todo tipo de ação contra os índios e a invasão de seus territórios.

CRENÇAS - Já a população urbana, que vive distanciada das áreas indígenas, tende a ter deles uma imagem favorável, embora os veja como algo muito remoto. Os índios são considerados a partir de um conjunto de imagens e crenças amplamente disseminadas pelo senso comum: eles são os donos da terra e seus primeiros habitantes, aqueles que sabem conviver com a natureza sem depredá-la. São também vistos como parte do passado e, portanto, como estando em processo de desaparecimento, muito embora, como provam os dados, nas três últimas décadas tenha se constatado o crescimento da população indígena.

Só recentemente os diferentes segmentos da sociedade brasileira estão se conscientizando de que os índios são seus contemporâneos. Eles vivem no mesmo país, participam da elaboração de leis, elegem candidatos e compartilham problemas semelhantes, como as conseqüências da poluição ambiental e das diretrizes e ações do governo nas áreas da política, economia, saúde, educação e administração pública em geral. Hoje, há um movimento de busca de informações atualizadas e confiáveis sobre os índios, um interesse em saber, afinal, quem são eles.

TRANSFORMAÇÃO - Qualquer grupo social humano elabora e constitui um universo completo de conhecimentos integrados, com fortes ligações com o meio em que vive e se desenvolve. Entendendo cultura como o conjunto de respostas que uma determinada sociedade humana dá às experiências por ela vividas e aos desafios que encontra ao longo do tempo, percebe-se o quanto as diferentes culturas são dinâmicas e estão em contínuo processo de transformação. O Brasil possui uma imensa diversidade étnica e lingüística, estando entre as maiores do mundo. São 215 sociedades indígenas, mais cerca de 55 grupos de índios isolados, sobre os quais ainda não há informações objetivas. 180 línguas, pelo menos, são faladas pelos membros destas sociedades, as quais pertencem a mais de 30 famílias lingüísticas diferentes.

No entanto, é importante frisar que as variadas culturas das sociedades indígenas modificam-se constantemente e reelaboram-se com o passar do tempo, como a cultura de qualquer outra sociedade humana. E é preciso considerar que isto aconteceria mesmo que não houvesse ocorrido o contato com as sociedades de origem européia e africana. No que diz respeito à identidade étnica, as mudanças ocorridas em várias sociedades indígenas, como o fato de falarem português, vestirem roupas iguais às dos outros membros da sociedade nacional com que estão em contato, utilizarem modernas tecnologias (como câmeras de vídeo, máquinas fotográficas e aparelhos de fax), não fazem com que percam sua identidade étnica e deixem de ser indígenas.

A diversidade cultural pode ser enfocada tanto sob o ponto de vista das diferenças existentes entre as sociedades indígenas e as não-indígenas, quanto sob o ponto de vista das diferenças entre as muitas sociedades indígenas que vivem no Brasil. Mas está sempre relacionada ao contato entre realidades socioculturais diferentes e à necessidade de convívio entre elas, especialmente num país pluriétnico, como é o caso do Brasil. É necessário reconhecer e valorizar a identidade étnica específica de cada uma das sociedades indígenas em particular, compreender suas línguas e suas formas tradicionais de organização social, de ocupação da terra e de uso dos recursos naturais. Isto significa o respeito pelos direitos coletivos especiais de cada uma delas e a busca do convívio pacífico, por meio de um intercâmbio cultural, com as diferentes etnias.


--------------------------------------------------------------------------------------

Quem desejar adquirir o livro Bahia um Estado D´Alma, sobre a cultura do nosso estado, a obra encontra-se à venda nas livrarias LDM (Piedade), Galeria do Livro (Boulevard 161 no Itaigara e no Espaço Cultural Itau Cinema Glauber Rocha na Praça Castro Alves) e na Pérola Negra (ao lado da Escola de Teatro da UFBA, Canela) E quem desejar ler o livro Feras do Humor Baiano, a obra encontra-se à venda no RV Cultura e Arte (Rua Barro Vermelho, 32, Rio Vermelho. Tel: 3347-4929)

16 novembro 2009

Revisando o índio brasileiro (1)

O índio tem ocupado um espaço minúsculo em nossa historiografia, deixando ao esquecimento. Mas o índio tem uma história, plural. É preciso reconstruir o verdadeiro cenário desconstruindo abordagens simplistas que eurocentrizaram as análises, configurando o índio num ambiente social exótico e primitivo.

A história do índio brasileiro permanece adormecida. O que se mostra nas escolas, principalmente no ensino fundamental, são apresentações distorcidas. O conceito de sincretismo deve ser revisto, afastando as possibilidades de folclorização da cultura indígena. Reduzir a contribuição da cultura indígena a sua herança (vocabulário, comida, etc), tal como vemos nos livros didáticos, é empobrecer a sua história. Reescrever a História Indígena é, antes de tudo, modificar os discursos que durante tanto tempo representaram os nossos nativos como os mais nocivos e pejorativos adjetivos. É preciso apontar perspectiva mais seguras de compreensão do universo histórico e cultural do índio.

DIVIDIDOS - Historiadores afirmam que antes da chegada dos europeus à América havia aproximadamente 100 milhões de índios no continente. Só em território brasileiro, esse número chegava 5 milhões de nativos, aproximadamente. Esses índios brasileiros estavam divididos em tribos, de acordo com o tronco lingüístico ao qual pertenciam: tupi-guaranis (região do litoral), macro-jê ou tapuias (região do Planalto Central), aruaques (Amazônia) e caraíbas (Amazônia). Atualmente calcula-se que apenas 400 mil índios ocupam o território brasileiro, principalmente em reservas indígenas demarcadas e protegidas pelo governo. São cerca de 200 etnias indígenas e 170 línguas. Porém, muitas delas não vivem mais como antes da chegada dos portugueses. O contato com o homem branco fez com que muitas tribos perdessem sua identidade cultural.

Em 1500, quando os portugueses chegaram ao Brasil, estima-se que havia por aqui cerca de 6 milhões de índios. Passados os tempos de matança, escravismo e catequização forçada. Nos anos 50, segundo o antropólogo Darcy Ribeiro, a população indígena brasileira estava entre 68 mil e 100 mil habitantes. Hoje o número é bem menor. Contando os que vivem em centros urbanos, ultrapassam os 100 mil. No total, quase 10% do território nacional, pertence aos índios. Quando os portugueses chegaram ao Brasil, havia em torno de 1.300 línguas indígenas. Atualmente existem apenas 150. O pior é que cerca de 35% dos 210 povos com culturas diferentes têm menos de 200 pessoas

Em seu estudo intitulado Colonialismo Predatório, Desempoderamento, o professor da Faculdade Dois de Julho, Derval Gramacho escreveu: “Ainda no primeiro quarto dos anos 1500, os índios passaram de simpática gente, conforme descrito nos primeiros relatos históricos, notadamente na carta de Pero Vaz de Caminha (1500), a terríveis canibais, antropófagos vorazes, vide, por exemplo, as narrativas de Hans Staden e Jean de Lery. Com isto, pode-se supor, os portugueses pretendiam forçar o afastamento de seus concorrentes na ocupação da nova colônia. Por outro lado, também justificavam a disposição de intervir, juntamente com a Igreja (na plenitude da vigência da Inquisição), na colonização e catequese dos índios que precisavam tornar-se cristãos, quer pelo poder do convencimento da cruz (a Igreja), quer pelo poder das armas (a Coroa). Uma vez submetidos à nova fé, a relação de subordinação deveria se processar de forma menos resistente, mantendo o colonizador a sua supremacia hegemônica” (...) Constata-se, então, que a usurpação do território lesou, não somente no sentido material, o índio com a desapropriação daquilo que lhe era tão caro (a terra) que valia morrer em defesa de seu sítio. Mesmo que fosse de sua natureza ser nômade, haveria sempre uma terra que seria ocupada e na qual se situariam por determinado espaço de tempo. No plano afetivo, o índio também perdeu, pela desapropriação, o lugar onde suas práticas rituais, seus costumes e sua tradição se instalaram, onde construíram relações quer sociais, quer de parentesco”.

NATUREZA - Os índios faziam objetos utilizando as matérias-primas da natureza. Vale lembrar que índio respeita muito o meio ambiente, retirando dele somente o necessário para a sua sobrevivência. Entre os indígenas não há classes sociais como a do homem branco. Todos têm os mesmo direitos e recebem o mesmo tratamento. A terra, por exemplo, pertence a todos e quando um índio caça, costuma dividir com os habitantes de sua tribo. Apenas os instrumentos de trabalho (machado, arcos, flechas, arpões) são de propriedade individual.

O trabalho na tribo é realizado por todos, porém possui uma divisão por sexo e idade. As mulheres são responsáveis pela comida, crianças, colheita e plantio. Já os homens da tribo ficam encarregados do trabalho mais pesado: caça, pesca, guerra e derrubada das árvores quando necessárias.

A visão que o europeu tinha a respeito dos índios era eurocêntrica. Os portugueses achavam-se superiores aos indígenas e, portanto, deveriam dominá-los e colocá-los ao seu serviço. A cultura indígena era considerada pelo europeu como sendo inferior e grosseira. Dentro desta visão, acreditava que sua função era convertê-los ao cristianismo e fazer os índios seguirem a cultura européia. Foi assim, que aos poucos, os índios foram perdendo sua cultura e também sua identidade.

ATUANTE - A historiografia costuma mostrar os índios como coadjuvantes incômodos, personagens secundários, selvagens infelizes e retraídos. Mas os índios tiveram um papel muito mais atuante e diferenciado do que se supõe, interagindo com os demais agentes sociais de diversas formas que vão da fuga ao ataque, da negociação ao conflito, da acomodação à rebeldia.

A quase totalidade dos índios do Nordeste foram contactados e passaram por experiências de aldeamento durante o período colonial. Sob a tutela dos jesuítas e de outras ordens religiosas como os beneditinos, os capuchinhos, os carmelitas e os franciscanos, os aldeamentos missionários totalizavam perto de uma centena em meados do século XVIII. O avanço da pecuária e da cultura do algodão e o assentamento de fronteiras no sertão foram devastadores para as populações indígenas. O índio brasileiro e baiano precisa ser reconhecido pelo seu próprio povo: o povo brasileiro.
--------------------------------------------------------------------------------
Quem desejar adquirir o livro Bahia um Estado D´Alma, sobre a cultura do nosso estado, a obra encontra-se à venda nas livrarias LDM (Piedade), Galeria do Livro (Boulevard 161 no Itaigara e no Espaço Cultural Itau Cinema Glauber Rocha na Praça Castro Alves) e na Pérola Negra (ao lado da Escola de Teatro da UFBA, Canela) E quem desejar ler o livro Feras do Humor Baiano, a obra encontra-se à venda no RV Cultura e Arte (Rua Barro Vermelho, 32, Rio Vermelho. Tel: 3347-4929)

13 novembro 2009

Música & Poesia

Hino de Duran (Chico Buarque)

Se tu falas muitas palavras sutis
Se gostas de senhas sussurros ardís
A lei tem ouvidos pra te delatar
Nas pedras do teu próprio lar



Se trazes no bolso a contravenção
Muambas, baganas e nem um tostão
A lei te vigia, bandido infeliz
Com seus olhos de raios X



Se vives nas sombras freqüentas porões
Se tramas assaltos ou revoluções
A lei te procura amanhã de manhã
Com seu faro de dobermam



E se definitivamente a sociedade
só te tem desprezo e horror
E mesmo nas galeras és nocivo,
és um estorvo, és um tumor
A lei fecha o livro, te pregam na cruz
depois chamam os urubus



Se pensas que burlas as normas penais
Insuflas agitas e gritas demais
A lei logo vai te abraçar infrator
com seus braços de estivador



Se pensas que pensas estás redondamente enganado
E como já disse o Dr Eiras,
vem chegando aí, junto com o delegado
pra te levar...





Reflexões (Clarice Lispector)

Há momentos na vida em que sentimos tanto a falta de alguém…
que o que mais queremos é tirar esta pessoa de nossos sonhos e abraçá-la…
Sonhe com aquilo que você quiser…
Seja o que você quer ser…
Porque você possui apenas uma vida
E nela só temos uma chance de fazer aquilo que queremos.
Tenha felicidade bastante para fazê-la doce,
dificuldades para fazê-la forte,
tristeza para fazê-la humana.
E esperança suficiente para fazê-la feliz.
As pessoas mais felizes não têm as melhores coisas,
elas sabem fazer o melhor das oportunidades que aparecem em seus caminhos.
A felicidade aparece para aqueles que choram…
Para aqueles que buscam e tentam sempre…
E para aqueles que reconhecem a importância das pessoas que passam por suas vidas.
O futuro mais brilhante é baseado num passado intensamente vivido.
Você só terá sucesso na vida quando perdoar os erros e as decepções do passado.
A vida é curta, mas as emoções que podemos deixar…
…duram uma eternidade…




------------------------------------------------
Quem desejar adquirir o livro Bahia um Estado D´Alma, sobre a cultura do nosso estado, a obra encontra-se à venda nas livrarias LDM (Piedade), Galeria do Livro (Boulevard 161 no Itaigara e no Espaço Cultural Itau Cinema Glauber Rocha na Praça Castro Alves) e na Pérola Negra (ao lado da Escola de Teatro da UFBA, Canela) E quem desejar ler o livro Feras do Humor Baiano, a obra encontra-se à venda no RV Cultura e Arte (Rua Barro Vermelho, 32, Rio Vermelho. Tel: 3347-4929)

12 novembro 2009

Brasil lembra 20 anos da morte de Luiz Gonzaga

Disco, filme e museu. Vinte anos depois de sua morte, a obra do compositor pernambucano é resgatada. Nascido em 13 de dezembro de 1912, Luiz Gonzaga conseguiu despertar em cada brasileiro um autêntico nordestino, cantando as dores, saudades e alegrias do sertanejo. Em seus 77 anos de vida, reuniu uma obra poucas vezes atingida por outros artistas, tanto em quantidade quanto em qualidade. Mostrou ao Brasil e ao mundo a beleza do forró, do xaxado, do xote, do maracatu e, principalmente, de sua criação: o baião.

Regravações de valsas que ele compôs na década de 40 e algumas ganharam letras inéditas de Zeca Baleiro, Abel Silva, Fernando Brant e Capinan estão previstos para chegar ao mercado no início de 2010. “Luas do Gonzaga” é o título do álbum que tem o cantor e violonista baiano, Gereba à frente do projeto. Um longa metragem baseado na biografia da jornalista Regina Echeverria (Gonzaguinha e Gonzagão – Explode Coração) está em processo de pré-produção com a direção de Breno Silveira, o mesmo de Dois Filhos de Francisco. Um museu e um complexo cultural em Recife vão reunir a obra e a história do Meste Lua. O Ministro da Cultura Juca Ferreira já levou a idéia ao presidente Lula que estimulou a iniciativa. O complexo segue a linha de museus “interativos”, como o Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo.

Vinte anos depois da morte de Luiz Gonzaga, o som de sua sanfona está cada vez mais presente nas salas de reboco das casas do sertão e nos mais diversos auditórios e palanques, enchendo de emoção e lirismo platéias de todas as categorias sociais. O forró pé-de-serra, introduzido no Brasil pelo Luiz Gonzaga na década de 40, conquista o mercado, concorrendo com outros ritmos brasileiros e estrangeiros. "O baião, coco, rojão, quadrilha, xaxado e xote caracterizam o forró e tem cheiro de carne de bode assada", comparou o velho Gonzagão, acrescentando que é uma música com a cara do Nordeste, que canta, ri, chora e "faz pouco" do seu secular sofrimento.

“Quando olhei a terra ardendo/Qual fogueira de São João/Eu perguntei a Deus do céu, ai/Por que tamanha judiação” ("Asa Branca", com Humberto Teixeira)

PRESENTE - Luiz do Nascimento Gonzaga nasceu no dia 13 de dezembro de 1912, na Fazenda Caiçara, município de Exu, ao lado da casa onde morou a heroína cearense Bárbara de Alencar. Morreu no dia 2 de agosto de 1989. A escola gonzagueana está cada vez mais presente na vida das novas gerações, vindas das mais diversas categorias sociais.

Intérprete de sucessos imortais nos mais variados ritmos, muitos outros cantores gravaram Luiz Gonzaga a partir do início dos anos setenta, entre os quais Geraldo Vandré (Asa-Branca), Gilberto Gil (Vem Morena), Caetano Veloso (A Volta da Asa-Branca) e até o grego Demis Roussos (White Wings/Asa-Branca). Essa afinidade com a nova geração musical brasileira - principalmente com os baianos - fez a gravadora RCA lançar em 1971 o disco ''O Canto Jovem de Luiz Gonzaga”, com músicas de Caetano Veloso, Edu Lobo, Geraldo Vandré, Gilberto Gil, Dori Caymmi. O elepê gerou em março de 1972 o show ''Luiz Gonzaga Volta Pra Curtir'', no Teatro Tereza Raquel, no Rio de Janeiro.

Suas músicas correram o mundo, "Asa Branca" teve interpretações em Israel, na Itália, Estados Unidos e Japão. Luiz Gonzaga ganhou diversos prêmios. Em 1976, recebeu o título de cidadão cearense, em 77 entrou na versão brasileira da Enciclopédia Universal Britânica, em 78 cantou para o Papa João Paulo II, e, em 81, ganhou dois discos de ouro. Embora sendo o terceiro artista mundial a receber o ''Cachorinho da RCA'', prêmio entregue anteriormente apenas para Elvis Presley e Nelson Gonçalves, o verdadeiro reconhecimento do valor de sua obra veio ainda em 1984. Luiz Gonzaga foi o grande homenageado na noite da entrega do Prêmio Shell para os melhores da Música Popular Brasileira. Segundo a crítica especializada, um prêmio justo e merecido para quem, em muitos anos de carreira artística somente recebeu dois Discos de Ouro e em 1981, o mesmo ano em que a classe artística se reuniu para homenagear Luiz Gonzaga em um show promovido pelo Cebrade. Em 1985 Luiz Gonzaga foi premiado com o ''Nipper de Ouro'' pelo conjunto de sua obra.

“Gonzaga é nosso primeiro artista pop. Com sua música, emendou pela primeira vez as pontas desse país, Nordeste e Sudeste”, informou o cineasta Breno Silveira. “Ele era o nosso Elvis Presley. Antes dele, ninguém por aqui ainda tinha pensado em criar um personagem para fazer música, com conceitos definidos de figurino e tudo mais. Ele inventou isso”, diz o líder da banda Cordel do Fogo Encantado, Lirinha. Para Lenine, Gonzagão foi o precursor do artista vestido, com música e com luz num ginásio. Ele e o letrista Humberto Teixeira, “botaram o Nordeste no centro da atenção, no mapa do Brasil”.

“Eu já dancei balancê/Xamego, samba e xerém/Mas o baião tem um quê/Que as outras danças não têm” ("Baião", com Humberto Teixeira)

-------------------------------------------------------------------------
Quem desejar adquirir o livro Bahia um Estado D´Alma, sobre a cultura do nosso estado, a obra encontra-se à venda nas livrarias LDM (Piedade), Galeria do Livro (Boulevard 161 no Itaigara e no Espaço Cultural Itau Cinema Glauber Rocha na Praça Castro Alves) e na Pérola Negra (ao lado da Escola de Teatro da UFBA, Canela) E quem desejar ler o livro Feras do Humor Baiano, a obra encontra-se à venda no RV Cultura e Arte (Rua Barro Vermelho, 32, Rio Vermelho. Tel: 3347-4929)