31 março 2009

Poder da Igreja de banir as mulheres (2)

As práticas de controle da sexualidade produziram violências que ainda hoje se reproduzem em sociedades africanas e entre os muçulmanos, como a extirpação do clitóris na mulher, que teriam seu contraponto nas práticas sadomasoquistas até os dias de hoje. Em 1997 uma somaliana fugitiva denuncia a mutilação feminina. Em 28 países africanos, na Índia e em alguns países asiáticos, quando as meninas começam a apresentar os atributos femininos, os pais exigem e as mães executam a extirpação do clitóris e, às vezes, até dos lábios da vagina, usando tesouras, lâminas e mesmo pedaços de vidro.

Numa cerimônia banhada em sangue e dor, costuram tudo, deixando uma pequena abertura para a saída da urina e da menstruação. A tortura acompanha a vida destas mulheres. Nada sensibiliza os pais que exigem a mutilação como garantia de pureza, enquanto os maridos a exigem como garantia de felicidade da esposa. As mães compactuam com o crime e repetem, o que lhes ensinaram: é um ato religioso, que faz parte da cultura do povo e que lhes foi transmitido pelas mães e avós, como o único meio de garantir o bom comportamento das meninas e impedir que elas fiquem livres.
“O rito de passagem, iniciático e religioso, serve de véu para encobrir o verdadeiro motivo do ato cruel, bárbaro, macabro. As sociedades ocidentais e orientais foram contaminadas por uma máxima que elas repetem incessantemente: a superioridade do macho sobre a fêmea, que se manifesta no âmbito biológico, intelectual, social e religioso; foram contaminados ainda pelo postulado fundamental, aceito pelos pensamentos greco-romano e judaico-cristão: o desejo e o prazer femininos são animalescos e a sexualidade da mulher, comandada pelos sentidos, deve ser domada, porque é perniciosa para a sociedade e para o homem”, informa a professora Maria Nazareth Alvim de Barros.
Segundo a historiadora britânica Geraldine Brooks, o costume da circuncisão feminina se originou na África Central na Idade da Pedra, seguindo para o norte do continente africano. No Ocidente, a circuncisão era utilizada como processo terapêutico até os anos 50. Médicos britânicos e norte-americanos praticavam a clitoridectomia e a castração feminina (retirada dos ovários) para enfrentar melancolia e ninfomania. Até o século 19, acreditava-se que as mesmas práticas “curavam” histeria, masturbação, lesbianismo e epilepsia.
Fatores culturais não devem servir de pretexto para violações aos direitos humanos, segundo a advogada norte americana Layli Miller, que obteve asilo nos EUA para uma africana que fugiu de Togo a fim de evitar a mutilação genital: Fauziya Kassindja. Entre as formas de discriminação contra as mulheres, a advogada cita o tráfico de mulheres, a violência doméstica e o “horror killings” (assassinatos motivados por ofendas à “honra”). “Crimes de honra também são um problema no Brasil. Parecem diferentes do que ocorre no Paquistão, onde uma mulher pode ser morta por se recusar a casar-se com o homem indicado por seu pai, mas traduzem a mesma idéia: a honra de um homem é um pretexto para assassinatos. Por exemplo, se ele descobre que a mulher o trai, ele a mata e não necessariamente é enviado à prisão. Isso também é crime de honra”. A cultura judaica-cristã atribuiu a idéia de culpa relacionada ao sexo e a circuncisão masculina (corte no pênis) indica o ingresso da criança no seio da comunidade.
A partir do século X, a Igreja se empenha em aprimorar seus instrumentos de controle e dominação. Dois séculos mais tarde, ao instituir a confissão, vê-se em condições de reger o íntimo. Para o bispo Étienne de Fougères, a mulher é portadora de mal. Ele repete com vigor no “Livre dês manières” (Livro das maneiras), composto entre 1174 e 1178. Escreveu-o em língua romântica, dirigido, portanto, aos membros da corte, aos cavaleiros e às damas. Trata-se de um longo poema – 336 estrofes, 1.344 versos -, sob forma de um sermão. Uma coleção de seis sermões, cada um deles referente a uma categoria social, sublinhando seus defeitos específicos e propondo-lhe um modelo de conduta. Esse homem de Igreja julga, define as infrações a fim de as reprimir, baseando-se na autoridade de seus antecessores (Marbode, o bispo Burchard de Worms, entre outros), e deste modo assentar solidamente, pouco a pouco, as regras de uma moral.

30 março 2009

Poder da Igreja de banir as mulheres (1)

Em um filme de aventura intitulado “O Vôo da Fênix” um grupo de pessoas está perdida no deserto. Em um momento de alta tensão um deles pergunta a um outro se ele é religioso. A resposta: “A espiritualidade não é religião. A religião divide as pessoas. A crença em alguma coisa une”. A religião em geral busca dirigir-se a todos os homens sem distinção, para lhes oferecer os “meios de salvação”, e não explicações (metafísicas) sobre a verdade pura e a natureza profunda das coisas – apesar de essas explicações serem oferecidas indiretamente e simbolicamente.

O filósofo alemão Friedrich Nietzsche (1844/1900) em sua obra “Humano, demasiado humano” afirma que os sacerdotes até hoje vivem da anestesia dos males humanos. E na vantagem de ter religião ele escreveu: “Existem pessoas sóbrias e eficientes, às quais a religião está pregada como uma orla da humanidade superior: estas fazem muito bem em permanecer religiosas, pois isso os embeleza – Todos os homens que não entendem de um ofício qualquer das armas - a boca e a pena contam como armas – se tornam servis: para eles a religião cristã é útil, pois nela o servilismo toma o aspecto de uma virtude cristã e fica espantosa – é muito vazia e monótona se tornam facilmente religiosas: isto é compreensível e perdoável, mas elas não têm o direito de exigir religiosidade daqueles para quem a vida não transcorre cotidianamente vazia e monótona”.
“Podemos continuar a consumir nossas comodidades, a minimizar perigos, a ignorar o misterioso e o desconhecido, e a desencorajar a criatividade, até o mundo ficar tão seguro para nós que nos tornaríamos ´inextirpáveis, como a pulga´. Ou podemos nos empenhar por nos tornarmos algo mais que ´humanos, demasiadamente humanos´, e aspirar ao Ubermensch (super-homem). O último homem é o burguês consumado, o utilitário satisfeito, o pamonha absoluto”.
“A igreja se mete nessa história porque tem seus próprios interesses. Os funcionários de todas as religiões vivem da figura de Deus. Essas pessoas quer acreditam nisso, têm que continuar acreditando, porque é Deus que dá a comida, a roupa, o prestígio e o poder para eles, no sentido exato da palavra. Quanto mais pobre e sem cultura, mais a pessoa é dependente da religião” (Elsimar Coutinho, médico, em entrevista a revista Ana Magazine nº01, 2006).

A história da humanidade tem sido a história de personagens masculinos, sejam eles guerreiros, sacerdotes, heróis ou artistas. A influência da tradição sempre foi reforçada e, em certa medida, continua sendo até hoje pela religião, instituição de marcado caráter conservador. Com o passar do tempo a mulher transformou-se, ela mesma, num agente de reprodução do sistema, cooptada pela ideologia paternalista, que tem como premissa a legitimidade da autoridade masculina sobre o conjunto da sociedade. De todos os milhares de mitos da criação imaginados por povos de todos os lugares, as histórias da criação e de Adão e Eva, que abrem o Gênese, dupla narrativa produzida há muito tempo por obscuros semitas foi a que triunfou nas três principais religiões monoteístas: judaísmo, cristianismo e islamismo.
Em seu livro sobre “A Assustadora História da Maldade”, Oliver Thomson traz uma profunda compreensão das complexas relações entre as crenças de uma sociedade e seu comportamento. A idéia dominante e provocativa do autor é que a moralidade está sujeita aos costumes e aos caprichos dos ricos e poderosos, como em qualquer outro aspecto da vida humana. Para a maioria de nós, todo código ético propõe a virtude e condena o mal. Entretanto, muitos crimes foram e são cometidos em nome do que se supõe ser a virtude, caminho para o poder ou o prestígio, em todos os períodos históricos. O genocídio fez parte da ética fascista, o infanticídio, de espartana. Os jesuítas praticavam a tortura, os puritanos queimavam as bruxas, os membros do IRA e do ETA crêem na validade do assassinato. O que faz com que o conceito do bem (e, portanto, o do mal) mude conforme a época, o povo e o contexto sócio econômico?
Todos os períodos da História abrigaram seus próprios dissidentes. Sociedade alguma jamais foi inteiramente normalizada, mesmo tendo cada uma estabelecido suas normas. Houve agnósticos em plena Idade Média cristã, libertinos no século 19, pornocratas na Inglaterra calvinista, despreocupados pacifistas às vésperas da Grande Guerra, puritanos declarados em maio de 68, etc. As grandes evoluções da moral sexual nunca envolveram a coletividade como um todo. Elas tiveram apenas uma significação majoritária, global, antropológica. Ficar de acordo com os valores dominantes em seu tempo ou se confrontar com eles, aceitar o peso do holismo ou oferecer-lhe resistência, esta margem permanece sempre em aberto. E remete cada homem a sua irredutível liberdade. A pressão coletiva é sempre poderosa, mas nunca o é de forma absoluta. Nos artigos a seguir vamos conhecer o poder da Igreja em esconder certas “verdades” em benefício próprio. E o povo que vai pastar. É a sua mensagem.

27 março 2009

Dez momentos do lançamento de Bahia, um estado d´alma

Na última quinta-feira, dia 26, no Espaço Cultural Unibanco Cinema Glauber Rocha (Galeria do Livro), foi lançado meu quinto livro "Bahia, um estado d´alma". O livro já está à venda nas livrarias LDM (Piedade), Galeria do Livro (Boulevard 161 e Cinema Glauber Rocha) e Pérola Negra (Canela). Eis dez momentos fotográficos do lançamento.




































































26 março 2009

Passeio gastronômico na cozinha baiana

Hoje, a partir das 18h30, estarei esperando os amigos (as) para o lançamento de meu quinto livro “Bahia, um estado d´alma” no Espaço Cultural Unibanco (Galeria do Livro) Cinema Glauber Rocha, na Praça Castro Alves. Conto com a presença de todos para um rápido papo e um coquetel especial oferecido pela nossa querida Andréa Siamenghi. Com exclusividade, um capítulo do livro sobre gastronomia:


“No tabuleiro da baiana tem:/vatapá, oi, caruru,/mugunzá, tem umbu pra Ioió./Se eu pedi você me dá/o seu coração, seu amor de Iaiá./No coração da baiana tem:/sedução,oi,cangerê,/ilusão, oi,candomblé pra você.//Juro por Deus, pelo Senhor do Bonfim/quero você, baianinha,/inteirinha pra mim./E depois, o que será de nós dois?/seu amor é tão fugaz, enganador./Tudo já fiz,/fui até um cangerê pra ser feliz/meus trapinhos juntar com você./E depois, vai ser mais uma ilusão./No amor quem governa é o coração” (No Tabuleiro da Baiana, de Ary Barroso)

Do Recôncavo até a Chapada Diamantina, da região sisaleira até o Sul do Estado, da Serra Geral ao Oeste o visitante tem a oportunidade de conhecer a verdadeira culinária baiana. Trata-se de um passeio gastronômico pelo que há de mais típico na cozinha da Bahia: moqueca de tucunaré com cortado de palmito, galinha caipira ao molho de cansanção, pingolete (godó de banana), ensopado de mandacaru, fritada de mamão verde, ensopado de jaca, malamba (fubá com galinha) e moqueca de maturi são alguns exemplos do que o turista tem para degustação. Da cozinha saem pratos do sertão nordestino. A buchada de carneiro (bucho recheado com miúdos) e a galinhada caipira (cozida em pedaços na própria gordura, com pirão e coentro) estão entre as atrações.

Carne-de-sol com macaxeira (mandioca), jerimum (abóbora) e batata-doce. A famosa manteiga de garrafa (líquida, na temperatura ambiente, conservada na garrafa) é tempero importante. Baião-de-dois é o nome do acompanhamento contendo feijão-de-corda cozido junto com arroz podem-se provar pratos como frigideira de camarão, moqueca de peixe acompanhada com arroz de coco e pirão e carne-seca com quiabo. Como se sabe, a culinária baiana é vigorosa e apimentada. Siri-mole frito, acarajé, bobó de camarão com vatapá e moqueca de siri-mole.


O azeite de dendê é ingrediente fundamental, praticado em Salvador e na região costeira situada dentro de sua faixa da influência. Seguindo-se em direção ao interior, já a partir de Feira de Santana e até para além do Rio São Francisco, o azeite de dendê praticamente desaparece, e a cozinha adquire consistência e sabores sertanejos: carne de sol com pirão de leite, feijão verde com manteiga de garrafa, entre outros.

NORTE - Nossa viagem começa pelo litoral norte com o beiju feito na hora com queijo e côco de Cardeal da Silva, ou os doces caseiros de leite, de côco, mamão e carambola, além do bolo de goma e aimpim. Jandaíra, Catu, Entre Rios, Ouriçangas, Pojuca, Sátiro Dias e Esplanada possuem comidas especiais de dar água na boca. Saindo do litoral norte e entrando na região metropolitana temos os peixes fritos de Camaçari, Candeias, Lauro de Freitas, São Francisco do Conde, Dias D´Ávila, Madre de Deus. Em Itaparica pode-se deliciar com os petiscos como moqueca de peixe e de camarão, ensopados de ostra, aratu, polvo, lula e sarnambi. E Vera Cruz tem doces típicos como a cocada sabor da ilha, servida na casca do coco.

Da região metropolitana seguimos para o Nordeste baiano. Grande produtor de beiju, farinha de mandioca e derivados da goma, Conceição do Coité, a capital do sisal conquistou muitos visitantes com esses produtos. Em Cipó tem doces de conserva de todo tipo. Já na capital do bode, Uauá o que não pode faltar é a buchada, viuvinha, arrumadinho, carne de sol e tripa de porco. Em Cansanção tem o legítimo ensopado de galinha caipira acompanhada de farofa caipira, pirão de muncanã e molho de cansanção (planta símbolo da cidade). Na sobremesa doce de cachixa de oricuri e o aperitivo pode ser pau-de-rato ou verga de quati. Em Santa Brígida o prato típico é a buchada de carneiro ou o bode assado. Serrinha oferece pão, doce, patê, pudim, musse, quibi, tudo feito com o caju, com sabor especialíssimo. É provar e gostar. Em Araci as bebidas são afrodisíacas. E em Fátima tem doce de bufu (feito com a raiz do umbuzeiro) e o cuscuz com mocotó.

No Paraguaçu o que mais se come é carne do sol, de bode (Rui Barbosa) ou mesmo a famosa feijoada de Iaçu. Se o assunto é mel de abelha, cachaça temperada (capim santo, alecrim, cidreira e jatobá), bode e carneiro defumado, tucunaré de vários tipos, caldo de peracuca (tipo de peixe da região) vai encontrar em Marcionílio Souza.


RECÔNCAVO - No Recôncavo vamos conhecer na festejada Santo Amaro da Purificação, berço do samba, e a sua maniçoba, ou a frigideira de marisco de Salinas da Margarida, a moqueca de fruta pão de Saubara. Maniçoba faz a delícia dos moradores de Governador Mangabeira. Mutuípe é conhecida pelo escaldado de pitu com pirão. Galinha caipira com andu ou pirão é a pedida no município de Laje. A rica variedade de frutas como o bacupari, a guabiraba e ouricuri estão em destaques em Amargosa, assim como o cuscus de inhame. Nazaré das Farinhas apresenta muitos doces caseiros (tomate, goiaba, caju e carambola). Já São Felipe, produtor de cana de açúcar tem rapadura, açúcar mascavo e melado de qualidade.

Saindo do Recôncavo e entrando na região do São Francisco, o visitante pode degustar de uma rapadura de Casa Nova ou beber um caldo de cana e se deliciar com a melancia e acerola, fruta da localidade. Barra, a princesa do São Francisco, uma das mais antigas povoações do Brasil apresenta sua culinária típica baseada no peixe (a cidade é banhada pelos rios Grande e São Francisco), principalmente a moqueca de surubim e doces deliciosos como o de muriti. Em Itaquara a pedida é malamba (fubá com galinha), e o doce de leite com rapadura.

“Bahia, terra do coco babaçu/Bahia, que tem muqueca e umbú/Baiana tem mandinga/Baiana tem feitiço/Eu sou da Bahia/E mereço um sacrifício/Quem da Bahia tiver saudade/Pega o pandeiro e cai no choro/Roda o tundá, bota a chinela/Cai num desafio/Integrando o coro/Terra do jongo e do batuque/A batucar nas noites de Reis/Eu, pra Bahia, hei de voltar/Juro por Deus/E não tem talvez” (Bahia, de Ary Barroso).

25 março 2009

Dia 26 (amanhã) no Espaço Unibanco de Cinema tem lançamento: Bahia, um estado d´alma

Para comemorar os 460 anos de fundação da cidade de Salvador, o jornalista e pesquisador Gutemberg Cruz lança nesta quinta-feira (dia 26) no Espaço Cultural Unibanco (Galeria do Livro) Cinema Glauber Rocha (Praça Castro Alves) a partir das 18h30min o livro “Bahia, um estado d´alma”. Capa e contra capa com ilustração do artista gráfico Wilton Bernardo. O livro está à venda nas livrarias: LDM (Livraria Multicampi, Piedade), Galeria do Livro (Espaço Cultural Unibanco na Praça Castro Alves e Boulevard 161, Itaigara) e Pérola Negra (Canela). A jornalista Cathyanne Rodriguez no prefácio informa: “A Bahia é um estado d’alma. (...). Não faz diferença que o baiano more em Paris ou Grécia, num casarão vitoriano ou num apartamento modernista, a Bahia o habita. Assim, a Bahia é onipresente. Cada um a carrega vida afora à sua maneira. Cada um tem a sua Bahia.. É assim que Gutemberg Cruz inicia sua obra: com emoção e simplicidade. E isso é recorrente ao longo de cada capítulo. Mesmo aquele que nunca foi a Bahia, sente-se caminhando por entre as descrições sensoriais do autor. Mais do que puro e simplesmente ler um livro, passeia-se pelo barroco, pelos becos escuros, pelos mistérios, encantos, sons, cheiros, imagens, sensações e emoções da Bahia”.

(Na foto, Gutemberg e a jornalista Cathyanne)
“Além de conhecer a Bahia, o autor presenteia o leitor ainda com o desvendamento de mitos, lendas e curiosidades desta terra. Uma das lendas que corre mundo afora é de que Salvador possui 365 igrejas, uma para cada dia do ano. O autor, sabiamente não desmitifica isso dando o número exato de igrejas, ele faz melhor: elucida a razão pela qual a capital baiana ostenta tantas basílicas e templos religiosos. Segundo ele, a disposição dos baianos para a festa, as transgressões e o caráter lascivo foram motivos suficientes para que nossos colonizadores erguessem tantas igrejas: para que as pessoas confessassem seus pecados. E tome igreja em cada esquina!”

ABENÇOADA - “A Bahia é, de fato, uma terra abençoada. O capricho da natureza é evidente no seu litoral de praias tranqüilas recheadas de coqueiros. Salvador carrega a fama de possuir 365 igrejas, uma para cada dia do ano, no puro estilo barroco. Símbolos da cidade como o Elevador Lacerda, o Farol da Barra e o Pelourinho encantam os visitantes. Aqui foi o berço onde se proliferaram movimentos que modificaram padrões estéticos de alguns segmentos da arte produzida no Brasil. A Bahia impulsionou o surgimento de notáveis escritores, músicos, políticos, juristas e educadores”.

“A fusão dos sons dos atabaques dos candomblés e o ritmo do samba-reggae, que costumam invadir as noites, transformam a capital da Bahia numa cidade diferente. Mais do que encantadora malemolência e jingado do povo baiano, chamam a atenção dos visitantes o sincretismo religioso e a beleza da cidade velha, que reúne um dos principais acervos culturais do país. São obras e monumentos do período renascentista, sacro, barroco, rococó e neo-clássico, distribuídos em pelo menos 166 igrejas e dezenas de museus. As estreitas ruas das íngremes ladeiras do Centro Histórico de Salvador, onde está localizado o Pelourinho, faz as pessoas retornarem ao passado. Casarões se perfilam por quarteirões inteiros, relatando, séculos depois, o fausto de uma época marcada pela riqueza e o rigor no trato com a população negra. Hoje os moradores do Pelourinho se destacam pela busca de uma cidadania outrora negada, e entidades como o Olodum se fortalecem dia a dia”.

PLURALIDADE - “A formação geográfica de Salvador, de forma triangular e cercada pelo mar em dois lados, concede condições privilegiadas para se aproveitar o sol, enquanto uma breve brisa sopra constantemente, tornando o clima muito agradável. Capital da pluralidade misturando novo e antigo na alegria de uma gente que soube guardar herança cultural de três raças e mescla-las numa só, criando esta identidade tão peculiar, que distingue o baiano de todos os outros povos dopais continente Brasil. Durante debate sobre conceito de Nação com teóricos do Partido Comunista da União Soviética, em Moscou, o dirigente comunista baiano Armênio Guedes, solicitado a dar sua opinião sobre o Brasil, respondeu, segundo Jorge Amado em “Navegação de Cabotagem”: “Se o Brasil é uma nação eu não sei. Conheço pouco de Brasil. Mas que a Bahia é uma nação, é, sem a menor dúvida”.

"A cidade mais antiga do Brasil, que completa 460 anos de vida, reúne praias belíssimas como a de Itapuã e a de São Tomé de Paripe, e parques de beleza natural como de Pituaçu, Abaeté e São Bartolomeu. O cidadão de Salvador nunca perde de vista a identidade. No simples sorriso que recepciona os visitantes ou na amistosa saudação aos íntimos (“diga aí, meu rei!”), no mergulho na Baía de Todos os Santos ou na subida da Colina Sagrada e na ritualística celebração, de bermuda e camiseta na Fonte Nova em dia de Ba Vi este povo exala o charme maior da cidade. O soteropolitano que recebe os turistas com um largo sorriso sabe que sua cidade é de Oxum, deus das águas doces, da malemolência, do dengo e dos mistérios. Assim é a Bahia, “terra da felicidade”, “cidade mãe” porque é acolhedora, cidade do sol, sempre sorrindo, do samba de roda, do som saliente, sabores sortidos e suculentos, e rica em tradições. Uma terra ao mesmo tempo singular e plural”.

No passeio pela Bahia, Gutemberg mostra a identidade visual de muitos municípios como Porto Seguro, a cidade monumento, Caravelas e o Arquipélago de Abrolhos, Ilhéus a terra dos romances de Amado, Itacaré ótima para o surf, Canavieiras a capital do caranguejo, Valença terra do camarão, Mucugê e o cemitério bizantino, Abaíra e sua boa cachaça, Iraquara cidade das grutas, Lençóis a capital do diamante, Paulo Afonso a terra dos esportes radicais, Juazeiro a capital da irrigação, Tucano e suas águas minerais, Monte Santo a terra dos peregrinos, Barreiras a capital da soja e Bom Jesus da Lapa a cidade santuário, da fé.

24 março 2009

Bahia, um estado d´alma será lançado dia 26 (quinta) de março

O jornalista e pesquisador Gutemberg Cruz estará lançando no próximo dia 26 de março, às 18h30, no Espaço Unibanco de Cinema (Galeria do Livro) na Praça Castro Alves, em Salvador, o livro “Bahia, um estado d´alma”. O lançamento comemora os 460 anos de fundação da cidade de Salvador. A capa e contra capa do livro conta com ilustração do artista gráfico Wilton Bernardo. No obra Gutemberg escreve sobre a “terra de todas as belezas” que começou como capital do Atlântico Sul, faz referência para os navegadores, os cheiros, temperos e aromas exóticos, o ritmo no sangue dos baianos (um povo que canta e dança), os diversos preceitos na religiosidade, a Bahia de Oxum, de corpo e alma, feminina. Em seguida ele descreve as comidas tentadoras do Sul da Bahia, a cultura popular e manifestação folclórica, faz um panorama da cultura popular numa Bahia singular/plural, mostra as trilhas da Chapada Diamantina, as relíquias de guerra, fé e grãos que destacam o oeste e sertão, a Baía de Todos os Santos ao Recôncavo e o turismo no litoral baiano. Eis a abertura da obra:
(Na foto, Lúcia e Gutemberg)
A Bahia é um estado d´alma. Nem o tempo nem o exílio podem destruir. Não faz diferença que o baiano more em Paris ou Grécia, num casarão vitoriano ou num apartamento modernista, a Bahia o habita. Assim, a Bahia é onipresente. Cada um a carrega vida afora à sua maneira. Cada um tem a sua Bahia. Para uns são as festas populares sagradas e profanas, e para outros, o perfume dos cacaueiros da infância ou o sabor das frutas tropicais. O lugar onde se está é onde o mundo nasce.
A Bahia é, de fato, uma terra abençoada. O capricho da natureza é evidente no seu litoral de praias tranqüilas recheadas de coqueiros. Salvador carrega a fama de possuir 365 igrejas, uma para cada dia do ano, no puro estilo barroco. Símbolos da cidade como o Elevador Lacerda, o Farol da Barra e o Pelourinho encantam os visitantes. Aqui foi o berço onde se proliferaram movimentos que modificaram padrões estéticos de alguns segmentos da arte produzida no Brasil. A Bahia impulsionou o surgimento de notáveis escritores, músicos, políticos, juristas e educadores.
A fusão dos sons dos atabaques dos candomblés e o ritmo do samba-reggae, que costumam invadir as noites, transformam a capital da Bahia numa cidade diferente. Mais do que encantadora malemolência e jingado do povo baiano, chamam a atenção dos visitantes o sincretismo religioso e a beleza da cidade velha, que reúne um dos principais acervos culturais do país. São obras e monumentos do período renascentista, sacro, barroco, rococó e neo-clássico, distribuídos em pelo menos 166 igrejas e dezenas de museus. As estreitas ruas das íngremes ladeiras do Centro Histórico de Salvador, onde está localizado o Pelourinho, faz as pessoas retornarem ao passado. Casarões se perfilam por quarteirões inteiros, relatando, séculos depois, o fausto de uma época marcada pela riqueza e o rigor no trato com a população negra. Hoje os moradores do Pelourinho se destacam pela busca de uma cidadania outrora negada, e entidades como o Olodum se fortalecem dia a dia.
A formação geográfica de Salvador, de forma triangular e cercada pelo mar em dois lados, concede condições privilegiadas para se aproveitar o sol, enquanto uma breve brisa sopra constantemente, tornando o clima muito agradável. Capital da pluralidade misturando novo e antigo na alegria de uma gente que soube guardar herança cultural de três raças e mescla-las numa só, criando esta identidade tão peculiar, que distingue o baiano de todos os outros povos dopais continente Brasil. Durante debate sobre conceito de Nação com teóricos do Partido Comunista da União Soviética, em Moscou, o dirigente comunista baiano Armênio Guedes, solicitado a dar sua opinião sobre o Brasil, respondeu, segundo Jorge Amado em “Navegação de Cabotagem”: “Se o Brasil é uma nação eu não sei. Conheço pouco de Brasil. Mas que a Bahia é uma nação, é, sem a menor dúvida”.

A cidade mais antiga do Brasil, que completa 460 anos de vida, reúne praias belíssimas como a de Itapuã e a de São Tomé de Paripe, e parques de beleza natural como de Pituaçu, Abaeté e São Bartolomeu. O cidadão de Salvador nunca perde de vista a identidade. No simples sorriso que recepciona os visitantes ou na amistosa saudação aos íntimos (“diga aí, meu rei!”), no mergulho na Baía de Todos os Santos ou na subida da Colina Sagrada e na ritualística celebração, de bermuda e camiseta na Fonte Nova em dia de Ba Vi este povo exala o charme maior da cidade. O soteropolitano que recebe os turistas com um largo sorriso sabe que sua cidade é de Oxum, deus das águas doces, da malemolência, do dengo e dos mistérios. Assim é a Bahia, “terra da felicidade”, “cidade mãe” porque é acolhedora, cidade do sol, sempre sorrindo, do samba de roda, do som saliente, sabores sortidos e suculentos, e rica em tradições. Uma terra ao mesmo tempo singular e plural.

O livro está à venda nas livrarias: LDM (Livraria Multicampi, Piedade), Galeria do Livro (Espaço Cultural Unibanco na Praça Castro Alves e Boulevard 161, Itaigara) e Pérola Negra (Canela).
Lançamento:

Livro: Bahia, um estado d ´alma
Dia: 26 de março
Horário: 18h30
Local: Espaço Unibanco de Cinema Glauber Rocha (Galeria do Livro) na Praça Castro Alves, Salvador, Bahia.

23 março 2009

A invenção do Nordeste (3)

Durval Muniz de Albuquerque Jr informa ainda que no Sul, a partir da década de 20, pensa-se a identidade nacional dividida em pólos antagônicos. São Paulo, Pernambuco e Bahia são tomados como células iniciais do tecido nacional. O discurso histórico centra-se na história dessas três áreas, para construir a história do Brasil. “O Brasil seria um país cindido entre a inteligência do Sul, mais bem aparelhada em seus conceitos de realidade; e, de outro lado, o ´nortista´, fantasioso, imaginoso e sensitivo, delirante e compadecido. Razão e sentimento, dilema em que se cindia a identidade nacional, representada pela divisão entre suas duas regiões”. E assim ele apresenta o pensamento de Menotti del Picchia, Mario e Oswald de Andrade, Amadeu Amaral, entre outros. Para o estudioso, o Nordeste, espaço da saudade, da tradição, foi também inventado pelo romance, pela música, pela poesia, pela pintura, pelo teatro etc.

O Nordeste como o lugar da tradição é sempre tematizado como uma região rural, onde as cidades aparecem, como símbolo da decadência, do pecado, do desvirtuamento da pureza e d inocência camponesa. Embora muito antigo, o fenômeno urbano e metropolitano no Nordeste é praticamente ignorado por sua produção artística e literária. Sendo o local de uma das primeiras manifestações industriais no país, a indústria é vista com desconfiança, como um corpo estranho numa “região agrícola”. “Olhar o Nordeste da cidade grande é como olhar do lado averso de um binóculo. Tudo longe, muito embaraçado”. Em algumas formulações, o Nordeste aparece como o mundo “primitivo”, em oposição à degenerescência do mundo “civilizado”.

Para o doutorado em História na Unicamp, e professor das universidades federais do Rio Grande do Norte e de Pernambuco, os romances der Graciliano Ramos e Jorge Amado. Da década de 30, a poesia de João Cabral de Melo etc, a pintura de caráter social, da década de 40, e o Cinema Novo, do final dos anos 50 e início dos anos 60, tomarão o Nordeste como o exemplo privilegiado da miséria, da fome, do atraso, do subdesenvolvimento, da alienação do país. “Tomando acriticamente o recorte espacial Nordeste, esta produção artística ´de esquerda´ termina por reforçar uma série de imagens e enunciados ligados à região que emergiram com o discurso da seca, já no final do século passado. Vindo ao encontro, em grande parte, da imagem de espaço-vítima, espoliado; espaço da carência, construído pelo discurso de suas oligarquias. Eles lançam mão de uma verdadeira mitologia do Nordeste, já fabricada pelos discursos anteriores, e a submete a uma leitura ´marxista´que a inverte de sentido, mantendo-a, no entanto, presa à mesma lógica e questões. Do Nordeste pelo direito, passamos a vê-lo pelo avesso, em que as mesmas linhas compõem o tecido, só quer, no avesso, aparecem seus nós, seus cortes, suas emendas, seu rosto menos arrumado, embora constituinte também da própria malha imagético-discursiva chamada Nordeste”.


Ele aborda a questão das contradições de uma literatura presa a um dispositivo de poder e às sua lógica vivido pelo povo brasileiro. “Na literatura realista, o significado e o significante ficam unidos por ligações inseparáveis. Nesta, a linguagem denotativa impõe um sentido como verdadeiro, enquanto o autor impõe um sentido ao leitor, que tende a participar pouco da construção do sentido da obra. Ela não é uma prosa dialógica, mas monológica, em que as identidades dos personagens são sempre fichadas, em que não se permite a afirmação da negação, que é excluída numa síntese dialética ou conciliada por um trabalho de harmonização pelo uso da linguagem simbólica”.

O Nordeste destes romances é o Nordeste artesanal, no qual o industrial é visto como dramático e feio. Um Nordeste mais dos marginais, dos malandros, dos trabalhadores informais e autônomos. Um Nordeste da fuga do trabalho rotineiro e da disciplina industrial.

Em sua conclusão, Durval Muniz escreveu que o Nordeste é uma invenção recente na história brasileira, se gestou no cruzamento de uma série de práticas regionalizantes, motivadas pelas condições particulares com que se defrontam, as províncias do Norte, no momento em que o dispositivo da nacionalidade, que passa a funcionar entre nós, após a Independência, coloca como tarefa, para os grupos dirigentes do país, a necessidade de se construir a nação. “O Nordeste é, portanto, filho da modernidade, mas é filho reacionário, maquinaria imagético-discursiva gestada para conter o processo de desterritorialização por que passavam os grupos sociais desta área, provocada pela subordinação a outra área do país que se modernizava rapidamente: o Sul”.

“O Nordeste, na verdade, está em toda parte desta região, do pais, e em lugar nenhum, porque ele é uma cristalização de estereótipos que são subjetivados como característicos do ser nordestino e do Nordeste. Estereótipos que são operativos, positivos, que instituem uma verdade que se impõem de tal forma, que oblitera a multiplicidade das imagens e das falas regionais, em nome de um feixe limitado de imagens e falas-clichês, que são repetidas ad nausem, seja pelos meios de comunicação, pelas artes, seja pelos próprios habitantes de outras áreas do país e da própria região”.

Assim a obra de Muniz questiona esta representação regional e a prisão dos discursos a este dispositivo de força que a sustentou e a sustenta. “É preciso fugir do discurso da súplica ou da denúncia da miséria; é preciso novas vozes e novos olhares que compliquem esta região, que mostrem suas segmentações, as cumplicidades sociais dos vencedores com a situação presente deste espaço. Se o Nordeste foi inventado para ser este espaço de barragem da mudança, da modernidade, é preciso destruí-lo para poder dar lugar a novas espacialidades de poder e de saber”.

20 março 2009

A invenção do Nordeste (2)

Para Durval Muniz de Albuquerque, a região Nordeste surge na “paisagem imaginária” do país, no final da primeira década do século XX, substituindo a antiga diversão regional do país entre Norte e Sul, e foi fundada na saudade e na tradição. Surgiu da construção de uma totalidade político-cultural como reação à sensação de perda de espaços econômicos e políticos por parte de produtores tradicionais de açúcar e algodão, dos comerciantes e intelectuais a eles ligados. Assim, lança-se mão de topos, símbolos, de tipos, de feitos para construir um todo que reagisse à ameaça de dissolução, numa totalidade maior, agora não dominada por eles: a nação.


A questão da influência do meio era a grande arma política do discurso regionalista nortista, desde que a seca foi descoberta em 1877, como um tema que mobilizava, que emocionava, que podia servir de argumento para exigir recursos financeiros, construção de obras, cargos no Estado etc. O discurso da seca e sua “indústria” passam a ser a “atividade” mais constante e lucrativa nas províncias e depois nos Estados do Norte, diante da decadência de suas atividades econômicas principais: a produção de açúcar e algodão.

Assim, o Nordeste surge como a parte do Norte sujeita às estiagem e, por essa razão, merecedora de especial atenção do poder público federal. O Nordeste é, em grande medida, filho das secas; produto imagético-discursivo de toda uma série de imagens e textos, produzidos a respeito deste fenômeno, desde que a grande seca de 1877. Veio colocá-la como o problema mais importante desta área.

A seca de 1877/79, a primeira a ter grande repercussão nacional pela imprensa e a atingir setores médios dos proprietários de terra, trouxe um volume considerável de recursos para as “últimas do flagelo” e fez com que as bancadas “nortistas” no Parlamento descobrissem a poderosa arma que tinha nas mãos, para reclamar tratamento igual ao dado ao “Sul”. A seca tornou-se a partir daí o problema de todas as províncias e, depois, dos Estados do Norte.

Para o estudioso Durval, que possui pós-doutorado pela Universidade de Barcelona, a produção sociológica de Gilberto Freyre, bem como a dos chamados “romancistas de trinta”, têm no trabalho com a memória a principal matéria. Eles vão tentar construir o Nordeste pela rememoração de suas infâncias, em que predominavam formas de relações sociais agora ameaçadas. Eles resgatam a própria narrativa como manifestação cultural tradicional e popular, ameaçada pelo mundo moderno, e a tomam como expressão regional. Enquanto em São Paulos os modernistas procuravam romper com a narrativa tradicional, assumindo a própria crise do romance no mundo moderno, no Nordeste o movimento regionalista e tradicionalista volta-se para resgatar as narrativas populares, a memória como único lugar de vida para este homem moderno dilacerado entre máquinas, a narrativa como o lugar de reencontro do homem consigo mesmo, de um espaço com sua identidade ameaçada.

Em seus estudos ele mostra que até nas músicas de Luiz Gonzaga, no trabalho teatral e literário de Ariano Suassuna o Nordeste parece estar sempre no passado, na memória. Para ele, “este Nordeste é uma máquina imagético-discursiva que combate a autonomia,m a inventividade e apóia a rotina e a submissão, mesmo que esta rotina não seja o objetivo explícito, consciente de seus autores, ela é uma maquinaria discursiva que tenta evitar que os homens se apropriem de sua história, que a façam, mas sim que vivam uma história pronta, já feita pelos outros, pelos antigos; que se ache ´natural´ viver da mesma forma as mesmas injustiças, misérias e discriminações. Se o passado é melhor que o presente e ele é a melhor promessa do futuro, caberia a todos se baterem pela voltados antigos territórios esfacelados pela história”.

Para Gilberto Freyre, o ponto de vista regional devia nortear os estudos de sociologia e história, porque a noção de região é aproximada à do meio ou local, habitat, um espaço da natureza sem o qual era impossível pensar a sociedade. A região é vista como a unidade última do espaço. Um espaço genético fundante de qualquer atividade humana. Freyre é também um dos fundadores do discurso que tenta modificar a negatividade das condições ecológicas do Brasil e, principalmente, do Nordeste. Sua visão é oposta à de Paulo Prado, por exemplo, para quem o meio era responsável pela tendência de o brasileiro ser teimoso, taciturno, triste, desconfiado, anulado. Para Prado, a tropicalidade nos condenava ao fracasso como nação, para Freyre ela nos singularizava como civilização, nos dava identidade, nos dava caráter próprio.

19 março 2009

A invenção do Nordeste (1)

Vivemos um momento de desidentificação com a memória nacional e regional. O livro de Durval Muniz de Albuquerque Júnior, “A Invenção do Nordeste e outras artes” (Cortez Editora, 2006) é uma boa prova disso. O trabalho de pesquisa para a realização do doutorado em História na Unicamp, defendido em 1994 apresenta o surgimento de um recorte espacial, de um lugar imaginário e real no mapa do Brasil, que todos nós conhecemos profundamente, não importa de que maneira, mas que nunca pudemos imaginar com uma existência tão recente. E falar do Nordeste é inventariar os muitos estereótipos e mitos que emergiram com o próprio espaço físico reconhecido no mapa composto por alguns estados e cidades. É mobilizar todo o universo de imagens negativas e positivas, socialmente reconhecidas e consagradas, que criaram a própria idéia de Nordeste.


Um trabalho de pesquisa aprofundado que desconstrói foucaltianamente os discursos que deram visibilidade e que tornaram dizível a região nordestina. O que o livro interroga não é apenas por que o Nordeste e o nordestino são discriminados, marginalizados e estereotipados pela produção cultural do país e pelos habitantes de outras áreas, mas ele investiga por que há quase 90 anos dizemos que somos discriminados com tanta seriedade e indignação. Como, por meio de nossas práticas discursivas, reproduzimos um dispositivo de poder que nos reserva o lugar de pedintes lamurientos.


“Nós, os nordestinos, costumamos nos colocar como os constantemente derrotados, como o outro lado do poder do Sul, que nos oprime, discrimina e explora. Ora, não existe esta exterioridade às relações de poder que circulam no país, porque nós também estamos no poder, por isso devemos suspeitar que somos agentes de nossa própria discriminação, opressão ou exploração. Elas não são impostas de fora, elas passam por nós.


Longe de sermos seu outro lado, ponto de barragem, somos ponto de apoio, de flexão. A resistência que podemos exercer é dentro desta própria rede de poder, não fora dela, com seu desabamento completo”, escreveu no prefácio.
“O Nordeste é tomado, neste texto, como invenção, pela repetição regular de determinados enunciados, que são tidos como definidores de caráter da região e de seu povo, que falam de sua verdade mais interior”. As fontes utilizadas foram desde o discurso acadêmicos, passando pela publicação em jornais de artigos ligados ao campo cultural, à produção literária e poética de romanistas e poetas nordestinos ou não, até músicas, filmes, peças teatrais, que tomaram o Nordeste por tema e o constituíram como objeto de conhecimento e de arte.



Divididos em três capítulos, o primeiro, Geografia em Ruínas acompanha as transformações históricas que possibilitaram a emergência da idéia de Nordeste, desde a emergência do dispositivo das nacionalidades, passando por uma mudança na sensibilidade social em relação ao espaço, à mudança da relação entre olhar e espaço trazido pela modernidade e pela sociabilidade burguesa, urbana e de massas.



O segundo capítulo, Espaços da Saudade, aborda esta invenção regional, o surgimento do Nordeste como um novo recorte espacial no país, rompendo com a antiga dualidade Norte/Sul. A seca, o cangaço. O messianismo, as lutas de parentela pelo controle dos Estados, são temas que fundarão a própria idéia de Nordeste, uma área de poder que começa a ser demarcada, com fronteiras que servirão de trincheiras para a defesa dos privilégios ameaçados.



No terceiro capítulo, Territórios da Revolta, é abordado uma série de reelaboração da idéia de Nordeste, feitas por autores e artistas ligados ao discurso de esquerda. Nordeste gestado, a partir dos anos 30, por meio de uma operação de inversão das imagens e enunciados consagrados pela leitura conservadora e tradicionalista que dera origem à região. Obras como as de Jorge Amado, Graciliano Ramos, Portinari, João Cabral de Melo Neto produzem Nordestes vistos pelo avesso, Nordeste como região da miséria e da injustiça social. Estes Nordestes, construídos pelo avesso, ficam presos, no entanto, aos mesmos temas, imagens e enunciados consagrados e cristalizados pelos discursos tradicionalistas.





18 março 2009

Os oceanos em questão

Os oceanos tem papel importante na história da Terra. Foi dentro dele que a vida começou. Serviram de principal via para expansão dos horizontes da humanidade com o advento das grandes navegações. Os oceanos são o envoltório líquido que encobre o planeta Terra em 71% da sua superfície. E todos os organismos vivos são constituídos na maior proporção em peso de água.


Por recobrirem a maior parte da superfície terrestre, absorvem, redistribuem para a atmosfera ou refletem de volta para o espaço a maior parte da radiação solar, energia recebida do Sol pela Terra. Dessa forma, são também os principais responsáveis, com a atmosfera, que é nosso envoltório gasoso, pelo controle do clima.

Mares e oceanos foram utilizados pelo homem desde o início da nossa civilização primeiro como fonte de alimentos pela pesca artesanal ou coleta de moluscos e algas, depois como fonte de matérias-primas como sal, bromo, magnésio, calcário e, principalmente, como meio de transporte. Hoje o oceano é uma grande fonte de matérias para a indústria der alimentos e farmacêutico.

Fonte da vida e da morte, cenário da história, o mar sempre foi objeto de guerras e disputas. A história das grandes armadas, quase sempre às voltas com grandes batalhas, é mais ou menos conhecida, envolvendo Portugal, Espanha, Inglaterra, França e Holanda. O mar ainda tem se oferecido à contemplação e à inspiração artística, o que resultou na produção de valiosos monumentos históricos. Dois bons exemplos para ilustrar: Camões imortalizou os feitos singulares dos lusíadas. Suangue no mar de Camões, sal de lágrimas no mar de Fernando Pessoa.


VIDA - Oceanos são grandes extensões de água salgada que ocupam as depressões da superfície terrestre. Eles são importantes para o planeta, neles se originou a vida. Os oceanos são os grandes produtores de oxigênio (as microalgas oceânicas), regulam a temperatura da Terra, interferem na dinâmica atmosférica, caracterizam tipos climáticos. Além disso, a maior parte da população mundial mora junto ao litoral.

São cinco oceanos: Antártico, Atlântico, Pacífico, Ártico e Índico. O oceano Atlântico é considerado o mais importante por ser usado para a navegação e comércio de produtos entre a Europa e a América, principalmente a do Norte. O Pacífico é o maior dos oceanos, com 175 milhões de quilômetros quadrados.

Grande conhecedor das coisas do mar, Jacques Cousteau preocupou-se com a sua transformação em esgoto universal. Navios, petroleiros e plataformas a partir das quais se perfuram poços de petróleo inundam os mares e oceanos com seus detritos. Baleeiros e caçadores exterminam exterminam aos poucos várias espécies de fauna marinha. As indústrias lançam ao mar resíduos contendo chumbo, mercúrio, cádmio e outros elementos nocivos à fauna e flora marinhas – e, também, aos banhistas. Inventos (pulmão aquático ou aqualung), cientista, oceanógrafo, cineasta (O Mundo em Silêncio, O Mundo sem Sol), Cousteau dedicou mais der 40 anos à pesquisa submarina.

ESGOTADOS - Ninguém ignora que os recursos minerais existentes na superfície da Terra estão quase esgotados. Os governos tenderam a ver o mar como a solução para a carência futura, tentando assenhorear-se das riquezas nele contidas: na massa líquida, no assoalho dos oceanos (manganês) e em seu substrato sólido (petróleo, gás, etc).
Um número crescente de países estende o limite de seu mar territorial até 200 milhas da costa. Outras nações, interessadas em continuar explorando as riquezas contidas nesta faixa, não reconhecem esses limites. O debate em torno do mar territorial de 200 milhas tem feito com que não se levem em conta os recursos contidos no “mar de ninguém” e as discussões travadas a seu propósito.

O esgotamento das reservas terrestres de petróleo, gás e outros minérios, junto com o crescente temor de que as atividades agrícolas não bastam para as futuras necessidades de alimento, tem levado cada governo a tomar medidas para a proteção de seu litoral. A questão é saber quanto podemos subtrair do mar sem prejuízo de estoques existentes.

Há milhares de anos a Chapada Diamantina era uma praia e parte da região ficava no fundo do mar. O mais interessante é que os diamantes surgiram da ação da água sobre as rochas. Hoje os solos são arenosos e pouco profundos, e há uma grande quantidade de nascentes de diversos rios, o que ajuda na formação de cachoeiras e quedas d´água.

Desde a Antiguidade o peixe constitui o principal recurso natural extraído dos oceanos. Mas os peixes se distribuem de uma forma desigual por eles. Nas áreas em que os nutrientes das plantas são abundantes e é possível a fotossíntese, os mares chegam a produzir, num ano, até 60 quilos de peixes por 100 metros quadrados. Já em outras regiões, os nutrientes de que as plantas necessitam localizam-se abaixo da zona em que existe luz na quantidade requerida para a fotossíntese. Aí, as possibilidades de vida marinha são quase nulas.

17 março 2009

Sertão excludente

Sertão é uma região geográfica caracterizada pela presença de clima semi-árido, vegetação de caatinga, irregularidade de chuvas, solos secos e rios intermitentes ou temporários. O sertão nordestino compreende as áreas mais secas e distantes do litoral leste do Brasil, situadas nos estados do Piauí, Ceará, Rio Grande do norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia. Apenas no Ceará e no Rio Grande do Norte o sertão chega até o litoral. O chamado Polígono das Secas totaliza 936.933km2. Na linguagem popular, costuma-se chamar de sertão bravo as áreas mais secas da caatinga, e altos sertões as faixas de montanhas e colinas.

A relação entre o sertão e a civilização é sempre encarada como excludente. É um espaço visto como repositório de uma cultura folclórica, tradicional, base para o estabelecimento da cultura nacional. Para Euclides da Cunha e Monteiro lobato, a civilização devia, no entanto, ser levada ao sertão, resgatando essa cultura e essas populações que aí vivem

“Os Sertões” de Euclides da Cunha, publicado em 1906, é tido pelos críticos como o início da procura pelo verdadeiro país, pelo seu povo, tendo posto por terra a ilusão de nos proclamarmos uma nação européia e mostrando a importância de sermos americanos. Com ele, teríamos iniciado a busca da nossa origem, do nosso passado, da nossa gente, da nossa terra, dos nossos costumes e tradições. Teríamos ficado conhecendo, com ele, a influência do ambiente sobre o nosso caráter e a nossa raça em formação.

O sertão aparece como o lugar onde a nacionalidade se esconde, livre das influências estrangeiras. O sertão é muito mais que um recorte territorial preciso; é uma imagem-força que procura conjugar elementos geográficos, linguísticos, culturais, modos de vida, bem como fatos históricos de interiorização como as bandeiras, as entradas, a mineração, a garimpagem, o cangaço, o latifúndio, o messianismo, as pequenas cidades, as secas, os êxodos etc. O sertão surge como a colagem dessas imagens, sempre vistas como exóticas, distantes da civilização litorânea. É uma idéia que remete ao interior, à alma, à essência do país, onde estariam escondidas suas raízes.

Para Monteiro Lobato (Urupês é um bom exemplo), o verdadeiro Brasil, o que queria mostrar, era o Brasil do interior, não era o Brasil artificial, macaqueado do estrangeiro. Era o Brasil do campo, não o das grandes cidades. “O Brasil não era um São Paulo, enxerto do garfo italiano,. Nem o Rio artificial português. O Brasil está no interior, onde o sertanejo vestido de couro vasqueja nas coxilhas onde se domam potros. Está nas caatingas estorricadas pela seca...”

Enquanto muitos escritores continuavam preso à imagem tradicional de que o homem sábio se encontre na cidade ou no litoral, é só com Guimarães Rosa que o sertão vai irromper como discurso sábio na ficção brasileira. Rosa explora o sertão de maneira poética, comparando a paisagem seca e quase desértica aos sentimentos e às relações humanas. “O sertão é o sonho, o sertão é dentro da gente”, disse ele. Guimarães Rosa faz um verdadeiro tratado em sua obra Grande Serão: Veredas, mostrando a diversidade do sertão que vai de Minas Gerais a Bahia, passando pelo Centro-Oeste do país. João Cabral de Melo Neto, como Guimarães Rosa, pode ser visto como quem iniciou o processo de “desregionalização da região”, ou seja, fazendo emergir o caráter de construção discursiva, de invenção pela linguagem, do regional; fazendo emergir a percepção da região como formada por diversas camadas de imagens e enuciados, como fruto de visões e leituras diferenciadas, denunciando a textualidade que a construiu anteriormente.
OCUPAÇÃO - A colonização foi, antes de tudo, a aventura da conquista e ocupação do sertão. Para os colonizadores portugueses, as terras americanas significavam um imenso vazio a ser preenchido com seus interesses, concepções e valores. Eles conquistaram o sertão: formando cidades e vilas, plantando canaviais, extraindo metais preciosos ou criando gado. Impunham a autoridade do rei, difundiam a fé cristã e transformavam índios e negros africanos em escravos. Buscavam construir o Novo Mundo à semelhança do Velho Mundo, de onde vieram.

Durante todo o século 16 o domínio português restringiu-se a uma estreita faixa litorânea e pouco se interessou pela conquista do interior, pelo sertão seco. Afinal, não tinha notícias de nenhuma riquezas da região que tivesse valor para o comércio colonial. Foi somente em meados do século 17, especialmente durante o período da ocupação holandesa, que teve início de forma mais enfática a ocupação do sertão nordestino por meio da pecuária.
As sucessivas secas enfraqueceram o processo de ocupação do sertão. Os anos de bons invernos acabaram permitindo um renascimento agropastoril, o renascimento das cidades, o aumento do comércio e certa prosperidade econômica. Diversas vezes, nos períodos mais intensos de uma seca, comunidades indígenas foram obrigadas a se vender para os conquistadores em troca simplesmente de comida.

Os projetos de irrigação, a reforma agrária, os projetos de colonização, o apoio aos pequenos e médios produtores rurais, a diversificação de culturas e a lavoura seca não passaram de tentações malogradas de superação do atraso e da miséria do sertão seco. Sem esperança de mudar a história das suas cidades, os nordestinos buscaram em outras paragens a solução para a sobrevivência das suas famílias. Foi nos sertões que permaneceu inalterado o poder pessoal dos coronéis, petrificado durante o populismo e pela migração de milhões de nordestinos para o Sul.


No regime republicano a elite política nordestina aceitou uma posição subserviente diante do poder central. A redemocratização de 1945, mantendo no poder grupos políticos surgidos em 1930, não alterou a posição do Nordeste em relação ao governo central. Nessa republica populista o coronelismo viveu a sua época dourada, associando domínio politico com a utilização de vastos recursos públicos para fins privados. Foi o florescimento da indústria da seca. E até o momento nada se resolveu que a questão essencial para enfrentar e conviver com a seca. O latifúndio improdutivo e o monopólio da água pelos poderosos da região impediram qualquer transformação sócio-econômica.



16 março 2009

Desertos de água

Os ecossistemas estão em alerta, em ruínas. O ser humano pescou demais, produziu lixo, gases do efeito estufa e esgoto demais. Com isso o oceano perde vida. Em todo o mar, 60 a 80% do lixo é plástico que não é biodegradável. Ou seja, a ação da natureza sobre ele não o quebra em elementos simples – como o papel, que se reduz a água e CO2, quando decomposto. O plástico só é quebrado pela luz do Sol, lentamente, algo como 450 anos em pedaços cada vez menores.

Do esgoto ao sapato largado no bueiro, 80% da poluição dos mares é produzida no continente. Assim, o oceano é o destino final de todo o nosso lixo. Além disso, os gases de efeito estufa afetam o suprimento de nutrientes na superfície e mata o fitoplâncton. Os mares quentes fazem os corais sofrer, se contaminar e começar a sufocar as algas que vivem em simbiose dentro deles – dando a sua cor e seu alimento. Assim, as algas liberam toxinas para forçar o coral a expulsa-las. Então eles ficam brancos e doentes. A temperatura esquentando mais ainda há outros desequilíbrios ao redor, e os corais morrem.

E os mares, além de mais quentes, estão mais ácidos e pode corroer a concha de ostras, mariscos e mexilhões. Os corais estão para o mar como as florestas tropicais estão para a terra: são campeões de biodiversidade. E eles guardam tesouros em termos de substâncias potencialmente curadoras de doença. O AZT (coquetel contra o vírus da aids) e o Acyclover (que combate o herpes) são derivados decomponentes encontrados em esponjas do mar.

ACIDIFICAÇÃO
Os oceanos têm absorvido uma parcela substancial do dióxido de carbono, um dos gases do efeito estufa. Mas este benefício tem uma armadilha: conforme o gás se dissolve, o mar fica mais ácido. Um painel internacional de cientistas marinhos diz que a acidez está acelerando tão rápido que ameaça a sobrevivência dos recifes de corais, moluscos e da cadeia alimentar em geral.
E com pouca fotossíntese, sem fitoplâncton o mundo está ganhando cada vez mais desertos de água, ou seja, sem vida. No estudo oceanógrafo a “cor” do oceano é assim: preto é o deserto, azul é mais produtivo e verde tem fitoplâncton abundante. E as manchas pretas estão se expandindo velozmente. Cerca de 6,6 milhões de quilômetros quadrados de mar viraram desertos nos últimos 10 anos. E os cientistas calcularam: das populações de grandes peixes que nadavam nos mares em 1900, sobraram só uns 10%.

Cerca de 25% dos atuns-azuis (que tem sangue quente e permite cruzar os mares do Ártico aos trópicos) é capturado pelo Japão. A flotilha japonesa reduziu os estoques do Pacífico a 6% da população original. Em 10 anos de pesca no Mediterrâneo, já o levamos ao risco de extinção. Afinal, mais de 1500 navios pesqueiros high tech são lançados ao mar, sacando dali 3 vezes mais atuns do que o limite para que a espécie se recomponha. Tudo isso com subsídios da União Européia. No Canadá o bacalhau foi reduzido a 1% da população original. O blue skate, uma arraia que é prato típico inglês, sumiu do mar do Norte.
Para se ter uma idéia de toda essa tragédia, basta lembrar que 90% das mercadorias comercializadas entre os países são transportadas por navios. A frota mundial de cargueiros chega a quase 100 mil. A flotilha de cargueiros transporta, além de seus contêineres, algo entre 7 mil e10 mil espécies de criaturas marinhas todos os dias. Algumas viajam grudadas no casco, outras vão nadando nos 10 bilhões de toneladas de água de lastro levadas nos porões dos navios. Muitas dessas espécies se instalam de vez em um ecossistema novo, criando uma confusão terrível na comunidade local. É a globalização dos ecossistemas submersos.
E para acabar de vez com a vida nos oceanos, a Organização Mundial do Turismo informou que 80% do turismo mundial se concentra no litoral sendo praias e recifes de corais nossos principais objeto de desejo. O que fazer para protegê-los?. É preciso pensar depressa antes do fim dos oceanos.
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Dia 26, a partir das 18h30 no Espaço Cultural Unibanco de Cinema (Galeria do Livro) na Praça Castro Alves, estarei lançando meu livro "Bahia, um estado d´alma".

13 março 2009

Poesia, poesia, poesia para melhorar o dia a dia

Mulher e homem

Mulher é pura emoção
homem é voltado à razão
mulher vive sempre a sofrer
homem só quer vencer
mulher sonha em amar
homem só pensa em transar
mulher está à beira dos nervos
homem sobrevive nos guetos
mulher só quer ser feliz
homem vive sempre por um triz
mulher é cheia de formas
homem é apenas reforma
mulher é como círculo
homem é linha reta, testículo
mulher é divina
homem é disciplina
mulher é vida, é cor
homem é estandarte, incolor
mulher é hormonal
homem é social,
mulher é radiante
homem é escaldante,
mulher é furacão
homem é solução
mulher é interrogação
homem é ação
mulher é musical
homem é tradicional
mulher fala
homem cala
mulher sonha
homem se enfronha
mulher quer
homem mulher.

Homem tem desejo constante
mulher tem orgasmo incessante
homem chega ao clímax num instante
mulher passa por orgasmo multiplicante
homem tem instabilidade
mulher tem irritabilidade
homem tem desejo sexual
mulher descarga hormonal
mas o melhor do homem e mulher:
estejam abertos a todas surpresas
e suas múltiplas expressões
a vida assim é como vulcão
explode a qualquer momento de ação
e hoje sensibilidade tanto
no homem como na mulher
a humanidade assim o quer.


Lembranças

Fez-me mar
em meu sonhar.
Fez-se vento
em meu tormento
Fez-se canto
em meu pranto
Fez-se amor
em todo esplendor.


E os pássaros no horizonte distante,
passeiam sobre o mar, vento, canto, amor,
eu não sei se isso é sonho,
pensamento, distração, discernimento,
esforço pra lembrar, vontade de esquecer,
agora é esperar o vento trazer
lembranças vivas de você.


Dias

Tem dias que estou melancólico,
chovendo por dentro, chorando por fora.
Tem dias que estou eufórico,
sentindo arrepios e cheirando amora.
Tem dias que estou um arrebento,
virando pelo avesso e curtindo todos os elementos.
Tem dias que me sinto desconhecido,
sofisticado de um lado e do outro sem sentido.
Tem dias que estou muito mais que sereno,
olhando o por do sol no mar de arrebento.


Mistério

Que mistério tem a vida?
não querer saber, lhe intriga.
Que mistério tem o amor?.
Não querer saber, sinta o ardor.
Que mistério tem a natureza?
não querer saber, com certeza.
Que mistério tem a flor?
sentir seu aroma já é um louvor.
Que mistério tem a luz ?
nada de ciência, se tudo reluz.
Que mistério tem a noite?
nada de dogma, só o açoite.
Que mistério tem o vento?
nada de sofisma, só o pensamento.
Que mistério tem o mar ?
tudo é profundo e eu não vou nadar.
Agora deixa de tantas perguntas
e vamos vivenciar.

12 março 2009

Cordel, manifestação cultural popular

Na época dos povos conquistadores greco-romanos, fenícios, cartagineses, saxões, a literatura de cordel já existia, tendo chegado à Península Ibérica (Portugal e Espanha) por volta do século XVI. Na Península a literatura de cordel recebeu os nomes de folhas soltas (Espanha) e folhas volantes (Portugal). Florescente, principalmente, na área que se estende da Bahia ao Maranhão essa manifestação impressa em papel barato era utilizada para contar as grandes histórias, os grandes romances. O dramaturgo francês Molière divulgou suas peças através dos folhetos. Fausto, obra maior de Goethe, foi publicada inicialmente em um folheto. Ariano Suassuna se inspirou em vários folhetos para fazer O Auto da Compadecida.


O cordel, trazido de Portugal além de entretenimento era instrumento de informação jornalística, numa época em que as notícias não chegavam ao interior, isso há um século atrás, aproximadamente, e ainda cumpriu a função de alfabetizador pelo método natural de ouvir (era lido em voz alta), memorizar, ler e escrever.

De custo baixo, geralmente estes pequenos livros são vendidos pelos próprios autores. Fazem grande sucesso em estados como Pernambuco, Ceará, Alagoas, Paraíba e Bahia. Este sucesso ocorre em função do preço baixo, do tom humorístico de muitos deles e também por retratarem fatos da vida cotidiana da cidade ou da região. Os principais assuntos retratados nos livretos são: festas, política, secas, disputas, brigas, milagres, vida dos cangaceiros, atos de heroísmo, milagres, morte de personalidades etc. Em algumas situações, estes poemas são acompanhados de violas e recitados em praças com a presença do público.

Como uma manifestação cultural popular, o cordel ultrapassa a visão representativa para se tornar produção de linguagem, ultrapassa a noção de obra e autor. Ele produz uma “realidade” nascida da reatualização de uma memória popular que entrelaça acontecimentos das mais variadas temporalidades e espacialidades. Presentificando-as, colocando-as acima do tempo corrosivo da história, uma prática discursiva que inventa e reinventa a tradição e, como tal, interessava a um grupo de intelectuais também preocupados com a estabilidade espaço-temporal.

Construído com histórias que circulariam em toda a área, histórias de cangaceiros, de santos, de coronéis, de milagres, de secas, de cabras valentes e brigões, de crimes, de mulheres perdidas, do sertão mítico, repositório de uma pureza perdida. A estrutura do cordel, com seus recetativos e heptassílabas acentuados na terceira e sétimas sílabas, fornece uma forma de expressão, uma dicção perfeitamente adaptada para se falar do Nordeste, onde todos os discursos lembram lamúrias, cantilenas, incelências, lamentos.

Alguns escritores dividem a presença do cordel no Brasil em duas fases. A primeira fase começa há 100 anos, quando os portugueses o introduzem pelos portões da Paraíba. A segunda fase começou por volta de 1979, momento em que o cordel foi sufocado pela grande imprensa, tempos de ditadura militar no país. Para evitar que o gênero morresse, promoveu-se um congresso internacional, aqui na Bahia. Desta forma, o movimento ganhou força e muitos cordelistas estabeleceram-se por aqui. O papel da Bahia na continuação desse gênero foi tão importante que fica sediada em Salvador, num espaço urbano, a Ordem Brasileira dos Poetas da Literatura de Cordel. E um de seus cordelistas e repentistas mais ilustre é Antônio Ribeiro da Conceição, mais conhecido por seu nome artístico, Bule Bule.

O cineasta Glauber Rocha descobriu que o cantador de cordel era, em grande medida, um ator brechtiano. Na medida em que não apenas interpreta a história, mas é, em grande parte, o seu autor e condutor. Ao incorporar os mitos do cordel, ele elaborou uma espacialidade anti naturalista de grande inventividade imagética. A poesia de João Cabral de Melo Neto busca no cordel, nos autos de natal, formas de expressão mais direta, mais comunicativas. A economia verbal, a musicalidade da palavra, a combinação eufônica ou gráfica das palavras, a necessidade de serem ditas mais do quer ouvidas.

E não foi só a literatura, a poesia, o cinema e o teatro a utilizar toda a estrutura do cordel, as artes plásticas também aproveitou dessa fonte popular através da xilogravura, as histórias em quadrinhos também desenvolveu um segmento especial. E apesar da morte tantas vezes anunciada ao longo dos tempos, a literatura de cordel continua um expressivo meio de comunicação. Enquanto expressão cultural, permanece adaptada, reinventada, no desempenho de suas funções sociais e políticas. Informar. Formar, divertir, criticar, conscientizar, socializar ou poetizar, conforme os diferentes temas que retrata e o enfoque abordado. A literatura de cordel enriquece a já reconhecida pluralidade cultural do nosso Brasil.
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Dia 26 tem lançamento do livro “Bahia, um estado d´alma” no Espaço Uni Banco de Cinema (Galeria do Livro)

11 março 2009

Relicário de Sérgio Mattos


Depois de lançar Amadeu um bandido nordestino, Os funerais de dona Camila, As confissões sexuais de Maria Francisca e Memória da Imprensa Contemporânea da Bahia, Sérgio Mattos reúne seus artigos, reportagens, orelhas, prefácios e resenhas em sua obra atual intitulada Relicário Comunicacional e Literário, editado pela Editora Contexto e Arte. Segundo o professor Edivaldo Boaventura no prefácio do livro, “poesia e comunicação são os pilares básicos do intelectual bem formado e melhor exercitado na imprensa e no departamento universitário. É na condição de escritor que, generosamente, estimula estreantes e veteranos apresentando inúmeros poetas, ensaístas. O importante é que o poeta Sérgio Mattos, pleno de bons sentimentos para com outros bardos, lança-os em prefácios incentivadores”.


Relicário está dividido em quatro partes. A primeira é dedicada aos artigos e reportagens. A começar pelo jovem Dorival Caymmi, seu primeiro encontro na casa de Jorge Amado, cultura importada, o cacique xavante Juruna, misticismo político (comunista macumbeiro), bairro do Rio Vermelho (e sua associação dos moradores e amigos), São Cristóvão, a cura através da arte, a fundadora da Escola de Teatro da UFBa Anna Edler, e o eterno palhaço Chaplin.

HOMENAGEM - Na segunda parte estão as orelhas e os prefácios. Com justa homenagem ao cinquentenário de vida do educador Edivaldo Boaventura, a produção expressiva do movimento cultural Contemp, portais poéticos, focus poético, a poesia de Kleyde Ramos, Franklin Maxado, Derval Evangelista de Magalhães, Ubiratã dos Santos, a última viagem do São Francisco, homens que fizeram história, entre o mito e a realidade, os dez anos da Turma do Xaxado, televisão na era da globalização, análise semiótica da telenovela, aspectos da trajetória da imprensa baiana, entre outros.

Resenhas estão enfileiradas na terceira parte dedicada aos comentários: para ler Tiêta, de Jorge Amado, o percegonho de Guido Guerra, narrativa de bastidores da notícia, revendo a mídia eletrônica, estudos da imprensa nanica, BBC um modelo de tv, e para entender a produção da tv brasileira. A quarta e última parte é dedicada aos perfis. Os escolhidos foram Jorge Calmon (o decano dos jornalistas baianos), Nonato Marques (o poeta da baixinha), e Paulo Gaudenzi (um profissional da cultura e do turismo).

MOSAICO - Assim, o Relicário de Sérgio Mattos é um mosaico de experiências de vida, aprendizado que vai da poesia a semiótica, do teatro ao cinema, da tevê para a imprensa. Tudo sob a ótica aprimorada do articulista que passeia com desenvoltura nos diversos assuntos da contemporaneidade. “Caminhar com Sérgio é desbravar novos espaços e rotas, abertos em ritmos variados desde os parágrafos e entrelinhas, pinçando aqui e ali gotas de sentimento daquele que considero a maior incógnita do universo – o multifacetado ser humano, com seus conflitos, verdades, angústias e dúvidas, desafio permanente para quem tem coragem de tentar decifrá-lo. Sérgio tem. É ler para crer!”, escreveu o jornalista José Jorge Randam na orelha do livro.

Mattos dedica-se à pesquisa e ao ensino mas não abdicou de atuar no mercado e sempre se manteve no exercício o jornalismo diário, em inúmeras funções editoriais nos jornais baianos. Foi o primeiro professor a orientar tese de doutoramento no Programa de Pós-Graduação em Comunicação Contemporânea. Tem tratado de temas como tevê, imprensa, rádio, internet em publicações e simpósios. Recebeu o Prêmio de Comunicação Luis Beltrão, na categoria de maturidade acadêmica. Poeta com oito livros publicados e compositor com dezenas de composições gravadas por diversos intérpretes.

Criou a revista Neon, de arte cultura e entretenimento que circulou de 199 a 2004, foi presidente fundador da Academia de Letras e Artes de Salvador, diretor do Instituto de Radiodifusão Educativa do Estado da Bahia e desde 2008 ingressou na Universidade Federal do Recôncavo como professor concursado. Assim é Sérgio Mattos, o “vigia do tempo” sempre atento ao que passa pela vida, revigorando o sentido do novo, em busca do “princípio invisível do existir”.
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Dia 26 tem lançamento do livro “Bahia, um estado d´alma” no Espaço Uni Banco de Cinema (Galeria do Livro)