21 agosto 2015

Duarts destila protesto e consciência musical



Eles têm uma grande paixão pela música. São jovens cheios de sonhos. Inspirado pelos recentes
movimentos sociais ao redor do globo, o grupo musical Duarts destila sua rebeldia em canções contestadoras e reflexivas. A banda, com quatro amigos paulistanos, foi formado em 2012 e lançaram um álbum, “Apresenta” com oito músicas demonstrando o lado contestador e enérgico da nova geração.

Duarts tem um estilo rock com tendências punk, sendo as principais influências as bandas Charlie Brown Jr, Titãs, The Offspring, NOFX e Red Hot Chili Peppers Sublime, entre outros. Mas a pegada é própria. Basta ouvir seu último trabalho, “Protesto não é crime” com quatro faixas.

Nervoso, agitado, guitarra em punho, cortante. Bateria pulsante. Assim é “Alumnus”, um rock protesto sobre a real humanidade. “Não minimize a nossa depressão”, grita o cantor. “O Mundo não Vai” fala do caos no mundo que não passa na Globo e é tempo de revolução, o povo tem que lutar nessa crise global, contestam. “Condenado” é balançado, onde a guitarra é o guia musical. A quarta e última faixa, “Guerra Civil” mostra o rosto da maldade, a luta entre nós mesmos.

 
Temas como alienação, reacionarismo, globalização levam aos ouvintes uma reflexão, acompanhada por uma melodia marcante. Abra bem os ouvidos e a mente, solte o corpo e curta essa banda que tem muito a dizer.

Membros da banda: Arthur Mota (baterista), Pedro Rodante (guitarra), Mateus Paes  (baixista) e Ulisses Lopresti (cantor)

Confira:
 


...................................................................................
Férias: oba!
Caros leitores: a partir de segunda feira (dia 24) estarei de férias. Serão 15 dias e vou aproveitar para ler uns livros reservados para ocasião (incluindo aí quadrinhos de alta voltagem), ouvir algumas músicas necessárias para o coração, colocar a mão na terra para saber da estação, mimar meus cachorros e plantar o que a natureza espera de cada um de nós. 

Vou dar uma chegadinha em Sampa para visitar o Museu da Língua e as livrarias especializadas em quadrinhos. Dia 08 de setembro estarei de volta. Voltarei com mais energia.   Obrigado pela atenção.




.....................................................................
O "Breviário da Bahia" 
está sendo  vendido 


com exclusividade 
no Pérola Negra, 
em frente a 
Biblioteca Central dos Barris.  
Tel: 3336-6997. 
Rua General Labatut, 137, 
Shopping Colonial (loja 01), 
Barris

20 agosto 2015

Decifrando a transa (1972) de Caetano Veloso




Gravado integralmente em Londres, Transa (1972) é o terceiro disco solo de Caetano Veloso e um dos melhores do artista. Ele reuniu os amigos Jards Macalé, Tutti Moreno, Moacyr Albuquerque e Áureo de Souza para o trabalho de gravação, uma mistura de línguas, ritmos e sonoridades inspiradas nas sete faixas. Transa, transe e trânsito estão relacionados com o experimentalismo e as tranças litero-musicais do poeta Gregório de Matos (Triste Bahia), do compositor popular Monsueto (Mora na Filosofia), na homenagem aos Beatles (You Don´t Know Me – Você Não Me Conhece), João Gilberto (em um trecho de Saudosismo), Luiz Gonzaga, Dorival Caymmi, Zé do Norte (“os óio da cobra verde”), Edu Lobo (“laia, ladaia, sabatana Ave-Maria”), entre outras preciosidades em seu processo de criação.

Se o LP anterior tinha tons sombrios da cinzenta paisagem londrina (Caetano Veloso, 1971), onde a capa traz um close do rosto do artista com fisionomia fechada e um espesso agasalho de pele e a vasta cabeleira em um exílio forçado, o disco de 1972 é o retorno, onde o Caetano múltiplo pede para ser decifrado. Você não me conhece, ele assume na primeira faixa.

A sensual "You don´t know me" abre o disco com um excelente arranjo acústico e um Caetano sutil e interpretativo. A música incidental cantada por Gal Costa (Saudosismo) foi gravada originalmente por Caetano no compacto duplo com os Mutantes. “Por que não me mostra (o que está) atrás do muro?”, ele pede cantando.

You don’t know me/Bet you’ll never get to know me/You don’t know me at all/Feel so lonely/The world is spinning round slowly/There’s nothing you can show me/From behind the wall//"Nasci lá na Bahia/De mucama com feitor/O meu pai dormia em cama/Minha mãe no pisador"//"Laia ladaia sabadana Ave Maria/Laia ladaia sabadana Ave Maria"//"Eu agradeço ao povo brasileiro/Norte, Centro, Sul inteiro/Onde reinou o baião.

Em seguida, o bilingüismo de "Nine out of ten" (Nove em Cada Dez) é acompanhado por uma levada meio samba, meio nordestina com uma sonoridade repleta de ecos, lembrando um show ao vivo. “A minha melhor música em inglês. É histórica. É a primeira vez que uma música brasileira toca alguns compassos de reggae, uma vinheta no começo e no fim. Muito antes de John Lennon, de Mick Jagger e até de Paul MacCartney. Eu e o Péricles Cavalcanti descobrimos o reggae em Portobelo Road e me encantou logo. Bob Marley e The Wailers foram a melhor coisa dos anos 70”, revelava Caetano na época. A música reflete a expansão do eu, o encontro do poeta com o prazer de viver, livre (“I´m alive”)

Walk down Portobello road to the sound of reggae/I’m alive/The age of gold, yes the age of/The age of
old/The age of gold/The age of music is past/I hear them talk as I walk yes I hear them talk/I hear they say/Expect the final blast/Walk down Portobello road to the sound of reggae/I’m alive//I’m alive and vivo muito vivo, vivo, vivo/Feel the sound of music banging in my belly/Know that one day I must die/I’m alive//I’m alive and vivo muito vivo, vivo, vivo/In the Eletric Cinema or on the telly, telly, telly/Nine out of ten movie stars make me cry/I’m alive/And nine out of ten film stars make me cry/I’m alive

E o baiano explora composições antigas como a bela "Mora na filosofia" (de Monsueto Menezes e Arnaldo Passos) carregado de tristeza e terminando como uma catarse, ou mesmo a impactante "Triste Bahia" onde mistura Gregório de Mattos com o samba de roda e jingadas de capoeira.. Há uma sonoridade crescente dos instrumentos afro-brasileiros, a começar pelo som do berimbau.

Triste Bahia, oh, quão dessemelhante…/Estás e estou do nosso antigo estado/Pobre te vejo a ti, tu a mim empenhado/Rico te vejo eu, já tu a mim abundante/Triste Bahia, oh, quão dessemelhante/A ti tocou-te a máquina mercante/Quem tua larga barra tem entrado/A mim vem me trocando e tem trocado/Tanto negócio e tanto negociante//Triste, oh, quão dessemelhante, triste/Pastinha já foi à África/Pastinha já foi à África/Pra mostrar capoeira do Brasil/Eu já vivo tão cansado/De viver aqui na Terra//Minha mãe, eu vou pra lua/Eu mais a minha mulher/Vamos fazer um ranchinho/Tudo feito de sapê, minha mãe eu vou pra lua/E seja o que Deus quiser//Triste, oh, quão dessemelhante/ê, ô, galo canta/O galo cantou, camará/ê, cocorocô, ê cocorocô, camará/ê, vamo-nos embora, ê vamo-nos embora camará/ê, pelo mundo afora, ê pelo mundo afora camará/ê, triste Bahia, ê, triste Bahia, camará/Bandeira branca enfiada em pau forte…//Afoxé leî, leî, leô…/Bandeira branca, bandeira branca enfiada em pau forte…/O vapor da cachoeira não navega mais no mar…/Triste Recôncavo, oh, quão dessemelhante/Maria pegue o mato é hora…/Arriba a saia e vamo-nos embora…/Pé dentro, pé fora, quem tiver pé pequeno vai embora…//Oh, virgem mãe puríssima…/Bandeira branca enfiada em pau forte…/Trago no peito a estrela do norte/Bandeira branca enfiada em pau forte…/Bandeira…


Segue a canção “It's a Long Way” que faz referências explícitas aos Beatles. Começa lenta, termina como começou, mas da metade até quase o fim vai crescendo e agregando aos versos da canção alguns outros versos de músicas antigas. Lembrando os Beatles naquela canção “The Long And Winding Road” (no LP Let it Be) ele canta “It´s a Long Way” (É Um Longo Caminho) com um registro de voz que passa por vários estágios, de alegria e tristeza, onipotência e fragilidade. (Acordei esta manhã cantando uma uma velha canção dos Beatles). Há sutilezas na pronuncia da palavra “long” onde se pode entender “lone” (só) e “London”, lugar do exílio. E a composição agrupa baião, rock, bossa nova numa versatilidade apaixonante. A música é toda baiana, no ritmo cadenciado, bom de se ouvir na rede. Haja balanço.

Woke up this morning/Singing an old, old Beatles song/We’re not that strong, my lord/You know we ain’t that strong/I hear my voice among others/In the break of day/Hey, brothers/Say, brothers/It’s a long, long, long, long… way//Os óio da cobra verde/Hoje foi que arreparei/Se arreparasse há mais tempo/Não amava quem amei//It’s a long, long, long, long… way//Arrenego de quem diz/Que o nosso amor se acabou/Ele agora está mais firme/Do que quando começou//It’s a long road, it’s a long, long, long, long…/It’s a long road, it’s a long and widing road…/Long and widing… road/It’s a long road, it’s a long, long, long, long…//A água com areia brinca na beira do mar/A água passa e a areia fica no lugar//It’s a hard… hard, long way//E se não tivesse o amor/E se não tivesse essa dor/E se não tivesse sofrer/E se não tivesse chorar/E se não tivesse o amor//No Abaeté tem uma lagoa escura/Arrodeada de areia branca…/Woke up this morning…

Há levadas experimentais como "Neolithic Man" que não perde o ar brasileiro e a poética atemporal em torno do olhar (“você não me verá/você não verá”), do conflito entre o ver e o não-ver.

I’m the silence that’s suddenly heard/After the passing of a car/I’m the silence that’s suddenly heard/After the passing of a car/I’m the silence that’s suddenly heard/After the passing of a car/Spaces grow wide about me/Spaces grow wide about me/If you look from your window at the morning star/You won’t see me…/You’ll only see…/That you can’t see very far/God spoke to me/You’re my son/And my eyes swept the horizon/Away/Que tem vovó pelanca só/Que tem vovó pelanca/You won’t see me…/Spaces grow wide about me

O disco se encerra com “Nostalgia (That's What Rock'n'Roll is All About)”, homenagem ao rock-blues curto, de duas estrofes rápidas, com o detalhe de Gal Costa imitar gaita na primeira e, na segunda, a gaita "real" ser tocada por Angela Ro Ro. E na composição ele revela valores contrário à ideologia burguesa como o acordar tarde, roupas extravagantes, movimento hippie e o comportamento marginal.

You sing about waking up in the morning/But you’re never up before noon/You look completely different from those straights/Who walked around on the moon/The clothes you wear/Would suit and old times baloons/You’re allways nowhere/But you’ll realize pretty soon/That’s all that you care/Isn’t worth a twelve bar tune//You won’t believe you’re just one more flower/Among so many flowers that sprout/You just feel faintly pround when you hear they shout/Very loud: "you’re not allowed in here, get out"/That’s what rock’n’roll is all about/That’s what rock’n’roll is all about/I mean, that’s what rock’n’roll was all about.

O que se observa nesse trabalho é a mistura de nosso ritmo com a sonoridade estrangeira, numa fusão de qualidade e profundidade pouco realizada antes dele. Em seu processo criativo ele utilizou da estética da inclusão, o uso da repetição (para o fluir do som) e transformar essa expressão artística (a música) como uma linguagem que permite transportar o ser ao infinito. Há nesse disco um trabalho afinado e identificado com experiências renovadoras do som. Para ouvir e re-ouvir sempre.


Caetano Veloso - Transa - Full album
https://www.youtube.com/watch?v=EPIRpI0GtDc
 



.......................................................................
O "Breviário da Bahia" 
está sendo  vendido 

com exclusividade 
no Pérola Negra, 
em frente a 
Biblioteca Central dos Barris.  
Tel: 3336-6997. 
Rua General Labatut, 137, 
Shopping Colonial (loja 01), 
Barris

19 agosto 2015

Árvore do Conhecimento (3)



"Quando os humanos ainda viviam no Paraíso, havia no meio do Jardim uma árvore mística cuja vida era
misteriosamente ligada aos seus feitos e gestos. Cada nascimento de um pequenino homem acrescentava uma radícula à árvore e cada morte fazia desaparecer uma fibrila de suas raízes. Quando uma arte era inventada e se difundia entre as tribos, crescia um galho novo e a insígnia dessa arte refletia sobre as folhas do jovem galho. Quando um clã nômade se estabelecia em uma terra desconhecida, os costumes que derivavam do clima e os recursos do lugar faziam abrir na árvore novas flores, e esses buquês tinham o perfume do novo lugar. Todas as vezes que uma criança aprendia algo novo ou adquiria uma nova habilidade, a árvore adquiria novo vigor e as folhas, que traziam o emblema de tais conhecimentos e habilidades, tornavam-se mais brilhantes, mais verdes.

Mas quando um saber se perdia, quando uma história ou uma habilidade caía no esquecimento, se algum velho morria sem ter transmitido sua experiência, então a árvore diminuía, as folhas caíam, os frutos secavam antes de terem atingido sua madureza e ninguém podia experimentá-los.

A árvore crescia com a humanidade. Estação após estação, trazia sinais mais numerosos e variados: indícios de talhadores de ossos e de sílex, símbolos de artesanatos e curtimento de peles, marchados emblemáticos dos caçadores, dardos dos guerreiros.

Os xamãs curandeiros, os que sabiam dos hábitos das bestas, os que falavam com os Deuses, os intérpretes entre os clãs, os bardos e os gravadores de figuras nas pedras, todos fazendo nascer na árvore novos sinais desde que encontrassem outras maneiras de fazer, de dizer ou de contar. E as mães, cada vez que falavam com os recém-nascidos, faziam subir na árvore uma seiva de primavera.

Assim, todos os humanos vivos formavam as raízes da árvore mística e todos dela eram jardineiros. O húmus no qual crescia não pesava um peso de argila ou de poeira, pois era o solo impalpável da transmissão, de geração em geração, de um clã a outro, de boca a ouvido, pela observação e a imitação. A água benfazeja não caia das nuvens, mas da fonte das invenções, dos numerosos regatos das adaptações e dos empréstimos.

E foi assim que a árvore mística, crescendo no mais das vezes e relaxando algumas, amarelecendo e verdejando, agitando seus milhares de sinais e de emblemas, oscilando e farfalhando ao vento da pré-história, acompanhou a aventura dos primeiros homens.

Mas chegou uma estação (nesta época, as geleiras estavam bem ao norte) em que a brisa da noite trazia mensagens inéditas, incompreensíveis. Algo havia imperceptivelmente mudado no ar do Jardim. Uma fenda crescia entre o espaço e o tempo. Os Deuses mudaram de feição. Não era mais o Paraíso.

Inúmeros homens já moravam em cidades fortificadas. Muitos trabalhavam com dificuldades nas terras usurpadas pelos conquistadores ou pelos senhores. Uma casta estabeleceu-se acima dos outros homens. Com uma grande quantidade de escravos, ela dirigia as escavações de longos canais de irrigação, a ereção de diques contra a cólera e o transborde dos rios. Os administradores faziam subir muralhas, templos, pirâmides e torres para parar o tempo, eternizar a glória dos reis e contemplar mais de perto as estrelas.

Na sombra dos palácios, os escribas gravavam em suas estantes o crescimento das tropas, o registro dos escravos e a contagem dos, grãos nos silos. Possuídos pelo jogo de um incessante cálculo, os escribas quiseram também contar o saber: desenharam, então, uma árvore do conhecimento do seu campo e se embriagaram, com este novo poder.

E assim perdeu-se a memória de que cada humano em pé sob o sol formava uma raiz da árvore mística e que o conhecimento era humilde, vasto, diverso e mutante como a vida.

Foram declarados ignorantes os que não haviam aprendido os poemas antigos, as línguas moribundas, e os sinais que se ensinavam nas casas dos escribas. Uma nova casta proclamava-se a única sábia, regozijava-se de sua sabedoria e queria que sua ciência se colocasse acima das outras.

Mas os homens desse tempo guardavam confusamente a lembrança do Paraíso. E tempos depois puderam voltar a desenhar, com sua própria existência, a grande árvore coletiva, vidas e conhecimentos misturados. Espelhos longínquos davam a ver, em todos os lugares, os crescimentos e as metamorfoses da árvore com seus milhares de sinais coloridos, para não mais esquecer que a vida não está separada do saber.” (Pierre Levy)

Esse conto do filósofo e sociólogo francês Pierre Lévy nos faz refletir sobre a riqueza e a beleza do nosso processo de aprendizagem, processo que acontece desde que nascemos até o fim de nossas vidas, em todos os espaços que vivemos e convivemos. E que alimenta, enriquece e fortalece a árvore da vida, que sustenta a humanidade.

Fontes pesquisadas:

http://chaosobral.org/literatura/arvore.htm

http://planetasustentavel.abril.com.br/noticia/estante/estante_263112.shtml

http://planetasustentavel.abril.com.br/noticia/atitude/conteudo_259923.shtml?func=1&pag=4&fnt=9pt

http://www.egov.ufsc.br/portal/conteudo/surpresas-do-olho-%C3%A1rvore-do-conhecimento-maturana-e-varela

http://www.egov.ufsc.br/portal/conteudo/reflex%C3%B5es-sobre-o-livro-%C3%A1rvore-do-conhecimento-de-maturana-e-varela

http://www.organizacaosustentavel.com/2009/06/arvore-do-conhecimento.html



........................................................................
O "Breviário da Bahia" 
está sendo  vendido 
com exclusividade 
no Pérola Negra, 
em frente a 
Biblioteca Central dos Barris.  
Tel: 3336-6997. 
Rua General Labatut, 137, 
Shopping Colonial (loja 01), 
Barris