Na sua revista Fradim, lançada em 1978,
desenvolveu ao máximo sua arte de quadrinização,
conquistando mais leitores com
sua série sobre a caatinga, onde Bode Orelana, Zeferino e Graúna
ridicularizavam o desenvolvimento do sul maravilha. Ao inundar o país com
milhares de cartuns e quadrinhos, o profissional que saiu da província balizou
uma trajetória digna da admiração dos seus pares.
Em depoimento a revista Status (1973), o
artista foi categórico ao definir o seu modo de desenhar: “Eu não sei desenhar.
Pra mim, é como mastigar pedra. Eu sei fazer tracinhos, juntá-los e formar
figuras (...) Meu desenho é caligráfico. Desenho como escrevo”. Ele adotou o
lápis como arma para denunciar e questionar tradições e comportamentos sociais.
Segundo o caricaturista Cássio Loredano, “Henfil tirou de debaixo do tapete o
que para lá tinham varrido zelosamente a nossa História inteira”.
“O Humor de Henfil era cruel. E
didático. Como se ele acreditasse que o Humor serve apenas para ensinar o Homem
a ser melhor. E que soubesse que o homem só aprende se lhe dói. O Humor do
Henfil era doloroso. E hilariante. Era engraçado e cruel, debochado e - ´pausa!
– desbordante de ternura. No Fradim baixinho o Henfil fez de tudo para não
deixar seu lado doce e terno vir à tona. Quando ele inventou a Graúna – o mais
emocionante personagem do imaginário brasileiro – com sua barriguinha
redondinha, uma bolinha preta, suas perninhas finas feitas de dois pauzinhos e
sua máscara de infinitas expressões conseguidas com três tracinhos, Henfil
abriu-se mais para as pessoas que o amavam. Neste personagem ele deixou-se ver
mais”, escreveu Ziraldo na apresentação do álbum A Volta da Graúna, pela
Geração Editorial (1973).
Em 1973 partiu para os Estados Unidos,
depois de uma longa e desgastante fase de censura no Pasquim. Foi cuidar da
hemofilia e “fazer a América”. Chegou a registrar os Fradinhos nos Estados
Unidos (os Fradins lá eram conhecidos como The Mad Monks) e a publicar algumas
tiras que saíram de circulação por pressão de leitores e editores, que o
consideravam sick (doentio) demais. Nesse exílio voluntário, ele descobriu
outra faceta do seu múltiplo talento: o de escritor. As cartas que escreveu a
familiares e amigos transformaram-se no livro Diário de um Cucaracha, onde
contava suas desventuras em terras americanas.
Henfil passou dois anos nos Estados
Unidos, sendo duramente criticado por isso. Segundo seus críticos, ele ia em
busca de reconhecimento mundial quando na verdade ia apenas tratar de um
problema no joelho. Lá, além dos seus próprios problemas de adaptação, teve que
enfrentar também o problema de adaptação de seus personagens, tendo preferido
não mexer neles e criar um outro para um jornal underground de Nova Iorque,
além de colaborar como chargista em um jornal do Canadá.
Foi o único brasileiro a ser aceito pelo
mais poderoso sindicato norte americano de cartunistas, UPS (Universal Press
Syndicate), que controla a publicação de tiras nos jornais dos EUA. A moral
americana rejeitou os fradinhos. Eram sádicos, escatológicos, desajustados,
diziam. Mas no Brasil eles seduziram milhares de leitores. Era com eles que
Henfil exorcizava as neuroses de sua educação rígida e mostrava a cara de seu
País. Cruelmente engraçado. No final dos anos 70 montou um apartamento em São Paulo,
levando para morar com ele Angeli, Laerte e Glauco. Morou durante sete anos.
Seu trabalho voltou-se exclusivamente para a crítica política.
Nesta época, também interrompeu as
publicações da revista Fradim. Embora muitos acreditassem ser obra da Censura,
a interrupção, na verdade, foi espontânea e deveu-se a uma decisão particular
de Henfil. Foi também neste período que surgiu a oportunidade de Henfil vir a
trabalhar como chargista da revista Playboy americana, mas foi rejeitado. O
motivo? Suas charges foram consideradas inteligentes demais para o público da
revista para o qual, segundo a direção da publicação, só servia entretenimento,
coisas que não fizessem pensar muito.
Mas as andanças de Henfil não param por
aí. Teve também a época que ele passou morando no Nordeste onde, segundo ele,
foi por uma questão de sobrevivência humana, egoística e individual, para
resolver problemas de saúde mental e refletir, ficar mais próximo do habitat
natural de seus personagens
“Em matéria de humor, sou pela gargalhada
pé na cara, franca, espontânea, brasileira; Não admito a sofisticação do
sorriso” (Revista de Domingo, Jornal do Brasil, 1978)
Henfil só pôde traduzir os diferentes
momentos da época porque os viveu. Ele aproximou-se da
militância com o irmão
Betinho, militante da Ação Popular. Com o irmão exilado, Henfil visitava
presos, participava de reuniões, da reorganização dos sindicatos, das greves,
da luta pela Anistia, do surgimento do PT e das Diretas Já. Para ele, “a chave
para você fazer humor engajado é estar engajado. Não há chance de você ficar na
sua casa vendo os engajamentos lá fora e conseguir fazer algo. Esse talvez seja
o humor panfletário. O que você faz de fora”.
Henfil não conseguia fazer um humor
panfletário também por causa de sua extrema sensibilidade. Sem “comprar a
briga” de uma categoria ou pessoa, ele não se achava em condições de desenhar.
Só se vivesse a luta. “Eu ia lá, assistia as reuniões, se eu começasse a me
emocionar com a coisa, saía”.
Os traços de Henfil são curtos, rápidos,
transmitem força e expressividade. Talvez o maior exemplo de síntese seja mesmo
a Graúna, que chegou a ser comparada com um ponto de exclamação. O leve
deslocamento de um de seus traços altera seu humor.
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