31 julho 2006

Quem disse que cabelo não sente? (1)

No mundo da música pop, o penteado é fundamental. As estrelas do rock passaram boa parte do tempo preocupando-se com seus cabelos. Futilidade? Uma arma para cada época. Protesto. A história do rock prova que o que está dentro das cabeças pensantes, de uma forma ou de outra – ou de um penteado ou de outro -, acaba por se refletir do lado de fora. Qual é o pente que te penteia? Nos anos 50, Bill Haley e Elvis atacavam de pega-rapaz e topetes. Nos anos 60, cabelos grandes eram sinal de rebeldia. Setenta apareceu arrepiando as cabeças de muitos rebeldes, os punks.

Nos violentos anos 80, os cabelos foram lançados ao vento, e muitos optaram pelo corte black lateral de Vernon Reid, do grupo Living Colour, e da estonteante Grace Jones. Outros preferiram os extensos fios metálicos de Axl Rose, do Guns´n Roses e companhia. O estilo elegante de Mick Hucknal (do Simply Red) e suas trancinhas avermelhadas não passaram despercebidos. Ou mesmo o inglês Jazzie B e seu look rastafari de longos cachos de cabelos trançados (dreadlocks), presos ao alto, responsável pelo som da Soul 2 Soul. Se a questão é muito cabelo, a irlandesa Sinéad O´Connor prefere o tipo careca, contrariando o look de cabelos fartos dos anos 90. O teu cabelo não nega. O visual do final do século XX resgata o culto às longas cabeleiras e, mais uma vez, elas têm a força.

As variações sobre o cabelo são o tema da canção de Jorge Benjor e Arnaldo Antunes que Gal Costa interpreta em um de seus CDs. Diz a letra: “Cabelo, cabeleira, cabeluda, descabelada/quem disse que cabelo não sente/quem disse que cabelo não gosta de pente/cabelo quando cresce é tempo/cabelo embaraçado é vento/cabelo vem lá de dentro//Cabelo é como pensamento/quem pensa que cabelo é mato/quem pensa que cabelo é pasto/cabelo com orgulho é crina/cilindros de espessura fina//Cabelo quer ficar pra cima/laquê, fixador, gomalina/cabelo, cabeleira, cabeluda, descabelada/quem quer a força de Sansão/quem quer a juba de leão/cabelo pode ser cortado//Cabelo pode ser comprido/cabelo pode ser trançado/cabelo pode ser tingido/aparado ou escovado//Descolorido, descabelado/cabelo pode ser bonito/cruzado, seco ou molhado”.

Nos anos 50, os cabelos eram lambuzados de brilhantina e ondulados com os “bem trabalhados” topetes. Numa América com corte reco, estilo militar, aquilo era provocante, tanto quanto a música que o acompanhava. Ambos passaram para a história. “É a minha marca registrada. Clark Gable tem as orelhas, Jimy Durante tem o nariz, e eu tenho o pega-rapaz...”. Era a marca de Bill Haley mantida à custa de toneladas de brilhantina. Ao contrário de Gable ou Durante, o rosto rechochudo e limpo do “pai do rock´n´roll” não tinha qualquer característica em especial, nada que o tornasse identificável pelo público – a não ser a mecha de cabelo, caprichosamente desajeitada, a cair na testa. O reinado de Bill Haley e seus Cometas espalhou-se pelo resto do mundo. Dois anos depois, com a sensualidade de seus requebros, aparecia Elvis Presley, mais jovem e bonito que Haley. Elvis Presley imortalizou o topete esculpido com gomalina e acompanhado por costeletas. Presley copiou o penteado de Tony Curtis, que aparecia de topete no filme Almas Abandonadas (1949). Depois de Elvis, um séqüito de seguidores, menos expressivos como Pat Boone, Gene Vincent e Paul Anka.

Desde que Tony Curtis e Elvis Presley puxaram seus topetes para a frente, em claro desafio, o cabelo passou a ser um estandarte da revolta jovem contra os padrões estabelecidos e, principalmente, uma forma de demonstrar sensualidade. James Dean, com sua massa de cabelos revoltos, lançou o look despenteado da juventude transviada.

Os alegres e ingênuos anos 50, fifties ainda não acabaram. São os rockabillies da cidade que resistem armados com jeans, topetes, jaquetas e muito rock. E não falta o cabelo gomalinado e óculos “Ronaldo”. Cresce a tendência pelo revival anos 50. Primeiro foi a publicidade a resgatar a imagem daqueles anos otimistas, quando o mundo era risonho e franco no embalo da euforia desenvolvimentista de JK. Os rockabillies seguem à risca os modelos de comportamento da época – o mesmo chiclete na boca e o mesmo pente no bolso de trás do jeans surrado, que o tempo todo ajeita o topete

Depois dos topetes, que infestaram o mundo, chegou a vez do corte de cabelo estilo Príncipe Valente, dos Beatles. Guiados pela mão forte de Brian Epstein, os Quatro de Liverpool foram ao barbeiro e voltaram para casa com um visual que influenciaram meio mundo, inclusive famosos “rivais” como os Rolling Stones e The Who. A franjinha dos Beatles foi criada em 1963 pela modelo alemã Astrid Kirchher, namorada do ex-integrante Stuart Sutclifffe. O corte foi um dos diferenciais da banda que usava topetes. Os Beatles dançaram, gritaram e provaram que cabelos longos não significavam idéias curtas. A imagem agressiva e rebelde dos Rolling Stones fez contraste com os bem-comportados Beatles. As pedras começaram a rolar, enfrentando o sistema, a família e os bons modos. Se os Beatles tinham cabelos compridos mas bem aparados, os Stones não gostavam de cortar os cabelos, deixavam crescer à vontade. Rebeldia pouca é bobagem! Na próxima semana vamos conhecer os cabelos da Jovem Guarda. (Gutemberg Cruz)


28 julho 2006

Música & Poesia

Romaria (Renato Teixeira)

É de sonho e de pó, o destino de um só
Feito eu perdido em pensamentos
Sobre o meu cavalo
É de laço e de nó, de gibeira o jiló,
Dessa vida cumprida a sol
Sou caipira, Pirapora Nossa
Senhora de Aparecida
Ilumina a mina escura e funda
O trem da minha vida
O meu pai foi peão, minha mãe solidão
Meus irmãos perderam-se na vida
Em busca de aventuras
Descasei, joguei, investi, desisti
Se há sorte eu não sei, nunca vi
Me disseram porém que eu viesse aqui
Pra pedir de romaria e prece
Paz nos desaventos
Como eu não sei rezar, só queria mostrar
Meu olhar, meu olhar, meu olhar.



Mar Português, de Fernando Pessoa


Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!

Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.

27 julho 2006

Diógenes Rebouças

Arquiteto, urbanista, pintor, professor e agrônomo. Diógenes de Almeida Rebouças nasceu no dia 07 de maio de 1914, no distrito de Tartaruga, Amargosa, Bahia. Ele aprendeu suas primeiras lições de arquitetura na Escola de Belas Artes da Bahia, onde entrou em 1931. Mesmo antes da formatura em 1937, já se dedicava a projetos arquitetônicos e a pintura, tendo recebido vários prêmios importantes como Viagem de Caminhoá e o prêmio do Salão de Maio da Sociedade de Artistas Brasileiros, no Rio de Janeiro. Diplomou-se em 1933 pela Escola Agrícola da Bahia, como Engenheiro Agrônomo. Em 1935 retorna a Itabuna, onde se criara, a fim de ajudar a mãe nas fazendas deixadas pelo pai. Lá, constrói a catedral da cidade e envolve-se em projetos de avenidas e jardins, a exemplo da Avenida Cinquentenário. Sua carreira como arquiteto se consolida a partir de 1943 quando integra a equipe do Escritório de Planejamento Urbanístico da Cidade do Salvador (EPUCS, o primeiro da Bahia), fundado por Mário Leal Ferreira, participando de projetos como a construção do estádio da Fonte Nova. E foi o primeiro presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil, seção Bahia.

Em 1947 torna-se consultor técnico do 2º Distrito do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN-Bahia). Realiza primeira etapa da obra da Escola Parque - Centro de Educação Carneiro Ribeiro. Faz o projeto do Hotel da Bahia, inaugurado em 1949. Diploma-se em 1952 na Faculdade de Arquitetura da UFBA, como arquiteto, passando a lecionar na instituição. Instala escritório de arquitetura. Em 1956 realiza a segunda etapa das obras na Escola Parque. De 1958 a 59 faz viagens de estudos aos EUA e à Europa. Em 1960 participa de obras da Escola Técnica da UFBA. Em 1963 faz a construção da sede do Baneb, no Comércio, e em 1965, obras da Escola de Arquitetura da UFBA. O professor Diógenes foi autor de inúmeros estudos, que resultaram em minuciosos e objetivos pareceres técnicos, envolvendo intervenções em inúmeros monumentos e núcleos históricos tombados no estado da Bahia. Entre suas contribuições valiosas estão os bens tombados nos municípios de Cachoeira, Cairu, Lençóis, Mucugê, Ilhéus, Mata de São João, Porto Seguro, Santa Cruz Cabrália, Rio de Contas e Santo Amaro.

Membro dos conselhos da Fundação do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia e do Estadual de Cultura, em 1968, realiza projeto de ampliação do Estádio da Fonte Nova. Em 1977 faz assessoria na Fundação do Desenvolvimento da Região Metropolitana de Recife, Pernambuco e, em 1978, tornou-se membro do Conselho de Desenvolvimento Urbano de Salvador. Em 1985, publica o livro Salvador da Bahia de Todos os Santos no Século XIX, com suas pinturas e desenhos, os textos são do poeta Godofredo Filho. E em 1989, coordena reforma do Hotel da Bahia. Chefiou durante muitos anos, o Departamento de Teoria e Prática do Planejamento da Faculdade de Arquitetura da UFBA. Lutou pela restauração e construção do patrimônio histórico da Bahia, sendo técnico do Pró-Memória, de onde só se afastou pela compulsória. Entre seus muitos livros e trabalhos publicados destacam-se o Planejamento da Universidade do Espírito Santo, o Projeto do Hotel da Bahia, o relatório da Comissão e Adaptação do Prédio da Faculdade de Arquitetura em 1960, entre outros. Foi também um grande incentivador das artes e é dele o projeto que obriga os edifícios a colocarem obras de artes em suas entradas. Patrocinou grandes exposições de novos artistas, hoje famosos. No dia 06 de dezembro de 1994 ele faleceu, aos 80 anos, em Salvador.

Talentoso em essência, Rebouças ganhou fama como urbanista e arquiteto. Poucos conheciam, na época, seus outros dotes, os artísticos. Criador de projetos arquitetônicos que ajudaram a construir a face moderna de Salvador, como o estádio da Fonte Nova, o Ginásio Antonio Balbino, as avenidas Contorno e Centenário, a Escola Parque, Hotel da Bahia, Penitenciária Lemos de Brito, Escola Politécnica, a Estação Marítima, a Faculdade de Farmácia da UFBA, o terminal do ferry-boat e seu último trabalho, o plano de revitalização do Mosteiro de São Bento, o arquiteto Diógenes Rebouças teve sua obra lembrada em 1996 com uma série de homenagens póstumas pela UFBA: outorga do título de Professor Emérito post mortem; exposição de fotos e croquis dos seus principais projetos; e relançamento, pela Odebrecht do livro Salvador da Bahia de Todos os Santos no Século XIX, em terceira edição.

O livro reúne imagens da Salvador do século passado, reconstruídas por Diógenes Rebouças através de outra das suas paixões: a pintura. Como pintor, fixou em telas a cidade do Salvador antiga, que depois doou ao IPHAN, para figurar como exposição permanente na Casa dos Sete Candeeiros. Os 68 quadros em óleo e acrílico sobre tela revelam uma apurada pesquisa da paisagem de Salvador no século 19. Suas interferências influenciaram decisivamente na melhoria da qualidade de vida da cidade. Para eternizar a memória desse que é um dos mais importantes arquitetos modernos da Bahia, foi instalado em 1998 no Mosteiro de São Bento, o Memorial Diógenes Rebouças.

Para o professor e arquiteto Antônio Heliodoro Lima, Diogenes Rebouças era “mestre sob vários aspectos, legou-nos lição de vida, ao transpor obstáculos de toda ordem próprios das limitações que o contexto baiano oferecia nos anos 40 para a formulação de qualquer arquiteto-urbanista”. “Devoto da Faculdade de Arquitetura, fez questão de levar todo o seu trabalho, para exposição na biblioteca de nossa escola. O sonhador da Salvador moderna, de vales, túneis, viadutos, o sonhador da Salvador racionalista, estava entregando a ela, não o século XX, mas a consciência de toda a sua historicidade”, escreveu a arquiteta e professora Socorro Targino Martinez.

26 julho 2006

Há nove anos Carybé nos deixou

O artista plástico Hector Julio Paride Bernabó, um argentino que se tornou mundialmente famoso com o apelido de Carybé, morreu no dia 01 de outubro de 1997, aos 86 anos, de problemas respiratórios decorrentes de um enfisema pulmonar. Ele foi quem melhor retratou a vida da Bahia. Suas figuras são inconfundíveis quer estejam num mural, numa tela ou numa aquarela.

Nascido em Lanus (1911), nas proximidades de Buenos Aires, o menino Hector passou a infância na Itália, visitando o Brasil pela primeira vez ainda garoto, em 1920. Dez anos depois, a família voltou à terra natal, onde ingressou na Escola de Artes Decorativas. Em 1938 travou o primeiro contato com a Bahia e apaixonou-se por Salvador. Deslumbrado, quis ficar. Não foi possível. Mas o desejo de pintar a magia do povo baiano, os rituais do candomblé e as belas paisagens da terra dos orixás falava alto em seu coração. Depois de ter viajado demoradamente pela América do Sul, desenhando e expondo, voltou várias vezes na década de 40, até que resolveu fixar-se definitivamente em 1950.

Chegou de vez à terra da mestiçagem, do candomblé e das puxadas de rede que retratou em seus quadros. Aceitou um, convite de Anísio Teixeira, no governo de Otávio Mangabeira, para desenhar a Bahia. Adotando a natureza mística da terra, Carybé integrou-se suavemente ao candomblé, fazendo-se filho de Oxossi, Oba de Xangô e presidente do Conselho dos Obas no terreiro Axé Opô Afonjá. Retratista fiel das tradições, crenças e costumes do povo baiano, projetou em sua arte os fundamentos da nação brasileira, na qual se misturam o negro, o índio e o branco.

Das atividades que desempenhou no Brasil, foi pandeirista do Bando da Lua, que acompanhou Carmem Miranda, ilustrador das obras de Jorge Amado, do qual era fraterno no amigo desde que passou a morar na Bahia. Foi parceiro de Paulo Vazzolini, autor de capas de livros de Gabriel Garcia Marques, ilustrador de “Macunaíma”, de Mário de Andrade, e autor do Memorial da América Latina, em São Paulo.

Carybé foi além das preocupações sociais e estéticas dos muralistas, propondo relevos e incrustações na pintura. Novas experiências são a tônica em seu trabalho, variando suportes e materiais. Barro, relevos em pedra, madeira, cimento, inclusões de ferro, vidro, metais, osso – Carybé multiplica-se como oleiro, carpinteiro, ferreiro, ourives. Segundo Jorge Amado, ninguém, no Brasil, contribuiu de forma mais evidente e verdadeiro para situar e exaltar essa contribuição do que mestre Carybé. Através da arte – desenhos, aquarelas, aguadas, óleos, talhas, painéis, livros – e através da ação pessoal numa participação cotidiana e criadora na vida popular baiana, tornou-se um dos cidadãos mais eminentes da urbe. Em sua obra, ele registrou de maneira expressiva os rituais do candomblé e valorizou as tradições trazidas da África pelos negros.

Na Bahia, como em todo o Brasil e muitos países do mundo, são marcantes os painéis de Carybé, em prédios públicos, bancos e mesmo edifícios residenciais. Suas obras fazem parte do acervo das mais respeitáveis instituições como o Museu de Arte Moderna de Nova Iorque, Fundação Gulbenkian, de Lisboa, Museu de Arte Moderna de São Paulo, Museu de Arte Moderna da Bahia e Fundação Raymundo de Castro Maya, Rio de Janeiro.

Ele retratou a Bahia com uma verdade afetuosa – as mulatas angulosas, os capoeiristas longilíneos, os orixás, as vaquejadas. Seus desenhos têm um traço vigoroso e ao mesmo tempo guardam a delicadeza da visão singular de um baiano de coração sobre sua terra. Seus quadros a óleo transbordam luz e exuberância. Como os grandes mestres, o artista fez da arte sua vida. Um artista completo: desenhista, gravurista, escultor, escritor e pintor.

O Museu Afro Brasil, em São Paulo, abriu uma mostra com aproximadamente 500 obras de Carybé (O Universo Mítico de Hector Julio Paride Bernabó, o Baiano Carybé, sob a curadoria de Emanoel Araújo: “ele foi um veículo para as modernidades”), de 27 de abril a 02 de julho. Segundo Emanoel Araújo, Carybé “incorporou o ser baiano, viu coisas, se comportou de igual para igual. Só entrando profundamente é que se chega ao âmago das coisas. Ele fez surgir nas artes plásticas a imagem do negro, que estava escondida”. Enquanto isso, murais, mosaicos e esculturas do artista espalhados por diversos espaços de Salvador, continuam à espera de conservação, conforme denuncia do jornal A Tarde do dia 27/04/2006.


25 julho 2006

Recruta Zero nasceu sem futuro militar

Como o Recruta Zero não tem nenhum irmão general, ele continua como recruta há nada menos do que 55 anos, quando alistou-se no Exército Americano. Pois é: o personagem do desenhista Mort Walker está completando cinco décadas e meia, e a essa altura é um soldado raso. Para quem não está bastante ligado, o Recruta Zero é uma história em quadrinhos escrita com o humor satírico de Mort Walker que ironiza numa boa com a vida de garotões e de coronéis durões, cujas “existências são tão livres quanto a dos pássaros nas gaiolas”.

Há 55 anos, mal nascia, o recruta alistava-se no Exército dos Estados Unidos, enfrentando o caos da Guerra da Coréia, Vietnã e a censura. O mais famoso soldado raso sobrevive até hoje em mais de 500 jornais do mundo inteiro, traduzido em cerca de 20 idiomas. Tudo isso começou a 4 de setembro de 1950, quando Recruta e mais personagens circulavam em 12 jornais. Tratava-se da tira intitulada Beetle Bailey apresentando um simpático e preguiçoso universitário americano que, entre nós, teve seu nome traduzido para Zero. A repercussão aconteceu mesmo quando estourou a guerra entre EUA e Coréia e o cartunista Walker resolveu alistar Zero e toda a tirinha. Imediatamente a tira passou a aparecer em cerca de cem periódicos e não parou de crescer. Hoje em dia, não tem quem não o identifique com seu peculiar bonezão caído sobre os olhos que nunca contemplamos. Assim, o recruta dorme de chapéu, toma banho de chapéu e os leitores aceitam na maior, como um a idiossincrasia do gozado soldado raso.

O personagem é um soldado raso preguiçoso, sempre procurando escapar de seu superior imediato, o Sargento Tainha. Tagarela, profano, estático, duro, sentimental e furioso, Tainha leva tudo ao extremo. Dentinho é um sujeito bem devagar, um jovem caipira. General Dureza é o líder que não consegue liderar um escoteiro a uma loja de doces. No desfecho da Guerra da Coréia, Walker resolveu mudar o esquema da história porque “a essas alturas já estava acostumado a certos luxos, como comer três vezes ao dia. Achei que uma boa solução fosse trazer Zero de volta pra casa”, conta o desenhista. A solução foi fazê-lo voltar ao convívio familiar. Daí o plano: “Criei uma irmã e um cunhado, Zezé e Cia e seus filhos, para manter o argumento do conflito. Após somente duas semanas os leitores exigiam o retorno de Zero ao exército e eu cedi. Mesmo assim continuei gostando de escrever piadas familiares e então institucionalizei Zezé e Cia. Os personagens até que mudaram um pouquinho, mas são basicamente os mesmo”.

O Recruta Zero já nasceu sem futuro militar. O Pentágono proibiu a sua divulgação no fim da Guerra da Coréia (1953) porque o personagem, tendo se alistado no início do conflito, dava um mau exemplo à juventude: gozava os praças americanos fazendo tudo errado e, por isso mesmo, de sua enorme impopularidade, só caiu em 1965, em plena Guerra do Vietnã. E Zero é hoje publicado em mais de 500 jornais do mundo inteiro.

A filosofia do nosso soldado raso passa a virar slogan impresso em muitos escritórios e outros ambientes de trabalho. A do Recruta para qualquer um se dar bem. “Sempre que me vem uma vontade de trabalhar, deito e espero a vontade passar”, diz Zero. O personagem reflete a visão que o americano tem do seu Exército. Pode até ser uma visão cínica, mas é real. Numa das tiras mais criticadas, ele pergunta ao Sargento Tainha por que o Sargento Robson, de um outro batalhão, foi promovido a Tenente e, ao menos de uma semana, a Coronel. A resposta de Tainha poderia explicar os 55 anos de sucesso, e polêmica, do Recruta Zero: “Porque ele é irmão do General”.

Em 1992, quando uma tira retratando General Dureza, o comandante do quartel onde o Recruta Zero "serve", mostrou o comandante numa situação de assédio sexual, mais uma vez, Mort Walker teve sua tira censurada. Nos últimos anos, Mort Walker tem delegado a um de seus filhos, Gregory, a autoria de diversas tiras do Recruta Zero. Ele recebeu diversas homenagens da National Cartoonists Society (entidade que reúne desenhistas importantes nos EUA) por seus bons serviços prestados ao humor naquele país.

24 julho 2006

Educação é começo, meio e fim

A escola tem conseguido muito pouco funcionar como reprodutora de informações e conhecimento para o futuro cidadão da era global. A missão da educação para a era planetária é fortalecer as condições de possibilidades das emergentes numa sociedade-mundo constituída por cidadãos protagonistas, conscientes e criticamente comprometidos com a construção de uma civilização.

Desenvolver a cidadania estimulando a reflexão crítica, provocar o debate, democratizar o acesso e o uso dos espaços (bibliotecas, internet) o jovem poderá compreender melhor o papel que possui na sociedade. Sabemos do esforço dos governantes em colocar todas as crianças nas escolas, mas a qualidade do ensino e as condições de permanência das crianças na escola foram esquecidas. Se o aluno não permaneceu na sala de aula o tempo mínimo suficiente para entender o que lê, escrever o que pensa e realizar operações aritméticas básicas, de pouco adianta.

Numa pesquisa do IBGE enquanto 11,4% dos brasileiros com 15 anos ou mais se declaravam, em 2005, incapazes de ler ou escrever um bilhete simples, mais do dobro desse contingente, com menos de quatro anos de escola, não sabia localizar ou relacionar mais de uma informação, ou seja, era analfabetos funcionais. A faixa de repetência, calculada pela Unesco é dramática: 21% contra 2% no Chile, 6% na Argentina e 16% no Haiti.

O número de matrículas cresceu na América Latina, mas apesar de a freqüência dos mais pobres à escola ter crescido na década de 90 a qualidade do ensino que essas crianças recebem ainda é muito inferior à verificada entre os alunos mais ricos. Essa constatação está no boletim “Quantidade sem Qualidade”, divulgado pelo Programa de Promoção da Reforma Educativa na América Latina e Caribe (Preal). O boletim do Preal traz também dados a respeito do investimento público feito pelos países da região em educação. Os dados mostram que paga-se mal aos professores e gasta-se aquém do necessário no setor. Mesmo sendo pouco, entretanto, esse gasto ainda traz poucos resultados, já que países com padrão de gastos similares (como a Polônia) ou até menores (como a Indonésia) que os da América Latina obtêm melhores resultados nos exames do que muitos países da região.

Em um artigo escrito para o jornal Folha de S.Paulo, o empresário, presidente do Instituto DNA Brasil e ex-presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, Horacio Lafer Piva escreveu: “Educação é começo, meio e fim. É a questão mais transversal em uma sociedade que se pretenda civilizada, democrática e próspera. Procura-se desenvolvimento, que é crescimento com justiça social? Sem ela, nada feito. Controle de natalidade é uma questão referencial? Só educando a população. O Brasil aceitou o desafio da inserção internacional? Competição pressupõe educação. O crime assusta, a saúde anda patinando, a Previdência está matando as contas públicas, o desemprego grassa? Só a educação os enfrenta”.

Um teste do Ministério da Educação (MEC) com estudantes de 4ª e 8ª séries da rede pública urbana no Brasil aponta que 54% dos alunos de escolas públicas têm dificuldade de compreender o que lêem, à exceção de frases simples ou textos curtos com informações explícitas. O balanço revela algumas curiosidades que remetem para as deficiências do ensino público no País: apenas 4% dos alunos da 4ª série tiveram desempenho adequado em português. Em matemática, o mesmo rendimento foi alcançado por menos de 1% dos estudantes da 8ª série. O Prova Brasil foi realizado em novembro do ano passado, com a participação de 1,9 milhão de alunos da 4ª série e 1,3 milhão da 8ª.

Segundo o presidente do Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Educação (Consed), Mozart Neves, que é secretário em Pernambuco, “houve avanços, mas estamos longe de onde precisamos chegar. Depois de matricular todas as crianças, é preciso garantir a permanência dos alunos e melhorar a gestão das escolas”. O Nordeste foi a região apontada com o pior desempenho do País no Prova Brasil.

21 julho 2006

Música & Poesia

Rosebud (Lenine / Lula Queiroga)

Dolores, dólares...

O verbo saiu com os amigos
pra bater um papo na esquina,
A verba pagava as despesas,
porque ela era tudo o que ele tinha.
O verbo não soube explicar depois,
porque foi que a verba sumiu.
Nos braços de outras palavras
o verbo afagou sua mágoa, e dormiu.

O verbo gastou saliva,
de tanto falar pro nada.
A verba era fria e calada,
mas ele sabia, lhe dava valor.
O verbo tentou se matar em silêncio,
e depois quando a verba chegou,
era tarde demais
o cáderver jazia,
a verba caiu aos seus pés a chorar
lágrimas de hipocrisia.

Dolores e dólares...
que dolor que me da los dólares
dólares, dólares
que dolor, que dolor que me dá.




Poema de Sete Faces (Carlos Drummond de Andrade)

Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.

As casas espiam os homens
que correm atrás de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,
não houvesse tantos desejos.

O bonde passa cheio de pernas:
pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.
Porém meus olhos
não perguntam nada.

O homem atrás do bigode
é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucos, raros amigos
o homem atrás dos óculos e do bigode.

Meu Deus, por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus
se sabias que eu era fraco.

Mundo mundo vasto mundo,
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.

Eu não devia te dizer
mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo.

20 julho 2006

Dom Obá II D´África

Oficial do Exército brasileiro, pensador e articulador político. Cândido da Fonseca Galvão, mais conhecido como Príncipe Oba, ou Dom Oba II d´África, filho de africano forro, brasileiro de primeira geração, nasceu na Bahia, na região de Lençóis por volta de 1845. Neto do maior imperador yorubá, o rei Alafin Abiodun, responsável pela unificação do império yorubá na África. Seu pai – Benvindo da Fonseca Galvão – veio como escravo para o Brasil. Em meados do século XIX, já como escravo liberto e movido pela corrida em busca dos Diamantes da Chapada Diamantina. Quando Dom Oba II vem ao mundo, a comunidade escrava reúne suas economias e compra a sua liberdade, garantindo-lhe o título de homem livre. Aprendeu a ler e escrever com o pai.

A Bahia foi a província brasileira que mais contribuiu com voluntários para a Guerra do Paraguai. Em 1865 participou ativamente no recrutamento de voluntários para a Guerra do Paraguai, sua primeira oportunidade de exercitar suas qualidades de liderança. Foi nomeado para alferes da 3ª Campanhia de Zuavos Baianos. Ferido na mão direita, Cândido da Fonseca Galvão retirou-se do serviço ativo no dia 31 de agosto de 1861. Mais tarde buscou o reconhecimento social de seus feitos e valimentos. Para tanto percorreu os trâmites legais, dirigindo-se preferencialmente ao próprio imperador. Em 1872 foram concedidas as honras. Não inteiramente satisfeito, Galvão encaminhou, no ano seguinte, um pedido de pensão. Sua solicitação é atendida. A vida de soldado permitiu uma ampliação extraordinária – quantitativa e qualitativamente – nos contatos entre regiões, classes e raças da sociedade brasileira. No tempo da guerra, o obscuro filho de um africano-foro, cujos horizontes não iam além da sua Comercial Vila dosa Lençóis, no sertão da Bahia, conheceria capitais de província, sua amada capital do Império, terras estrangeiras e questões internacionais de fronteira. A campanha permitiu-lhe entrar em contato direto com praticamente todas as instâncias do poder político. Condecorado como herói, Dom Obá II torna-se um elo entre os altos poderes do estado e os escravos, uma espécie de porta-voz não-oficial do povo negro brasileiro. E começou a escrever artigos para jornais e freqüentar a corte de Dom Pedro Segundo com a elegância de trajes dos senhores.

Questões de definição política e cidadania, questões de raça são assuntos discutidos e analisados por Galvão na imprensa. Em seus artigos ele apoiava a libertação dos escravos. Para o Príncipe, a Conquista da cidadania começou com o alistamento para a guerra e continuou, depois dele, com o processo de abolição progressiva. Vez por outra ele publicava poesia abolicionista e anti-discriminatória. Príncipe pacifista, Dom Obá acreditava na força das idéias. “O elemento da guerra é a espada”, gostava de explicar, “o elemento do meu triunfo há de ser a minha pena”. Ele tinha um pensamento vanguardista para a época. Enquanto a elite estava influenciada pelo pensamento darwinista europeu, que pregava a superioridade da raça branca, e se preocupava com o branqueamento do Brasil, Dom Obá formulou um pensamento contrário pregando o enegrecimento do país, sustentando que quem trabalhava no Brasil eram os negros.

A trajetória do alferes Galvão, do sertão da Bahia para a Guerra do Paraguai e daí para a vida urbana na África Pequena - composta pelos populosos bairros negros do Rio de Janeiro, antepassados das favelas – é emblemática do percurso do negro livre na sociedade escravista. Um líder popular, homem considerado amalucado pela “boa” sociedade, mas reverenciado e sustentado por seus semelhantes, que se constitui em um elo insuspeitado entre as elites e a massa que energia da sociedade tradicional. Negro, alto, forte e elegante, trajando fraque, cartola e luvas, trazendo à mão bengala e guarda chuva, ostentando sobre o nariz um pince-nez de ouro com lentes azuis, o príncipe Dom Obá II d´África era o primeiro a chegar às audiências públicas que o imperador Pedro II concedia aos sábados na Quinta da Boa Vista. Ele não limitou sua esfera de influência aos guetos da África Pequena. O acesso de Dom Obá ao palácio e ao próprio imperador Pedro II é um fato histórico bem documentado. Dom Oba nunca perdia as audiências públicas na Quinta da Boa Vista, aos sábados. Ele também aparecia, mesmo em ocasiões solenes, no paço da cidade. Aqui e ali, fosse com seu fardão de alferes ou em apurados trajes civis, Dom Obá II d´África era sempre “um dos primeiros que se apresentavam”.

Dom Obá II d´África era o representante da África Pequena do Rio de Janeiro, dos “pardos e pretos” que viviam precariamente à margem do sistema, em atividades de auto-emprego. Quando havia debate intelectual e político no Parlamento e na imprensa, Dom Obá tinha idéias definitivas. Ele pensava na salvação da grande lavoura de exportação, base econômica do Império, e era contra o trabalho escravista. Como as demais personalidades, também o Príncipe procurava o apoio do imperador para seus projetos. Por algum tempo fez campanha para ser nomeado embaixador do Império do Brasil na Costa d´África (África Ocidental), e, ao faze-lo, forneceu munição para a sátira política da época. Mas o Príncipe tinha uma resposta pronta para a zombaria racista. Ele relatava vários problemas do cotidiano aos sábados na audiência pública.

O reino de Dom Obá começou a desintegrar-se com a chegada da Abolição. O declínio de sua autoridade era evidente, em particular no que toca à capacidade de arrecadar impostos de seus súditos. Ele praticamente desapareceu das colunas dos jornais. “Não havia mais espaços para velhas fidelidades políticas, nem mesmo para príncipes do povo”. Sua morte, em 1890 foi noticiada na primeira página dos jornais da capital do país, que ressaltaram a imensa popularidade do Príncipe Obá e o fato de ter falecido “na majestade de uma soberania que ninguém se atreveu jamais a contestar”.

19 julho 2006

Energia está em todo lugar


Ela é definida como “a força do trabalho”, uma “medida de transformação que pode ser aplicada ao movimento, à luz, ao som, ao magnetismo, às reações químicas” ou seja, qualquer processo natural que envolva mudança. Estamos falando da energia que está em quase todos os trabalhos que exercemos. Ela ilumina as nossas cidades, abastece os nossos carros, comboios, aviões. Aquece as nossas casas, cozinha a nossa comida, permite-nos ouvir música e ver televisão. É ela que põe as máquinas e fábricas a funcionar.

Quando comemos os nossos corpos transformam os alimentos em energia. Esta é usada para trabalhar, brincar, correr, estudar, ler e em todas as outras atividades que exercemos. Existem várias fontes de energia: a energia do mar (os oceanos podem ser uma fonte de energia para iluminar as nossas casas e empresas. Existem três maneiras de produzir energia usando o mar: as ondas, as marés ou deslocamento das águas e as diferenças de temperatura dos oceanos. Há um convênio entre a Eletrobrás e o governo do Ceará para construção da primeira Usina de Energia das Ondas das Américas), energia solar (o sol sempre foi uma fonte de energia. As plantas usam a luz do sol para produzir comida e os animais alimentam-se delas. A decomposição de animais e plantas durante milhões de anos dá origem ao carvão, petróleo e gás natural. É a única indústria que cresce com um índice de 30 a 40% ao ano), a energia eólica (energia cinética do vento também é uma fonte de energia e pode ser transformada em energia mecânica e elétrica. A eletricidade gerada a partir dos ventos ajuda a disseminar tecnologia de ponta pelo Brasil. Vem aí o carro movido a ar).

Para muitos, se aproxima o fim da era dos combustíveis fósseis. Os organismos geneticamente modificados (OGM) tanto podem estar aí para o bem, como para o mal. Combustível limpo para o transporte sustentável: esta é a atual busca de companhias de petróleo que ao se reestruturarem para atender um novo perfil de empresas de energia, visualizam a perspectiva da finitude dos combustíveis fósseis e cada vez mais a urgência em zelar por questões ambientais.

Biomassa é ainda um termo pouco conhecido fora dos campos da energia e da ecologia, mas já faz parte do cotidiano brasileiro. Fonte de energia não poluente, a biomassa nada mais é do que a matéria orgânica, de origem animal ou vegetal, que pode ser utilizada na produção de energia. O biodiesel etílico nacional proporciona uma combustão muito mais limpa. Biodiesel é um combustível diesel de queima limpa derivado de fontes naturais e renováveis como os vegetais. Outras alternativas à dependência do petróleo no Brasil: biocombustíveis - álcool, óleos e gorduras-biodiesel.

A ciência nas diversas fases do tempo - antiguidade, medieval, renascentista e iluminista foi assim: o “homo erectus” ao domar o fogo abriu caminho para incontáveis processos de transformação. A agricultura e a irrigação desenvolveram-se. O cobre, bronze e ferro começaram a ser usados. Os egípcios inventaram o relógio de sol e o calendário moderno. Sumérios e babilônicos criaram a matemática e a astronomia. O filósofo Demócrito propôs o átomo como a menor partícula da matéria. O matemático grego Euclides criou os elementos da geometria. Arquimedes articulou o princípio da alavanca. Johannes Gutemberg inventou a imprensa moderna. André Vesálio desenvolveu a nova anatomia. Copérnico propôs um modelo heliocêntrico do universo, e Galileu pensou sobre a gravidade.

O químico britânico John Dalton fez progredir a teoria atômica. George Cayley criou a base da aerodinâmica. O físico alemão Georg Simon Ohm formulou a Lei de Ohm, pedra fundamental da eletricidade e da engenharia. Faraday inventou o gerador elétrico e Joseph Henry o motor elétrico. Daguerre inventou a fotografia. Hellmholtz formulou a Primeira Lei da Termodinâmica (conservação da energia). Darwin publicou a origem das espécies. Mendel criou a ciência da genética. Edson inventou a lâmpada elétrica incandescente. Rontgen descobriu os raios X. Thomson descobriu o elétron e Marconi demonstrou o rádio.

Com as leis de Isaac Newton (1642-1727), o mundo científico viveu até a segunda metade do século XIX, a sensação de que a física havia concluído sua tarefa e que a ciência estava, enfim, às portas de obter as respostas definitivas sobre os segredos da natureza e os mistérios do mundo. Em 1900, Max Planck anuncia que a energia não é emitida e tampouco absorvida continuamente, mas sim na forma de pequeninas porções discretas chamadas quanta, ou fótons, cuja grandeza é proporcional à freqüência da radiação. Nascia a física quântica. Cinco anos depois Albert Einstein lança a teoria da relatividade. E surgiu, década após décadas, novas descobertas. O mundo é assim, é feito de mudanças.

O bacteriologista Oswald Avery descobriu o significado genético do DNA. O astrônomo alemão Carl Friedrich propôs uma nova hipótese nebular da origem do sistema solar. John Mauchly e John Eckert Jr projetaram o primeiro computador totalmente eletrônico. George Gamown formulou a teoria do “big bang” para a origem do universo. Surgiram novas técnicas de clonagem, descobriram os pulsares (estrelas de nêutron com muita energia), desenvolveram-se a engenharia genética, fibra óptica, o genoma humano foi mapeado e foi pesquisado a cultura de células-tronco. São os fatos científicos que transformaram o mundo.

Mas é necessário lembrar que para garantir a existência de energia suficiente no futuro é necessário utilizá-la prudentemente no presente. Todos nós devemos conservar a energia e usá-la eficientemente. Depende de todos nós a iniciativa de criar novas tecnologias que transformem a energia.

18 julho 2006

Maldito, um rótulo que estigmatiza a arte – 2

A maldição atingiu também o cineasta baiano Glauber Rocha, que realizou uma verdadeira revolução formal no cinema brasileiro e se indispôs, sobretudo a partir do movimento do Cinema Novo, contra toda a estrutura conformista que impregnava nosso ambiente cultural. Inquieto, polêmico, combativo, Glauber utilizou nessa luta as armas com que fez seus filmes: agressividade, choque, ternura, imperfeição formal, desprezo pelo convencional. Por sua participação nos principais debates políticos e culturais do País recebeu o rótulo de maldito, mas também o reconhecimento, por parte dos especialistas como o mais importante cineasta brasileiro e um dos maiores da sua geração do mundo inteiro.

Há mais de cem anos o poeta francês Paul Verlaine criou o rótulo ao lançar uma antologia de nomes que lutavam contra a corrente parnasiana: Lês Poetes Maudits, que incluía versos de Rimbaud, Mallarmé, Corbière e do próprio Verlaine, entre outros. Segundo o professor, tradutor e poeta Haroldo de Campo, malditos eram aqueles autores verdadeiramente criativos em oposição ao domínio dos parnasianos. A expressão ganhou notoriedade e passou a designar o artista ou a obra que traz em si a antecipação no futuro, que molda as novas direções da arte. O maldito pode também continuar a sê-lo por muito tempo, ainda que sobre ele se acendam as luzes de um tênue reconhecimento.

O cantor e compositor Jorge Mautner, que misturou na sua trajetória política e cultura sempre foi considerado um maldito com letra maiúscula. Divulgador do PK (Partido do Kaos), inspirado no suporte que inclui a Numerologia, a Cabala, a Astrologia, Telepatia, Empatia e toda e qualquer fenomenologia, a psicanálise freudiana e a todos os dissidentes, Mautner retornou em 1986 ao panorama musical brasileiro justamente se opondo ao rótulo que carregou por tanto tempo, com o lançamento do disco Antimaldito. O tempo passou e ele continuou maldito.

A sociedade elimina os diferentes, isso é ponto pacífico. E para que isto aconteça basta que se esteja um momento em desacerto com as regras estabelecidas pela sociedade. Na maldição incorrem aqueles que chocam a moral corrente, no Ocidente ou no Oriente, nos regimes mais diversos, incorrendo na rejeição social que pode acobertar uma grande obra. Uma referência aos malditos desconhecidos que a posteridade poderá ou não resgatar,. A exemplo de tantos que a seu tempo incomodaram e agora estão nas escolas. O limbo não é necessariamente eterno, mas viver nele é árduo, exige todas as forças de um ideal. O escritor Fernando Gabeira, por suas idéias inconformistas, chegou a ser expulso do País, anos mais tarde é digerido com aparente facilidade pela sociedade brasileira. Ainda maldito?

Se fosse o caso de citar os brasileiros considerados malditos, teríamos ainda a dramaturga Leilah Assumpção com seus textos fortes e marcadamente urbanos, refletindo a barra pesada de se viver numa grande metrópole com todos os conflitos a que se tem direito. Não menos inquietos e inconformados foram os dramaturgos Plínio Marcos (que construiu um retrato fiel da falsa sociedade burguesa classe media brasileira) e José Celso (este com a revolução instaurada através da montagem de O Rei da Vela, de Oswald de Andrade). Não esquecer do poeta brasileiro que melhor encarnou a contracultura, Torquato Neto.

Num ponto todos concordam: a maldição é uma forma de discriminação, de separar o joio do trigo, como se em arte as coisas fossem tão evidentes como o joio e o trigo, o negativo e o positivo. E ser maldito já aparece agora como uma garantia de venda. Quando se vêem malditos vendendo mais que os outros, é sinal que as coisas mudaram. Não se sabe mais o que chamar de maldito, os limites ficaram indefinidos.

Do roqueiro Lou Reed ao cineasta Godard, do escritor Gabeira ao dramaturgo Plínio Marcos, passando pelos cantores Walter Franco e Sérgio Sampaio, a maldição esteve presente nas suas obras, tornando-os mais inquietos do que já eram naturalmente, pela incompreensão imputada pela sociedade massificadora e pasteurizadora. Muitos já sofreram o estigma e outros ainda hoje são rotulados. Em síntese, se hoje as estrelas badaladas pelos meios de comunicação são castigadas pela rebeldia ao stablishment, a maldição antigamente não poupava os gênios incompreendidos nas artes. Assim é que Baudelaire, Poe, Artaud, Fellini, Mautner, Glauber e outros do mundo literário e artístico estão associados ao conceito de maldição. O debate fica, por assim dizer, aberto.


17 julho 2006

Maldito, um rótulo que estigmatiza a arte - 1

A arte foi dessacralizada. A contemplação deu lugar à participação. A palavra foi deformada em grito, o som se fez ruído, a cor agrediu e o gesto atingiu o transe. O cinema acabou com a conseqüência temporal, o teatro pôs fim à separação ortodoxa ator-espectador, a dança entrou em convulsão, a música se dirigiu também aos olhos e a pintura se apropriou dos objetos em vez de pintá-los. O frenesi, a estridência e o transe dominaram os espetáculos. Rebelde e inconformada com a própria década, a arte retirou desta o tom selvagem da violência com que escreveu, cantou e criou a mitologia dos anos 60. Estava deflagrada, irreversivelmente, a maldição, que já havia atingido os artistas do mundo inteiro tempos atrás.

Mas já vai longe a famosa década de 60 e muita gente já pode falar dela para os filhos. Alguns já estão falando dela para seus netos. Mas ela permanece uma área de referência muito forte, graças à variedade de desejos políticos, não burocratizados, que mobilizou e colocou em discussão. E permaneceu ainda mais forte porque a década de 70 foi um período de refluxo e rebordosas as mais variadas, tornando ainda mais sedutoras as possibilidades desencadeadas na década de 60. E nada mais maldito do que a Geração Beat, que teve seus anos de máxima potência entre, justamente, 55 e 60. Com as cabeças feitas pelo ácido, saíam pela estrada figuras como Jack Kerouac, Allen Ginsberg, Neal Cassady e outros tantos tidos como malditos.

É o maldito Allen Ginsberg, velho admirador e conhecedor de artistas franceses (não menos malditos) como Apollinaire, Rimbaud, Celine, Breton, quem vai fazer a ponte entre a geração Beat americana e os movimentos europeus de contestação na década de 60. Essas considerações todas nos levam à questão central da matéria: maldição. Por que, desde a antiguidade, alguns artistas foram considerados malditos? Que conceitos regem a classificação? Na realidade, maldição (do latim male e dictio) refere-se, de certo modo, à má dicção, mau dito, mau feito. Enfim valores do bem e do mal, do bom e do mau.

A maldição implica sempre estar à margem da sociedade. Ser maldito em arte ou na vida, ou em ambas, é um fardo que não se carrega voluntariamente, pois o criador, ainda que nem sempre consiga, almeja a compreensão, quer estar ao lado do homem, quer subir junto com ele. Maldito é um rótulo que não permite a indiferença e que revela o fato artístico como elemento de inquietação e inconformismo, e quem o realiza como agente confesso ou não da transgressão e da dessacralização. O maldito se posiciona à margem da cultura dominante com seus valores estabelecidos, parâmetro pelo qual se julga o novo. A maldição não é procurada, é simplesmente vivida.

Foi vivendo a maldição que Jean-Luc Godard, por exemplo, realizou Je Vous Salue Marie, onde trata de uma forma totalmente inesperada, irônica e desmistificadora, figuras como a da Virgem Mareia e de José. Ao longo de sua carreira, Godard foi um contestador profissional dentro de sua arte, procurando derrubar os tabus. “O que eu quero antes de tudo é destruir a idéia de cultura”, declarou certa vez.

A maldição é condição de quem nela está, de quem não concorda com as regras artísticas ou sociais, ou ambas, e deseja a sua mudança, contribuindo para subverte-la, antecipando o futuro e, muitas vezes, preparando um paradoxo póstumo, o reconhecimento de sua obra pela história, a imposição de um novo rótulo para atenuar a contundência de sua ação: os clássicos Rimbaud, Van Gogh, Pasolini ou mesmo Glauber Rocha, incompreendidos quando vivos, incensados quando mortos, itens importantes no quadro da indústria cultural que tem na arte dita maldita um potencial mercadológico constante.

O fato que mais ressalta na vida e nas obras desses autores malditos é que eles transgrediram os preceitos morais dominantes em suas épocas. Van Gogh só vendeu um quadro em vida e terminou suicidando-se de desespero. Ernest Hemingway, ao sentir-se incapaz de criar, teve o mesmo fim. Baudelaire, além de ir parar nas barras dos tribunais acusado de imoralismo em seu livro, era um excêntrico na maneira de se comportar em público. Enfim, esses homens hoje considerados geniais sofreram na vida as mais diversas privações. Assim sofreu também o dramaturgo Jean Genet, com sua força poética, violência, erotismo criminoso e fantasia desvairada. Quem viu o filme “Querelle”, de Fassbinder a partir da história de Genet, pode comprovar a maldição desse francês irreverente.





14 julho 2006

Música & Poesia

Flor da Idade (Chico Buarque de Holanda)

A gente faz hora, faz fila na vila do meio dia
Pra ver Maria
A gente almoça e só se coça e se roça e só se vicia
A porta dela não tem tramela
A janela é sem gelosia
Nem desconfia
Ai, a primeira festa, a primeira fresta, o primeiro amor

Na hora certa, a casa aberta, o pijama aberto, a família
A armadilha
A mesa posta de peixe, deixe um cheirinho da sua filha
Ela vive parada no sucesso do rádio de pilha
Que maravilha
Ai, o primeiro copo, o primeiro corpo, o primeiro amor


Vê passar ela, como dança, balança, avança e recua
A gente sua
A roupa suja da cuja se lava no meio da rua
Despudorada, dada, à danada agrada andar seminua
E continua
Ai, a primeira dama, o primeiro drama, o primeiro amor


Carlos amava Dora que amava Lia que amava Léa que amava Paulo
Que amava Juca que amava Dora que amava Carlos que amava Dora
Que amava Rita que amava Dito que amava Rita que amava Dito que amava Rita que amava
Carlos amava Dora que amava Pedro que amava tanto que amava
a filha que amava Carlos que amava Dora que amava toda a quadrilha




E. E. Cumming

nalgum lugar em que eu nunca estive, alegremente além
de qualquer experiência, teus olhos têm o seu silêncio:
no teu gesto mais frágil há coisas que me encerram,
ou que eu não ouso tocar porque estão demasiado perto

teu mais ligeiro olhar facilmente me descerra
embora eu tenha me fechado como dedos, nalgum lugar
me abres sempre pétala por pétala como a Primavera abre
(tocando sutilmente,misteriosamente) a sua primeira rosa

ou se quiseres me ver fechado, eu e
minha vida nos fecharemos belamente,de repente,
assim como o coração desta flor imagina
a neve cuidadosamente descendo em toda a parte;

nada que eu possa perceber neste universo iguala
o poder de tua imensa fragilidade:cuja textura
compele-me com a cor de seus continentes,
restituindo a morte e o sempre cada vez que respira

(não sei dizer o que há em ti que fecha
e abre;só uma parte de mim compreende que a
voz dos teus olhos é mais profunda que todas as rosas)
ninguém, nem mesmo a chuva, tem mãos tão pequenas

13 julho 2006

Bahiano

Cantor. Nascido em 05 de dezembro de 1887, em Santo Amaro da Purificação, na Bahia, Manuel Pedro dos Santos ganhou fama ao se tornar cançonetista com o apelido de Bahiano. Especializado em modinhas e lundus, ele cantava acompanhado de violão e teve a chance de se tornar conhecido e ganhar lugar definitivo na história da música popular brasileira e do samba em particular, ao gravar para a Casa Edison o considerado primeiro samba levado ao disco, o Pelo Telefone, em 1917. Foi o primeiro samba a alcançar sucesso nacional. Para tanto, influíram vários fatores. A letra jocosa e provocativa sobre a “jogatina” na cidade (“O chefe da polícia/pelo telefone/mandou me avisar/que na Carioca/tem uma roleta/para se jogar...”) era de fácil assimilação e foi sem dúvida o estopim para a difusão maciça do samba. Nas gravações, a letra foi alterada (“O chefe da folia/pelo telefone/manda me avisar/que com alegria/não se questione/para se brincar//Ai,ai,ai/deixa as mágoas para trás/ó rapaz!/ai,ai,ai/fica triste se és capaz/e verás//Tomara que tu apanhes/pra nunca mais fazer isso/tirar amores dos outros/e depois fazer feitiço...”). Não faltaram também os aproveitadores, que na esteira do êxito da gravação de Bahiano correram atrás dos lucros. Nas ruas, e nos jornais da época, o samba vingara com inúmeras versões e acirrada polêmica, contribuindo definitivamente para a fixação do gênero como música de carnaval.

O batuque é a célula-mãe da manifestação musical popular mais importante do país e dele surgiram ramos, afluentes, tendências, que se espalharam por todo o território. Sob nomes mais diversos, ganharam estilos e andamentos próprios, sotaques regionais, assumiram caráter romântico, jocoso, boêmio, patriótico. Na união dos africanos, com baianos e imigrantes italianos surgiria música naturalmente. Do batuque passou para calundus e calhandos, seguiram-se fofa, lundu e fado (ambiente urbano) e jongo, samba e coco (rural), passando pela modinha, lundu-canção, maxixe e choro até chegar na vertente atual do samba, seja samba-canção, samba-enredo, samba de roda, samba de breque, samba funk ou samba reggae.

Com a gravação de Pelo Telefone, o samba dava o primeiro passo para abrir a porta de saída do gueto negro e ganhar as ruas. Parodiando jocosamente, usado como veículo publicitário, assobiado nas ruas e cantado nas festas ricas e pobres, o primeiro samba cumpria seu papel de pioneiro desde a primeira vez em 1916, quando foi notado por um público maior que aquele frequentador do casarão comandado por Tia Ciata, a mãe do samba. No ano seguinte foi gravado e abriu um capítulo novo na história da música popular brasileira, provocando uma série de imitações - quando não plágios - de tímidos seguidores. Gradativamente fez escola, tomou forma, criou estilo, empolgou poetas populares e mesmo eruditos, trouxe músicos da melhor qualidade para seu redor, deixou de ser considerado marginal ganhando respeito como arte popular e status de gênero musical por meio do qual o mundo reconhece o Brasil.

A carreira de um dos mais celebrados intérpretes da música popular brasileira não ficou perdida graças a introdução do fonógrafo no Brasil. O fonógrafo foi responsável por ser possível avaliar a obra do cantor Bahiano, logo após a implantação do aparelho no Brasil. Quando em 1903 Fred Figner, o proprietário da Casa Edison, fez editar o primeiro catálogo comercial de discos de sua fábrica, quem encabeçava a lista das primeiras 73 gravações era exatamente Bahiano, por ele contratado - junto com Cadete, outro intérprete popular - para ser o primeiro a gravar comercialmente no Brasil. Em 1904 o jornal Echo Phonographico, de São Paulo, estampava uma foto e prestava uma homenagem ao cantor Bahiano, “primeiro cançonetista brasileiro”.

Primeiro cantor a se profissionalizar no Brasil, gravou também o primeiro disco, que substituiu os cilindros gravados, como de hábito na época, em apenas uma das faces. Esse registro foi feito com o lundu de Xisto Bahia, Isto É Bom, no selo Zon-O-Phone nº10.001. Entre 1902 e 1904, ele gravou três discos: a canção Ave Maria (letra de Fagundes Varela), a cançoneta Art Nouveau e a modinha Querida Flora. Sendo o artista mais popular de seu tempo, Bahiano fez sucesso até meados dos anos 20, gravando composições consideradas clássicas entre as centenas de sua discografia. A modinha Perdão Emília, de Eduardo das Neves, o tango de Arthur Azevedo, As Laranjas da Sabina, e a toada Cabôca de Caxangá, de Catulo da Paixão Cearense e João Pernambuco, são exemplos.

O samba Quem Vem Atrás Fecha a Porta, de Caninha, foi gravado com sucesso por Bahiano em parceria com a cantora Izaltina. Ao lado de Maria Marzulo ele gravou O Casaco da Mulata. Bahiano cantou sobre muitos motivos de sua terra, e uma de suas características era falar de si próprio em algumas canções que gravava. Um bom exemplo disso é o lundu Baiano Dengoso em que a figura do baiano é citado na música nada mais é do que o próprio cantor. Sua autoria é anônima: “Sou baiano/sou cabra dengoso,/sou baiano de todos querido,/sou baiano, sou forte e manhoso,/sou baiano, sou bem decidido.//Sou baiano que tenho capricho,/é notório por todos sabido,/sou baiano e não quero rabicho,/pois rabicho é tempo perdido”... Outro lundu gravado por Bahiano tem como título A Farofa. Música de melodia alegre traz em seus versos um pouco de malícia. Ele também gravou Ai Seu Mé, Goiabada, Luar de Paquetá, Tatu Subiu no Peru e Chora, Chora, Choradô. No final da carreira grava Quem Eu Sou, lamentoso e autobiográfico: “Quem eu sou?/Um baiano atirado/Nessas vagas soberbas do mar/Já sem leme, bem perto da rocha/Desse abismo que vai me tragar”- e fecha com uma fala inesperada: “Canto há tantos anos e nunca arranjei nada. Finalmente, consegui um empregozinho nesta casa, com o que vou vivendo, graças a Deus”. Bahiano morreu no dia 15 de julho de 1944, no Rio de Janeiro. Sua carreira chegou ao fim como começou, humilde. E hoje poucos se lembram dele.

12 julho 2006

Felicidade ao alcance de todos

A busca da felicidade é a única (ou mais importante) razão de viver para os seres humanos? Na sociedade contemporânea o “dever de ser feliz” se tornou um dogma – que pode não se constituir na salvação essencial de uma pessoa. Pode ser apenas evento indireto, fugaz, resultado de valores como amor, amizade, trabalho, arte, ou seja, os eixos da atividade humana.

Para alcançar felicidade, é preciso renunciar ao ego e à ânsia pelas coisas deste mundo. Para os budistas, estamos presos à lei de causa e efeito. Já os cristãos afirmam que sem a fé, a razão não leva ao caminho da bem-aventurança. Os hedonistas acham que o fundamento da vida moral é o prazer enquanto os liberais afirmam que cada um deve buscar a satisfação de todos os seus apetites e, dessa forma, estará automaticamente em busca da felicidade dos demais. E os freudianos acreditam que o princípio do prazer nos impele a ser feliz, mas a sociedade bloqueia. Então, vamos adequar nossos impulsos sexuais à vida civilizada e fingir que felicidade é possível. E você, o que pensa da felicidade?

Nos dias de hoje, a publicidade é um dos alto-falante dos desejos em voga, e a busca do bem-estar prende as pessoas a um círculo da corrida do consumo. A vontade de possuir coisas não vem mais do prazer e do conforto que proporcionam, mas da necessidade de ser amado, respeitado e reconhecido pelos outros como alguém que tem valor. Isso é o que o filósofo alemão Hegel chamou de “desejo de reconhecimento”. Já o filósofo francês Philippe van den Bosch tenta responder à pergunta “como viver para ser feliz?” no livro “A Filosofia e a Felicidade”. A resposta: desejar menos e gastar menos. Nessa alternativa à roda do trabalhar-consumir são eliminados os excessos de posses e atividades que produzam cansaço extremo, incompatíveis com valores ecológicos e éticos.

Muita gente está reavaliando suas vidas e percebem que importante não é a fortuna, o poder e o status, mas os relacionamentos, os laços comunitários, o significado e o propósito da vida. Não é muito fácil quebrar esse ciclo e, na prática, chegar à simplicidade. Trocar tudo pela teoria e a prática da vida simples. A pressão social é forte. A cultura narcisista impõe a ostentação – é preciso ser não apenas rico mas também jovem e feliz o tempo inteiro. Daí o grande mercado de auto-ajuda, das drogas, cirurgias plásticas e academias.

O escritor francês Pascal Bruckner (A Euforia Perpétua) disserta sobre a “obrigação de ser feliz” na atual sociedade hedonista. Para ele “felicidade é uma palavra velha, prostituída, adulterada, tão envenenada que gostaríamos de bani-la de todas as línguas”. E se justifica: “Não se trata de ser contra a felicidade, mas, sim, contra a transformação desse sentimento em verdadeiro entorpecente coletivo ao qual todos devem se entregar, em suas modalidades químicas, espirituais, psicológicas, informáticas, religiosas”.

Para outras a forma mais prática de alimentar a alma de felicidade está na arte, pois toda arte é criação divina. Todo verdadeiro artista ouve um sussurro em seu ouvido, vindo do mundo das idéias antes de começar a sua obra. A nossa aproximação com a arte, seja na música, no cinema, nas pinturas ou esculturas, e até em um local isolado através da literatura, onde estão escritas as idéias sussurradas no ouvido do escritor, faz com que nossa alma se aproxime do criador. Como o nosso pensamento vem do mundo das idéias, nossa alma se sente cheia de amor e próxima de seu mundo livre e eterno. A forma mais prática de ser feliz, é apenas pensar, pensar apenas em coisas boas. Passe o dia pensando, mesmo que esteja em uma camisa de força, nada pode lhe proibir.

Outros acham que a felicidade é capacidade de contemplação. Quanto mais se desenvolve a nossa faculdade de contemplar, mais se desenvolvem as nossas possibilidades de felicidade, e não por acidente, mas justamente em virtude da natureza da contemplação. Esta é preciosa por ela mesma, de modo que a felicidade, poderíamos dizer, é uma espécie de contemplação.

Para o filósofo Aristóteles, felicidade é um estado permanente que não parece ter sido feito, aqui na terra, para o homem. Na terra, tudo vive num fluxo contínuo que não permite que coisa alguma assuma uma forma constante. Tudo muda à nossa volta. Nós próprios também mudamos e ninguém pode estar certo de amar amanhã aquilo que hoje ama. É por isso que todos os nossos projetos de felicidade nesta vida são quimeras.

Já o filósofo Jean-Jacques Rousseau viu poucos homens felizes, talvez nenhum, mas viu muitas vezes corações contentes e de todos os objetos que lhe impressionaram foi esse o que mais lhe satisfez. A felicidade, para ele, não tem sinais exteriores. Para conhecer seria necessário ler no coração do homem feliz, mas a alegria lê-se nos olhos, no porte, no sotaque, no modo de andar, e parece comunicar-se a quem dela se apercebe. “Existirá algum prazer mais doce do que ver um povo entregar-se à alegria num dia festivo, e todos os corações desabrocharem aos raios expansivos do prazer que passa, rápida mas intensamente, através das nuvens da vida?”.perguntou. Todo mundo está atrás da mesma coisa: apenas um pouco de felicidade a cada dia. Mas é preciso que a cabeça esteja vazia de pensamentos para que os olhos possam ver. Pense nisso!

11 julho 2006

Uma paixão da alma chamada saudade

Hoje vamos falar de uma aventura de sensibilidade, um sentimento, uma paixão da alma: a saudade. Um conceito que trata de uma experiência universal comum a todos os homens em todas as sociedades – a experiência da passagem, da duração, da demarcação e da consciência reflexiva do tempo. Mas a saudade é diferente de outras experiências porque associa a elementos que não estariam presentes em outras modalidades culturais de medir, de falar, classificar e controlar o tempo.

Nos estudos sobre a saudade, realizados em Portugal, ele é explicado como o resultado de experiências empíricas, das viagens que promovem a dor, da ausência e dos desejos insatisfeitos. Ou como disse o poeta português Teixeira de Pascoaes: “Desejo e dor fundidos num sentimento dão saudade”. Assim, a saudade é o resultado de uma dada experiência, se ela é causada pela contingência sentimental, pelo amor e pela emoção dilacerada da ausência. É a noção de saudade que nos faz refletir e, sobretudo, sentir com mais vigor, presença e intensidade, o nosso amor e a ausência dos entes e das coisas que queremos bem. Ou seja: eu sei que amo porque tenho saudade, e sei que sinto a falta de um lugar porque dele sinto saudade.

A saudade fala do tempo por dentro. Da temporalidade como experiência vivida. É pela saudade que podemos invocar e dialogar com pedaços de tempo e, assim fazendo, trazer os tempos especiais e desejados de volta. Por exemplo, lembro-me bem do tempo em que estudei no Colégio Duque de Caxias, no bairro da Liberdade em Salvador, no antigo “ginásio”, em seguida no Colégio Central fazendo o “científico”. Bons tempos ouvindo Beatles, Roberto Carlos, Rolling Stones e Led Zeppelin. Ou mesmo, tempos depois fazendo o programa semanal da rádio Piatã, “Sessão Maldita de Rock”, toda sexta, meia noite. Pauleira pura!.

Da dor ao riso, do amor ao ódio e do esquecimento à saudade, os sentimentos são marcados e impostos pelo sistema que nos informa porque os temos, como devemos manifestá-los e o modo correto como devemos ser englobados por cada um deles e os seus alvos mais legítimos. Esse tesouro chamado saudade é exclusivo da língua portuguesa. E chegou ao ponto de ser considerada palavra-chave para a definição da alma, do estado de espírito e do caráter de toda uma nação. A importância da palavra saudade não é pequena, pois tornou a melancolia portuguesa passível de inclusão entre as três grandes tristezas européias.

A palavra remete ao exílio dos poetas e dos judeus e já foi chamada de “monopólio sentimental da língua portuguesa”. E é Mario de Sá-Carneiro, que tinha uma “alma nostálgica de além”, que concluiu: “Perdi-me dentro de mim/porque eu era labirinto,/e hoje, quando me sinto,/é com saudades de mim”. “A palavra é bem pequena/mas diz tanto de uma vez!.../por ela valeu a pena/inventar-se o português”, escreveu Bastos Tigre em 1935. Assim, a saudade é tão nossa que nenhuma outra língua a possui em seus léxicos. Em alguma delas, com outro nome, da origem grega – nostalgia, ou mesmo a melancolia, sentimento típico do exilado.

E nossos poetas que perpetraram sobre “a bendita dor que faz bem ao coração” numa vontade de lembrar querendo esquecer, ou de uma “saudade,/torrente de paixão,/emoção diferente,/que aniquila/a vida da gente,/uma dor que nem sei/de onde vem”, diz os versos de “Canção de Amor”, de Chocolate e Elano de Paula. Vamos agora abrir uma janela para associar saudade e música popular brasileira. A música, muitas vezes, neutraliza a passagem do tempo assim como a saudade que nos segue por toda a vida. E na poesia de Julia de Sá, “saudade é voz do passado, e tristeza do presente. Segue o tempo, lado a lado, a falar dentro da gente”. E a saudade permite transformar a perda em felicidade. “Choras sem compreenderes que a saudade, é um bem maior que a felicidade. Porque é a felicidade que ficou!”, dizia o poeta Manuel Bandeira. Através da saudade podemos lembrar da passagem do tempo.

A escritora Clarice Lispector em seu livro “A Descoberta do Mundo” escreveu: “Saudade é um pouco como fome. Só passa quando se come a presença. Mas às vezes a saudade é tão profunda que a presença é pouco: quer-se absorver a outra pessoa toda. Essa vontade de um ser o outro para uma unificação inteira é um dos sentimentos mais urgentes que se tem na vida”. “Quando eu olho para mim/dentro de mim tem você/quando eu olho pra você/por dentro sinto saudade/quando eu olho pra saudade/meus olhos vão desaguando...” canta Alceu Valença em “Quando eu Olho pra o Mar”.

“Hoje me olhei no espelho/e senti ´sardade´ d´eu/daquele moço canteiro/repentista e violeiro./Hoje só resta o porão/pois a casa e a cumieira/destino fez bagaceira/e o vento jogou no chão...”. A música é “Baque do Coração” de Vevé Calazans e Bubuska na bela voz de Fafá de Belém. E quem não se lembra da canção “A Saudade Mata a Gente”, de João de Barro e Antônio de Almeida na voz de Nélson Gonçalves? Ou mesmo a “Saudade da Bahia” de Dorival Caymmi, a “Saudade de Amar” de Francis Hime e Vinícius de Moraes, ou a dramática “Nunca” de Lupicínio Rodrigues. O jeito agora é cantar a letra de Tom Jobim e Vinícius de Moraes: “Chega de Saudade”!.

10 julho 2006

Hip hop, a cultura urbana contra a violência

Eles cantam o som que surgiu nas ruas, com letras inspiradas na rotina diária dos grandes centros urbanos. São os garotos do hip hop, uma cultura de rua. A reunião do rap, break e reggae em um único espetáculo é a forma mais moderna de se representar o hip hop - a cultura negra das ruas das grandes cidades americanas como Nova Iorque, Chicago ou Detroit -, que se tem desenvolvido muito na periferia de São Paulo. O objetivo principal do hip hop é tentar conduzir para a arte as energias, muitas vezes canalizadas para a violência.

Rap são as iniciais de Rhythm and Poetry que os garotos negros dos EUA inventaram para a música que substituiu a dança break. Mas a origem está na Jamaica, na década de 50, com o disc-jóquei Big Younth e alcançou nos EUA a celebridade internacional com músicos como Kurtis Blow, Grand Master Flash e Afrika Bambaataa. A música é sincopada e a letra declamada, permitindo ao dançarino breaker uma variedade de movimentos e passos. Os “scratches” dos disc-jóqueis, girando o disco ao contrário para obter diferentes efeitos sonoros, o skate, os patins são também elementos que acabaram se incorporando ao hip hop.

O reggae, também jamaicano, tem a mesma origem do rap: a soul-music e a mesma importância na conscientização do movimento negro dos Estados Unidos e, hoje em dia, também no Brasil. Rap é um estilo de cantar quase falado, expressão de quem já fez tudo o que podia com seu corpo. No meio dos anos 70, no auge das discotecas, a música negra americana mescla-se à disco music, enveredando para um lado mais comercial. Enquanto isso, nos bairros negros de Nova Iorque como o Bronx e Brooklyn, nasce uma forma de reação, reivindicando uma volta à autenticidade da black music, na forma de rap.

A característica mais marcante do rap são suas letras longas, sobre temas do cotidiano dos bairros negros das grandes cidades, em geral com humor. Nessas letras são cantadas por exemplo as malandragens, namoradas, amigos, o dia-a-dia enfim, existindo várias correntes e ideologias dentro do rap (alguns contra as drogas, contra a violência, sobre política...). Enquanto o vocalista (MC, Master of Cerimony ou rapper) fala canta e dança, a música é improvisada pelo disc-jóquei (DJ) que faz os scratch (o disco é usado como instrumento, sendo arranhado pela agulha no sentido inverso), havendo uma base pré-gravada de baixo e bateria (geralmente eletrônica). Alguns DJ usam o sampler, digitadores de sons, que “roubam” trechos de músicas alheias, muitas vezes antigos sucessos. Em 1982 o rap saiu das ruas e entrou em estúdios de Nova Iorque. Pouco tempo depois espalhou-se pelo mundo.

Enquanto os rappers sonham, o movimento atravessa uma crise. “Colors”, filme dirigido por Dennis Hopper que trata de guerra entre gangs americanas, traz uma trilha exclusivamente rap. Na Inglaterra, shows do Public Enemy causam distúrbios. E o rap demonstrou uma vitalidade contínua, apesar de submetidos a um processo de mercantilização para atingir um mercado mais amplo, que inclui os brancos. Surgiram desde rap comercial mais suave de artistas como MC Hammer, Kris Kross, Vanilla Ice, a rapper hardcore como Public Enemy.

Hip...hop...onomatopéia – sinônimo da palavra movimento. Garotos de gueto nova iorquinos não podem ficar parados em qualquer esquina. Garotos negros no mundo inteiro costumam ser presos por vadiagem. Saída: jogar bola, dançar, dormir cedo, acordar às duas da madrugada para ouvir o DJ preferido. O hábito desesperado de manter a cabeça funcionando originou o rap, em 1975, sobrepondo a fala e a música em uma forma inspirada de poesia urbana..

Em São Paulo, esse hábito ganhou o nome de Movimento Hip Hop Organizado (MHHO). O sonho dos rappers é o de transformar todos os jovens em B.Boys – garotos de diferentes classes sociais que se unem tendo a música e a dança como fator comum. Seus nomes e preocupações são semelhantes aos de qualquer cara negro oprimido. No Rio por exemplo são realizadas centenas de bailes nos clubes e agremiações, geralmente nos subúrbios, durante os fins de semana, aos quais comparecem milhares de jovens. São Paulo, Minas, Salvador e outras cidades também há bailes. A música que impera nessas festas é o hip hop. Os rappers procuram uma expressão e código de atitudes semelhantes em todo o mundo. A expressão plástica do hip hop é o grafite. Os grafites são extravagantes com toques dourados. A tensão está sempre nas letras, redonda, quebradas, imitando muros. Desta forma o hip hop é um termo amplo que abrange uma subcultura associada à vida social, à música, à dança e à moda dos jovens negros e latinos urbanos dos Estados Unidos que avançou para o mundo. Inclui o rap, a dança break, o grafite, os clubes, os DJs e os trajes esportivos (bonés, tênis, camisetas, etc).

07 julho 2006

Música & Poesia

Na Volta Que o Mundo Dá
(Vicente Barreto e Paulo César Pinheiro)

Um dia eu senti um desejo profundo
De me aventurar nesse mundo
Pra ver onde o mundo vai dar

Saí do meu canto na beira do rio
E fui prum convés de navio
Seguindo pros rumos do mar

Pisei muito porto de língua estrangeira
Amei muita moça solteira
Fiz muita cantiga por lá

Varei cordilheira, geleira e deserto
O mundo pra mim ficou perto
E a terra parou de rodar

Com o tempo
Foi dando uma coisa em meu peito
Um aperto difícil da gente explicar

Saudade, não sei bem de quê
Tristeza, não sei bem por que
Vontade até sem querer de chorar

Angústia de não se entender
Um tédio que a gente nem crê
Anseio de tudo esquecer e voltar

Juntei os meus troços num saco de pano
Telegrafei pro meu mano
Dizendo que ia chegar

Agora aprendi por que o mundo dá volta
Quanto mais a gente se solta
Mais fica no mesmo lugar


Esquecimento
(Florbela Espanca)


Esse de quem eu era e era meu,
Que foi um sonho e foi realidade,
Que me vestiu a alma de saudade,
Para sempre de mim desapareceu.

Tudo em redor então escureceu,
E foi longínqua toda a claridade!
Ceguei... tateio sombras... que ansiedade!
Apalpo cinzas porque tudo ardeu!

Descem em mim poentes de Novembro...
A sombra dos meus olhos, a escurecer...
Veste de roxo e negro os crisântemos...

E desse que era eu meu já me não lembro...
Ah! a doce agonia de esquecer
A lembrar doidamente o que esquecemos...!

06 julho 2006

Uma saudade que faz 35 anos

Há 35 anos, no dia 6 de julho, morria Louis Armstrong, o músico mais conhecido da história do jazz. Como trompetista, Armstrong encontra poucos rivais entre os artistas de jazz, sendo considerado, também, o maior vocalista de todos os tempos, ao lado de Billie Holiday. Sua carreira decolou mesmo a partir de 1924, quando se tornou solista da Fletcher Henderson Orchestra. A melhor parte das suas obras foi produzida antes de 1940.

Iniciada nas primeiras décadas do século, quando os conjuntos de jazz começavam, a florescer nos bares de Storyville, a carreira prodigiosa de Louis Armstrong coincide com a própria evolução do jazz, música de raízes populares que nasceu num cantinho da América e conquistou o mundo, graças à sua linguagem universal. Armstrong, cuja vida e música se confundem com a história do próprio jazz, teve a sorte de nascer precisamente no começo do século, quando o jazz dava também seus primeiros vagidos.

Daniel Louis Armstrong nasceu em Nova Orleans no dia 04 de julho de 1900. Nasceu no coração das favelas negras. Sua boca grande e o seu sorriso largo granjearam-lhe o apelido de “boca de saco”, mais tarde abreviado para “boca de cartucheira”. Desde a tenra infância, era atraído irresistivelmente para a música que vinha das ruas e das tabernas da cidade.

Ele tinha uma base de música religiosa negra. Dançava, cantava e assobiava com os dedos para imitar uma clarineta. Cantava com os olhos fechados e a boca escancarada. Por incrível que pareça, era tenor, pois só muito mais tarde foi que desenvolveu seu timbre grave e rascante. Aos 15 anos conseguiu seu primeiro emprego profissional, tocando num trio de bar e não parou mais. Ele podia tocar e sustentar notas agudas durante mais tempo do que qualquer músico da região e gostava de usar um “vibrato” de controle exótico. Mais importante ainda, começara a compor e a inventar trechos improvisados, ao mesmo tempo profundos e líricos, que se tornaram característicos. A fama de Louis Armstrong se espalhara e já era uma lenda. Quando se juntou a Joe “King” Oliver em Chicago, 1922, com sua Credle Jazz Band, Armstrong tornou-se o primeiro solista de jazz a conquistar fama mundial.

Passou também a introduzir os “scats”, sons ininteligíveis, um amontoado de sílabas sem sentido que lhe dava a liberdade de usar sua voz como trompete. “Mas o que torna a arte de Armstrong tão notável?” perguntou o historiador e crítico James Lincoln Collier, e respondeu: “Primeiro, há o seu domínio do instrumento. Seu tom é quente e rico, como o mel, em todos os registros. Seu toque é um dos mais fortes e claros entre os trompetistas do jazz. Enquanto muitos instrumentistas de metais no jazz têm um estilo cheio de ligaduras e efeitos de língua, Armstrong sempre introduziu uma nota instantaneamente afiada como a lâmina de uma navalha. Seu vibrato é amplo, mas mais lento quer o vibrato ligeiramente nervoso de Oliver e dos músicos de Nova Orleans”.

Na carreira e na contribuição de Louis Armstrong, o canto ocupou lugar tão importante quanto o som de seu pistão. Ao longo de sua vida ele gravou com vocalistas como Billie Holiday, Bing Crosby, Ella Fitzgerald, com o duo folclórico dinamarquês Nina and Frederick e em orquestras dirigidas por notabilidades como Sy Oliver, Benny Carter, Gordon Jenkins e Russ Garcia. Fez gravações de grupos pequenos com Oscar Peterson e Duke Ellington. Apareceu em diversos filmes e a sua gravação da canção que deu título ao seu último filme, “Hello Dolly”, fez dele uma grande estrela para toda uma nova geração de ouvintes.

Louis Armstrong deixou-nos no dia 06 de julho de 1971, dois anos após ter festejado seu 71º aniversário em companhia de alguns amigos e de ter tocado uma última vez o trompete. Com ele, desaparece não somente uma vida pitoresca e lendária a serviço da música simples, calorosa e universal de sua cidade natal, Nova Orleans, mas também um artista único, criador e improvisador de uma música original.

“Louis Armostrong é um grandioso cronópio”, disse certa vez o escritor Julio Cortazar. Cronópio é o efeito do jazz sobre as pessoas: é uma coisa para ser sentida e não explicada por meio de palavras. “Quando pego o pistão, tenho a impressão de agarrar o mundo. Eu sinto isso tanto hoje como nos velhos tempos em Nova Orleans”. Essa era sua sensação de músico. Ele que não perdeu de vista, em tudo que fez, a essência de sua música, ou seja, sua fundamentação verdadeiramente popular. Armstrong foi o homem que, praticamente sozinho, alterou o destino de toda a música popular no século XX.


05 julho 2006

Qualquer palavra vale mais que mil imagens

“Mais vale uma palavra a tempo do que cem fora de tempo”. A frase é do novelista espanhol Miguel de Cervantes. Nos dias do texto condensado, da brevidade da notícia, do “já não há tempo para ler”, vale mais uma imagem que mil palavras. Fernando Savater no jornal El País inverte a relação de domínio entre a imagem e a palavra: qualquer palavra vale mais que mil imagens, já que pode suscitar todas as imagens, não sendo tão plausível o contrário, pelo menos porque a palavra suscita mais ativismo intelectual e menos passividade contemplativa ou emocional. E Savater cita o politólogo italiano Giovanni Sartori: “O homem que lê, o homem da galáxia Gutemberg está constrangido a ser um animal mental; o homem que vê, e nada mais, é unicamente um animal ocular”.

Savater apresenta as deficiências da informação por imagens: provoca mais emoção que raciocínio e privilegia o movimento em relação à estabilidade, não deixando, todavia, por um efeito paradoxal, de provocar um virtual “embrutecimento gregário”; provoca comoção, mas não ajuda no processo decisional (particularmente quando se trata de jogar com causas remotas e complexas); a exigência intrínseca de velocidade na informação por imagens inibe tendencialmente a reflexão, entendida como “pausa analítica”. É, por isso, virtualmente anti-intelectual. Mesmo assim, o elogio savetariano da leitura e da escrita não retira, realisticamente, virtudes à civilização videológica. A passagem da galáxia Gutemberg para a galáxia Lumière não pode deixar-nos a anos luz da força primordial da escrita, como se passasse do mundo em que a filosofia era serva da teologia para o mundo em que a escrita se torna serva da imagem.

Muito já se escreveu sobre o homem-vídeo, aquele que vê sem saber, que vê tudo mas nada decide. E quando decide, o faz por aquilo que outros lhe dão a ver. É a tal videocracia, a substituição da soberania popular pela soberania da imagem, do vídeo, do simulacro. É a videocracia vista como a simulação democrática da era pós-moderna.

O assunto é velho e novo ao mesmo tempo. Ítalo Calvino e Píer Paolo Pasolini, em dois textos bem diferentes e afastados no tempo, refletem criticamente, mas com grande coincidência de pontos de vista, sobre a chamada civilização da imagem. Calvino afirma (no texto de 1984) que corremos o risco de vir a perder essa “faculdade humana fundamental” de “pensar por imagens”, tal o dilúvio de imagens pré-fabricadas que está a inundar, cada vez mais, a Humanidade. Pasolini, por sua vez em texto de 1974 vê na televisão o médium mágico que, por força da sua linguagem físico-mímica ou comportamental, consegue fazer passar diretamente, sem mediações, um abstrato “modelo de vida” para os comportamentos de milhões de sujeitos reais, quais “cópias” vivas dos modelos representados no vídeo. De tal modo que “os heróis da propaganda televisiva (...) proliferam em milhões de heróis análogos na realidade”. Uma espécie de versão microeletrônica e de massas da mais elitista teoria platônica das idéias.

O que está em causa é essa dimensão crítica, analítica, reflexiva e ativa de uma cultura (humanística) que pressupõe uma relação vivida originária e mediada com a realidade, sem sobreposições arbitrárias ou mesmo caóticas de “condensados” mentais produzidos e difundidos à escala mundial como simples produtos de mercado. Questiona-se a cadeia de efeitos que o dilúvio de pré-fabricados mentais ou comportamentais pode provocar num indivíduo moderno, carente de vínculos comunitários. Esse fluxo da imagética televisiva irrompeu impondo e promovendo padrões de vida, estereótipos ou modos comportamentais que são rapidamente assimilados pelas populações à escala mundial.

A publicidade é citada em várias dessas reflexões porque cria fetiches que geram, atraem e modelam comportamentos. Não tanto pelos produtos publicitados, mas sobretudo pelas escalas de valores a que são referidos e pelas situações, pelos contextos expressivos recriados ou representados como “naturais” do próprio produto. O que se torna socialmente relevante são as situações estilizadas ou representadas como estereótipos e que, por isso, se tornam expressivamente ideais – de imitar, portanto.

Quem não se lembra dos filmes hollywoodianos dos anos 60 a 70 onde os “heróis” fumavam o tempo todo (depois de uma trágica luta ou mesmo depois de fazer sexo) e aquilo passou a ser a realidade de todos. Todos queriam imitar o “herói”. Por trás do heroísmo uma falsa publicidade criando modelos ideais. Além do cigarro, o uso do álcool nos filmes (wisque, tequila entre outras) era uma prova de coragem, de força, de vitalidade. O que se mostrava era publicidade subliminar. E o império do consumo, a magia da publicidade, “o mundo às suas mãos”, toda essa gigantesca feira tornou-se obsoleta a tradição humanística, tornando simplesmente arqueológicos os modelos comunitários de produção e reprodução do imaginário social.

04 julho 2006

No mundo atual a palavra ainda comanda

“A imagem te mostra a situação, a palavra deve descrevê-la. E essa é a grande magia da palavra. Nenhuma palavra é, em si, poética. O que a torna poética é a palavra que está ao lado”, afirmou o escritor português José Saramango na abertura da Feira do Livro de Sevilha, Espanha em maio deste ano. Num século XXI em que as novas tecnologias parecem colocar de escanteio a palavra impressa, mesmo nesse mundo invadido pela imagem (televisão, vídeo, internet), a palavra ainda comanda. Nos contatos diários, profissionais ou pessoais, a palavra é soberana. Isso porque a palavra é a matéria-prima do pensamento. Conhecer a língua, saber falar corretamente para ser compreendido, questionar e raciocinar são pontos importantes. Afinal, dominar a palavra permite melhor controle do mundo ao seu redor.

“No princípio era o Verbo”. A palavra constrói e destrói. Portanto, ser dono de seus pensamentos é poder dirigir a própria vida e defender-se das manipulações econômicas, políticas e sociais que sofremos no dia a dia. A jornalista, artista plástica e roteirista Elvira Vigna discorda em achar que nossa época é do apogeu da imagem. “Acho que nossa época matou a imagem. Fez isso ao elegê-la como a linguagem preferencial da comunicação social. Nesta função, a imagem precisou se tornar cada vez mais eficiente. Ter menos possibilidade de erro. Precisou ficar mais rasa, mais rápida. Ser entendida da mesma forma por mais gente. Não propõe um diálogo. Segue normas. De perfeição. É autoritária. E burra. O que nos salvará a todos é a arte contemporânea. Opaca, complexa, dúbia. Efêmera. Imperfeita. E inteligentíssima. Sempre com um texto escondido. Às vezes com um texto às claras”.

A leitura, além de dar asas à imaginação, é ponte que conduz ao conhecimento. O hábito de ler é fundamental para as pessoas desenvolverem a capacidade de pensar, refletir e argumentar. Quem não lê, não desenvolve idéias e, conseqüentemente, não consegue se comunicar com os outros. Ler, portanto, é um ato de libertação. É emancipação. O escritor Mark Twain chegou a dizer que “o homem que não lê bons livros não tem nenhuma. “Ler é a arte de mastigar com os olhos e ver com os ouvidos”, lembra Carlos Nejar. E esta arte carece de incentivo desde o berço.

A falta de intimidade com a leitura entre os alfabetizados é um problema que aflige o mundo há tempos. Em 1936, Mario de Andrade, então criador do Primeiro Departamento de Cultura de São Paulo, já dizia: "A disseminação no povo do hábito de ler criará fatalmente uma população urbana mais esclarecida, mais capaz de vontade própria, menos indiferente à vida nacional."

Segundo teoria de Monteiro Lobato, um país se faz de homens e de livros. O que nos dias atuais pode se considerar uma oportunidade que foge da realidade do Brasil. Muitos relacionam a falta de incentivo por parte dos pais e das instituições escolares, e até mesmo o fato de que nem todos que apreciam o hábito da leitura têm condições financeiras de comprar uma boa obra literária. Além das condições financeiras em adquirir livros - por parte de quem já gosta de ler - outro ponto que influencia o desinteresse ou incentivo pela leitura, e conseqüentemente as vendas nas livrarias, é a falta de campanhas de incentivo à leitura por parte do governo e seus educadores e dos pais que também não mantêm o hábito de ler.

O professor de português Pasquale Cipro Neto afirma que o exercício que não pode faltar no aprimoramento do idioma é o ato de ler. E reconhece a dificuldade que envolve a leitura, principalmente na vida atual. "Ler é uma atividade penosa, exige concentração, silêncio, raciocínio, solidão. Ler não se faz com a galera, com a turma. Hoje as pessoas vivem em bando e tudo tem que ser feito em bando. Ler não é algo que se faz em bando. É o oposto disto. Em tempos de vida moderna, do celular, cadê a concentração? Cadê a solidão? Nestes tempos, ler é difícil", conclui. O professor acredita que há muita hipocrisia. Não se enfrentam as coisas como elas são. "As pessoas querem o tempo todo confusão, se afastam de si, têm medo delas mesmas. Neste contexto não há espaço para a leitura."

“Ler é uma ação individual, solitária e alienante do seu em torno. É seu maior problema e sua maior qualidade. É o contrário do que se dá na tela anterior, a da televisão, que permite o ´ver junto´. Ninguém lê junto. Ninguém senta junto no computador. Ninguém pensa junto. Compartilha-se. É diferente. E muito, muito melhor. O mundo melhorou. A tecnologia atual é melhor do que a anterior. Por exemplo, a questão da imposição cultural. Não há muita defesa contra sitcoms. Mas enquanto se falar `eu deletei`, quem tem de se defender é o inglês”. O assunto merece mais discussão. Vamos voltar a escrever sobre a força da palavra brevemente, aguarde.

03 julho 2006

Há 50 anos a poesia concreta acaba com o símbolo, o mito e o mistério

O movimento de poesia concreta – que completa 50 anos agora em 2006 – alterou profundamente o contexto da poesia brasileira. Procedeu a revisões do nosso passado literário. Pôs idéias e autores em circulação. Colocou problemas e propôs opções. O ponto crucial da poesia concreta era a sua relação direta com uma vanguarda estética, ou seja, com o experimento de novas formas, nunca empreendido no Brasil. O Concretismo seria, assim, o primeiro movimento brasileiro que – ao contrario de outros e do próprio Modernismo – não se ajustava ou não se atualizava em relação a movimentos alienígenas, mas dava um passo a frente, autonomamente, a procura de renovação.

No plano nacional, o movimento tomou o diálogo com 22, interrompido por uma contra-reforma convencionalizante e floral. Ofereceu, pela primeira vez, uma totalização critica da experiência poética estante, armando-se de uma visada e de um propósito coletivos. Pensou o nacional não em termos exóticos, mas em dimensão critica. No plano internacional, exportou idéias e formas. Com o Concretismo – e ninguém pode negar tal fato – passamos de país importador a país exportador de experiências estética, e não foi à-toa que um pensador da linguagem de Max Bense se deteve no primeiro movimento da nova poesia brasileira. E sob este aspecto historicista, o Concretismo deve ser considerado realmente uma vanguarda poética.

Em dezembro de 1956 foi inaugurada nos salões do Museu de Arte Moderna de São Paulo, a I Exposição Nacional de Arte Concreta. Tomavam parte pintores, desenhistas, escultores, gravadores e os poetas Décio Pignatari, Haroldo de Campos, Augusto de Campos, Ferreira Gullar e Wlademir Dias Pino. Eles apresentavam ao público suas primeiras produções no terreno novo. Dois meses depois a exposição era transferida para o Rio de Janeiro. A cisão do movimento entre paulistas e cariocas (residentes) se deu em junho do mesmo ano, por não concordarem Reynaldo Jardim, Ferreira Gullar e o critico Oliveira Bastos com uma certa ortodoxia teórica, mantida por aqueles, quando defenderam em artigos a estrutura matemática do poema concreto, eliminando deste modo a sua tradicional referencia subjetiva. Para os poetas cariocas, o poema não vive apenas no espaço gráfico, ultrapassa-o, tem um tempo onde a palavra significa uma experiência e não apenas uma relação fria entre objeto e vocábulo.

Desta cisão e desenvolvendo estes pontos de vista, sairia o movimento neoconcreto, encabeçado pelos poetas do Rio que também teve exposição. A mostra Neoconcreta foi realizada entre os fogos dos debates e recebeu a adesão dos escultores Amílcar de Castro e Franz Weissmann, da pintora e gravadora Lygia Clark e Lygia Pape com poemas de Reynaldo Jardim, Ferreira Gullar e Theon Spanudis. Estava encerrado um ciclo inicial de polemica que tinha por base a luta pela afirmação e vulgarização dos movimentos.

Em 1954 o livro de poesia de Ferreira Gullar, A Luta Corporal surgia como o primeiro documento (alguns trabalhos) de uma experiência pessoal e isolada de sentido concretizante onde mais acentuadamente do que em qualquer outro poeta, ele procura dissolver a frase, quebrar o discurso, as próprias palavras com o propósito de criar objetivamente novas relações entre os elementos sintáticos, ou mesmo de romper com a própria sintaxe. E o espaço gráfico começa a ter também uma função orgânica no poema.

Não interessa se, algum tempo depois, Ferreira Gullar tenha repudiado essas experiências ou tentado dar-lhes uma conotação diferente, mas o fato é que na época do Suplemento Dominical do Jornal do Brasil (que desde 1956 publicava artigos e teorias sobre os processos da corrente de vanguarda), Gullar fazia questão em ser apontado como o primeiro poeta novo a romper com o verso e a fazer experiência espacial. Isto para não dar aos paulistas a primazia histórica do fato. Salienta-se ainda que Ferreira Gullar desconhecia totalmente, na época da publicação de seu livro, as experiências mais avançadas dos autores estrangeiros como também desconhecia a experiência do grupo de poetas de São Paulo que há muito estudava as possibilidades renovadoras da linguagem poética já por volta de 1950.

Na Bahia a produção foi isolada. Nos anos 50 foi liderado por Clarival Valadares. Em 1959 Glauber Rocha escreveu um artigo falando de seu interesse pelo Concretismo. Mais tarde surgem os trabalhos de Erthos Albino de Souza, alem da influência geral de Gilberto Gil e Caetano Veloso que retomaram muitas das proposições da poesia concreta e da literatura concretista da obra de Oswald de Andrade. No seu disco Araçá Azul, Caetano musicou versos do poeta Sousândrade e dedicou uma faixa a Augusto de Campos. Nos anos 70 depois de uma exposição comemorativa dos 20 anos de Poetamentos, surge a revista Código com ensaios de vários poetas
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