21 outubro 2021

Amor de mar, amor Odemar (18)

Ele chegou

no momento certo.

Precisava de

uma mão

para segurar.

Um ombro

para abraçar.

Alguém

para poder falar.

E como eu falava.

Ele escutava,

me alimentava,

me protegia,

me amava.

Nunca mais

lembrei

de minha vida

antes dele.

Sua presença

preencheu todo o vazio.

Depois que ele se foi

deixou Niquita

para eu nunca

esquecer o seu amor.

 

Para psiquiatra inglês Colin Murray Parkes, o luto é o preço que se paga pelo amor, por uma vida feliz. É assim que ele impulsiona seus pacientes a não esquecer, mas seguir com a boa lembrança. Para ele, o luto é uma importante transição, pode ser um momento para recriar a própria história, diz.

O amor é um risco que vale a pena correr.




Dizem que a morte é o fim, mas não é. Para quem ficou parece que a dor nunca se acaba

A idealização a qual submetemos um parceiro, onde por vezes cobramos ao outro se encaixar nas nossas expectativas. Os defeitos e preconceitos que carregamos, muito além da ideia vaga de um completar o outro numa utopia incoerente. As vezes temos dias ruins no trabalho, as vezes acreditamos que o que fizemos foi suficiente por um dia, as vezes não estamos bem com o nosso próprio ”eu” e não é possível lidar com o outro.

 

Descobrimos muito mais sobre nós mesmos apenas conversando sobre assuntos que tipicamente cotidianos e, com nossas conversas, a gente também aprendeu como se desprender de amarras sociais pode nos fazer viver experiências únicas.

 


Estar com Odemar mudou minha qualidade de vida. Sua chegada me iluminou. Ele era uma pessoa humanista, se importava muito com o próximo. Nos ganhamos a vida com o que recebemos mas e vivemos s vida com o que damos. Odemar deu muito mais do que recebeu, ele melhorou nossas vidas. Minha e da comunidade. Ele sempre estará comigo. Viverá em minhas memórias.

 

O mar foi se aproximando

molhando meus pés,

pernas, corpo e cabeça,

e em cada onda, uma suspeita.

Não queria mais sair dali,

queria fazer uma ode ao mar sem fim

ou seria Odemar um amor em mim?

 


Queremos ser amados, amar, compartilhar a vida com alguém que sinta prazer em estar na nossa companhia.

 

Ele foi a descoberta mais importante em minha ida. Um sentimento que surgiu e me iluminou. Um mor tão forte que me fazia viver com mais intensidade!

 

A vida é um fenômeno rápido, e o amor faz parte, nos ensina que não se trata de domínio e de posse, mas de uma entrega que ultrapassa qualquer limite do bom senso ou da razão.

 

Existe a dor de viver para morrer como uma flor que um dia foi semente. A travessia, no entanto, não é só feita de dores; existem tantos outros odores, e cores, e tantas outras belezas mordidas pela morte no mundo. Basta vivê-las! Estou tentando, mas é muito difícil.

20 outubro 2021

Amor de mar, amor Odemar (17)

 

Uma vez um poeta Fernando Pessoa disse: "Não fazemos amigos, reconhecemos". O reconhecer está em enxergar no outro, o que quer, deseja, aspira da vida, afinidades, medos, angústias, ou apenas uma admiração, ou de ser o como o amigo é...ser reconhecido por eles como alguém, existir.

 

“Tenho oito anos, eu vim contar como era conhecer Odemar. Não sei quantos anos conheci ele, parece três ou quatro anos. Ele era muito legal, engraçado, simpático, gentil e muito alegre. Gostava muito das comidas dele, tipo coxinha e mais, ele tem uma cachorrinha muito legal. Ela gosta de carinho, engraçada. Ainda Odemar se vestia muito bem...ele tem uma casa de praia e limpava a piscina pra eu tomar banho e é isso, um beijo” (Beatryz Bispo, mas conhecida como Bia).

 


“Penguem. Assim que eu o chamava. Um cara gente boa. Quando ele gostava, falava tudo o que realmente a pessoa queria ouvir. Comigo não tinha papas na língua. Minha mãe o admirava muito, pois várias vezes dava conselhos e também dava muitas rizadas. Era um chefe na cozinha e um estilista, pois confeccionava roupas para minhas filhas e para mim. Não era para todos que ele se propunha a fazer. Nos 15 anos da minha filha mais velha ele fez um bolo lindo, sem que eu pedisse. Ele me dizia gostar de mim de graça, me defendia se alguém falasse de mim. Nossas farras na Feira de São Joaquim...saia para comprar caranguejo e acabava nos numa barraca tomando umas geladas. Pra mim ele continua vivo no meu coração. Agradeço a Deus por ele ter sido meu amigo” (Conceição, moradora do bairro da Saúde)

 


“Estudei com ele no colégio em Vitória da Conquista. Ele era três cursos mais adiantado do que eu e também mais velho. Morávamos duas ruas de diferença no mesmo bairro. Uma irmã dele ficava muito lá em casa e ele gostava muito dela, Lora. Nos encontramos em Salvador por acaso no bairro da Saúde, 12 anos depois. Bebemos muito juntos, muitos carnavais, muita relentagem nas ruas e um amigo de coração. Todo dia lembro como também outros amigos inesquecíveis pela maneira de ser. Amigo, chegava junto quando precisava e nós dois gostávamos muito de resenhar sobre a vida dos outros, ou seja, fofocar. Que ele fique om Deus que merece! (Paulo Cesar Faria, morador do bairro da Saúde).

 

Gratidão

 

Dema,

queria agradecer

sua amizade.

Quero eternizar

nossa parceria.

Quero perfumar

toda essa energia.

Sem você

meu caminho

não seria forte.

Sua doação

é meu espírito,

meu norte.

Agora estou só,

desamparado,

quieto,

desorganizado.

Só o tempo

dirá o que fazer,

mas meu coração

foi sempre de você.

 

Ele se foi mas deixou um pouco dele em Niquita, sua cachorrinha, ou melhor nossa. Com ela o sentimento é de afinidade intima, de solidariedade indiscutível. Ao abanar o rabo com intensidade expressa sua alegria. Seu amor é incondicional. A cada carícia sentimos seu coração agitar-se. Sua nobreza e bondade não tem limites.

 


Cheiro

Quando levamos nossa cadela Niquita para passear bem cedinho, ela fareja o meio fio, as pedras e as árvores, a fim de saber exatamente que cachorro passou por ali antes, sua idade, sexo, temperamento, estado de saúde e quando passou pelo local pela última vez. Esse procedimento e a mesma coisa que ler um jornal de manhã. Essas narinas revelam-lhe as trilhas invisíveis dos outros cães. Outra novidade é que Niquita adora ficar na janela vendo a banda passar...

 

19 outubro 2021

Amor de mar, amor Odemar (16)

 

“Se lembra quando a gente chegou um dia a acreditar/Que tudo era pra sempre/Sem saber/

Que o pra sempre/acaba...” (Por Enquanto (Renato Russo)

 

“Eu vim/Vim parar na beira do cais/Onde a estrada chegou ao fim/Onde o fim da tarde é lilás/Onde o mar arrebenta em mim/O lamento de tantos "ais".”(A Paz, Gilberto Gil e João Donato)

 “Amores são águas doces/paixões são águas salgadas/queria que a vida fosse/essas águas misturadas” (Memórias das Águas, Roberto Mendes e Jorge Portugal)



“Odemar era carinhosamente chamado pelos amigos de Dema, uma pessoa alegre e divertida. Nos dias de bebida no bar com a turma nos distraia com suas histórias e seu humor. Chamava a gente de `biba` (viado) e nos fazia rir. Nesse período de Covid nos deixou abrindo uma grande saudade e um vazio para a turma do álcool. Deixou boas lembranças que nunca será esquecido. Da última vez que vi passeava com a cachorrinha dele da qual não deixava ninguém chegar perto. Um jeito único de ser e de fazer a gente sorrir. Com sua fisionomia que lembrava Renato Russo, assim é a imagem que tenho dele. Irônico e verdadeiro e sem papas na língua, falava o que pensava, pois melhor seria não brincar com a língua dele. Boa pessoa´´ (Andre Luis Rodrigues Santos, autônomo).

 


Arredio!

 

Nós nos respeitávamos. Ele era um artesão que sabia como viver bem sem fama e sem dinheiro. Mas sabia viver, livre, leve e solto. Eu, por outro lado, um pouco mais pesado (pesadíssimo, estressado e ansioso como quase todo jornalista), sobrecarregado, responsabilizado. Tendo uma família conflituosa onde tento pesar os pros e contra. Mas Dema me fazia sair daquele meio e me aprofundar naquilo que amo – os quadrinhos, cinema, música e literatura, as artes. No  tempo em que vivíamos juntos ele sabía tudo  sobre minha família, participava, ajudava, interagia. Já sobre a família dele, era tudo mistério. Pouco se sabe ou sabia. Parece que ele gostava e manter a família distante. So ocasionalmente via (final de ano, por exemplo). Conquista? Esqueceu, dizia que odiava frio! Ele era arredio (como definiu uma criança paulistana, filho de Sonia), não tocava no assunto. Eu, por outro lado, também não tinha lá muitos interesses, já andava ocupado demais com o trabalho, e o tempo que restava era para ficarmos juntos. E assim, se passaram 40 anos...quatro décadas de aventuras, desafios, risos e choros, abraços, muitos abraços (mesmo ele sendo aquela pessoa que não gostava do tipo que conversava pegando nele, detestava, ou mexendo nas panelas enquanto cozinhava). Adorava beber uma cervejinha como todo brasileiro. Eu sempre odiei bebida, mas batava um gole e já estava grogue...Agora, de olho no passado, noto que tudo passou tão de repente...como num piscar de olhos. A vida é assim, breve como um sopro

 

Você sempre foi

meu abrigo,

meu amigo,

meu amor antigo,

meu bem maior

e mais bonito,

parecia ser infinito,

mas você ganhou asas

e sumiu, sem pena.

Virou poema.

18 outubro 2021

Amor de mar, amor Odemar (15)

Ele era de fina estampa,

espalhou encantos,

verdadeiro cavalheiro

reluzente,

sempre contente,

e de bem com a vida,

disseminou alegria

onde passava,

ajudava

a todos que podia

e não se despedia

pois sempre voltava

com ternura e harmonia.

 

“Conheci Odemar em 1985 quando minha mãe comprou uma casa na Rua do Alvo, e essa casa veio com um piano antigo. Nós iríamos joga-lo fora, quando uma moça chamada Mari, estudante de música, resolveu comprar. Ela morava em frente a nossa casa. Um amigo comum chamado Juraci nos apresentou a Odemar, estava junto com ela. Ali começou uma grande amizade. Tempos depois Juraci me levou na casa do jornalista Gutemberg, pois estava iniciando na música e ele me levou para comprar alguns discos. Foi quando descobrir que Odemar e Gutemberg moravam juntos.

 


“Então comecei a frequentar a casa deles. Tínhamos muitos amigos em comum. Odemar costurava muito bem e fazia umas camisas de viscose flower power que me lembrava as roupas de Jimi Hendrix que sou fã, e comecei a comprar, e assim a amizade foi se consolidando. Começamos a sair para as festas na casa de Márcio e beber em bares e lavagens da Bahia. Os anos foram passando e a amizade cada dia mais forte. Nunca na vida conheci alguém tão fiel e verdadeiro em meus momentos difíceis. Sempre me ajudou, mas não queria que ninguém soubesse. Quando resolvi montar uma barraca de frutas, ele me mostrou todos os lugares na Ceasa e São Joaquim, pois conhecia como ninguém.

 

“Foi a primeira pessoa a me dar força nesse projeto. Vou ter uma eterna gratidão. Não posso esquecer de falar do talento dele na cozinha. Tem dois pratos que não como mais, pois só ele sabia preparar: Teiú (moqueca) e carne de jaca que ele fazia. Duas delícias. Foi um grande conselheiro, um amigo e com já falei, a referência de fidelidade do meu filho é Odemar, nunca vi igual. Saudade do meu amigo” (Derval Bastos dos Santos, autônomo)

 


De onde vem a calma (Los Hermanos)

 

De onde vem a calma daquele cara?

Ele não sabe ser melhor, viu?

Como não entende de ser valente

Ele não sabe ser mais viril

Ele não sabe não, viu?

E às vezes dá como um frio

É o mundo que anda hostil

O mundo todo é hostil

De onde vem o jeito tão sem defeito

Que esse rapaz consegue fingir?

Olha esse sorriso tão indeciso

'Tá se exibindo pra solidão

Não vão embora daqui

Eu sou o que vocês são

Não solta da minha mão

Não…

  

17 outubro 2021

Amor de mar, amor Odemar (14)

 

O cineasta espanhol Luis Buñuel (1900-1983) dizia que amor e revolta eram as palavras mais revolucionárias que existiam. O amor erótico tem um poder revolucionário tão forte e desestruturador quanto qualquer revolta. Não é à toa que governos de ditadura, tanto de direita quanto de esquerda, tentam a todo custo higienizar os costumes, tornando as pessoas assépticas e consequentemente mais dóceis, submissas e passivas. O final do filme, Esse Obscuro Objeto do Desejo (de 1977), é premonitório, revelando sua perplexidade diante dos atos terroristas. Um alto-falante anuncia um ato terrorista do grupo extremista Brigada do Menino Jesus, enquanto o casal central (um senhor burguês e sua jovem amante pobre) passa por uma vitrine na qual uma mulher costura um véu ensanguentado. Os dois começam a discutir quando outra bomba explode, tirando a vida do casal. O amor, como um ato devastador de subversão, é punido por uma sociedade que só conhece o ódio. O caos reina, enquanto um vírus dizima a população de Barcelona.

 

Somos um simples grão de areia. Cada pessoa que passa pela vida é única, tem DNA e precisa fazer que sua vida faça sentido. Ninguém passa por nossa vida em vão. A diferença é que algumas pessoas são possibilidades de felicidade, outras de lições.

 


Ele se dava por inteiro,

sabia dos temperos

e do vai e vem do mar.

Aprendia coisas da vida

para ajudar os desprotegidos.

Tido como muito sabido

Era simples, humilde, distinto.

Uma pessoa valiosa

gostava de prosa,

de bebida e de companhia.

Parceiro verdadeiro

levou no seu peito

ternura e gratidão

de um povo que ajudou

sem receber um tostão.

Agora companheiro morto

o silencio, alvoroço

perdi um grande amor,

sei que um dia

ele se tornará flor.

 

Cada um tem sua dificuldade e deve aprender a lidar com ela. Seres humanos não são perfeitos. Todos são capazes de superar seus limites se puderem compreender uns aos outros. Tenho dificuldade em sair sozinho, não consigo ir ao cinema, teatro, show, só, sinto-me perdido, apesar de gostar muito de ficar só para ler, escrever, ver filmes. em casa. Odemar, ao contrário, gosta de sair, só ou acompanhado, resolver problemas caseiros como cano de água quebrado, máquina de lavar roupa com defeito, lâmpada que não acende etc. Respeitamos nossas diferenças e conseguimos achar pontos comuns para viver uma grande amizade. Ser sensível com as diferenças, essa é a nossa lição.

 


"No amor não há inteligência nem estupidez. O amor é como um aroma, como um riacho, como a chuva. Sabe, minha querida, você chove em mim e eu, como a terra, recebo você ...". Essa foi a carta de Frida Kahlo para Josep Bartolí, pintor e escritor espanhol que lutou na guerra civil espanhola.

 

16 outubro 2021

Amor de mar, amor Odemar (13)

Energia

Nascemos para cuidar um dos outros. Cuidamos e somos cuidados desde o momento em que nascemos. Conectamos com a comunidade. Todas as vezes que servirmos a outro temos sentimentos de contentamentos. Generosidade é um bom exemplo de amor ao próximo. Sabemos que o coração manda na gente. Trata-se de uma onda portadora de amor, cuidado, paixão, compaixão. Afeta nosso corpo. Já a raiva nos deixa burros. Emoções positiva funcionam melhor, produz empatia. Todas as coisas são precedidas pela mente, guiadas e criadas pela mente. Tudo o que somos hoje é resultado do que temos pensado. O que hoje pensamos determina o que seremos amanhã. Nossa vida é criação de nossa mente. Você, o oceano, as estrelas...tudo é feito da mesma coisa, energia. Assim, tudo é pura energia. Então seja melhor no que puder ser.

 

Com você

cheguei a outra margem

que Guimarães Rosa escreveu,

tirei a pedra

do meu caminho

que Drummond se inspirou,

virei passarinho

como no poema de Quintana.

Mas estou com o poeta

Manoel de Barros:

“Ando muito completo

de vazios”

ou como encerrou

o soneto de fidelidade

do Vinícius:

“Mas que seja infinito

enquanto dure”.

 


Depoimento da jornalista carioca Alcidea de Oliveira: “Quando penso em Odemar Alves, a primeira palavra que me vem à cabeça é acolhimento. Um misto de muitos afetos, amizade, generosidade e uma alegria despojada de vaidade ou qualquer outra coisa que sempre me fazia ficar bem mais tempo que o programado ao lado dele. É estranho pensar que vou voltar a Salvador e não mais encontrá-lo. Que bom que a vida me deu esse privilegio de conhecê-lo, conviver (ai agora eu olho e vejo que foi tão pouco...), desfrutar do seu carinho, da sua alegria, do seu aconchego, que sempre rendia horas de conversas, às vezes madrugada adentro, tão cheias de gargalhadas que era a mais pura expressão da felicidade... Sempre que Gute perguntava de que tanto ríamos, era só motivo para mais risos ainda (lembranças que agora me fazem rir novamente, apensar de triste). Era mesmo sobre isso: felicidade de compartilhar momentos simples e bons! Por isso, eu quero falar com você mesmo, Dema, que resolveu partir tão cedo e dessa forma tão nada a ver.



Amigo dos bons, você, Odemar! Bom de ouvir, bom de falar sem papas na língua, bom de não julgar, um ser solidário por essência, sempre pronto a tornar o momento do outro mais leve. Bom de copo também, por que não? Quantas cervejas geladas na sala de casa, na barraca e no boteco do largo da Saúde, nas imediações da Praça Castro Alves, que a gente adorava parar! Que companhia impar no carnaval de Salvador você foi pra mim! Uma festa sempre! Como era bom encontrá-lo naquela multidão gostosa que só quem brinca ou brincou o Carnaval da Bahia sabe como é. Sempre tão parceiro, protetor, sabia exatamente onde parar em segurança para que a folia fosse só mesmo suor e cerveja ou também chuva se quisesse cair. Nunca tivermos problemas em tomar chuva no Carnaval. E tome-lhe cerveja, papo e gargalhadas. Riamos de tudo e de todos. Estar com você, Dema, era sinônimo de festa sempre! Que saudade, meu amigo! Também não dá pra negar, que mão boa pra cozinhar, meu Deus! Absurda disposição sua para estar com aquela mesa posta, lotada de delícias baianas de manhã bem cedinho, para que ninguém deixasse de se alimentar antes de descer para o fervo da Lavagem do Bonfim. Eu amava esse momento maravilhosamente delicioso! Quem poderia imaginar alguém disposto assim para preparar aquilo tudo e ainda por cima feliz da vida, todo pronto para brincar na melhor lavagem do planeta?! Caramba, tantas lembranças boas! Quantas habilidades, quanto talento, quanta criatividade! Sabe o Piolin, aquele palhacinho vermelho que você fez para experimentar e me deu? Está aqui enfeitando a minha bancada da sala até hoje, lindo, exatamente como você o fez e a Música batizou com o nome do palhaço que, segundo ela, dizia que a beleza está nas coisas simples! Tudo a ver com você, não é Dema? Ah, e a minissaia preta de pedrinhas coloridas, que você fez pra eu brincar o Carnaval, naquele ano de sei lá quando? Continua no armário, mesmo que as medidas já não me favoreçam nem para tentar entrar nela... Para mim, são afetos materializados, amor sem tamanho nem medida. Por isso seguirão comigo, como as melhores lembranças de você! Que a sua caminhada seja linda e cheia de luz tanto quanto foi a sua passagem por aqui, meu amigo! Obrigada, Gutemberg Cruz por me permitir viver tudo que vivi perto de vocês. (Alcidéa de Oliveira)

15 outubro 2021

Amor de mar, amor Odemar (12)

Complexidade da vida

 

A tristeza ainda está instalada por todos os meus poros. Sei que o amor só existe com a esperança. Enquanto existe um fio de esperança na gente, não tem como esquecer. È  difícil se acostumar com essa vida vazia. Ocupo minha cabeça procurando atividades novas para fazer. Ele era minha confiança, minha emoção, segredos e dia a dia. A vida fluía como um rio tranquilo, sem susto. Quando nossos olhares se cruzavam e ele estampava aquele sorriso meigo, tudo era azul. Não havia tempestade. Era uma rotina prazerosa. Eu com meus livros, quadrinhos e filmes e ele com sua variada gastronomia e essa aura iluminada em ajudar ao próximo. Era uma pessoa intensa com toda sua complexidade.

 

Ele tinha

uma fragilidade

que nos prendia.

Ele tinha

um carisma

que nos aproximava.

Ele tinha

uma timidez

que encantava de vez.

Ele tinha

uma gastronomia

que a todos unia.

Ele tinha

um olhar

somente para amar.

 

No relato de memórias da paulistana/baiana Sonia Martins:Não é fácil recordar e escolher as palavras para contar nossa amizade de 37 anos!!! Me mudei para Salvador no final de 1983, através do meu trabalho conheci Gutemberg, que trabalhava no caderno cultural do Correio da Bahia, eu enviava a programação e o material de divulgação de uma rede de cinemas. Logo nos conhecemos pessoalmente nas pré-estreias promovidas pela rede de cinemas. Em meados de 1984 voltei à São Paulo e não consigo me lembrar bem quando essa amizade começou a se estreitar.


 

“Depois me lembro de várias férias que tive o prazer de passar em Salvador, sempre hospedada em sua casa. Sempre muitas conversas e histórias, passeios, eu sempre descobrindo detalhes e encantos que só os moradores conhecem e eu tinha o privilégio de tê-lo me guiando e me apresentando a cidade.

 

“Atravessar a Praça Castro Alves, em pleno Carnaval, protegida por ele e Gutemberg, também tive o privilégio de viver e tem uma vivacidade em minha memória, assim como amanhecer na Praça para ver o encontro dos blocos na 4f de cinzas, toda essa magia da Bahia me foi apresentada por ele e seu amor pela folia e pelas festas de largo. Me lembro de como ele reclamava de como eu comia pouco, de que ninguém podia viver de alfaces, de como me mimava fazendo biscoitos de nata, farofa de cenoura, cuscuz e tudo mais que descobrisse que eu gostava de comer, E os maravilhosos acarajes e abaras que buscava na casa de Edina - pra mim!! De sua preocupação quando eu me demorava em retornar da praia.....

 

“E as recordações de suas visitas aqui em Sampa, na primeira vez, apesar de já ser final do inverno - ele detestava o frio - e fez muito - e ele pode curtir a noite todo encasacado, com peças confeccionados por ele. Nossas andanças pela noite paulistana - preferencialmente na cena underground -  e de como nos divertimos!

 


“Depois de alguns anos em que nos visitamos menos, retorno à Salvador em dezembro de 1999 para as férias de verão, agora com meu filho, na época com quase 3 anos. Imaginem dias deliciosos, imaginem um menino ocupando toda atenção e mimos possíveis. Nossos passeios pelo Pelourinho, mercado modelo e o encantamento do Arthur pelos tambores, pela capoeira fazia Odemar brincar comigo que eu nutria um amor tão grande pela Bahia que de alguma forma já tinha transmitido pro Arthur,

 

“Não me esqueço das broncas que tomei - estava tirando as fraldas de Arthur - e Odemar me dizia que eu enchia o saco que devia deixá-lo fazer xixi tranquilamente sem a neura do banheiro. Passamos dias lindos tanto em Salvador quanto na praia de Jauá, onde passamos a virado do ano.

 

“Retornamos mais em outras férias de verão e sempre curtíamos dias incríveis, poucos dias na cidade e corríamos para curtir o maravilhoso Recanto do Vento. Os dias vividos em Barra de Jacuipe, fazem parte das felizes lembranças da infância de Arthur. Sempre muito carinho, mimo, muita praia, piscina, brincadeiras, me lembro deles - Dema e Arthur - fazendo peixinhos e borboletas com as conchas pegadas na praia. Lembro-me dos fogos soltados na comemoração da vitória de Lula e do encantamento tanto de Odemar quanto de Arthur pelos fogos, ele brincava tão intensamente que se tornava um menino.

 

“Nossas conversas na rede ao final da tarde com o vento soprando, mas ele logo - inquieto como era- ia fazer alguma coisa: plantar, cuidar das flores, das frutas, do jantar.....Não sei se essas palavras conseguem descrever nosso vínculo e descrever como era esse homem incrível. Os poemas de Gutemberg o fazem com maestria. Um enorme abraço aos amigos e família, que nosso carinho por ele possa aquecer o coração de todos. (Sonia Elizabeth Martins)

 

14 outubro 2021

Amor de mar, amor Odemar (11)

 

“Quer dizer de uma pessoa que ouvimos falar pela primeira vez por nosso amigo Gugu? Dema, era assim que ele o chamava e todos nós aprendemos a chamá-lo assim também, mas quando Gugu estava aborrecido com ele por qualquer motivo o chama de Odemar (como estas coisas estão vivas em minha mente). Dema era um `ser´ único como todos nós, mas assim como nós, tinha suas características peculiares. Amigo de toda a criação divina, animais, plantas e do `ser humano´.

 

“Quando o vi presencialmente pela primeira vez (pois já o conhecia há muito pelas lentes de Gugu), lembrou - me as feições de um "anjo" pois apesar de adulto tinha cachinhos descendo pela sua testa, um sorriso de criança e a voz meio gozadora com um sotaque bem interior ano, um ar de timidez  que camuflava um espírito vivaz, experiente e sábio, com um olhar desconfiado que nos fitava profundamente como a querer nos dizer "sei o que você está pensando”. Com o tempo fui conhecendo seu lado prestativo, caridoso, despretensioso e serviçal, não serviçal no sentido de se curvar aos arrogantes e sim auxiliar àqueles que de fato necessitavam  de uma "mão amiga".


 

“Além de todas as virtudes e qualidades que era portador ainda não citei suas mãos de fadas para preparar alimentos, ótimo cozinheiro e doceiro, me paladar foi agraciado muitas vezes por lanches levados para nosso local de trabalho por Gugu, como: cocadas, bolos de vários tipos, cuscus de tapioca, doces diversos etc. Hj só em lembrar destas delícias fico com a "boca cheia d'água" e agradecida por ter tido a oportunidade de degustá-los.

 

“Lembro de certa vez ter ido visitá-lo no hospital por conta de uma cirurgia e passamos uma tarde agradável, nós dois, eu e Dema, pois o nosso Gugu parecia um vulcão preste a explodir de tanta ansiedade e Dema, rindo pedia para ele se acalmar, uma cena hilaria que guardo com carinho na minha memória, a cena de um amigo preocupado com a saúde do outro e o enfermo preocupado com a agonia do que estava saudável, uma demonstração de solidariedade recíproca. Odemar Alves e Gutemberg Cruz, foram amigos, companheiros irmãos aqui na terra e assim serão por toda a eternidade, pois onde Dema estiver tenho certeza que estará ajudando Gutemberg a conduzir sua Cruz, como sempre fazia aqui na terra”. (Lucia Maria Carvalho, amiga)

 


O amigo Fernando Moraes escreveu: Conheci Odemar no começo dos anos 90. Ele gostava de andar pelo bairro inteiro da Saúde, onde moramos e por isso conhecia muitos vizinhos. Nosso encontro se deu numa festa de uma conhecida, a quem chamávamos de Música. Era aniversário dela. Era uma festa bem reservada, para poucos convidados. Entre um papo aqui e outro vi que Odemar adorava filmes. Ficamos conversando sobre erros de cenas de filmes clássicos. A gente se divertiu relembrando gafes históricas da sétima arte.

 

“Meu pai era fã apaixonado por histórias quadrinhos e acompanhava uma coluna do jornalista Gutemberg Cruz que comentava sobre as HQS. Me pai havia dito que Gutemberg morava no nosso bairro. Eu também era fã de quadrinhos. Descobri onde o Gutemberg morava e fui até o seu apartamento conhecer sua coleção de revistas e de discos. Ao apertar a campainha, quem abra a porta? O Odemar! Já fiquei feliz em saber que tinha um amigo para me recepcionar. Adentrei no apartamento e ele me apresentou ao Gutemberg. Ficamos horas os três conversando. Odemar me convidou para almoçar com eles no dia seguinte e eu fui.

 

“Dentre tantas qualidades do ser humano que era o Odemar, ele também sabia cozinhar como ninguém. Ele mandava hiper bem na culinária e no artesanato. Quando soube que ele era um exímio artesão, pedi para que ele ensinasse a minha ex-mulher a aprender patinas e outras técnicas. E assim ele fez. Lembro que na primeira aula, um pedaço de madeira entrou no dedo da mão de minha ex-mulher. Tranquilamente, Odemar olhou a cena e disse a ela, que aquilo era a arte entrando no corpo dela. Morri de rir quando ela me contou isso!

 

“Os aos foram se passando e minha amizade cresceu com a dupla Odemar e Gutemberg. Adorava conversar com eles. Eu via mais o Odemar, porque sempre nos encontrávamos pelo bairro e a cada encontro, um bate papo. Passaria dias aqui escrevendo os momentos em que tive o privilégio de conhecer essas duas figuras maravilhosas. Incríveis parceiros. Era incrível a dedicação que o Odemar tinha pelo Gutemberg. Mesmo brincalhão, como era viso aqui no bairro, ele nunca admitiu que se mencionasse uma única ofensa ao Gutemberg. Tinha o maior respeito pelo parceiro.

 

“Ao tomar conhecimento da sua partida, em alguns segundos, um filme passou pela minha cabeça. Custei a acreditar. A ficha ainda está caindo aos poucos. É difícil aceitar a partida de uma pessoa tão cheia de vida, sem nenhum apego a nada material, que amava os animais e os amigos. Sabemos que a morte é a única certeza de que todos nós teremos um dia. Todo mundo irá morrer um dia. Mas, pessoas como Odemar, poderia ter ficado mais um tempo aqui ainda entre nós. Encerro desejando que vá em paz meu amigo e que Deus lhe dê o merecido descanso. Você merece. (Fernando Moraes, amigo)