30 novembro 2010

Depressão, a doença do século

Até bem pouco tempo pairava uma enorme confusão sobre o que atualmente se conhece pelo nome de depressão. Confundida com as crises de tristeza naturais e passageiras, ora com a manifestação de algum recôndito mal orgânico, a depressão nunca fora abordada de forma correta pela medicina. Não se acreditava tratar-se de um tema da Medicina, mas sim da Psicologia e até da espiritualidade. Muitos pacientes eram tratados como portadores de uma doença mental e, portanto, candidato a choques elétricos num hospício. Outros eram submetidos a sessões de psicanálise que poderiam, durar décadas sem fornecer alívio.


Considerada a doença do final do século passado, a depressão pode ser diagnosticada pela ocorrência combinada de quatro ou mais sintomas típicos que, juntos, durem, no mínimo, duas semanas: insônia, irritabilidade, fixação no suicídio e perda de apetite. Assim, a depressão tem fundo orgânico e acomete de 10 a 15 milhões de brasileiros em alguma fase da vida. Preocupado com a extensão da patologia, um grupo de psiquiatras de São Paulo – depois de cinco anos de estudos – decidiu caracterizar a depressão como uma alteração da velocidade dos processos mentais (raciocínio, memória, atenção e cognição), que se tornam lentos, associados à diminuição do ritmo de vida. O doente abandona o trabalho, fica muitas horas deitado ou sentado e tem poucas atividades.


A psiquiatra Florence Kerr-Corrêa, junto com os psiquiatras Giordano Estevão e Carol Sonenreich lançaram no início dos anos 90 o livro “Debate sobre o Conceito de Doenças Afetivas”, no qual propõem um tratamento mais preciso para o fenômeno. O tratamento sugerido pelo grupo inclui o uso de antidepressivos voltados para a normalização da velocidade dos processos psíquicos e o uso da psicoterapia para a recuperação do ritmo de vida do paciente. Para o psiquiatra baiano César Romero, a depressão “está ligada ao relacional, ou seja, às relações interpessoais. As pessoas reagem depressivamente às situações no casal, no social, no familiar, no profissional e também na compreensão do seu próprio eu. Nessa compreensão do seu próprio eu, seria uma relação intrapessoal, enquanto as outras interpessoal. As pessoas se deprimem muitas vezes por não conseguirem atingir suas expectativas, por errarem e não aceitarem o próprio erro, por não conseguirem concluir metas, não serem suficientemente fortes, não buscam ajuda e apressarem-se até a exaustão”.


Segundo o psiquiatra, a depressão é uma emoção chamada tristeza. Que toda vez que a gente expressa através do choro, melhora. Em casos graves é necessário o uso de medicação, especialmente quando pensa em suicídio. É bom lembrar que a falta de credibilidade dos políticos atualmente, a corrupção infestando o país e a violência geral fazem com que as pessoas percam as esperanças e aumentam muito os casos de depressão. As relações humanas se deterioraram muito através dos tempos.


Num país em que a tristeza é um substrato forte da cultura nesses tempos de crise e alta taxa de desemprego, cresce cada vez mais a depressão na população. Que o digam seus poetas e compositores. Em “Circulado”, Caetano Veloso retrata a desconstrução de um país esquizofrênico, de realidades divididas. “A mais triste nação na época mais podre compõem-se de possíveis grupos de linchadores”, canta. Já o grupo Legião Urbana distribuiu doses melancólicas em seu disco V. Renato Russo compôs letras onde menciona drogas, tristeza e melancolia: “Antes eu sonhava, agora já não durmo”.

A partir dos anos 80 a depressão virou moda e cresceu o consumo de antidepressivos. A AIDS surgiu como nova causa orgânica da doença e aumentaram os fatores psicossociais que podem, levar alguém a ficar deprimido, como a perda do emprego, da posição social e do poder aquisitivo. Com a difusão da doença, expressões como “estar de baixo astral” ou “deprê” incorporaram-se ao cotidiano fomentando o modismo. Mas os médicos alertam a diferença entre a pessoa se sentir desanimada, triste, entediada, deprê pela depressão onde a pessoa não quer viver mais. Enquanto no estado depressivo passageiro a pessoa sozinha pode sair dessa situação, na depressão o doente não consegue, pois a doença o domina. O melhor tratamento é o acompanhamento médico com orientação familiar.


Quando se torna crônica, a depressão fere forte – e nos períodos de crise elimina toda a criatividade. Depressivos ilustres foram, por exemplo, o compositor russo Tchaikosvski, o presidente americano Abraham Lincoln, o filósofo marxista francês Louis Althusser, a escritora inglesa Virginia Woolf, o escritor mineiro Pedro Nava, o escritor Charles Bukowski, a atriz Marilyn Monroe e o romancista brasileiro Graciliano Ramos. O romancista e ensaísta norte americano William Styron (autor de A Escolha de Sofia) conta em seu livro “Perto das Trevas”, como se curou da depressão que quase o levou ao suicídio. No livro ele defende os remédios antidepressivos com cautela, as terapias e até a hospitalização em, casos extremos, como o dele. Aos que sofrem com a depressão, aconselha: “Aguente firme”.

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Quem desejar adquirir o livro Bahia um Estado D´Alma, sobre a cultura do nosso estado, a obra encontra-se à venda nas livrarias LDM (Piedade), Galeria do Livro (Boulevard 161 no Itaigara e no Espaço Cultural Itau Cinema Glauber Rocha na Praça Castro Alves), na Pérola Negra (ao lado da Escola de Teatro da UFBA, Canela) e na Midialouca (Rua das Laranjeiras,28, Pelourinho. Tel: 3321-1596). E quem desejar ler o livro Feras do Humor Baiano, a obra encontra-se à venda no RV Cultura e Arte (Rua Barro Vermelho, 32, Rio Vermelho. Tel: 3347-4929.

29 novembro 2010

Corta essa

Cortar pode ser uma arte, seja na alimentação, na moda, no cinema, no esporte, música, teatro, na vida. O segredo de um bom churrasco por exemplo é a carne de primeira, de boa procedência e a forma do corte correto. Existem profissionais especializados em belas cortadas no vôlei. Para muitos o corte de cabelo na lua cheia crescente é uma prática simples e eficaz. Na moda o terno bem cortado, sob medida, é mais eficiente. Entre o corte e a costura existe toda uma técnica e habilidade que realça as qualidades da pessoa. No homem pode corrigir defeitos e na mulher, acentuar as formas.


Através de um estudo sobre o corte pode-se saber a prova do crime, a arma que provocou a morte. Um corte nas relações afetivas pode-se causar perdas e danos. O rompimento, às vezes, é a única solução. Todo tratamento psicanalítico pode sofrer um corte. No trânsito o corte significa ultrapassagem incorreta. Um bom planejamento estratégico faz previsão e orçamento, e para fazer um corte no orçamento e evitar surpresas desagradáveis, é necessário saber onde pode cortar.

No cinema muitas vezes a história é cortada ou contida graças ao corte. O diretor grego Costa Gavras comparece com seu mais recente título, O Corte. Fala de desemprego nos países ricos e desenvolvidos em tempos de globalização. Engenheiro sofre o “corte de pessoal” e dois anos depois, ainda desempregado, resolve eliminar seus concorrentes nas disputas por vagas no mercado: “por que não matar os potenciais concorrentes à mesma função?”. Filme contundente deste sistema neo-liberal.


Na música, “San Vicente”, Milton Nascimento e Fernando Brant, acordam de um sonho estranho: “Coração americano/acordei de um sonho estranho/um gosto vidro e corte/um sabor de chocolate/no corpo e na cidade/um sabor de vida e morte/coração americano/um sabor de vidro e corte//A espera da fila imensa/e o corpo negro se esqueceu/estava em San Vicente/a cidade e suas luzes/estava em San Vicente/as mulheres e os homens/coração americano/um sabor de vidro e corte//As horas não se contavam/e o que era negro anoiteceu/enquanto se esperava/eu estava em San Vicente/enquanto acontecia/eu estava em San Vicente/coração americano/um sabor de vidro e corte”.


“Você corta um verso, eu escrevo outro/você me prende vivo, eu escapo morto/de repente, olha eu de novo/perturbando a paz, exigindo o troco/vamos por aí, eu e meu cachorro/olha o verso, olha o outro/olha o velho, olha o moço chegando/que medo você tem de nós/olha aí”, é o “Pesadelo”, de Paulo César Pinheiro e Maurício Tapajós.


“Em caso de dor ponha gelo/mude o corte de cabelo/mude o modelo/vá ao cinema, dê um sorriso/ainda que amarelo/esqueça seu cotovelo//Se amargo foi já ter sido/troque já esse vestido/troque o padrão do tecido/saia do sério, deixe os critérios/siga todos os sentidos/faça fazer sentido//A cada mil lágrimas sai um milagre//Em caso de tristeza vire a mesa/coma só a sobremesa/coma somente a cereja/jogue para cima, faça cena/cante as rimas de um poema/sofra apenas, viva apenas/sendo só fissura ou loucura/quem sabe casando cura//Ninguém sabe o que procura//Faça uma novena, reze um terço/caia fora do contexto/invente seu endereço//A cada mil lágrimas sai um milagre//Mas se apesar de banal/chorar for inevitável/sinta o gosto do sal do sal do sal/sinta o gosto do sal/gota a gota, uma a uma/duas três dez cem mil lágrimas - sinta o milagre//A cada mil lágrimas sai um milagre” é a letra “Milágrimas” de Itamar Assunção e Alice Ruiz.

Já Cazuza cantou que “O Nosso Amor a Gente Inventa”: “O teu amor é uma mentira/que a minha vaidade quer/e o meu, poesia de cego/você não pode ver//Não pode ver que no meu mundo/um troço qualquer morreu/num corte lento e profundo/entre você e eu//O nosso amor a gente inventa/pra se distrair/e quando acaba, a gente pensa/que ele nunca existiu//O nosso amor a gente inventa, inventa/o nosso amor a gente inventa, inventa//Te ver não é mais tão bacana/quanto a semana passada/você nem arrumou a cama/parece que fugiu de casa//Mas ficou tudo fora do lugar//

café sem açúcar, dança sem par/você podia ao menos me contar/uma história romântica//O nosso amor a gente inventa/pra se distrair/e quando acaba, a gente pensa/que ele nunca existiu”


No teatro, o dramaturgo Plínio Marcos fez um retrato naturalista do submundo brasileiro na peça “Navalha na Carne”. A violência das relações humanas, a situação opressora e a luta de cada personagem constroem um quadro cuja dramaticidade sobrevive ao tempo. Saindo do teatro e partindo para dança vamos observar uma dança lasciva que escandalizou a alta sociedade do início do século XX foi o corta jaca. Trata-se de uma dança rural que tem como característica os movimentos dos pés sempre muito juntos e a não flexão dos joelhos. Os movimentos de pés dão a impressão de uma faca cortando uma jaca.


Para encerrar, o corte nas artes plásticas. As obras de Amílcar de Castro (1920/2002) eram formadas por uma chapa de metal cortada ao meio e torcida em dois planos, para cima e para baixo, dialeticamente. Era um novo dinamismo de espaço. Nos anos 60 ele ampliou o alcance obtido pela orientação dos cortes e dobras.


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Quem desejar adquirir o livro Bahia um Estado D´Alma, sobre a cultura do nosso estado, a obra encontra-se à venda nas livrarias LDM (Piedade), Galeria do Livro (Boulevard 161 no Itaigara e no Espaço Cultural Itau Cinema Glauber Rocha na Praça Castro Alves), na Pérola Negra (ao lado da Escola de Teatro da UFBA, Canela) e na Midialouca (Rua das Laranjeiras,28, Pelourinho. Tel: 3321-1596). E quem desejar ler o livro Feras do Humor Baiano, a obra encontra-se à venda no RV Cultura e Arte (Rua Barro Vermelho, 32, Rio Vermelho. Tel: 3347-4929.

26 novembro 2010

Música & Poesia

Bahia de todas as contas (Gilberto Gil)


Rompeu-se a guia de todos os santos

Foi Bahia pra todos os cantos

Foi Bahia


Pra cada canto, uma conta

Pra nação de ponta a ponta

O sentimento bateu

Daquela terra provinha

Tudo que esse povo tinha

De mais puro e de mais seu


Hoje já niguém duvida

Está na alma, está na vida

Está na boca do país

É o gosto da comida

É a praça colorida

É assim porque Deus quis


Olorum se mexeu


Rompeu-se a guia de todos os santos

Foi Bahia pra todos os cantos

Foi Bahia


Pra cada canto, uma conta

Pra cada santo, uma mata

Uma estrela, um rio, um mar

E onde quer que houvesse gente

Brotavam como sementes

As contas desse colar


Hoje a raça está formada

Nossa aventura plantada

Nossa cultura é raiz

É ternura nossa folha

É doçura nossa fruta

É assim porque Deus quis


Olorum se mexeu




Coisas de Elisa Lucinda (enviadas pela amiga Cathy)



Remeta-me

os dedos

em vez de cartas de amor

que nunca escreves

que nunca recebo. Se meta na minha vida

outra vez meta

Remeta.


****


todo mundo beija

todo mundo almeja

todo mundo deseja

todo mundo chora

alguns por dentro

alguns por fora

alguém sempre chega

alguém sempre demora.

******

Paulo Leminski



Tudo em mim anda a mil

tudo assim tudo por um fio

tudo feito tudo estivesse no cio

tudo pisando macio tudo psiu

tudo em minha volta anda às tontas

como se as coisas fossem todas

afinal de contas.

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25 novembro 2010

Samba de roda: mais do que um gênero musical, é o nosso patrimônio humano

Já dizia nosso poeta Dorival Caymmi que “quem não gosta de samba, bom sujeito não é. É ruim da cabeça, ou doente do pé...". Os escravos precisavam de ânimo para enfrentar a dor da escravidão, então, inventaram um jeito próprio de fazer o corpo e a mente relaxar. Pouco importava se era na cozinha, na senzala ou nas plantações, mexer os quadris ao ritmo das palmas, batuques, cabaças e canções era a forma encontrada por eles de fazer o “sangue alegrar”. Assim nasceu o samba, que veio dos batuques e lundos.

O samba é a principal forma de música de raízes africanas surgida no Brasil. O gênero, descendente do lundu (canto e dança populares no Brasil do século XVIII), começou como dança de roda originada em Angola e trazida pelos escravos, principalmente para a região da Bahia. Também conhecido por umbigada ou batuque, consistia em um dançarino no centro de uma roda, que dançava ao som de palmas, coro e objetos de percussão e dava uma ''umbigada'' em outro companheiro da roda, convidando-o a entrar no meio do círculo.


RECÔNCAVO BAIANO - Mais do que um gênero musical, o samba é hoje parte pulsante da nossa identidade nacional. Miscigenado, o samba conheceu a força do povo baiano, que agregou ao ritmo, suas próprias vivências. O samba baiano apresenta formas variadas cujos nomes remetem às coreografias e aos ritmos musicais. Dentre alguns, destacamos: Samba de Roda, Samba de Chave, Samba Partido-Alto, Samba Batido, Samba Baiano e Samba Bate-pau.


Fortemente praticado nos municípios de Cachoeira, Santo Amaro, São Félix, São Francisco do Conde, e em todo o Recôncavo baiano, o Samba de Roda é “um dos fundamentos de uma grande manifestação muito mais complexa, que é o samba brasileiro em seu todo. E, mais que isso, é a fonte, a matriz preservada de onde emana toda a grandeza dessa expressão musical”, disse o Ministro da Cultura, cantor e compositor baiano, Gilberto Gil.


TRADIÇÕES CULTURAIS - Os primeiros registros dão conta, já com nome e com muitas das características que ainda hoje o identificam, que o Samba de Roda data dos anos de 1860. Desde estes registros, já se testemunha a ligação do Samba de Roda a tradições culturais transmitidas por africanos escravizados e seus descendentes. A herança negro-africana se mesclou a essa variante do samba de maneira singular a traços culturais trazidos pelos portugueses, como certos instrumentos musicais, viola e pandeiro, principalmente, e à própria língua portuguesa e elementos de suas formas poéticas.

O próprio Samba de Roda possui inúmeras variantes, que podem, grosso modo ser divididas em dois tipos principais: o Samba Chula e o Samba Corrido. O primeiro é mais típico da região de Santa Amaro, e cujo similar, na região de Cachoeira, chama-se “barravento”, neste ninguém samba enquanto os cantores principais estão “tirando” ou “gritando” a “chula” – nome dado à parte poética deste tipo de samba. No Samba Corrido o canto é mais tipicamente responsorial, alternando-se rapidamente entre um ou dois solistas e a “resposta” dos participantes. Aqui, a dança acontece ao mesmo tempo que o canto, e várias pessoas podem sambar de cada vez.


PRINCIPAL FONTE - Os historiadores da música popular consideram o samba de roda baiano a principal fonte do samba carioca, que como se sabe veio a tornar-se, no decorrer do século XX, um símbolo indiscutível de brasilidade. As famosas “tias” baianas tiveram papel de relevo na fase pioneira do samba no Rio de Janeiro nos anos 20. Depois disso, o samba de roda baiano continuou sendo uma das referências do samba nacional, presente de maneira mais ou menos explícita nas obras de Dorival Caymmi, Ary Barroso, Caetano Veloso assim como na ala das baianas das escolas de samba e nas letras de inúmeros compositores de samba de todo o país.


Por toda sua beleza, força, resistência, cultura e história, o Samba de Roda foi inscrito em outubro de 2004, no Livro das Formas de Expressão do Patrimônio Imaterial do Brasil. Em novembro do ano seguinte, também foi incluído pela Unesco na Terceira Declaração das Obras Primas do Patrimônio Oral e Imaterial da Humanidade.

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24 novembro 2010

De Paulo Afonso para o mundo: O Sertão Vermelho de Lampião

A prefeitura de Paulo Afonso está de parabéns. Juntamente com a Secretaria de Educação e Cultura e Secretaria de Serviços Urbanos deram apoio cultural a uma obra que está atravessando fronteiras. Trata-se de Sertão Vermelho 2 (formato 21 x 28 cm, 106 páginas), do roteirista Haroldo Magno e do desenhista Edvan Bezerra. Através da arte sequencial (histórias em quadrinhos) eles contam a saga de Lampião, o rei do cangaço pelo sertão da Bahia. Nesse trabalho eles contaram com a participação de artistas especialmente convidados como Júlio Shimamoto (Lídia e Zé Baiano: Beleza, traição e tragédia), Eugênio Colonnese (Corisco, o Vingador de Lampião) e Vítor Barreto (O Raso da Catarina). A capa é assinada por Rodolfo Zalla. A diversidade de estilos tornou a obra ainda mais interessante. Além de Lampião e Maria Bonita, aparecem nas histórias o padre Cícero e os cangaceiros Zé Baiano e Corisco, "o Diabo Louro".


Segundo a premissa do primeiro volume de só mostrar os fatos reais, baseando-se nas pesquisas dos mais sérios investigadores do tema (Oleone Coelho Fontes, Rodrigues de Carvalho, Ranulfo Prata, entre outros), Sertão Vermelho 2 apresenta a arte de Edvan que resgatou uma técnica há muito abandonada e pouco utilizada pelos quadrinhos brasileiros: a aquarela, produto utilizado nos anos 50. Este segundo volume eles mostram a origem, fator decisivo que levou Lampião a tornar-se cangaceiro, sua nomeação a capitão. Mostra a rixa entre famílias. O momento em que Virgulino Ferreira deixava de ser o sertanejo trabalhador para renascer como cangaceiro. A participação do Padre Cícero é destacada na promoção do posto de capitão; o Raso da Catarina é mostrado em toda a sua exuberância e agressiva beleza; uma cidade ribeirinha do São Francisco conhece o ferrete de Zé Baiano, a morte do bandoleiro do Papeú é recontada sob a ótica da polícia, e a vingança e morte do capitão Corisco, o Diabo Louro.


A linguagem utilizada por Haroldo é a sertaneja. O argumento é criativo e bem desenvolvido. Já o traço de Bezerra é ágil com destaque para o uso de aguados, técnica que lembra a aquarela e que deu um charme todo especial a alguns capítulos da trama. A representação da paisagem nordestina em suas múltiplas formas foi apresentada com uma fidelidade poucas vezes vista.

Os oito capítulos têm bom agenciamento narrativo com belas composições dos planos, fluência do argumento centrado na força do cangaço, e nos tons que dão força a obra. Há sequências de altas voltagens. A obra pode muito bem ser utilizadas nas escolas municipais para que o professor possa trabalhar conceitos como a mitologia brasileira do cangaço, a origem desse movimento e sua trajetória. Pode também servir para discutir temas como questão de traição, vingança, posse de terra, religião e política, entre outros. Trata-se de uma obra que vai fundo nas nossas origens, nos nossos dilemas. Uma obra que precisa ser mais difundida entre nós. Procure conhecer. E o terceiro volume já está sendo preparado com novas informações que marcaram o fenômeno do cangaço e deixaram profundos sulcos na memória do sertão.


Como todas as lendas que tendem a se tornar maiores que os fatos, Lampião e sua saga pelo nordeste brasileiro têm todos os elementos de aventura, romance, violência, amor e ódio das grandes histórias da humanidade. Jogado na clandestinidade após o assassinato de seu pai, Lampião foi o maior cangaceiro (nome dado aos fora-da-lei que viveram de forma organizada, no final do século passado na região do nordeste brasileiro) de todos os tempos. Ele percorreu sete estados da região nordeste entre as décadas de 20 e 30, levando sangue, morte e medo à população do sertão. Causou grandes transtornos à economia do interior e sua história é um misto de verdades e mentiras.

Grande estrategista militar, Lampião sempre saía vencedor nas lutas com a polícia, pois atacava sempre de surpresa e fugia para esconderijos no meio da caatinga, onde acampavam por vários dias até o próximo ataque. Apesar de perseguido, Lampião e seu bando foram convocados para combater a Coluna Prestes, marcha de militares rebelados. Em 1929 ele conheceu Maria Bonita e foram viver pelo agreste sertão. Lampião é odiado e idolatrado com igual intensidade, estando sua imagem viva no imaginário popular mesmo após 69 anos de sua morte. Sua influência nas artes – música, pintura, literatura, cinema e quadrinhos – é impressionante.


As causas do surgimento do cangaço foram de natureza variada. A pobreza, a falta de esperanças e a revolta não foram as únicas. Isso é mais que certo. Mas foram estas circunstâncias as mais importantes para que começassem a surgir os cangaceiros. Muitos, como dissemos, eram pequenos proprietários, mas mesmo assim tinham que se sujeitar aos coronéis. Do meio do povo sertanejo rude e maltratado surgiram os cangaceiros mais convictos de que lutavam pela sobrevivência. “Se não me dão os meios de conseguir, eu tomo”, pareciam dizer.


Virgolino Ferreira era um trabalhador. Do tratamento duro e injusto que o trabalhador Virgolino Ferreira e sua família receberam surgiu Lampião, o "Rei do Cangaço". Lampião nunca foi um líder de rebeliões ou um ídolo que servisse para a formação de camponeses revoltados. Política nunca foi parte de sua vida. Mas as populações humilhadas e ofendidas viam em Lampião um exemplo, naquele meio termo entre temer o que ele era e querer ser igual a ele, quase a justificar sua existência de bandoleiro errante. (Este artigo foi publicado em 2005, e agora republicado a pedidos)

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23 novembro 2010

Mordaça brasileira

Há 590 anos, quando o Brasil ainda era adolescente, nasceram nossas primeiras regras de censura. Isso mesmo, em 1517 os portugueses começaram a montar o tripé institucional que regulamentaria a censura na metrópole (e consequentemente na colônia) até 1768. Juízes eclesiásticos denominados Ordinário, representantes do Estado absolutista (cuja instituição era chamada de Mesa do Desembargo do Paço), e pelo Santo Ofício da Inquisição. Era essa a estrutura formada para censurar.


A censura nesses primeiros séculos, tanto no Brasil quanto em Portugal, seguia ditames religiosos, amordaçando grandes literatos como Gil Vicente e até Camões. Segundo as professora de Historiada USP, Maria Luíza Tucci Carneiro, “o argumento usado para apreender e queimar livros é que eles feriam a verdadeira fé católica. É uma luta contra o herege, o inimigo número um deles”.


A repressão só começaria a mudar de ritmo com a ascensão do marquês de Pombal ao poder português. Assim, o ministro do rei dom José 1º cria, em 1768, a Real Mesa Censória, instituição formada por leigos e religiosos que passou a regulamentar as perseguições oficiais. “A censura ganha um tom político” conta Maria Luiza.”Perseguia não mais o cristão-novo, mas os maçons, que representavam a trama de algo secreto contra o governo, os teóricos da Ilustração, como Voltaire, e os jesuítas, grandes inimigos de Pombal”.


Essa nova censura política se estenderia ao Brasil, que só deixou de espelhar as práticas censoriais portuguesas depois de 1808, com a abertura dos postos e o nascimento oficial da imprensa no país. E a mordaça no Brasil não parou mais. Um mês depois da Proclamação da República, em 1889, já existia um decreto restringindo a atuação da imprensa. Em 1923 é decretada a Lei Adolfo Gordo (senador paulista) que cerceava a atuação da imprensa, e o alvo era os anarquistas e comunistas.


E como explicou a professora: “O século 20 é o auge da censura. E os seus dois grandes momentos são, claramente, o período Vargas, com o DIP e a polícia política atuando como aparatos censores e repressores,e, depois, a ditadura militar, sobretudo o período de 1968 a 1975”.”A censura é a mais forte arma que os regimes totalitários têm utilizado, desde a Antiguidade, para impedir a propagação de ideias que podem pôr em dúvida a organização do Poder e o seu direito sobre a sociedade.


Sempre, em todos os tempos, os homens que detêm a direção de um Estado se valem da força para fazer cair os que contestam a sua legitimidade. Pensar diferente foi considerado crime no Antigo Regime, na época moderna, como foi em vários períodos de nosso século”, escreveu a professora Anita Novinsky no capítulo “Os regimes totalitários e a censura”.


Quem deseja conhecer toda a trajetória da censura em território brasileiro não deve deixar de ler a obra organizada por Maria Luiza, “Minorias Silenciosas – A História da Censura no Brasil”, lançada pela Edusp, Imprensa Oficial de SP e a Fapesp. O livro reúne ensaios e depoimentos de 22 intelectuais de campos distintos. Trata-se de um time de historiadores, professores de literatura, jornalistas, sociólogos e educadores. Eles fazem uma analise sobre a censura à atividade intelectual e artística em diferentes momentos da história brasileira, desde o período colonial até os anos posteriores ao golpe militar de 1964.


“A repressão à liberdade não é só inerente aos governos autoritários – lembra José Mindlin na orelha do livro -, ela pode ter outras origens – a Igreja, a existência de classes mais fortes e mais fracas, e as injustiças da sociedade em geral”. “Se quisermos combater a censura, não será ridicularizando seus excessos, mas contestando o seu cerne”, afirma Renato Janine no prefácio da obra.

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22 novembro 2010

Ciência da rede avança cada vez mais

Um bom exemplo de que nossa vida está conectada a uma série de redes. No século 13, os inquisidores católicos perseguiam os heréticos medievais, pessoas que rejeitavam, entre outras coisas, a autoridade do papa. A Igreja Católica instruía os cruzados a matar todos os que viviam em vilas e cidades suspeitas de abrigar dissidentes. Esse foi só o começo e a igreja não conseguia destruir a rede de heréticos com destruição indiscriminada. Os massacres aleatórios conseguiram um alívio temporário, mas a heresia sempre ressurge.

Como a heresia se espalhava, os inquisidores decidiram encontrar uma maneira melhor de extirpar a epidemia herética. Escreveram manuais para inquisidores detalhando a melhor maneira de derrubar uma rede sem escala. O esforço deveria se dirigir a identificar os heréticos que visitaram o suspeito em sua casa, bem como os guias que os conduziam até lá. O importante são as conexões, não os nódulos. Assim mudaram seu estilo de punição com a doutrina de isolamento. Aqueles que tivessem contato com heréticos eram forçados a usar uma cruz amarela na frente e nas costas de toda vestimenta visível. Quem era visto com um portador dessas cruzes corria o risco de ser acusado de simpatizante pela heresia. Essa medida funcionou mas não deteve a disseminação da heresia.


Os inquisidores perceberam a importância das conexões da rede. Como a Internet, por exemplo que tem Yahoo e Napster funcionando como atalhos para conectar muitas pessoas por meio de poucos links. Assim, a heresia dependia das atividades de umas poucas pessoas influentes. E os inquisidores enviaram um espião para descobrir onde eles se escondiam. Vários frades dominicanos foram treinados na caça a heréticos para capturá-los. A operação custou muito para o Vaticano. Era a fórmula ideal que a Inquisição adotou para lidar com as redes sem escalas. Os inquisidores envolvidos eram conhecidos como pessoas que pensavam cientificamente. Afinal, os frades dominicanos era uma das ordens mais cultas. Diferente da Idade Média, as aplicações modernas da teoria das redes sem escala estão salvando vidas, tal como o controle de doenças.


Os sistemas complexos da natureza funcionam de forma similar a proliferação de heresias. A todo momento, centenas de moléculas do corpo ficam loucas e deixam de cumprir sua função original. O motivo de continuarem vivos por anos e anos é que a rede dentro da célula é dominada por “centros de distribuição” – as falhas aleatórias têm pouco efeito. Se alguém distribuísse as moléculas que servem de centros de distribuição, o resultado seria mortal. Bem no estilo do adolescente canadense que conseguiu paralisar algum dos maiores sites da Internet (incluindo Yahoo, Amazon e eBay) com seu computador ligado à rede. Graças ao avanço no entendimento das redes que está havendo uma revolução na biologia. Graças a ela temos hoje a lista dos genes humanos. A ciência das redes está mapeando as interações entre as moléculas dentro da célula e vai ajudar a desvendar, por exemplo, o que são as doenças.


A sociedade em rede tem cinco séculos de existência. Basta lembrar da Renascença onde os banqueiros já teciam sua rede financeira florescente. Os artistas, nesse período, armaram outra rede, sólida e influente, por meio do barroco, primeiro estilo internacional. Outra rede de sucesso: a ferroviária da Europa, iniciada no século 19 e teve vasta repercussão social. Dessa forma, a rede existiu em outros tempos e espaço. Agora a tecnologia da informação é a base para uma rede que tudo alcança no mundo todo. Milhões de pessoas estão unidas pelo e-mail, na Web. É a comunidade virtual. Baudelaire escreveu sobre o sentimento de se sentir sozinho no meio da multidão e ao mesmo tempo, e por isso mesmo, com ele virtualmente “linkado” na cidade moderna. Vivemos virtualmente, sempre fomos virtuais – o que nunca nos impediu de sermos reais.


A nova ciência pode ser aplicada a virtualmente todas as áreas do conhecimento. Todas as redes – sejam elas de computadores, pessoas, empresas ou moléculas – são frutos de uma rede intricada de ligações. A vida é fruto da interação de uma complexa rede de moléculas dentro das células. A economia é uma rede complexa de empresas e consumidores. A sociedade é uma rede complexa de pessoas conectada por laços de família, amizade e trabalho. A Internet é uma teia complexa de computadores conectados por fios. Todos fazemos parte, queiramos ou não, de várias redes.


Em seu livro “Seis Graus de Separação”, o dramaturgo John Guare apresentou a idéia de que cada um de nós está a somente seis apertos de mão de qualquer um dos seis bilhões de habitantes da Terra. O sociólogo americano Duncan Watts testou se isso seria verdade também em outras redes. Ele e colegas descobriram que redes tão diversas como a World Wide Web (ou WWW), os neurônios do organismo e os atores de Hollywood têm a mesma propriedade da rede social que nos une. Todos fazem parte do fenômeno conhecido como “mundo pequeno”. Nele, estamos todos a uma pequena distância de nossos pares de rede. Pouco importa se a rede é o bilhão de páginas da WWW ou 500 mil atores de Hollywood. Uma página de WWW está a somente 19 cliques de qualquer outra e um ator está a três apertos de mão de seus colegas. Todos fazem parte de várias redes. Até mesmo você caro leitor.

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Quem desejar adquirir o livro Bahia um Estado D´Alma, sobre a cultura do nosso estado, a obra encontra-se à venda nas livrarias LDM (Piedade), Galeria do Livro (Boulevard 161 no Itaigara e no Espaço Cultural Itau Cinema Glauber Rocha na Praça Castro Alves), na Pérola Negra (ao lado da Escola de Teatro da UFBA, Canela) e na Midialouca (Rua das Laranjeiras,28, Pelourinho. Tel: 3321-1596). E quem desejar ler o livro Feras do Humor Baiano, a obra encontra-se à venda no RV Cultura e Arte (Rua Barro Vermelho, 32, Rio Vermelho. Tel: 3347-4929.

19 novembro 2010

Música & Poesia

Maldição (Zeca Baleiro)


Baudelaire macalé luiz melodia

Quanta maldição o meu coração não quer dinheiro quer poesia

Baudelaire macalé

Luiz melodia

Rimbaud a missão

Poeta e ladrão escravo da paixão sem guia

Edgar allan põe tua mão na pia


Lava com sabão

Tua solidão tão infi-nita quanto o dia

Vicentinho van gogh luiza erundina

Voltem pro sertão pra plantar feijão

Tulipas para a burguesia


Baudelaire macalé luiz melodia waly salomão

Itamar assumpção o resto é perfumaria



Procura da Poesia (Carlos Drummond de Andrade)

Não faças versos sobre acontecimentos.

Não há criação nem morte perante a poesia.

Diante dela, a vida é um sol estático,

não aquece nem ilumina.

As afinidades, os aniversários, os incidentes pessoais não contam.

Não faças poesia com o corpo,

esse excelente, completo e confortável corpo, tão infenso à efusão lírica.


Tua gota de bile, tua careta de gozo ou de dor no escuro

são indiferentes.

Nem me reveles teus sentimentos,

que se prevalecem do equívoco e tentam a longa viagem.

O que pensas e sentes, isso ainda não é poesia.


Não cantes tua cidade, deixa-a em paz.

O canto não é o movimento das máquinas nem o segredo das casas.

Não é música ouvida de passagem, rumor do mar nas ruas junto à linha de espuma.


O canto não é a natureza

nem os homens em sociedade.

Para ele, chuva e noite, fadiga e esperança nada significam.

A poesia (não tires poesia das coisas)

elide sujeito e objeto.


Não dramatizes, não invoques,

não indagues. Não percas tempo em mentir.

Não te aborreças.

Teu iate de marfim, teu sapato de diamante,

vossas mazurcas e abusões, vossos esqueletos de família

desaparecem na curva do tempo, é algo imprestável.


Não recomponhas

tua sepultada e merencória infância.

Não osciles entre o espelho e a

memória em dissipação.

Que se dissipou, não era poesia.

Que se partiu, cristal não era.


Penetra surdamente no reino das palavras.

Lá estão os poemas que esperam ser escritos.

Estão paralisados, mas não há desespero,

há calma e frescura na superfície intata.

Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.

Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.

Tem paciência se obscuros. Calma, se te provocam.

Espera que cada um se realize e consume

com seu poder de palavra

e seu poder de silêncio.

Não forces o poema a desprender-se do limbo.

Não colhas no chão o poema que se perdeu.

Não adules o poema. Aceita-o

como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada

no espaço.


Chega mais perto e contempla as palavras.

Cada uma

tem mil faces secretas sob a face neutra

e te pergunta, sem interesse pela resposta,

pobre ou terrível, que lhe deres:

Trouxeste a chave?


Repara:

ermas de melodia e conceito

elas se refugiaram na noite, as palavras.

Ainda úmidas e impregnadas de sono,

rolam num rio difícil e se transformam em desprezo.

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