Seus personagens, habitantes da caatinga
seca e árida, passaram a apresentar a contradição do sul
maravilha e o mundo
bravo do sertão, principalmente mostrando nos personagens Zeferino e Graúna,
sendo que esta última ganhou cada vez mais espaço dentro do contexto das tiras
inicialmente dedicadas a Zeferino. Além destes há ainda o bode e a onça que são
resultado de histórias que ouviu do cantador que também cria bodes, Elomar,
conforme contou Henfil: “Ele me falava da sua afeição por alguns deles,
principalmente o Francisco de Orelana e enquanto ele falava, fui me lembrando
do meu pai, todo o meu passado foi voltando. Quando tive de criar a história eu
não sabia bem o que fazer, sabia apenas que os meus símbolos deveriam ser bem
brasileiros. Surgiu assim, tudo de repente, e depois eu pesquisei, li Os
Sertões, literatura de cordel...”.
Na galeria de personagens criados pela
genialidade de Henfil, os Fradins têm um lugar especial. Eles nasceram por
imposição de Roberto Drummond, editor da Alterosa, e foram inspirados em dois
freis dominicanos mineiros. O Cumprido é o religioso carola e careta, covarde,
mas também lírico, romântico e sonhador. Já Baixim é o Henfil pós-freis
dominicanos, com uma nova visão de Igreja, que conhece a hipocrisia do mundo e
a combate através da ironia e da agressão. Os Fradins têm ainda o mérito de
introduzir em páginas impressas expressões como putsgrilla, tutaméia, cacilda,
além do gesto simbólico e sua onomatopeia, o top top, que caíram no gosto dos
leitores.
A repercussão da série Zeferino obrigou
Henfil a colecionar cachos de cartuns proibidos ou suavizados sob rigorosa
pressão. Mas ele não esmoreceu. Zeferino crispava-se de ódio contra os
corruptos que desviavam incentivos fiscais do Nordeste. Os faniquitos da Graúna
afugentavam o machismo brasileiro. Bode Orelana devorava quilos de papel em
protesto contra a censura prévia de livros. Henfil ainda bolou uma série contra
a usura dos ricos e a influência do império Disney na cultura brasileira. A
onça Glorinha, guerrilheira do Comando de Libertação do Quadrinho Nacional,
captura o “agente imperialista” Tio Patinhas. Levado a julgamento no Tribunal
da Caatinga, Patinhas é todo o mundo! Numa fuga suspeitíssima, preserva a
fortuna.
Numa entrevista a revista Veja (1971)
Henfil revelou: “O Baixinho sou eu. Hoje. O Cumprido também sou eu, numa versão
antiga. Vamos dizer que eu andei e o Cumprido ficou para trás. É isso. O
Cumprido é como eu era: um cara carola, infantil, ingênuo, aquele mineiro com
aquela formação religiosa antiga, mórbida. A religião do terror, na qual tudo é
pecado (o raio que está caindo é castigo de Deus). Do pecado mortal, venial e
original. O Cumprido ficou nessa fase. Agora eu me identifico com o Baixinho,
que é totalmente como eu sou hoje: toda uma negação desse meu passado. E de uma
maneira muito agressiva, porque esse meu passado me incomoda bastante (…) O
Baixinho procura, através da agressão, do ridículo, me checar e ao meio em que
vivo. Já vi: não era anarquizar, agredir essa gente, como o Baixinho agride”.
Acompanhado os dois Fradins, o Preto que
Ri, um frei negro, que ri de sua própria desgraça, e o Tamanduá que Chupa
Cérebros. O Cabôco estreou no Pasquim em 1972 e de todos os personagens de
Henfil foi o que causou mais polêmica e inimizades ao autor. Dono de um
cemitério atípico, Cabôco só enterrava pessoas que estavam vivas. Para
personalidades públicas que, no entendimento de Henfil, haviam colaborado de alguma
forma com a ditadura, caia no cemitério dos mortos-vivas. E o Cabôco tinha como
cúmplice o Tamanduá, que sugava cérebros de suas vítimas para conhecer os
pensamentos mais escondidos.
FRADIM
Quando decidiu lançar o Fradim em
revistas, Henfil criou um elenco de personagens mais leves para acompanhar a
publicação. Surgiu Zeferino, um nordestino da caatinga, esfomeado e sedento,
acompanhado de uma minúscula graúna, seu único personagem feminino, que após
morrer e ressuscitar em três dias, pôs um ovo e gerou a Grauninha, um
personagem delicado que morreu de inanição pouco depois. E ainda um bode
devorador de livros, Francisco Orelana, vestindo seu constante chapéu coco, e
que foi inspirado num bode real, da criação do cantador Elomar Figueira de
Mello. Como antagonistas, o onça Glorinha, e Lati, um coronel do interior.
Com o negro Orelhão, criado nas páginas
de O Dia, Henfil desenha a crítica social, com um humor direto, falando
claramente aos pobres da cidade, sobre seus problemas mais imediatos. Também para
esse público surgiram no Jornal dos Spots seus personagens de futebol: Urubu
(torcida do Flamengo, composta em sua maioria de negros), Bacalhau (torcida do
Vasco, portugueses), Pó de Arroz (torcida do Fluminense, de pessoas ricas),
Cri-Cri (torcida do Botafogo, por conta de sua chatice), Gato Pingado (torcida
do América, muito pequena). E para os mais intelectualizados Ubaldo, o
Paranoico, um personagem criado com a anistia de 1070, e que sempre se recusou
a admitir que os tempos estariam mudando. Segundo Márcio Malta, a chave de
Henfil para o sucesso popular foi abordar o futebol não só por seu cunho
esportivo, mas também pelo mundo real – partindo da esfera econômica – em que
chamou atenção para as contradições sociais entre as torcidas.
2 comentários:
CARO GUTEMBERG, SE V. GOSTAR, LEIA SEM RECEITA, POR FAVOR.
https://dartelondrina.files.wordpress.com/2020/12/revista_d_arte_dez_jan_2020_up1.pdf
NELSON BRAVO, 76 ANOS, APOS. DO BB - JUIZ DE FORA (MG) - TEL. 32 - 3233-2602
PARABÉNS, GUTEMBERG. VOCÊ É 10! NADA SEI DE COMPUTADOR. LIGUE PRA MIM, QUANDO QUISER, QUE A GENTE PODE CONVERSAR UM POUCO.
https://ongartebrasil.blogspot.com/2020/07/aldir-blanc-uma-dor-assim-pungente.html
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