As aventuras de Calvin & Haroldo
falam a todos nós, remetendo a experiências comuns a nossas
vidas. Quem nunca
achou a escola uma prisão? Quem nunca teve uma professora ou professor que só
queria ver de longe, de preferência bem longe? Quantas vezes sentimos que nem
nossos pais nos entendem, e quantos de nós não gostariam de ter um amigo
absolutamente fiel e companheiro, mas igualmente capaz de ser nossa consciência
como Haroldo?
No quadrinho, o sagaz garoto de 6 anos e
seu tigre de pelúcia -- que ganha vida na imaginação do menino -- entabulam
diálogos divertidos e surreais. Em suas conversas inteligentes e bem-humoradas,
debatem o jeito de ser dos humanos, enquanto expõem particularidades do mundo
infantil e contradições do mundo adulto.
Bill Watterson, eternamente oposto aos
estragos que o capitalismo e o merchandising provocam em qualquer criação
original, proibiu expressamente a sua editora de vender os direitos para lançar
no mercado uma panóplia de artigos baseados na série. Por este motivo,
Watterson passou vários anos em guerra aberta com a Universal Press e existem
mesmo algumas tiras que fazem referência a esse conflito de forma muito pouco
dissimulada. No final, Watterson levou a melhor e não permitiu o lançamento de
qualquer merchandising exceto alguns artigos únicos de edição limitada como
postais e posteres originais.
Apesar desta proibição, hoje em dia não
é nada difícil encontrar T-shirts estampadas, porta-chaves ou
autocolantes para
carros pirateados, com imagens de Calvin a dizer e a fazer coisas que nunca
disse nem fez nos quadrinhos. A proibição imposta por Bill Watterson ao
merchandising da série significa também que nunca irá haver uma série de
desenhos animados, como aconteceu com Garfield e Charlie Brown. Poucos
ilustradores conseguiram captar tão bem a imaginação de um garoto, e ainda
assim desenvolver críticas à sociedade de forma tão sutil. E sem nunca se
vender ao sistema, já que jamais liberou os direitos dos personagens para
bonecos, camisetas e toda essa porcariada que gera muito dinheiro.
A obra foi multipremiada. Seu autor
recebeu os principais prêmios dos quadrinhos, como o Harvey Award (oito
edições), o prêmio Eisner (duas edições) e Reuben Award (duas edições), todos
nos Estados Unidos, e o Angoulême International Comics Festival, na França,
entre muitos outros.
Calvin era - e continuava sendo até
pouco tempo atrás - a tira favorita de dez entre dez leitores de tiras. Em
1995, no entanto, Watterson declarou estar “cansado de acordar todos os dias
pensando no que Calvin iria fazer” e anunciou sua aposentadoria da tira -
muitos viram na atitude do quadrinhista uma resposta às pressões para
comercializar os direitos do personagem em produtos de licensing, algo que ele
sempre se recusou a fazer, mas o autor, avesso a entrevistas, nada confirmou.
Quando Watterson anunciou o fim da tira, Calvin era publicado em 2,5 mil
jornais apenas nos Estados Unidos e em centenas de outras publicações de mais
13 países, entre eles o Brasil. O autor recebia, com o personagem, cerca de US$
1 milhão. Ainda hoje, as tiras de Calvin são republicadas por diversos jornais
(inclusive brasileiros) e podem ser vistas e até mesmo adquiridas, em quadros,
via Internet (www.calvinandhobbes.com).
Os cartunistas de antigamente se
consideravam homens de jornal, simplesmente. Seu trabalho era ajudar o
periódico a vender sempre mais, sem se preocupar com qualidade. Assim, repor um
desenhista era muito mais fácil. A tira continuava, mas seu criador não tinha
seu lugar garantido. A situação mudou e hoje em dia até mesmo os syndicates
acham que apenas o autor pode dar à tira sua forma ideal. Por isso, atualmente,
os quadrinhos são levados mais a sério do que em anos anteriores, tanto pelo
público como pelos seus criadores e empresários do ramo de comunicação.
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