03 agosto 2011

O número 1 dos quadrinhos brasileiros (3)

Aventureiro, cômico e romântico, Caipora tornou-se popular rapidamente. Suas peripécias pelo interior do País e pelas florestas alimentavam a imaginação dos leitores. O traço fino e realista de Agostini dava vida a boiadeiros, onças, sucuris, macacos e índios. Além de inaugurar um estilo que inspirou quadrinhos das décadas seguintes, Ângelo Agostini criou cenas em dois planos, referência do teatro medieval, e também abriu caminho para a sensualidade, criando a primeira heroína dos quadrinhos: a índia Inaiá, protetora e guia de Caipora, que, com os seios à mostra, representa o mito da amazona.


Todo esse talento de Agostini, que José do Patrocínio considerava “o mais brasileiros dos brasileiros”, ficou relativamente esquecido a partir de 1910. Com o resgate e a publicação das histórias de Nhô Quim e Caipora, a nova geração pode rever o pioneirismo do ilustrador Angelo Agostini. É bom lembrar que a nossa primeira história em quadrinhos de longa duração foi homenageada em selo dos Correios. A data inicial de sua publicação, 30 de janeiro, é hoje comemorada como o Dia do Quadrinho Nacional, e Angelo Agostini passou a ser, desde 1984, o nome do troféu que representa o mais importante prêmio concebido pela Associação dos Quadrinhistas e Caricaturistas do Estado de São Paulo.


O mito do Menino Amarelo como primeiro personagem da história em quadrinhos, atravessado na garganta de muitos estudiosos, principalmente belgas e franceses, ficará abalado. Caipora será a lenha na fogueira da contestação que ameaça extinguir-se por falta de combustível. Poderá o Menino Amarelo ser considerado o primeiro personagem e a primeira história em quadrinhos porque tem balão e moldura? Caipora mostra tudo o que as modernas histórias em quadrinhos têm, antecipando-e em quase meio século às obras-primas de Hal Foster, com Tarzan e Príncipe Valente; Alex Raymond, com Flash Gordon e Jim das Selvas; e Roy Crane, com o Capitão César. não possui o balão, que os dois primeiros, também, não usaram” (CARDOSO, 2002, pp. 30 e 31).

Agostini inovou o que existia em história em quadrinhos, substituindo a caricatura pelos desenhos realistas e o humorismo pela aventura de ação. Foi o primeiro a explorar o suspense, deixando o leitor na expectativa até o capítulo seguinte.


Como primeiro herói brasileiro dos quadrinhos a se transformar em mito, ocupou durante muito tempo o inconsciente coletivo nacional. Foi tão marcante que, mesmo depois de seu último capítulo, ao longo da década seguinte, serviu de inspiração para uma canção popular, quadros teatrais e dois filmes mudos [...] As Aventuras de Caipora dão a sensação de estar como um todo no Brasil. Suas aventuras são o único repositório iconográfico sequencial dos usos e costumes rurais e urbanos do fim do Segundo Império e do começo do século XX” (CARDOSO, 2002, pp. 29 e 30).


Agostini produziu uma obra vultosa, impressionante bela, cheia de vigor e paixão. Mais de cinco mil páginas em 55 anos de militância na imprensa ilustrada. A maior parte dos seus desenhos estão nos quatro jornais que fundouo primeiro em São Paulo: O Diabo Coxo (1864-1865), seguido do Cabrião (1866-1867). Os outros dois no Rio, a Revista Illustrada (1876-1895), a mais importante e de maior circulação, mas que esteve sob sua direção até 1888, quando se viu obrigado pelas ameaças dos escravocratas a passar alguns anos na Europa. E, por último, o Don Quixote (1895-1903), um dos últimos jornais a usar a litografia como processo de reprodução. Boa parte de sua obra se encontra também em outros periódicos, O Arlequim, O Mosquito (1867 a 1876), Gazeta de Noticias (1904 e 1905), Leitura para Todos (1905) e, finalmente, n´O Malho (1904 a 1907).

Para Teixeira (2001, p.12), na Monarquia, as charges mantêm características estruturais de linguagem que as singularizam perante as charges do período republicano: pluralidade de quadros, abundância de textos e engajamento político. Tanto no Diabo Coxo, quanto em O Cabrião, revistas criadas por Agostini ainda em São Paulo, ou no Rio de Janeiro na Arlequim, mas, sobretudo, na Vida Fluminense em 1868, ele aprofunda essa linguagem típica do período, marcando com seu estilo singular, o grafismo de humor da época. Agostiniquadrinizadefinitivamente a charge, isto é, sistematiza corriqueiramente essa narrativa sequenciada, sincronizada no tempo e ordenada no espaço, acompanhada por longos textos verbais. Fleiuss havia esboçado algo semelhante na Semana Illustrada, entretanto, sem a criatividade gráfica e o vigor político do italiano. Agostini desenvolve e sofistica esse estilo da charge, e ocupa com seu traço páginas inteiras das revistas por ele ilustradas.

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