Na experiência baiana, a autoria nos
quadrinhos em seu grau máximo costuma ser associada ao Clube da Editora Juvenil
(mais tarde Centro de Pesquisa de Comunicação de Massa) fundado no final dos
anos 60 em Salvador publicando fanzine e realizando exposições e debate sobre a
importância dos quadrinhos. Todo o movimento fortaleceu o surgimento de
artistas gráficos na imprensa baiana.
Em agosto de 1975, enfrentando diversos
problemas com a censura e, por motivos internos do jornal, A Coisa foi reduzida
a uma página até sumir, em março de 1976. Saíram 32 números, com muito humor,
quadrinhos e informações. Durou oito meses, tempo suficiente para a reunião dos
cartunistas e discussão de novas idéias e projetos. Em junho surgiu o nanico
Coisa Nostra, com, debate nas escolas e bibliotecas sobre o assunto para que
as pessoas pudessem apreender mais o sentido visual, a força da imagem nos meios
de comunicação de massa. Era preciso saber ler os quadrinhos, sua linguagem
específica e a sua importância no mundo.
Nildão, Lage, Setúbal, só
para lembrar esse trio, traçavam as linhas de quadrinhos e humor no suplemento
semanal de um jornal diário da década de 1970 no Brasil: A Coisa. Além deles,
participavam regularmente com palpites e algumas contribuições, Antonio Cedraz,
já com espaço regional garantido pelo seu Joinha; Dilson Midlej e as primeiras
tiras da Nikita, Sebastian Seriol (Sebas) e a série sobre um vendedor de picolé
conhecido como Juá, Os Bixim, de Nildão questionando a natureza.
Os problemas de um homem
de meia idade, classe média, diante da realidade – trabalho exaustivo em
relação a baixa remuneração eram assuntos tratados na série Argemiro, de
Setúbal, e o malandro Bacuri, de Carlos França, a garota Bartira de Péricles
Calafange, a vida de um casal nos alagados, Nego & Nega, de Romilson Lopes.
Tem ainda o grafismo de Cleber Barros, Helson Ramos, o poema processo de
Almandrade, e o experimentalismo gráfico de Carlos Ferraz, Jorge Lessa e Jorge
Silva num delírio visual nunca visto até hoje na região, as pinturas
influenciadas pelos quadrinhos de Juarez Paraíso, Floriano Teixeira, Carybé,
Chico Liberato entre outros. Até Castro Alves já rabiscava caricatura, o
cineasta Glauber Rocha também.
NOVOS CAMINHOS - Na Bahia
os quadrinhos procuram novos caminhos, tomados em sua mais ampla significação
estética e social. E, como nas demais manifestações artísticas, cruzam-se
várias correntes e direções, das mais tradicionais às mais experimentais.
Ocorre com o quadrinho feito na Bahia o mesmo espírito de reforma que vem
atingindo outra arte. As linhas que se marcam pelo experimentalismo –
quadrinhos que exploram a potencialidade visual dos temas – desdobram-se em
várias matrizes, desde a pesquisa puramente gráfica (Aps, Calafange) à visão de
página como um todo articulado (Jorge Silva, Carlos Ferraz), desde os modelos
que se inspiram nos cartuns (Lage, Nildão, Lessa e Setúbal), do poema processo
(Almandrade), desenho-animado (Chico Liberato) até o realismo fantástico
(Juarez Paraíso, Edsoleda Santos).
NILDÃO
- No traço distorcido, contundente, irônico, muitas
vezes cruel, outras líricas, que deforma e informa, Nildão deixou impresso um
retrato desse país numa época marcante de sua história recente. O traço
desmascara, escancara, revisa do avesso e expõe os personagens do nosso dia a
dia. Ele condensa sua ação no desenho e desdenha do verbo. E assim Nildão dá a
todos, seu toque implacável do ser humano. Sua
obra nos revela um artista gráfico de respeito profundo pelo trabalho a que se
sente chamado. De nanodelicadezas a falsas logomarcas, de cartuns não verbais a
anúncios fictícios e charges políticas tudo está sob seu trabalho. Nildão
continua com olhar atento, a se debruçar sobre o ridículo dos contentes no coro
dos sisudos.
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