Historiadores
sociais falam que
a variedade humorística
anterior (antes de
1880), era de orientação
regional, mais suave,
despretensiosa, excêntrica,
apoiava-se principalmente
nas relações pessoais e
convencionais comumente
subentendidas. O novo
humor urbano, que substituiu
o anterior, começou a
florescer na década
de 1880. Era uma
mistura de influência
locais e estrangeiras,
desenvolveu-sesobre tensões
raciais e interétnicas
e sobre os equívocos
e impasses verbais. O
historiador Gunter Barth
(em seu City People)
afirma que esse humor
novo e mais agressivo
“unia pessoas heterogêneas
num movimento de harmonia
que para eles justificava
rir das condições
de uma minoria hostilizada”.
Será que os estereótipos
étnicos também não
reforçam, ao invés
de contradizer, noções
ultra simplificadoras sobre
negros e estrangeiros,
oriundos de encontros
superficiais nas ruas,
lojas ou no trabalho?
Os judeus
eram caricaturados como
avaros, agiotas, desonestos,
financistas velhacos e
comerciantes ou alfaiates
de roupas de segunda
mão, ou mascates que
operavam à margem
do comércio e da
sociedade. Muitos chargistas
eram judeus e tentavam
“suavizar” e humanizar
seu material. Estudiosos
da comunidade imigrante
judaica da virada
do século informaram
que os judeus tem
uma longa tradição de
rir de si mesmos,
sabiam que na sociedade
cristã as artes, nas
diversas níveis, lidavam
com eles de forma
irônica.
No Antiguidade
os judeus já eram
representados como narigudos.
Os impressos europeus dos
séculos XV e
XVI dependiam de personagens
simbólicos para interpretar
judeus e judias: sacos
de dinheiro, chapéus especiais
e insígnias que eram
forçados a usar.
O século XVII trabalhava
com rótulos de identificação
fisiológica: barbas longas
ou tufos estreitos
que circundavam o
rosto, o nariz grotescamente
dependurado.
Os chargistas
dos séculos XVIII e
XIX aperfeiçoaram os
indícios básicos que
retratavam os judeus:
grandalhão, narigudo,
gesticulando com as
palmas abertas, e, na
Inglaterra e nos
EUA, o sinal de
três bolas caracterizando
o “tio” ou agiota.
Os chargistas alemães acrescentaram
os pés chatos, as
pernas curvas e o
gosto pelo alho no
século XX. Assim judeus
coniventes, trapaceiros,
ricos e não obstante
cômicos da tradição
usurária elisabetana
predominaram entre os
judeus personificados nas
peças teatrais, romances e
charges. Nunca se
acusaram os chargistas
do século XIX por
sua sutileza, pois na
época suas charges não
eram excepcionais. Havia
estereótipos atribuídos
a judeus e irlandeses.
Mas nenhum grupo nos
EUA deve ter escapado
a algum estereotipagem
humorística, satírica e,
via de regra, prepotente,
humilhante e até
mesmo hostil. Isso faz
parte da história e
do legado comum.
Abie, o
Representante
Personagem fumante,
de olhos arregalados,
baixinho, gorducho,
de nariz acebolado
e bigodinho, proferindo
um inglês com sotaque,
expressões e inflexões
ídiches, assim é
Abie, o Representante,
criado para as tiras
de quadrinhos por Harry
Hershfield (1885-1974),
cuja carreira de chargista,
radio comediante, escritor
e humorista, estendeu-se
a vários meios de
comunicação. Sua estreia
aconteceu em 1914
e seu encerramento
definitivo, com várias
interrupções, em 1940.
Abie foi a primeira
figura judaica em tira
de uma cadeia de
jornais.
O vendedor
de carros Abie estreou
no New York Journal
em 02 de fevereiro
de 1914. Abie era
uma réplica positiva de
muitos judeus estereótipos
em caricaturas, e
mostrou, com humor
leve um bem sucedido
de classe média de
imigrantes. O personagem
perdeu muitas de suas
características mais típicas
judaicas ao longo
de décadas, mostrando
a sua integração
bem sucedida, mas também
a diminuir lentamente
o caráter especial que
defina essa tirinha para
além dos outros.
Suas tiras
eram distribuídas pelas
agências (syndicates)
que impunham limitações
à liberdade de expressão
de chargistas que, em
sua maioria, ainda tentavam
evitar temas tidos como
ofensivos ou antipáticos
aos leitores. Abie, o
Representante, concordavam
seus estudiosos, divertia
leitores judeus e
não judeus de classe
média, que gostavam e
compartilhavam de suas
estripulias de trabalhador,
cidadão e marido.
Para John e Selma
Appel (Comics. Da Imigração
na America, Ed. Perspectiva,
1994, p.152) “as personagens
judaicas de Hersfield
eram os judeus aculturados
da mistura de raças,
em conformidade com
o ideal teuto-judaico
de agir em público
como ´americanos` e
de confinar as expressões
do Judaismo ao ambiente
doméstico. Essa postura
evitou um envolvimento
visível ou ativo
dos judeus em assuntos
tipicamente judaicos que
chamariam a atenção,
numa sociedade propensa (ao
menos potencialmente) a
reações anti-semitas,
para sua identidade
étnica ou religiosa”.
Outras personagens
judaicas das tiras
de jornais apareceram
ocasionalmente nas HQs
da década de 1920
e do início da
década de 1930. Nenhum,
entretanto, alcançou a
longevidade ou a
fama de Abe Kabibble.
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