Inteligente, criativo e carismático, Calvin recebeu seu
nome em homenagem a Calvino (filósofo e teólogo francês do século
XVI que foi uma das figuras chaves na reforma protestante) e seu
amigo tigre, Haroldo (Hobbes), foi batizado em referência a Thomas
Hobbes, filósofo britânico do século XVII). Watterson teria
escolhido estes nomes por acreditar que os dois foram os grandes
responsáveis pelos conceitos religiosos e morais americanos, que
muitas vezes são colocados em xeque nas tiras.
Os dois são melhores amigos e adoram pregar peças nos
outros. Com uma imaginação sem limites e um vocabulário
sofisticado para um garoto, Calvin ironiza - mais que isso, é
sarcástico em relação aos - costumes, crenças, morais,
instituições e relacionamentos tipicamente americanos. Se Calvin é
sarcástico e muitas vezes cruel, Haroldo, por outro lado, é irônico
e altamente filosófico, o que d’um contraponto à história - mas
não impede que os dois briguem em suas reuniões de clubinho para
decidir quem tem mais poder, o “supremo ditador para toda a vida”
Calvin ou o “primeiro tigre” Haroldo.
Calvin adora dar dor-de-cabeça a seus pais, que têm
bastante trabalho para educá-lo. O pai eventualmente “se vinga”
dando explicações nada claras sobre fenômenos naturais ou
brincando com assuntos “sérios” como o presente de Natal que não
virá, ou ainda levando o garoto para viagens de camping e atividades
“que constroem o caráter”, o que dá ainda mais dor-de-cabeça à
pobre mãe. Calvin adora ainda pregar peças e deixar enojada a
coleguinha de escola e vizinha Suzie Derkins.
E, por falar em escola, o garoto deixa louco a
professora, senhorita Wormwood (batizada em homenagem a uma demônio
aprendiz de um conto de C.S. Lewis), graças à sua farta imaginação
e criatividade imensurável que ele raramente aplica aos estudos - e
também por causa de perguntas capiciosas em relação ao sistema de
ensino americano.
Ainda na escola, Calvin sofre com o gorilão Moe, o
típico valentão do colégio. Depois de uma tira em que Calvin é
gozado pelo professor de Educação Física por ser demasiado fraco
para entrar na equipe de basebol e não saber seguir as regras da
equipe, Calvin decide criar o seu próprio desporto, onde a única
regra é nunca repetir a mesma regra duas vezes. Assim nasceu o
Calvinbol, um desporto fictício (não segundo Watterson, que ainda
por cima já recebeu inúmeras cartas a perguntar como se joga) que
fez inúmeras aparições na série.
O desenhista Bill Watterson sempre usou a tira como um
espelho de si mesmo. Por exemplo, uma vez a mãe de Calvin vai fazer
compras no supermercado e passa por aquelas situações bem comuns:
mal atendimento, filas intermináveis etc. No final, a moça do caixa
diz: “Tenha um bom dia!” e ela responde: “Tarde demais!”. Com
certeza esta situação já deve ter acontecido com o próprio
Watterson. A piada se escreveu sozinha.
Calvin e seu fiel tigre Haroldo (que só ganha vida
quando os dois estão a sós), em uma série dominical de página
inteira, discute a respeito do lixo deixado por algum imbecil em
pleno bosque. "Aposto que as civilizações futuras vão saber
mais do que gostaríamos sobre nós", ele comenta desapontado
com uma sociedade que polui, estoca armas nucleares e emporcalham
tudo. Haroldo comenta que tem orgulho de não ser humano, e no final
Calvin concorda. Watterson, o mago, critica sem dó as mazelas da
sociedade, mas com uma finesse, uma leveza e um bom humor
inigualáveis.
A completa falta de sintonia entre Calvin e os pais é
que faz as tirinhas e histórias maiores serem tão divertidas. Mesmo
quando Calvin se dá mal em uma de suas armações, a lição que
tiramos daí nada tem de didática ou maçante. Watterson, sempre
ele, consegue sempre nos maravilhar e fazer rir.
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