O pintor,
escultor e poeta francês Marcel Duchamp (1887/1968) nasceu há
125 anos (dia 28 de julho de 1887) e foi um dos precursores da arte
conceitual e introduziu a ideia de ready made como objeto de arte.
Quando tirava uma peça de seu ambiente natural - como fez com uma
roda de bicicleta e um banquinho de madeira ou até com uma louça de
sanitário masculino - e dava aos objetos a envergadura de um objeto
de arte, o que desejava era instigar o pensamento, provocar um
raciocínio, destruir a quietude das coisas aceitas e estabelecidas.
Ele contribuiu para o infindável debate entre o que é e o que não
é arte. Quando pintou bigodes na Monalisa, de da Vince, colocava
nitidamente o seu desprezo pela arte clássica. Colocar a Monalisa e
um urinol no mesmo patamar é uma provocação. Duchamp foi um
provocador.
Começou
sua carreira como artista criando pinturas de inspiração
impressionista, expressionista e cubista. Dessa fase, destaca-se o
quadro Nu descendo a escada, que apresenta uma sobreposição de
figuras de aspecto vagamente humano numa linha descendente, da
esquerda para a direita, sugerindo a ideia de um movimento contínuo.
Esse quadro, na época, foi mal recebido pelos partidários do
Cubismo, que o julgaram profundamente irônico para com a proposta
artística por eles pretendida.
Como
escultor ele atingiu grande fama. Deixou a Europa e foi para Nova
York. Em 1917 (há 90 anos) ele lançou a revista Blind Man (Homem
Cego). O objetivo era criar polêmica sobre o urinol que mandou para
a exposição de vanguarda em Nova York, e que foi recusado pelo
júri, também de vanguarda. O urinol comum, branco e esmaltado que
foi enviado ao júri foi um gesto iconoclasta de Duchamp. Há quem
veja nas formas do urinol uma semelhança com as formas femininas, de
modo que se pode ensaiar uma explicação psicanalítica, quando se
tem em mente o membro masculino lançando urina sobre a forma
feminina.
Levar uma
peça de banheiro para uma exposição de arte atrai adversários. Um
mictório não é uma peça bonita por si só, embora isso possa ser
discutido. Por outro lado, a arte não significa apenas a apreciação
do bonito e mesmo o conceito de bonito é algo muito subjetivo. Com o
seu posicionamento, Duchamp não buscava o belo e nem a aprovação
do público. Ele procurava o âmago das emoções humanas, as reações
instintivas. “Transformar todas as pequenas manifestações
externas de energia, em excesso ou desperdiçadas, como por exemplo,
o crescimento dos cabelos ou das unhas, a queda da urina ou das
fezes, os movimentos impulsivos do medo, do assombro, do riso, a
queda da lágrima, os gestos da mãos, o olhar frio, o ronco ao se
dormir, a ejaculação, o vômito, o desmaio, etc", disse na
época. Compreende-se através dessas preocupações, um pouco sobre
a maneira como Marcel Duchamp olhava o mundo.
O que o
artista propunha era uma arte conceitual, na qual a ideia era mais
importante que a execução da obra pelas mãos do artista. Daí a
sua série ready-made (o transporte de um elemento da vida cotidiana,
a priori não reconhecido como artístico, para o campo das artes),
objetos industriais que ele expunha como obra de arte. Com isto ele
deixava de ver toda a arte do passado e cegava o artista moderno
deixando-o com um só olho na direção de um pretenso futuro. Ele
pretendia despertar uma nova maneira de ver o mundo e as coisas.
Os ready
made passaram, então, a ser o elemento de destaque da produção de
Duchamp. Mais tarde ele dedicou-se ao estudo da "quarta
dimensão", o que, de alguma forma, orientou a sua criatividade
artística para problemas óticos. Os Rotoreliefs, discos coloridos
que, quando girados com extrema rapidez, produziam efeitos óticos, é
mais uma de suas tentativas de se aproximar das pesquisas que fazia.
O estudo do olhar sobre a arte interessou muito a Duchamp, que se
opunha àquilo que ele próprio dizia ser a "arte retiniana",
ou seja, uma arte que agrada à vista. Pode-se, de certo modo,
compreender toda a arte de Duchamp como um esforço para se afastar
da "arte retiniana" e passar para uma arte mais "cerebral",
em que se ressaltam os aspectos mais intelectuais do labor artístico.
Dessa forma, os ready made, inclusive, são uma tentativa de escapar
da "arte retiniana", uma vez que confrontam o público,
oferecendo-lhes algo que ele próprio já viu algures, forçando-o a
pensar e refletir sobre a questão da arte enquanto linguagem.
Vale a
pena ressaltar que a obra de Duchamp deixou um legado importante para
as experimentações artísticas subsequentes, tais como o Dadaísmo,
o Surrealismo, o Expressionismo Abstrato, a Arte Conceitual, entre
outros. No século da hiper visualidade é necessário rever a arte.
O desafio é ver com novos olhos.
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