O gaúcho Renato
Canini (1936-2013) criou para a revista Patota (editora Artenova) em 1973, o
personagem do DR. FRAUD. Com um
óbvio trocadilho em relação ao nome do pai da psicanálise, Sigmund Freud, Dr.
Fraud era evidentemente um charlatão e recebia em seu divã toda espécie de
objetos inanimados, personagens de ficção e pacientes em geral, que recebiam
sua completa atenção, mas provavelmente, nenhuma ajuda. O personagem antecipou
em alguns anos o Analista de Bagé, de Luís Fernando Veríssimo.
O
desenhista Miguel Paiva lança no Caderno B do Jornal
do Brasil em 1977 a série DR. FREUD, o psicanalista dominado por fortíssimo complexo de Édipo e tarado sexual. Ele é um grande investidor. Investe particularmente nas neuroses do paciente. Dr Freud – diz seu criador – cultiva um ´caso´ eterno com a
mãe. É um desajustado sexual e, como todo bom psicanalista, um grande
investidor. Investe particularmente nas neuroses dos pacientes. Chegou até a
criar o Fundo Freud de Investimentos, onde cada paciente pode ´aplicar´ a sua
neurose, transformando-a um dia, com paciência e perseverança, numa magnífica
paranóia. Por estranha coincidência, o Dr Freud recomenda tratamento mais
longos para as pessoas mais ricas.
Nildão
(Josanildo Dias Lacerda) começou a publicar a tira OS BICHIM no jornal A Tarde, Caderno 2, em 18 de julho de 1977. O
universo do tamanho do fruto da goiabeira. Bichim era um bichinho de goiaba que
chegava ao mundo e começava a questionar as coisas que via. Tanto na escolha do
tema, como na linguagem, o domínio da poética é visto nesses quadrinhos de
traço simples e equilíbrio. O título foi decorrente da linguagem nordestina que
sempre abrevia o diminutivo em “im”. Aos poucos foi conhecendo outros
personagens como Fernão Capelo Gaivota, um animal massificado que já conhece as
malandragens do mundo. Mais tarde eles chegaram a conclusão de que o câncer da
humanidade era o homem e resolveram ir ao céu pedir a Deus para tirar o humano
da terra. Ao chegarem lá encontra o Deus narcisista, preocupado com a imagem e
que não se interessava pelo que aqui estava acontecendo. Nessa fase, o jornal
deixou de publicar a tira, alegando ser uma empresa de fundamentos religiosos.
Para não deixar de publicar suas criações, Nildão cria novos personagens e
novos argumentos. A tira Os Bichim foi distribuída pela ECAB (Editora Carneiro
Bastos) para outros jornais e também publicada na revista Eureka da editora
Vecchi.
ZEFERINO – A partir do dia 14 de setembro de 1975 o cangaceiro Zeferino, a
Graúna e o bode Francisco de Orelana voltam às páginas do Jornal do Brasil
carregados de experiências vividas por seu criador. Depois de apagar o jogo de
estourar lá fora, e acabar a visão subdesenvolvida da cultura brasileira,
Henfil retomou o seu papel de artista engajado numa perspectiva social do
Brasil. O arquétipo do cangaceiro nordestino surgiu na
folha cor de rosa do Jornal dos Sports em 01 de abril de 1969 deslocado no
tempo e espaço na imensidão do Maracanã. Para criar Zeferino, o cartunista Henfil
(Henrique de Souza Filho, 1944-1988) mesclou traços do próprio pai, do
personagem Corisco, do filme Deus e o diabo na terra o sol, de Glauber Rocha e
no livro Os Sertões, de Euclides da Cunha. Depois foi publicado na revista
Placar, da Editora Abril, em 1970, como uma espécie de representante do Brasil
na Copa do Mundo do México. Três anos depois de seu nascimento, no dia 21 de
agosto de 1972, passa a ser publicado no Jornal do Brasil (Caderno B), o
cangaceiro Zeferino, seguido pela doce e irônica Graúna e pelo intelectual
provinciano e boquirroto Bode Francisco Orelana. Uma trinca do barulho, que
vivia se engalfinhando na utopia de superar as provocações do
subdesenvolvimento. Nordestino da caatinga, esfomeado e sedento, acompanhado de
uma minúscula Grauna, seu único personagem feminino, que após morrer e
ressuscitar em três dias, pôs um ovo e gerou a Grauninha, um personagem
delicado que morreu de inanição pouco depois. E ainda um bode devorador de
livros, Francisco Orelana, vestindo seu constante chapéu coco, e que foi
inspirado num bode real, de criação do cantador baiano Elomar Figueira de
Mello. Como antagonistas, a Onça
Glorinha, cuja missão era caçar o “agente imperialista” Mickey, e o Lati,
latifundiário. A série assumiu um tom de crítica política e de luta pelos
direitos civis, trilhando uma longa e vitoriosa carreira que incluiu peça de
teatro e revista em quadrinhos (Fradim) pela editora Codecri e publicação em
outros órgãos da imprensa, como o jornal O Estado de São Paulo, já no final da
vida do cartunista. O trio volta ao Jornal do Brasil em 14 de setembro de 1975
mais humanizados, carregados de experiências vividas por seu criador, Henfil.
Depois de apagar o jogo de estourar lá fora, e acabar a visão de
subdesenvolvimento da cultura brasileira, Henfil retomou o seu papel de artista
engajado numa perspectiva social do Brasil.
Ao final da década de 1970, foi parar nas revistas de histórias em quadrinhos o quarteto cômico composto pelos artistas Renato Aragão (Didi), Manfried Santana (Dedé), Antonio Carlos Bernardes Gomes (Mussum) e Mauro Faccio Gonçalves (Zacarias), denominado OS TRAPALHÕES, que juntos estrelaram o mais longo programa humorístico da televisão brasileira (D’Oliveira, Vergueiro, 2010-2011). O conteúdo das revistas, publicadas a partir de 1976, pela Editora Bloch, trazia conteúdo semelhante ao desenvolvido no programa, explorando temas picantes, brincando com preconceitos, ridicularizando figuras proeminentes do cenário político nacional, do mundo dos esportes e do entretenimento, satirizando situações do cotidiano brasileiro, desde questões económicas (compras em lojas, preço dos alimentos etc.) a sociais (relação marido e mulher, homossexualidade, exploração do corpo feminino etc.).
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