O amor está presente em todas as
culturas. Mas as formas que ele assumiu ao longo do tempo mudaram. O amor varia
de acordo com a cultura e os gostos de cada época, mas a essência dessa emoção
é imutável. Os gregos foram os primeiros a criar uma palavra para o amor. A
civilização que gerou filósofos como Sócrates e Aristóteles discutia ideias
como “almas gêmeas” e “cara metade”.
Com a conquista da Grécia por Roma, por
volta do século 2 a.C., a ideia do amor foi mudada. Os romanos tinham pavor da
ideia de serem escravizados por uma paixão. Após a queda do Império Romano, no
século 5, e as invasões bárbaras, o mundo como se conhecia desapareceu. No
lugar dele, violência, caos social, conflitos. A religião passou a dominar a
vida social e o amor confundia-se com o sentimento religioso. O casamento se
tornou uma cerimônia cristã.
Numa época em que as mulheres eram parte
das propriedades e os nobres tinham direito de deflorar as noivas de seus
vassalos, surgiu na França (século 12), o amor cortês – um cavalheiro escolhe
uma mulher casada, bela e distante, a quem passa a idealizar. A mulher como
objeto de súplica amorosa reflete o modelo da sociedade feudal. A Idade Média
chega ao fim com a reforma protestante e a transformação das aldeias em grandes
cidades.
Nos séculos 15 e 16 a religiosidade dá
espaço à razão, a ciência e à lógica. O efeito do Renascimento
foi uma
desvalorização dos desejos individuais. Os jovens deviam escolher seus pares,
viver sozinhos e morar em sua própria casa (século 17). Tempo do casal Romeu e
Julieta, de Shakeaspeare.
Chega o século 18 com a racionalidade.
Teologia e metafísica dão lugar à matemática e à física e o amor ganha códigos
de ética e até de etiqueta. Luís XIV é o símbolo maior do galanteio racional. A
figura literária que representa o amor desse século é Don Juan, educado na arte
da conquista, da sedução. Outro ícone dessa fase é Casanova.
Chega a revolução burguesa, na França, e
a ascensão do capitalismo, durante a Revolução Industrial, na Inglaterra,
colocando em xeque a autocracia da Igreja e o direito patriarcal. Agora o que é
nobre, digno de qualquer sacrifício, é o amor. E quanto mais sacrifício,
melhor. É o amor romântico que arrebata a todos.
Hoje, não precisamos mais estar casados
ou até ter planos eternos para continuarmos nos amando. Completamente
desconectado da família e até do sexo, o amor continua vivo alimentando-se de
sua capacidade de mudar e se adaptar.
“O
verbo amar é um dos verbos mais difíceis de conjugar: o seu passado não é perfeito;
o seu presente é apenas indicativo; e o futuro é sempre condicional” (Jean
Cocteau – 1889/1963, poeta, teatrólogo e cineasta francês)
Amar
pode ser entrega sem expectativa de retorno. Pode ser perder. Para muitos,
ganhar. Para outros tantos, nada sem apetite sexual. Posso não existir sem
você, mas, se juntos, o que você me acrescenta? Amar é olhar para fora, para o
outro, e desabar por dentro, em busca da rendição condicional.
Por ser uma das experiências
fundamentais da vida, o amor gera inúmeras e angustiantes preocupações quanto a
seus efeitos, criando consequentemente, o desejo de controlá-lo. Dante foi uma
prova desta preocupação. Desde que viu a bela Beatriz, pelo menos assim pensava
que ela era chamada, sua vida não foi mais a mesma.
Camões, em sua Lírica, nos deu um soneto
famoso, no qual podemos observar não só o caráter dúbio e ambíguo do Amor,
assim como a relação igualmente ambivalente que temos com ele.
Amor é um fogo que arde sem se ver;
é ferida que dói, e não se sente;
é um contentamento descontente;
é dor que destina sem doer.
É um não querer mais que bem querer;
é um andar solitário entre a gente;
é nunca contentar-se de contente;
é um cuidar que ganha em se perder.
É querer estar preso por vontade;
é servir a quem vence, o vencedor;
é ter com quem nos mata, lealdade.
Mas como causar pode seu favor
nos corações humanos amizade,
se tão contrário a si é o mesmo Amor?
Revelada a natureza dupla do amor - por
um lado torturador, monstruoso, ferida ardente, inimigo, por outro belo, amigo
e divino - Platão, em busca de seu significado descobriu através da Beleza o
Amor gera seres, quer no corpo quer na alma. Com outras palavras, a visão da
Beleza do amado liberará o desejo de gerar, até então adormecido no interior do
e da amante.
Através do Amor vivenciamos o outro e,
ao mesmo tempo, vivenciamos a nós mesmos. Este movimento sutil foi percebido
por Fernando Pessoa e transformado num de seus mais belos poemas: Eros e
Psique.
“Conta a lenda que dormia
Uma princesa encantada
A quem só despertaria
Um Infante, que viria
De além do muro da estrada.
Ele tinha que, tentado,
Vencer o mal e o bem,
Antes que, já libertado,
Deixasse o caminho errado
A Princesa Adormecida,
Se espera, dormindo espera.
Sonha em morte a sua vida,
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera.
Longe o Infante, esforçado,
Sem saber que intuito tem,
Rompe o caminho fadado.
Ele dela é ignorado.
Ela para ele é ninguém.
Mas cada um cumpre o Destino
Ela dormindo encantada,
Ele buscando-a sem tino
Pelo processo divino
Que faz existir a estrada.
E, se bem que seja obscuro
Tudo pela estrada fora,
E falso, ele vem seguro,
E, vencendo estrada e muro,
Chega onde em sono ela mora.
E, inda tonto do que houvera,
À cabeça em maresia,
Ergue a mão, e encontra hera,
E vê que ele mesmo era
A Princesa que dormia.”
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