09 abril 2013

As descobertas de Alice (Diário de um bebê)



O céu estava azul infinito e o vento soprava uma brisa fresca quando Antonio conheceu Maria. Eles trabalhavam juntos, depois com o tempo, se separaram. Mas a vida fez com que eles se encontrassem de novo. Nesse dia os olhos dos dois brilharam como estrelas na noite. E desse encontro amoroso surgiu a primeira letra do alfabeto e também a primeira letra da palavra amor: Alice. Linda como uma pequena borboleta que quer voar, a pequena Alice abriu os olhinhos, balançou os bracinhos e, com o gesto suave, abriu um sorriso para seus pais. E nesse momento uma luz muito breve, leve, iluminou todo o recinto.
 
Olhar aberto para o mundo, a pequena Alice queria conhecer tudo em sua volta. Primeiro foi o olfato, o sentido mudo, o que não tem palavras. Antes mesmo de abrir os olhos, Alice sentiu o cheiro da mãe, aquele perfume suave que jamais vai esquecer porque aquela sensação de pertencimento. O aromo repousa leve em suas narinas quando a mamãe levanta a pequena Alice do berço e coloca em seu braço esquerdo (o braço mais quente, porque está mais próximo do coração) e a menina então sente aquele aroma levemente almiscarado, basicamente floral, do pulso esquerdo. A fragrância acalanta e agrada o bebê que se agita e acalma com todo aquele afeto.

Agora quem conta toda essa história é a própria Alice, de suas descobertas.

Em seguida chega o papai e sinto de longe outro cheiro no ar, dessa vez mentolado tipo hortelã, é papai Antonio com aqueles pelos engraçados no rosto que as pessoas adultas chamam de barba. É engraçado e, ao mesmo tempo, agradável. Enquanto a mamãe tem o rosto limpo, suave e tranquilo, o do papai é firme, seguro, resistente. Os dois se combinam.

Foi o primeiro sentido que despertou em mim ao nascer. O olfato é como mágica, transporta a gente para diversos lugares. Muitas vezes os odores das frutas fazem com que eu flutue por toda minha casa. Quando papai e mamãe viajava para o interior, os aromas do mato fresco da manhã, as flores silvestres, os pequenos animais de estimação, tudo repentino e fugaz faziam meu coração dilatar de felicidade. Esses cheiros estão percorrendo minhas memórias em todo meu corpo.

O segundo sentido foram as mãos quentes em meu corpo, ah que delícia!. Colocando suas mãos cuidadosamente aquecidas, meus pais, primeiro, massageia minha cabeça, depois o meu rostinho muito suavemente, passando depois para o pescoço, ombros. Algumas vezes escorregava as mãos nas minhas costas e esfregavam lentamente ao longo da coluna, acariciava meus braços e pernas. O toque não podia ser muito leve para não provocar cócegas (sim, algumas partes do corpo sentem cócegas, outras sentimos coceiras), nem muito forte para não me agitar. Suas mãos eram firmes e constantes.

Essas massagens me deixavam ativa e alerta e mantinha melhor minha emoção que começava a aprender naquele instante. Sentia um sono gostoso, me consolava. Quando mamãe apertava meu corpo de encontro ao seu a sensação era de conforto. Um mimo.

Outra sensação agradável foi quando meus pais levaram seus lábios em meu rosto num gesto afetuoso conhecido como beijo. Aquela sensação em minhas bochechas me deixava felicíssima. Era um grande acontecimento para mim. Um beijinho aqui, outro ali, maravilha!

Assim como o olfato e o tato, o paladar é um sentido íntimo. Comecei a perceber o gosto das coisas. A primeira coisa que senti do paladar foi o leite do seio da mamãe, acompanhado de amor, afeição, carinho. Era uma sensação de segurança, de bem estar. Mais tarde fui conhecendo outros alimentos, comida sólida e com diversos sabores. Descobrir que precisamos comer para viver, da mesma
maneira que precisamos respirar. Mas respiramos involuntariamente, ou seja, nascemos respirando enquanto que para comer é necessário ir em busca de comida e isso exige energia, planejamento. Notava que toda manhã meus pais saiam da cama, tomavam banho, vestiam roupas e iam para o trabalho paraganhar o pão de cada diacomo ouvia as pessoas falarem. Ou se preferir,trabalhar para merecer o sal, de onde vem a palavra salário. E é com o salário que se compra comida. Para o crescimento das crianças como eu, precisamos fazer as refeições para podermos crescer fortes. O alimento nutre nosso corpo.

E a sensação provocada pela comida é uma grande descoberta. Existem comidas adocicadas, outras amargas e outras ainda apimentadas. Essa última mamãe não deixava provar, mesmo assim eu tentava. Mas nada era mais confortável do que aquele sabor gelado do sorvete, seja ele de baunilha, de cajá ou de morango.. É um prazer enorme!!!

Como filha única, eu era todo ouvidos. Desde pequena inda no útero da mamãe ouvia a batida de seu coração, mas não entendia nada. quando cheguei ao mundo que comecei a identificar os sons ao redor. Primeiro meu próprio choro, o que fez meus pais correrem para me alimentar. Depois adorei ouvir palavras rimadas deles, gostei quando seus sons se esbarravam. Ao falar baixinho nos meus ouvidos, aquele murmúrio me deliciava e foi assim que comecei a falar do mesmo jeito que eles. Depois descobrir a música e a emoção foi grande. Aquela emissão de mantras que mamãe cantarolava me conduzia à meditação e adormecia suavemente.

Como as emoções puras, a música ondula e suspira, agita-se ou acalma-se. Nesse sentido, comporta-se tão semelhante às nossas emoções. Existem baladas sincopadas, batuques rápidos e balanceados, música de ninar, e até um estilo que a vizinhança gostava de ouvir bem alto e que papai fechava as janelas para não perturbar meu sono. Mais tarde descobrir que era conhecido como pagode, o ritmo do momento na cidade e que meus pais não gostavam muito. Mas a cidade era uma catedral de som, música em todos os lugares.

Ah! Tem ainda a minha visão, que coisa significativa. Ao abrir os olhos pela primeira vez, via meus pais sorridentes e ansiosos. Vendo meus pais parecia que me via no espelho... bem mais velha, mas os olhos...brilhantes... emocionava. E assim ansiava por mais informações. Estava conhecendo o mundo então comecei a olhar para todo o lugar, era um quarto de hospital quando abrir os olhos, tudo branco. Quando meu pai estendeu os braços e me carregou, vi seu sorriso. Minha mãe estava deitada e observada tudo.

Quando o tempo passou, tudo ficou escuro, era noite (isso eu descobrir bem mais tarde) e estava conhecendo aquilo naquele momento. Sem luz não podia ver e foi nessa escuridão que adormeci. No dia seguinte distinguia as cores: azul, vermelho, amarelo, lindo. Eu preciso conhecer as palavras para as varias cores das nuvens, que vão do rosa perolado, durante o por do sol tranquilo sobre o oceano, até ao verde cinza elétrico das ventanias que passavam no ar. As cores são vida. Descobrir o por que  as folhas mudam de cor no outono. Na primavera elas são vivas, brilhantes e as árvores começam a retirar nutriente em sua volta. Com o tempo, as folhas perdem a cor, subnutridas e as árvores para sobreviver deixam suas folhas caírem para recomeçar mais adiante. É o ciclo da vida que vou conhecer mais tarde. O chão fica parecendo um tapete de folhas.

Bem, dessa forma que comecei a conhecer o mundo através do cheiro, do tato, da audição, visão e do paladar... Amanhã vou descobrir outras novidades. Acompanhe as minhas aventuras que você também aprenderá comigo.
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