O samba
surgiu na Bahia, mas se popularizou nacionalmente através do Rio de
Janeiro, que, com uma indústria fonográfica forte, teve um papel
fundamental na divulgação dessa música. Ao primeiro toque do
tambor, homens e mulheres se colocavam a postos, em círculos. E iam
se alternando no centro da roda, dançando sozinhos ou em pares,
enquanto os outros acompanhavam em palmas. “A dança consiste num
bambolear sereno do corpo, acompanhado de um pequeno movimento dos
pés, da cabeça e dos braços. Estes movimentos aceleram-se,
conforme a música se torna mais viva e arrebatada, e, em breve, se
admira um prodigioso saracotear de quadris”, informa o antropólogo
Edison Carneiro em seu livro “Samba de umbigada”. Quando dançam
sozinhos, convidam outro a substituí-lo com uma umbigada, que chamam
de “semba”.
Filho
legítimo das danças africanas, especialmente dos povos de língua
banto, o samba veio dos batuques e lundus. Onde se plantava cana,
tabaco, algodão, café e minas de ouro, havia negros e onde havia
negros, havia dança e música, lembra Carneiro. Assim, os batuques
foram se espalhando pelo país e se misturando com sonoridades e
danças dos portugueses e dos índios, dando origem ao coco (no
Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas), ao
jongo (no Rio, São Paulo, Minas e Goiás) e ao samba (no Maranhão,
Bahia, Guanabara e São Paulo), afirma o pesquisador.
Considerado
obscena, ofensivo, os sambas eram vistos como locais de orgia e
bebedeira, dignos da mais severa perseguição. Apesar de tudo, o
samba sobreviveu. Os negros eram a maioria da população e o samba,
a forma que eles conheciam de celebrar, se divertir, brincar. E
apesar da base africana, o samba é natural do Brasil, onde descobriu
novos instrumentos, coreografias e sotaques.
Os
pesquisadores são unânimes em afirmar que o centro de tudo, o local
onde o samba ganhou vida foi no recôncavo baiano, onde a música
estava nas plantações, na pesca, na hora de construir, no lazer. O
samba, naquela época cadenciava o trabalho. O coração do samba no
recôncavo é a região que inclui Santo Amaro, Acupe, Santiago do
Iguape e Cachoeira. E foi de Cachoeira que saiu Hilária Batista de
Almeida, ou Tia Ciata, a mulata baiana que, no começo do século XX,
ensinou o Brasil a sambar. Ela promovia em sua casa festas onde
estava presentes os grandes músicos da época e foi lá que surgiu
“Pelo Telefone”, o samba que lançaria no mercado fonográfico um
novo gênero musical. A gravação de Donga foi em 1917 (há 95
anos), mas antes dele, em 1902 (há 110 anos), o santo-amarense
Baiano foi o responsável pela primeira gravação feita no Brasil, o
lundu “Isto é Bom”, do baiano Xisto Bahia. A partir daí o samba
se espalhou por todo o país.
Há
várias vertentes do samba como o choro, um samba em forma de canção,
ou a bossa nova, ritmia do samba a serviço do requinte melódico da
região. O samba de roda foi a grande fonte de inspiração do pagode
baiano, assim como o samba duro e o pagode carioca.
Depois
que a Unesco reconheceu o samba de roda como Obra-prima do
Patrimômnio Oral e Imaterial da Humanidade, todas as atenções se
voltaram para essa expressão cultural que, desde os tempos da
escravidão, floresce no entorno da Baía de Todos os Santos. O samba
de roda do Recôncavo Baiano sobrevive em dezenas pequenas
comunidades interioranas, sendo a principal manifestação folclórica
nas datas festivas, comemorações do dia a dia ou nos batuques que
animam o encontro de amigos nos butecos.
“Desde
que o Samba é Samba”, composição do mano Caetano diz: “A
tristeza é senhora,/Desde que o samba é samba é assim/A lágrima
clara sobre a pele escura,/a noite e a chuva que cai lá fora/Solidão
apavora,/tudo demorando em ser tão ruim/Mas alguma coisa
acontece,/no quando agora em mim /Cantando eu mando a tristeza
embora//O samba ainda vai nascer,/O samba ainda não chegou/O samba
não vai morrer,/veja o dia ainda não raiou//O samba é o pai do
prazer,/o samba é o filho da dor/O grande poder transformador”.
Caetano
Veloso, Maria Bethânia, Gilberto Gil, Roberto Mendes e outros
artistas baianos já se renderam à beleza do ritmo tendo gravado
vários samba de roda. De raiz africana, era a diversão dos escravos
e se subdivide em vários formatos como a chula, o samba de corrida,
o de parada, de quadra, o samba duro, entre outros. O samba não é
apenas um ritmo, é algo mais que uma simples música, ele evidencia
o sentimento de um povo, uma espécie de herança que passa de
gerações a gerações sendo, portanto, um conjunto de emoções.
O poeta
Vinícius de Moraes sintetizou, com extrema felicidade, a origem do
samba brasileiro, seu compromisso com a herança africana e as
contribuições que lhe foram trazidas pela cultura européia, ao
dizer que “o samba nasceu lá na Bahia e se hoje é branco na
poesia, ele é negro demais no coração...”.E Zé Keti completa:
“Eu sou o samba/A voz do morro sou eu mesmo sim senhor/Quero
mostrar ao mundo que tenho valor/Eu sou o rei do terreiro/Eu sou o
samba/Sou natural daqui do Rio de Janeiro/Sou eu quem levo a
alegria/Para milhões de corações brasileiros/Salve o samba,
queremos samba/Quem está pedindo é a voz do povo de um país/Salve
o samba, queremos samba/Essa melodia de um Brasil feliz”.
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