14 agosto 2012

Centenário de Jorge Amado (3)


Quando surgiu em 1945, a Editora Brasil América Ltda (Ebal) o Brasil vivia um momento de protestos contra os quadrinhos. O editor Adolfo Aizen procurou trazer temas educativos em linguagem atraente para as crianças e, em 1948 lançou a Edição Maravilhosa. “Por 23 números, Edição Maravilhosa trouxe apenas autores estrangeiros. A revista já havia completado seu primeiro aniversário quando,. Durante uma visita à editora, o escritor e sociólogo pernambucano Gilberto Freyre, então deputado federal, sugeriu a Aizen que adaptasse também as obras brasileiras. O editor gostou da ideia e encomendou a primeira ao haitiano naturalizado brasileiro André Le Blanc. Na edição 24, saiu O Guarani, de José de Alencar”, revela Gonçalo Júnior no livro A Guerra dos Gibis (Cia das Letras, 2004, pág. 123).

Jorge Amado teve três de seus romances que retratava a Bahia nos anos 20 e 30 incluídos na coleção: Terras do sem fim, São Jorge dos Ilheus e Mar morto. “A ideia geraria polêmica entre os escritores – conta Gonçalo -, mas a decisão de alguns deles de autorizar que suas obras fossem quadrinizadas por Aizen foi importante para romper um pouco da resistência dos colegas em relação aos quadrinhos. Então comunista convicto, Jorge Amado contrariou até mesmo seu editor, José Olympio, que achou muito perigosa as adaptações porque desestimulariam a compra dos livros. Mas havia um apelo irresistível dos gibis sob os escritores: as vendas elevadas. Enquanto a tiragem de 3 mil exemplares de um livro poderia levar até três anos para se esgotar, a edição em quadrinhos quase sempre passava dos 70 mil em uma quinzena – embora os autores não tivessem direito a 10% das vendas, como acontecia com os livros, uma vez que Aizen apenas pagava um valor fixo. Mesmo assim, ajudava a promover o autor e a aumentar a procura por outros títulos. Amado percebeu isso e mais tarde reconheceria que os quadrinhos foram fundamentais para popularizar seus romances”.

Problemas e injustiças sociais, folclore, a política, crenças e tradições, e a sensualidade do povo brasileiro foram temas constantes nas obras de Jorge Amado. A literatura de Amado conheceu inúmeras adaptações para cinema, teatro, televisão e quadrinhos, além de ter sido tema de escolas de samba por todo o Brasil. Numa época em que os gibis eram vistos como subliteratura, o escritor baiano aprovou a ideia de quadrinização de suas obras e tempos depois atribuiu sua popularidade às versões feitas em gibi de seus primeiros livros.

Ele teve três de seus romances adaptados para quadrinhos, na década de 1950, que fizeram parte da coleção Edição Maravilhosa, da Ebal. Amado estimulava essas adaptações, contrariando o seu editor na época, José Olympio, o qual pensava que os quadrinhos iriam prejudicar as vendas dos seus romances. Tornou-se um grande amigo de Adolfo Aizen, e diversas vezes visitou as instalações da Ebal com seus filhos, leitores vorazes de quadrinhos.

A rigidez da autocensura que Aizen estabeleceu, na época, não permitiu que a adaptação de Jubiabá fosse publicada. Anos mais tarde, houve uma segunda adaptação de Jubiabá. Essa, com roteiro de Fernando Albagli e desenhos do mestre Eugenio Colonesse, que não chegou a ser publicada por falta de interesse editorial, como nos conta Gonçalo Junior, em A guerra dos gibis. Recentemente a Companhia das Letras editou a quadrinização de Jubiabá, feita por Spacca. Esse romance foi o primeiro best-seller de Jorge Amado, e graças às ligações internacionais da militância comunista da qual Jorge fazia parte, ganhou várias traduções no estrangeiro. Foi lendo uma dessas traduções – Bahia de tous les saints – que o argentino Carybé e o fotógrafo Pierre Verger se encantaram com a Bahia e tornaram-se baianos para sempre.

“Há muita gente que tem preconceitos contra as histórias em quadrinhos e algumas aconselharam-me a não permitir tal adaptação. Mas eu gosto de concluir por mim mesmo, à base da experiência. E hoje, aproveitando o lançamento de Gabriela em quadrinhos, desejo dar meu depoimento. Estou plenamente satisfeito com essas adaptações e penso que elas só têm feito aumentar o público dos meus livros. O leitor da adaptação em quadrinhos, se gosta do livro, termina por ir buscá-lo para uma leitura na íntegra. Tenho provas disso. Da mesma maneiras que as adaptações cinematográficas, teatral, radiofônica ou para TV, a adaptação em quadrinhos é uma fora de popularizar o livro, de aumentar seu círculo de leitores, de ampliar sua repercussão”, disse Jorge Amado. Este depoimento foi transcrito da Edição Monumental n.01, 1961, da Ebal.

Quatro Azes

No dia 14 de março de 1934, Adolfo Aizen lança o Suplemento Infantil, apêndice semanal do jornal A Nação, do ministro João Alberto. A partir do número 15, o suplemento desliga-se do jornal e passa a ser editado separadamente. É o Suplemento Infantil, que depois passou a ser chamado Suplemento Juvenil que traz Flash Gordon, Dick Tracy, Príncipe Valente entre outro. Mas é no n1673 do Suplemento (28/03/34) que Jorge Amado em parceria com Matilde Garcia Rosa começa a publicar uma novela infantil Os 4 Azes, ilustrações de Santa Rosa. Durante alguns números os leitores se divertiram comas aventuras do menino Tonico, do gato Pega-Ligeiro, do papagaio Doutor e do galo do terreiro.

Jorge Amado, um dos maiores leitores de quadrinhos na Bahia permitiu, na época, que vários romances seus fossem adaptados para os quadrinhos, agindo contra o conselho de alguns amigos e editoras, que “achavam muito perigoso as adaptações, pois desvalorizariam a obra do escritor”. Jorge Amado, depois dos resultados das publicações, afirmou à imprensa que passou “a ter um número maior de leitores e parte da minha obra pode chegar ao grande público, com mais facilidade”.

Adolfo Aizen ainda foi responsável por outras publicações quadrinizadas no Grandes Figuras da História do Brasil (biografias de grandes vultos da nossa história), Série Sagrada (vidas de santos da Igreja Católca), o Antigo e Novo Testamento, Ciência em Quadrinhos, A Independência do Brasil, A Libertação dos Escravos, A Proclamação da República, além de uma preciosa quadrinização de Os Lusíadas, de Camões. Em 1974, Aizen foi premiado com a medalha Machado de Assis, oferecida pela Academia Brasileira de Letras como agradecimento pela sua contribuição à cultura do País.

Perfil/Gente

No dia 18 de novembro de 1985, a coluna Gente do 2º Caderno do jornal Correio da Bahia publicou uma página sobre Perfil/Gente dedicada a Jorge Amado, Camafeu de Oxossi, Aninha Franco. Calazans Neto, Ney Galvão, Jorge Calmon e outras personalidades falam do escritor baiano. Como editor de cultura do jornal prestei o seguinte depoimento:

“O mais consagrado escritor brasileiro, Jorge Amado, ao longo de tantos anos de atividades literária, vem se empenhando numa luta permanente em defesa de um ideal de justiça social, sem jamais trair a sua vocação de artista. Para ele, escrever sempre foi um grande prazer. São marcantes o romantismo, populismo e nacionalismo em suas obras. O nacionalismo de Jorge Amado, ao contrário de outros, contém uma forte dose de crítica social, derivada de suas convicções socialistas. Isto em sua primeira fase. De 1958 para cá, justamente com Gabriela Cravo e Canela, o romantismo, o populismo e o nacionalismo, embora se mantenham, mudaram de conotação: a crítica social violenta foi substituída pela ironia e pela adesão à tradição do romance picaresco.

“Sou um baiano romântico e sensual”, declarou certa vez. E, provavelmente, tem razão nas três coisas: Jorge Amado é baiano até a medula. Seu amor e compreensão das coisas da Bahia levaram-no desde cedo a reconhecer o candomblé como algo importante na tradição de seu povo. A popularidade da obra de Jorge Amado faz com que personagens e títulos de seus romances sejam utilizados das mais variadas maneiras – nomes de bares e restaurantes, bebidas e temperos. Ele é um dos poucos escritores nacionais que vive exclusivamente dos seus direitos autorais.

“Além disso, seus romances, contos e novelas têm sido adaptados com significativa frequência para o teatro, cinema, televisão, rádio, história em quadrinhos, livros de bolso e cordel. Romancista do povo, como é considerado pelas características de sua obra, e criador de tipos inesquecíveis, o escritor trabalha para difundir a cultura e a grandeza de seu povo. O alcance e seu trabalho não só no Brasil mas em outras partes do mundo, o que comprova a importância desse escritor muito amado”.

“Jorge Amado foi um escritor movido pela utopia de pensar e reinventar o Brasil – utopia que no início da carreira se traduziu na militância comunista, e, com o passar dos anos, se transformou num elogio rasgado da mestiçagem e do sincretismo. Seus retratos da Bahia (que para ele significava uma espécie de laboratório para refletir sobre o Brasil) parecem ganhar, sempre, voo próprio, alcançando um público alargado, que inclui aqueles familiarizados com o universo da leitura, e outros, mais contagiados pelas novelas, seriados, filmes, músicas e até pelos passeios turísticos por Salvador e Ilhéus. O Brasil de Jorge Amado é, pois, multifacetado e descoberto por ângulos os mais inusitados”, escreveu Ilana Goldstein e Lilia Moritz Schwarcz na apresentação do Caderno de Leituras O Universo de Jorge Amado, publicado em 2009. No capítulo sobre O artista da mestiçagem, Lilia Moritz informa “..a Bahia que descreveu foi aquela dos costumes misturados, dos credos cruzados e das gentes de muitas cores e mistérios. Sua ficção é sempre repleta de atores tão reais como imaginados e seu mundo de romance é povoado de um universo a um só tempo pessoal e partilhado socialmente. Por isso, em se tratando da obra de Jorge Amado, é sempre difícil dizer onde começa a ficção e quando termina a realidade”.

Referências bibliográficas:

CASTRO, Daniela. Jorge revivido. Salvador: A Tarde. Caderno 2, 06 de agosto de 2011. Páginas 01, 04 e 05.

CRUZ, Gutemberg. Gente da Bahia. Volume 1. Salvador: Editora P&A, 1997. Página 59.

CRUZ, Gutemberg. Gibis. Estima e admiração do público abrem caminho para as edições permanentes e livros luxuosos. Salvador: A Tarde Cultural, 02 de março de 1991

FUCHS, Franco Caldas. Retrato da mocidade. Salvador: Correio, 26 de abril de 2011. Páginas 26 e 27.

JUNIOR, Gonçalo. A Guerra dos gibis: a formação do mercado editorial brasileiro e a censura aos quadrinhos, 1933-64. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.

SCHWARCZ, Lilia Moritz & Ilana Goldstein. O Universo de Jorge Amado. Orientações para o trabalho em sala de aula. Caderno de Leituras. São Paulo: Editora Schwarcz Ltda - Cia das Letras, 2009.

TABACOF, Germano. Amado Jorge: 100 anos. Salvador: A Tarde, 21 de agosto de 2010. Página 02.

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