O Brasil é um país risível. Todos já
sabem disso. Música, esquetes de radio, quadros de TV, diálogos de cinema,
cartuns, quadrinhos e paródias carnavalescas. O povo ri dos poderosos. A
chegada da Família Real já dera munição aos compositores, muitas vezes
anônimos, para exercer sua verve na crítica aos hábitos e costumes da corte
portuguesa que desembarcara no Brasil com D. João: “Quem furta pouco é ladrão/Quem
furta muito é barão/Quem mais furta e esconde/Passa de barão a visconde”, debochava
uma canção satírica sobre a decisão do rei de vender títulos de nobreza para
equilibrar as finanças da Coroa.
Desde o início do século XX, já em 1907
a música era usada como sarcástica crítica aos políticos, em especial aos
parlamentares. Já naquele período havia o nefasto hábito de “mamarem nas tetas
do governo”, como descrevia a canção “Sessão no Congresso”, de 1907, de autor
desconhecido, interpretada por Cadete. Nela, o verbo cavar era empregado com o
significado de arranjar uma boquinha, um emprego, uma colocação: “Neste tempo
de progresso/Onde tudo causa efeito/Estou aqui nesse Congresso/Nada pode andar
direito/Tudo berra, tudo grita,/Eles fazem arrelia/Parecendo até ser fita/De
cinematografia/Em se cavando/Passa toda a humanidade/Só não cava quem não pode/Por
não ter habilidade”.
O cômico Cadete, numa gravação da Casa
Edson, dá uma geral nos políticos da época (1909): “Ninguém cuida do país,
ninguém dele faz reclame/No entanto é bem feliz quem lhe avança no arame
(dinheiro)/Esse negócio de deputado é uma mamata/A Nação é uma vaca e os
deputados os bezerros”
A sátira é a forma mais eficiente e
direta de transformar em humor o protesto. O humor, por sua vez, é a fórmula
universal de dizer com graça o que todo mundo gostaria de falar, mas não sabe
ou não pode. Vamos conhecer algumas preciosidades:
Ai,
Philomena (Bahiano)
Sucesso no carnaval de 1915, inspirado na urucubaca di azarento marechal Hermes
da Fonseca, o seu Dudu, talvez o presidente mauis satirizado da história do
Brasil.
“A minha sogra/Morreu em caxambu/Com a
tal urucubaca/Que lhe deu o seu Dudu//Ai, philomena/Se eu fosse como tu/Tirava
a urucubaca/Da careca (cabeça) do Dudu..”
Fala
Meu Louro (Sinhô).
Registro da segunda derrota de Rui Barbosa em eleições presidenciais, quando o
Águia de Haia perdeu para o Garnizé de Quitanda, Epitácio Pessoa. Fala meu
louro lançou Chico Alves no mundo do disco.
“A Bahia não dá mais coco/para botar na
tapioca/Pra fazer o bom mingau/para embrulhar o carioca//Papagaio louro do bico
dourado/Tu falavas tanto/qual a razão que vives calado//Não tenhas medo/coco de
respeito/Quem quer se fazer não pode/Quem é bom já nasce feito”
Francisco Alves - Fala meu louro
(Papagaio louro)
Aí,
seu Mé! Marcha (Freire Jr e Luiz Nunes Sampaio). Artur
Bernardes, dentre outros apelidos atribuídos pela oposição, era conhecido por
Seu Mé. Freire Júnior e Luiz Nunes Sampaio (Careca) compuseram a marcha Aí, seu
Mé, que teve quatro gravações em 1921 e 1922. Ressalte-se que o nome dos
compositores não constou em nenhuma das gravações e sim A Canalha das Ruas. Isso
de pouco adiantou aos compositores, uma vez que foram presos logo depois que
Artur Bernardes assumiu a Presidência da República.
“Zé-povo quer a goiabada campista/Rolinha,
desista, abaixe essa crista/Embora se faça uma bernarda a cacete/Não vais ao
Catete!/Não vais ao Catete!//Ai, seu Mé!/Ai Mé Mé!/Lá no Palácio das Águias,
olé...”
BAHIANO - AI, SEU MÉ 1922
Nenhum comentário:
Postar um comentário