13 março 2018

Povo ri dos poderosos (1)


O Brasil é um país risível. Todos já sabem disso. Música, esquetes de radio, quadros de TV, diálogos de cinema, cartuns, quadrinhos e paródias carnavalescas. O povo ri dos poderosos. A chegada da Família Real já dera munição aos compositores, muitas vezes anônimos, para exercer sua verve na crítica aos hábitos e costumes da corte portuguesa que desembarcara no Brasil com D. João: “Quem furta pouco é ladrão/Quem furta muito é barão/Quem mais furta e esconde/Passa de barão a visconde”, debochava uma canção satírica sobre a decisão do rei de vender títulos de nobreza para equilibrar as finanças da Coroa.

Desde o início do século XX, já em 1907 a música era usada como sarcástica crítica aos políticos, em especial aos parlamentares. Já naquele período havia o nefasto hábito de “mamarem nas tetas do governo”, como descrevia a canção “Sessão no Congresso”, de 1907, de autor desconhecido, interpretada por Cadete. Nela, o verbo cavar era empregado com o significado de arranjar uma boquinha, um emprego, uma colocação: “Neste tempo de progresso/Onde tudo causa efeito/Estou aqui nesse Congresso/Nada pode andar direito/Tudo berra, tudo grita,/Eles fazem arrelia/Parecendo até ser fita/De cinematografia/Em se cavando/Passa toda a humanidade/Só não cava quem não pode/Por não ter habilidade”.

O cômico Cadete, numa gravação da Casa Edson, dá uma geral nos políticos da época (1909): “Ninguém cuida do país, ninguém dele faz reclame/No entanto é bem feliz quem lhe avança no arame (dinheiro)/Esse negócio de deputado é uma mamata/A Nação é uma vaca e os deputados os bezerros”

A sátira é a forma mais eficiente e direta de transformar em humor o protesto. O humor, por sua vez, é a fórmula universal de dizer com graça o que todo mundo gostaria de falar, mas não sabe ou não pode. Vamos conhecer algumas preciosidades:


Ai, Philomena (Bahiano) Sucesso no carnaval de 1915, inspirado na urucubaca di azarento marechal Hermes da Fonseca, o seu Dudu, talvez o presidente mauis satirizado da história do Brasil.

“A minha sogra/Morreu em caxambu/Com a tal urucubaca/Que lhe deu o seu Dudu//Ai, philomena/Se eu fosse como tu/Tirava a urucubaca/Da careca (cabeça) do Dudu..”

Fala Meu Louro (Sinhô). Registro da segunda derrota de Rui Barbosa em eleições presidenciais, quando o Águia de Haia perdeu para o Garnizé de Quitanda, Epitácio Pessoa. Fala meu louro lançou Chico Alves no mundo do disco.


“A Bahia não dá mais coco/para botar na tapioca/Pra fazer o bom mingau/para embrulhar o carioca//Papagaio louro do bico dourado/Tu falavas tanto/qual a razão que vives calado//Não tenhas medo/coco de respeito/Quem quer se fazer não pode/Quem é bom já nasce feito”

Francisco Alves - Fala meu louro (Papagaio louro)


Aí, seu Mé! Marcha (Freire Jr e Luiz Nunes Sampaio). Artur Bernardes, dentre outros apelidos atribuídos pela oposição, era conhecido por Seu Mé. Freire Júnior e Luiz Nunes Sampaio (Careca) compuseram a marcha Aí, seu Mé, que teve quatro gravações em 1921 e 1922. Ressalte-se que o nome dos compositores não constou em nenhuma das gravações e sim A Canalha das Ruas. Isso de pouco adiantou aos compositores, uma vez que foram presos logo depois que Artur Bernardes assumiu a Presidência da República.

“Zé-povo quer a goiabada campista/Rolinha, desista, abaixe essa crista/Embora se faça uma bernarda a cacete/Não vais ao Catete!/Não vais ao Catete!//Ai, seu Mé!/Ai Mé Mé!/Lá no Palácio das Águias, olé...”

BAHIANO - AI, SEU MÉ 1922



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