Os sentimentos nos
humanizam e nos tornam iguais. Quem não quer sofrer, que não ame. Amor com
desejo ardente de um corpo querendo o outro. Amar sem explicações, sem
mentiras, sem medos, sem palavras neutras. As palavras muitas vezes nos revelam
ou nos escondem. A vida abre sempre janelas para os horizontes. É bom respeitar
o tempo porque ele é nossa própria aventura. Tudo que viver até agora é ainda
pouco para se saber o que é viver. Mas na entrega total ao que me cabe, ao que
acolho como bom. E a semente da minha história começou a brotar. Feliz daqueles
que sabem deixar uma marca na alma dos outros.
“A vida, em parte, do maior Re Te Tê, sob a
visão de um amigo, que teve o privilégio de conhecer, aprender, compreender e
exaltar, através do convívio, esporádico, nos últimos 30 anos, as atitudes de
um homem, integrante de uma família de respeito, de trabalhadores e de
indivíduos divertidos até a tampa, popularmente falando para indicar que a
atenção por eles dispensada não tem limites.
“Não tenho conhecimento da origem do codinome
que o tornou conhecido e sempre lembrado nos ambientes onde viveu, ou só
passou, mas, quando passou, deixou a sua marca como amigo, irmão, filho, tio,
cunhado, professor, companheiro e artista (na mais extensa expressão da
palavra). Por exemplo: como artesão, na costura (alfaiataria) e na culinária,
que foi um dos seus mais fortes empreendimentos.
“Empreendia tudo com afinco e dedicação
provenientes de uma sabedoria, ímpar, que só ele tinha. Não me lembro de alguma
informação de que ele tenha cursado séries mais avançadas no sistema
educacional instituído. Mas o conhecimento adquirido na vida, intensa, que
experimentou o tornou inteligente e preparado para realizar o que dispôs a
fazer.
“Como surgiu o PENGUEM, ou PENGA para os mais
chegados, repito, eu não sei. Só sei que esse apelido, ou nome que
carinhosamente ficou registrado, foi atribuído a ODEMAR ALVES. Na verdade, vejo
dois seres, e o descrito com todas e mais qualidades, acima citadas, só
pertence a Penguem. Assim que ele era conhecido. Quem o viu na Rua Salgado
Filho e adjacências, não viu Odemar, mas Penguem.
“Quando criança, me lembro, na Rua do Campo,
atual Rua dos Motoristas, Penguem já passava deixando suas lembranças. Um fato,
de natureza infantil, ao ser provocado, principalmente por algumas de minhas
irmãs, que posteriormente passaram a ser tão amigos que chegaram a dividir
residências, intimidades e cervejadas na idade adulta, ele não hesitava em
abaixar o seu calção (vestes da época para meninos) e mostrar o que tinha entre
as pernas e como um menino levado não temia voltar pelo mesmo caminho para dar
o trôco.
“Passam os anos e já adolescentes, eu o via
comprando sola (pele de boi curtida) e artefatos de metal para confeccionar
seus artigos de couro, costurados a mão. Cintos, bolsas, decoradas com ramos de
flores na parte da frente, espelhos emoldurados, também com couro decorado, com
aparadores para sala de visita, gargantilhas e etc... Só que sentado no chão da
copa da casa de seus pais, ao lado da máquina de costura de Sr Fia, seu pai e
alfaiate. Aproveito e lembro D. Vina, sua mãe, que quando um deles chegava de
viajem, ficava fazendo festa com as mãos, ou seja, virava e mexia, batia
palmas, curtas, mas fazia.
“Vi fazendo bolo para aniversário. Não era
comum, convencional, um rapazinho fazendo bolo, naquela época, anos 60, 70,
mas, para ele não tinha convenção, fazia porque era solicito. Desenvolveu sua
culinária e viveu alguns anos com essa atividade no Bairro da Saúde, em
Salvador, onde residiu umas 4 décadas, fazendo daquele bairro a extensão do
apartamento onde morou.
“Dançarino. Não sei avaliar qual era a dança,
se, samba de gafieira, forró, música lenta (expressão muito usada à época) e
valsa. Há, a valsa. Foi um frisson, quando sua irmã, Oderlândia – Lôra,
concluiu o curso Normal no Cienb – Centro Integrado de Educação Navarro de
Brito, o famoso Centro Integrado, cuja comunidade, daqueles anos, que por ali
passou, se formou com pompas, tipo: culto batista, missa e colação de grau no Cine
Madrigal, que já na entrada demonstrava glamour, ao oferecer uma escada em
espiral para o acesso ao seu interior, sem contar que, em seguida, e era o mais
esperado, a festa de formatura no Clube Social Conquista. Penguem, o escolhido
para padrinho da formanda, ficou ansioso por vários motivos: sentindo-se
importante, claro, irmã, família, formatura, dança e a muito comentada valsa.
Treinou com a formanda e as vezes sozinho. Tinha receio de escorregar nos tacos
encerados do clube - dizia. No baile, desce o casal a escada espiralada do
salão nobre, portando ela, um longo vestido verde, com mangas e saia plinsada –
luxo só – e ele um terno, também verde, com camisa e gravata de tonalidade
esverdeada. Sapato meio grená de verniz, bico quadrado (coqueluche do momento),
muito brilhoso. Ele demonstrava ansiedade, porque prendia o lábio inferior.
Mania que eu acho que ele tinha. Salão hiper lotado para a valsa. Na evolução,
via-se que nem todos haviam treinado, pois era um verdadeiro bate – bate. Por
exemplo: as mãos esticadas demais, atingia de cheio as costas ou os ombros ou
até mesmo o rosto de quem estava por perto. Findada a dança, perguntei: ué, e o
ensaio, travou as pernas? A resposta foi com base no receio. O piso estava
escorregando, acrescido de que a professora estava de salto alto e temerosa com
o empurra, empurra.
“Naqueles dias eu passei a só comprava sapato
modelo cavalo de aço, porque tinha borracha no solado e não couro. Aprendizado
com o professor de dança. Nos momentos
mais hilariantes ou de preocupação e ansiedade, quando menos se esperava estava
Penguem. Em 1982, operado do olho direito no Hospital Espanhol em Salvador,
tive uma revisão com um oftalmologista famoso no norte e nordeste. Fomos eu e
minha mãe a pé, pelo Bairro da Barra Avenida, pois quem poderia, naquele
momento, nos orientar seria uma irmã, muito chegada a ele, e que saíra cedo
para a praia. Aguardando a chamada e cansados, vimos, Peguem e a inseparável
Joledur, com trajes de banho de praia, adentrando a sala do consultório. Ela,
ainda usou um short rosa de tergal e ele, como era moda, trajando, apenas, uma
tanga vermelha. Agachou-se em frente a mãe, com as mãos sobre os joelhos, e
externou preocupação pela demora, desculpando-se. Mãe disse aos dois: saiam
daqui agora. Já pra casa. Assim ocorreu. Detalhe: os dois se agacharam, pois
não se seguravam de pé. Cerveja demais. Não me sai da mente a imagem de um
rapaz magrelo, alto e de tanga vermelha saindo do consultório. Eu falei: veja
só mãe... ela interrompeu e disse: estavam preocupados. Aprendizado. O
destemido me mostrou que nas mais diversas situações, podemos mostrar nossa
solicitude. Anos depois, num dos micaretas, desta cidade, socorri um colega de
bloco – as muquiranas – adentrando o hospital com o rosto maquiado a facão e trajando
um vestido da mãe de minha amiga.
“Certa vez, num apartamento em Salvador,
chegando do trabalho, meio dia, com fome, inventei de fazer um frango para
almoçar. Uma hora para o almoço. Ele na sala, vendo a labuta. Já tinha comido
até farinha seca para ir segurando o desespero da fome. De lá, ele me orienta.
Faz a passarinho. É mais rápido. Eu não
tinha noção do que era aquilo. Hoje eu sei, pois tomei uma aula.
“Em outra ocasião, já em casa, fazendo almoço
festivo, quis criar uma farofa diferente, daquelas com tudo dentro. O molho
estava bonito e fervendo. Quando fui botar a farinha, ele, encostado no portal,
disse: se por farinha aí agora, escalda. Eu querendo mostrar meus dotes, todo
no entusiasmo, e mais uma vez, foi uma aula. Segui a orientação e o prato ficou
bonito. Tantas e tantas outras vezes foi assim. Mas a eterna gratidão, a
ele, surgiu quando soubemos, por uma outra irmã, também muito companheira dele,
que, quando no mesmo hospital, após 38 anos, ele continuava demonstrando
preocupação e sentimentos por nós. Lá estava sozinho, as cinco da manhã,
sentado, em prantos, ao lado de minha mãe, velando-a, enquanto eram tomadas as
providências para o translado.
“É isto. Tentar homenagear um ser humano que
aprendeu os ofícios de inteligência, sabedoria, solicitude, trabalho, amizade e
irmandade, dentro da minha visão, é contar casos, hilariantes, na maioria das
vezes e preocupantes nas vezes que ele queria ultrapassar limites, impostos
pela sociedade que sabia estar equivocada, mas por conveniências, agia como
dona da verdade fosse.
Corajoso.
Trabalhador.
Brincalhão.
Conversador.
Aproveitador da vida, até onde pôde.
“Só terminava a narrativa de suas aventuras,
fossem na rua, em casa, na feira, no bairro ou onde estivesse, dizendo: FOI O
MAIOR RE TE TÊ. À Família os meus respeitos e considerações, desejando muita
paz e a esperança de dias melhores” (Franklin Coutinho Chaves, amigo de Vitoria da Conquista)
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