04 outubro 2021

Amor de mar, amor Odemar (01)

 

A morte de Odemar é o início de minha história, mas havia uma pré-história. Sei que sofrer com a lembrança é um reconforto. Sobrevivi e tive que ter força para manter a sanidade para seguir o caminho. Sempre tive que pagar o preço de ter um sobrenome Cruz. Minha ascendência explicava a todos os meus defeitos. Irritadiço, teimoso, impaciente, impulsivo.

 

Em Fragmentos de um discurso amoroso, o francês Roland Barthes afirma que o sujeito apaixonado não pode, ele mesmo, escrever seu romance de amor. Mas é preciso saber que mesmo que o filósofo consegue nos convencer de que o amor segue uma sequência própria dele, e indiferente a nós, sabemos que os amores são plurais. É o amor, e lhe escapam todas as explicações. Sonhos podem crescer e abarcar o outro, entretecendo, interligando e, nesse movimento, ganhando novos contornos. Nos meus sonhos e planos há lugar para o outro com toda sua alteridade.

 


Voltamos para nossa história. Cruz é um sobrenome religioso de origem ibérica, uma referência é cruz carregada por Jesus Cisto, no qual ele foi crucificado. Nomes de família ligados ao cristianismo eram bastante comum na Espanha e Portugal durante a Idade Média. Era uma maneira de prestar homenagem ao cristianismo. A origem do sobrenome foi uma só, mas o mesmo foi dado a diversas pessoas que não são necessariamente só do mesmo sangue. Dessa forma a família Cruz não é uma só.

 

Eu nasci em Salvador. No outono e, com ele a brisa que nos percorre o corpo ainda quente, vamos aos poucos começar a acalmar depois de tanta energia consumida no verão. As primeiras folhas caem no chão, sabemos que agora começa a época de acalmar de novo, de voltar a pôr os pés no chão ao mesmo tempo que vamos saboreando e recordando as emoções que acabamos de sentir no pico do verão. Procuramos o melhor aconchego, descansando um pouco para que as forças regressem para um novo ciclo. Estamos no momento de reflexão e relaxamento após o êxtase, estamos a saborear tudo o que vivemos e a incorporar em nós o que aprendemos. É o fim de um ciclo e o preparar um novo ciclo. Um ciclo se encerra e outro vai começar.

 

Plantei esperanças nas sofridas jornadas de fome de uma família pobre e sem muita perspectiva, mas habituada a trabalhar sem descanso. Plantei expectativas no desvario de meus escritos que retratavam as minhas angustias e cogitavam um mundo sem cordão umbilical como se o passado fosse um detalhe

 


A trajetória e os caminhos percorridos ao longo de minha formação acadêmica e profissional nunca deixaram dúvidas sobre o destino ao qual estavam me levando. Há décadas venho me relacionando e envolvendo com tudo aquilo que diz respeito aos estudos das histórias em quadrinhos, bem como à teoria que cerca esta grande área de saber. Ao trilhar um caminho na qual a HQ esteve (e está) presente de forma muito intensa, e que aos poucos me foi sendo revelado encantador e desafiador, questiono-me sobre a possibilidade de realização de uma pesquisa de mestrado, que trazem à tona algumas discussões sobre os tipos de quadrinhos e sua relação com a sociedade. Além de publicar diversos artigos em jornais e revistas, já escrevi dois livros sobre o assunto.

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