No dia
04 de janeiro de 1988 – há 25 anos - morria o cartunista Henfil
(1944-1988). Ele teve uma atuação marcante nos movimentos políticos
e sociais do país, lutando contra a ditadura, pela democratização
do país, pela anistia aos presos políticos e pelas Diretas Já. Com
humor mordaz e desenho caligráfico, Henfil destaca-se como um dos
militantes mais ativos na resistência ao regime militar. De suas
mãos saem personagens antológicos como os fradinhos Baixim e
Cumprido, a ave Graúna, o bode Orellana, Capitão Zeferino e Ubaldo,
o paranoico, que provocam mudanças na história dos quadrinhos
brasileiros não tanto pela inovação formal - apesar de ser
marcante o seu traço nervoso e espontâneo -, mas pelo uso dessa
linguagem gráfica específica como o melhor suporte para crítica e
comprometimento social.
Na sua
revista Fradim, lançada em 1978, desenvolveu ao máximo sua arte de
quadrinização, conquistando mais leitores com sua série sobre a
caatinga, onde Bode Orelana, Zeferino e Graúna ridicularizavam o
desenvolvimento do sul maravilha. Ao inundar o país com milhares de
cartuns e quadrinhos, o profissional que saiu da província balizou
uma trajetória digna da admiração dos seus pares.
Em 1973
partiu para os Estados Unidos, depois de uma longa e desgastante fase
de censura no Pasquim. Foi cuidar da hemofilia e “fazer a América”.
Chegou a registrar os Fradinhos nos Estados Unidos (os Fradins lá
eram conhecidos como The Mad Monks) e a publicar algumas tiras que
saíram de circulação por pressão de leitores e editores, que o
consideravam sick (doentio) demais. Nesse exílio voluntário, ele
descobriu outra faceta do seu múltiplo talento: o de escritor. As
cartas que escreveu a familiares e amigos transformaram-se no livro
Diário de um Cucaracha, onde contava suas desventuras em terras
americanas.
Henfil
passou dois anos nos Estados Unidos, sendo duramente criticado por
isso. Segundo seus críticos, ele ia em busca de reconhecimento
mundial quando na verdade ia apenas tratar de um problema no joelho.
Lá, além dos seus próprios problemas de adaptação, teve que
enfrentar também o problema de adaptação de seus personagens,
tendo preferido não mexer neles e criar um outro para um jornal
underground de Nova Iorque, além de colaborar como chargista em um
jornal do Canadá.
Foi o
único brasileiro a ser aceito pelo mais poderoso sindicato norte
americano de cartunistas, UPS (Universal Press Syndicate), que
controla a publicação de tiras nos jornais dos EUA. A moral
americana rejeitou os fradinhos. Eram sádicos, escatológicos,
desajustados, diziam. Mas no Brasil eles seduziram milhares de
leitores. Era com eles que Henfil exorcizava as neuroses de sua
educação rígida e mostrava a cara de seu País. Cruelmente
engraçado. No final dos anos 70 montou um apartamento em São Paulo,
levando para morar com ele Angeli, Laerte e Glauco. Morou durante
sete anos. Seu trabalho voltou-se exclusivamente para a crítica
política.
Nesta
época, também interrompeu as publicações da revista Fradim.
Embora muitos acreditassem ser obra da Censura, a interrupção, na
verdade, foi espontânea e deveu-se a uma decisão particular de
Henfil. Foi também neste período que surgiu a oportunidade de
Henfil vir a trabalhar como chargista da revista Playboy americana,
mas foi rejeitado. O motivo? Suas charges foram consideradas
inteligentes demais para o público da revista para o qual, segundo
a direção da publicação, só servia entretenimento, coisas que
não fizessem pensar muito.
Mas as
andanças de Henfil não param por aí. Teve também a época que ele
passou morando no Nordeste onde, segundo ele, foi por uma questão
de sobrevivência humana, egoística e individual, para resolver
problemas de saúde mental e refletir, ficar mais próximo do habitat
natural de seus personagens
“Em
matéria de humor, sou pela gargalhada pé na cara, franca,
espontânea, brasileira;Não admito a sofisticação do sorriso”
(Revista de Domingo, Jornal do Brasil, 1978)
Henfil só
pôde traduzir os diferentes momentos da época porque os viveu. Ele
aproximou-se da militância com o irmão Betinho, militante da Ação
Popular. Com o irmão exilado, Henfil visitava presos, participava de
reuniões, da reorganização dos sindicatos, das greves, da luta
pela Anistia, do surgimento do PT e das Diretas Já. Para ele, “a
chave para você fazer humor engajado é estar engajado. Não há
chance de você ficar na sua casa vendo os engajamentos lá fora e
conseguir fazer algo. Esse talvez seja o humor panfletário. O que
você faz de fora”.
Henfil
não conseguia fazer um humor panfletário também por causa de sua
extrema sensibilidade. Sem “comprar a briga” de uma categoria ou
pessoa, ele não se achava em condições de desenhar. Só se vivesse
a luta. “Eu ia lá, assistia as reuniões, se eu começasse a me
emocionar com a coisa, saía”.
Os traços
de Henfil são curtos, rápidos, transmitem força e expressividade.
Talvez o maior exemplo de síntese seja mesmo a Graúna, que chegou a
ser comparada com um ponto de exclamação. O leve deslocamento de um
de seus traços altera seu humor.
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