20 junho 2012

Mulheres da Cidade d´Oxum


A socióloga e Mestre em Geografia, Antônia dos Santos Garcia realizou uma pesquisa em 34 bairros populares de Salvador. Esses movimentos de bairro são, predominantemente de mulheres, que buscam melhores condições de vida não só junto ao poder público, mas agindo diretamente em creches, escolas e outras experiências comunitárias. Ao analisar a distribuição dos serviços públicos da cidade, vê-se claramente a sua perversidade ao privilegiar as regiões abastadas e brancas.

Este seu trabalho lançado pela Edufba em 2006, intitulado Mulheres da Cidade d´Oxum busca, sobretudo, compreender a pratica desigual de apropriação do espaço urbano entre homens e mulheres, fazendo uma releitura sobre a cidade a partir das relações raciais, de gênero e de classe no espaço soteropolitano.

Antonia Garcia analisa as mulheres das classes populares como sujeitos sociais, buscando o resgate dos múltiplos significados de suas práticas coletivas. Mostra ainda que a base deste movimento é amplamente negra, como as próprias militantes, sujeitos de sua pesquisa, se autodefinem. E foi inspirada em Oxum (orixá das águas doces, da beleza e da vaidade feminina) que Garcia reflete sobre os problemas apontados pelos homens, especialmente, pelas mulheres, sujeitos de sua pesquisa, traçando um panorama atual e pertinente sobre as relações de poder na cidade do Salvador.

As mulheres, apesar de maioria da população, em quase todas as cidades continuam quase sempre invisíveis. Em Salvador, por exemplo, são 53% (IBGE, 2000) de população e também maioria do eleitorado (51%), segundo o TSE – Tribunal Superior Eleitoral. Esta mesma tendência se manifesta no Estado, onde as mulheres baianas já são 4.155.743 eleitores, com predominância nas faixas etárias que variam de 25 a 69 anos, e um total de 4.063.500 eleitores, nos 417 municípios.

Além da invisibilidade, permanece o tratamento desigual baseado no sexo, que continua em todo o mundo, em todas as cidades. Os direitos civis e políticos das mulheres são violentados. Os direitos econômicos e sociais são afrontados. Salvador, por exemplo, se inscreve entre s lugares mais desiguais do sistema. A pobreza crônica atinge mais de 1,4 milhão de moradores (cerca de 73% da população – IBGE 1996). Pesquisa da Fundação Getúlio Vargas (2001) confirma o grau de pobreza da capital, que apresenta as menores rendas familiar e per capita entre as 12 maiores capitais brasileiras.

ESCOLHIDA - No século XVI, Salvador foi escolhida como sede de governo devido à excelente localização geográfica e estratégica posição econômica, como principal porto de carga e descarga de mercadorias de todo o Nordeste. Localizado entre o mar e as colinas da Baia de Todos os Santos, a capital baiana prosperou, inicialmente, com a exportação do açúcar e depois com o comércio entre a Colônia e Portugal.

A partir do final do século XIX a influência de Salvador como metrópole colonial regional diminuiu progressivamente, sobretudo na terceira década do século XX. Entrou em declínio, ficando estagnada desde o início do século XIX até por volta de 1950. Com a instalação da Petrobras, na década de 1950, o Centro Industrial de Aratu na década de 1960, e o Polo Petroquímico de Camaçari na década de 1970, a economia da Região Metropolitana de Salvador tomou outro rumo.

Assim, o período de 1960 a 1980 houve a politica industrial incentivada e que foi abortada na década de 80. Com a derrocada da Sudene, o Nordeste perdeu sua capacidade de desenvolvimento industrial. Salvador herdou o desemprego em toda a década de 1990. O setor terciário é o mais significativo da cidade.

Ao concluir sua obra, Antonia dos Santos Garcia informa: “Infelizmente, a Cidade d´Oum é sexista, racista, e classista, como todas as cidades organizadas sob a ótica das classes dominantes. Contudo, as mulheres de Salvador têm no símbolo de Oxum a inspiração para torná-la a cidade das mulheres, dos homens, enfim, das pessoas felizes e libertas das amarras da dominação de qualquer natureza” (p.210)

Com suas formas curvilíneas repleta de contornos, enseadas, ladeiras, curvas sensuais, Salvador ganhou a roupagem da terra feminina, de mulheres bonitas e atraentes, regida pelas divindades femininas mais fortes do candomblé, Oxum e Iemanjá. “Nessa cidade todo mundo é de Oxum, homem, menino, menina, mulher...”, diria o cantor Gerônimo. E Gilberto Gil escreveu que “toda menina baiana tem um santo que Deus dá. Toda menina baiana tem encanto que Deus dá. Toda menina baiana tem defeito também que Deus dá”.

A regência de orixás como Oxum e Iemanjá é uma característica que fortalece bastante Salvador como cidade feminina. Elas são lembradas com muita fé. A festa de Iemanjá é um dos maiores ritos do mundo. A forte presença das mulheres negras em Salvador, as famosas mulheres do partido-alto que conseguiram muito progresso, também intensificou a ideia de Salvador terra das mulheres. Elas foram e são símbolos de força, mulheres do povo. A maior autoridade religiosa na Bahia foi mãe Menininha do Gantois. Toda essa história da cidade feminina tem muito das origens e cultura da terra.

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