27 junho 2012

Cinco fases de Gilberto Gil -1967/1987 (1)


Poetas, seresteiros, namorados, correi, é chegada a hora de se deleitar com a obra de Gilberto Passos Gil Moreira, o conhecido Gilberto Gil. Neste especial (que produzi para a Rádio Educadora da Bahia na época) vamos conhecer a trajetória do artista em cinco fases, no período de 1967 a 1987.

A preocupação política sempre foi uma constante na obra do cantor e compositor Gilberto Gil. Mas a sensibilidade do artista, aguçada por ricas experiências pessoais e por uma rara sintonia com o mundo a seu redor, levou-o a alargar e a aprofundar essa postura, entrelaçando-a ao próprio cotidiano. Já em seu primeiro disco, “Louvação”, ele pulava fora do convencional. Assim ele define sua Procissão: “Olha, lá vai passando a procissão/se arrastando que nem cobra pelo chão”. Afinal, comparar uma procissão à cobra que se arrasta pelo chão anunciava a chegada de um poeta da MPB.

Olha lá vai passando a procissão/se arrastando que nem cobra pelo chão/as pessoas que nela vão passando/acreditam nas coisas lá do céu/as mulheres cantando tiram versos/os homens escutando tiram o chapéu/eles vivem penando aqui na terra/esperando o que Jesus prometeu//E Jesus prometeu vida melhor/pra quem vive nesse mundo sem amor/só depois de entregar o corpo ao chão/só depois de morrer neste sertão/eu também tô do lado de Jesus/só que acho que ele se esqueceu/de dizer que na terra a gente tem/de arranjar um jeitinho pra viver//Muita gente se arvora a ser Deus/e promete tanta coisa pro sertão/que vai dar um vestido pra Maria/e promete um roçado pro João/entra ano, sai ano, e nada vem/meu sertão continua ao deus-dará/mas se existe Jesus no firmamento/cá na terra isto tem que se acabar” (Procissão)

Desde seu elepê de estreia, Gil mostrou que não ia se contentar com o convencional. Tanto que já nesse disco ele surpreendia com “Lunik 9”, uma canção dividida em diversas partes, sem se fixar num único andamento. Gil canta um tema da era tecnológica, contrapondo a lua da lírica tradicional à lua desmistificadora pelos voos especiais. Outra música que refletia o clima de contestação da época, “Ensaio Geral”.

Também desta primeira fase estão as canções “Roda”, de Gil e Torquato Neto, e “Ele Falava Nisso Todo o Dia”. Esta última sobre um personagem preocupado com o seguro de vida. É pelo protesto que Gil se identifica com o despertar de uma geração. Uma canção que causou impacto pela complexidade construtiva: “Domingo no Parque”. O forte da música é o arranjo que Gil e Rogério Duprat realizaram, segundo uma concepção cinematográfica, assim como a interpretação contraponteada de Gil. Letra, música, sons, ruídos, palavras e gritos são sincronizados, interpenetrando-se como vozes em rotação para narrar uma tragédia amorosa, vivida em ambiente popular. “Domingo no Parque” ficou em segundo lugar no 3º Festival da Record, em São Paulo.

O rei da brincadeira (ê, José)/o rei da confusão (ê, João)/um trabalhava na feira (ê, José)/outro na construção (ê, João)//A semana passada, no fim da semana/João resolveu não brigar/no domingo de tarde saiu apressado/e não foi pra Ribeira jogar capoeira/não foi pra lá, pra Ribeira, foi namorar/o José como sempre no fim da semana/guardou a barraca e sumiu/foi fazer no domingo um passeio no parque/lá perto da Boca do Rio/foi no parque que ele avistou Juliana/foi que ele viu/foi que ele viu Juliana na roda com João/uma rosa e um sorvete na mão/Juliana seu sonho, uma ilusão/Juliana e o amigo João/o espinho da rosa feriu Zé/e o sorvete gelou seu coração/o sorvete e a rosa (ô, José)/a rosa e o sorvete (ô, José)/foi dançando no peito (ô, José)/do José brincalhão (ô, José)//O sorvete e a rosa (ô, José)/a rosa e o sorvete (ô, José)/oi, girando na mente (ô, José)/do José brincalhão (ô, José) Juliana girando (oi, girando)/oi, na roda gigante (oi, girando)/oi, na roda gigante (oi, girando)/o amigo João (João)/o sorvete é morango (é vermelho)/oi girando e a rosa (é vermelha)/oi, girando, girando (é vermelha)/oi, girando, girando...//Olha a faca! (olha a faca!)/olha o sangue na mão (ê, José)/Juliana no chão (ê, José)/outro corpo caído (ê, José)/seu amigo João (ê, José)/amanhã não tem feira (ê, José)/não tem mais construção (ê, João)/não tem mais brincadeira (ê, José)/não tem mais confusão (ê João)...(Domingo no Parque)

Em 1967, com o som dos Beatles na cuca e toda a ebulição da época, contracultura e psicodelismo, Gil começa a procurar novos caminhos. Junto a Caetano Veloso, Gal Costa, Tom Zé, o maestro Rogério Duprat, os poetas Torquato Neto e Capinam, o artista plástico Rogério Duarte e o empresário Guilherme Araújo, Gil é um dos expoentes do Tropicalismo, um movimento que iria modificar profundamente a música brasileira.

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2 comentários:

BLOGDOFERNANDODEAIRA disse...

Que bom que exista a net para vc passar seus inumeros e vastos conhecimentos para todos. Parabens meu amigo e lembraças sempre ficam guardadas no coração.

BLOGDOFERNANDODEAIRA disse...

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