A maioria do público leitor brasileiro está embriagado pelos modelos estrangeiros, principalmente o norte-americano. Afinal, vivemos num pais praticamente ocupado e neocolonizado pelo estrangeiro. E essas forças existem e influenciam uma visão a serviço dos grupos dominantes dentro do país. O sistema ideológico sustentado perla estrutura narrativa dos quadrinhos mostra uma visão de mundo segundo a qual as ocorrências representam sempre a mesma situação, com personagens que reagem sempre segundo os mesmos estímulos. Os heróis são invariavelmente pobres, enquanto os maus são invariavelmente ricos e poderosos, configurando, obviamente uma acentuada ideologia de conformismo.
É esse quadrinho que vai influenciar o nosso leitor, os nossos desenhistas em primeiro lugar. E quando aparece um quadrinho brasileiro sério, ligado a nossa realidade, às nossas raízes, a repressão toma conta, obrigando o nosso quadrinho a utilizar os canais de alienação, dos recalques, as relações de frustração existentes no seio da massa. E são poucos os que se entregam com entusiasmo a uma obra que discute os temas de interesse nacional e de interesse popular mesmo sabendo que há uma pressão permanente para lhes tolher os passos e matar qualquer entusiasmo pelo que é nacional, popular, democrático.
A discussão sobre censura, do ponto de vista de moral social, baseia-se em duas teses antagônicas. Uma considera o povo – principalmente a faixa jovem – incapaz de entrar em contato com certas realidades, devendo-se portanto preservá-lo do convívio com cenas que envolvem sexo e violência. Baseado nesses princípio, alguns países interditaram a publicação da revista Kelling, por exemplo. A segunda corrente considera as cenas de sexo e violência uma ocasião de liberar sentimentos de maneira sadia.
SURTO DE NACIONALIZAÇÃO
A liberdade de imprensa, que vigorou no Império, muito contribuiu para o desenvolvimento no país das caricaturas e charges, graças ao espírito liberal de D. Pedro II. Quando Raimundo Aguiar (K-Lunga) começou a fazer charges políticas para o jornal A Hora, dirigido por Artur Ferreira, vários problemas iriam surgir. A Hora fazia campanha contra o governador Antonio Muniz (governou a Bahia entre1916 a 1920) cuja alcunha era Cara de Nádegas de Anjo. Uma de suas charges mostrava o governador cobrindo as nádegas de uma estátua do passeio público e “zé povo” perguntando: “Que é isso, excelência, cobrindo estátuas?”. “É, meu amigo, eu não quero confusões”. Nesse dia, a edição do jornal foi apreendida. Mas o Artur Ferreira não perdia tempo e, nem tampouco tinha medo de represálias. Encomendou outra caricatura criticando o governador. Aguiar fez a cabeça do governador se transformando, em quatro fases, num anjinho de cócoras. Nesse dia o jornal foi empastelado. Em 1930 Aguiar foi preso, por causa de suas charges na revista A Luva.
Muitos dos nossos humoristas foram perseguidos por causa de suas charges. Alguns deles tiveram que mudar de profissão caso contrário perderia até a vida se continuasse a retratar o mundo dos poderosos. Juracy Magalhães, um dos chefes do Movimento Revolucionário de 1930, é um bom exemplo dos que perseguiram os nossos humoristas.
Sob o Estado Novo, o direito de informação vai conhecer o retrocesso no Brasil. Liquida-se a liberdade e imprensa, reimplanta férrea censura, cria-se órgão estatal para o controle de jornais e periódicos, além de radiodifusão, institucionaliza-se a propaganda do regime e dos senhores do poder. Durante a ditadura imposta ao país pelo Estado Novo, através de o
rganismos como o DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda), o controle de informação era dos mais rígidos. Foi um período obscurantista de nossa História, dada a terrível estagnação ao desenvolvimento da cultura brasileira.
Durante o governo de Juscelino Kubitschek (1956/61) foram livre os sindicatos, as manifestações artísticas e científicas – apareceram a música de protesto, o cinema novo, a bossa nova. Foi livre a imprensa. E nesse período que tem inicio a quadrinização de artistas populares como Arrelia e Pimentinha, Mazzaropi, Oscarito e Grande Otelo, Carequinha e Fred.
É o surto da nacionalização. Ziraldo lança na O Cruzeiro o seu Pererê. Moysés Weltman cria Jerônimo, o herói do sertão. Álvaro Aguiar cria O Anjo. Mauricio de Souza cria Bidu e Cebolinha. O quadrinho brasileiro começa a tomar fôlego. Apesar de pequeno surto de nossos quadrinhos, Juscelino foi também um aliado fraterno das multinacionais.
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2 comentários:
Caro Gutemberg,
Descobri seu blog realizando uma pesquisa sobre Raymundo Aguiar, para um livro-reportagem que estou escrevendo sobre a revista A Luva, como Trabalho de Conclusão de Curso. Foi um achado pra mim este seu trabalho. Além de material sobre Raymundo Aguiar, fiquei feliz em encontar uma biografia sobre Carlos Chiacchio. Ajudou-me muito!
Estarei adqurindo em breve o seu livro.
Saudações,
Karla Izabelle
Karla
Depois do São João vou publicar diversos artigos sobre a origem dos quadrinhos e, muito mais adiante, estarei falando de Raimundo Aguiar, as revistas ilustradas na Bahia. Um forte abraço
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