NOSSO QUADRINHO UDIGRUDI
A partir do Tropicalismo (1967/8) surge um novo caminho para o grafismo brasileiro e que alcançou o público através de edições marginais como Flor do Mal, Verbo, Bondinho, Roling Stones, Folha de Rosto, Ruído, Vapor, Isso e Feto.
A vida cultural brasileira no período posterior a 68/69, o controle das informações, a despolitização gradativa e segura das paixões e das ambições, os novos condicionamentos, as novas formas de rebeldia, a falta de mercado, o desinteresse dos editores por publicações feitas aqui foram e são ainda problemas que nossos desenhistas enfrentam, tudo isso – e mais algumas coisas – deu origem ao chamado quadrinho marginal.
Por volta de 1971/2, uma nova perspectiva editorial abriu-se na HQ brasileira: os desenhistas, cansados de tanto esperar pelas respostas das editoras e/ou não concordando com as colocações das mesmas, resolveram partir para o financiamento de seus próprios trabalhos. O desenhista, após editar sua revista, via-se obrigado a sair em campo para veicular e conseguir, no mínimo, pagar os custos gráficos.
Este tipo de técnica menos sofisticada permitiu uma proliferação e uma circulação à margem do sistema editorial. Como consequência de iniciativas marginais, as produções tornaram-se irregulares, sem periodicidade certa, programação definitiva para os números seguintes, distribuição precária – venda; muitas vezes, de mão em mão, colaboradores inconstantes e cobertura publicitária insuficiente, ocorrendo como em outros exemplos, mortes prematuras, silêncio e pressões externas.
A gênese desse tipo de publicação marginal está na incapacidade dos mecanismos tradicionais de edição e comercialização da revista – editoras, distribuidoras e bancas de jornais – absorveram capacidade de produção e principalmente de consumo de larga parcela do público leitor. Seu crescimento e principalmente sua vitalidade deram-se à margem desses e de outras instituições. Com o surgimento de cooperativas de desenhistas essas edições se transformaram numa experiência mais estável.
O GRILO
12 de outubro de 1971. Uma data importante para o mercado editorial de quadrinhos no Brasil. Uma data de renovação. Sem publicidade alguma, aparecia nas bancas de jornais uma publicação diferente, formato jornal, dobrada em formato revista. O Grilo. Ponto de partida para as revistas underground brasileiras.
Trazendo em suas páginas artistas como Gore, Crumb, Corben, Wolinski, entre outros. O Grilo fez florescer o udigrudi nacional. Por volta de 1972 os grêmios da Universidade de São Paulo lançaram Balão, uma revista contra os bandidões das historietas. Entre todas as experiências de criação independente no campo dos quadrinhos, o Balão mostrou os resultados mais inteligentes e inovadores.
E os quadrinhos marginais espalharam-se por todo o País. No Rio surgiram A Esperança no Porvir, Cordelurbano e O Bicho. A última desponta como a mais séria experiência editorial na esfera dos quadrinhos nacionais, tendo em vista o real aparecimento das possibilidades produtoras dos nossos artistas. Em Porto Alegre surgiu Araruta. Em Curitiba a revista Apesar de Você. Em Natal foi lançada a revista Cabramacho. Em Recife O Outro e em Minas, a revista Uai, título que “mais que uma pergunta e uma expressão mineira é esperança de melhores dias”. Como não passou do número zero, deitou sementes para o Almanaque do Humordaz.
NOVOS TÍTULOS
Chega o ano de 1976 e com ele novas publicações marginais. Como a maioria das revistas desse tipo, o quadrinho udigrudi é difícil de conseguir: só é encontrada em postos ambulantes, escolas, viadutos e por aí a fora.
Na cidade de Natal, Enoch Domingos juntamente com J. Medeiros, Emanuel Amaral, entre outros, lançaram Maturi, a menor revista de quadrinhos do mundo. Em Curitiba, começa a circular Casa de Tolerância com trabalhos de Cortiano, Solda, Miran etc. Destacando-se os trabalhos de Jô Oliveira, Duarte, Caco e Bravo, é lançada em Brasília a revista Risco. No Rio, aparecem duas novas publicações: Virus e Roleta.
Em São Paulo, que ficou um período sem atividades devido à paralisação da revista Balão, volta agora à luta. Os diretórios acadêmicos de Comunicações e Artes Plásticas da Faap, tendo à frente Dagomir Marquezi, com o objetivo de “mostrar quadrinhos realizados em países dominados por Patópolis ou se libertando de Gothan City” lançam a revista Boca. Os lançamentos de revistas udigrudi no ano passado foram: A Mosca, do Rio; Meia Sola, de Belo Horizonte; Quadreca, em São Paulo; Na Era dos Quadrinhos, em Salvador. E já está para ser lançada a revista Lixo.
As experiências são vastas, incontáveis, devendo estar na casa de dezenas de milhares de revistas vendidas de mão em mão em todo o País. É impossível contar essa produção. Mais importante controlá-la totalmente,
De futuro ignorado, o certo é que Risco, Vírus, A Mosca, Boca, Roleta, Na Era e dezena de outras têm para a cultura brasileira de hoje, a mesma importância que os saudosos A Manha de Aparício Torelly, O Barão de Itareré, o Pif Paf de Millôr Fernandes, Dr Macarra de Carlos Estêvão e Aba Larga de uma cooperativa gaúcha. Sem dúvida, os anos 70 estão sendo férteis para o quadrinho marginal. Pelo menos dez novos títulos – Maturi, Vírus, Risco, Boca, A Mosca, Roleta, Casa de Tolerância, Meia Sola, Quadreca e Na Era – vieram juntar-se à cada vez mais numerosa trupe de underground que aparece nas universidades e outros locais.
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