Desde muito cedo, Valmar Oliveira vivia
cercado por elementos que o acompanham até hoje, como música, filmes, seriados
e quadrinhos. Antes mesmo de ler, já rabiscava nos livros da casa. Influenciado
por seu pai, consumia avidamente as revistas que lhe eram dadas, em especial os
quadrinhos de heróis. No meio dos anos 80 tomou contato com o quadrinho
underground europeu e nacional, o que abriu novos horizontes para um novo tipo
de linguagem, passando a explorar novas técnicas. No final dos anos 80
participou da AQB (Associação de Quadrinistas da Bahia), grupo de fanzineiros
que se reuniam para troca de idéias e experiências. Participou de fanzines,
publicando quadrinhos, tiras, ilustrações oi fazendo resenhas, inclusive de
música. Publicou quadrinhos na revista Crau, da extinta Impression, quadrinhos
eróticos pela 2M (Brazil e HQ Brazil), e no núcleo de pesquisa da UFBA
(Universidade Federal da Bahia), onde se formou como Bacharel em Artes
Plásticas. Participou de vários salões de humor nacionais e internacionais
(como a 4th Cartoons Undercover na Belgica e o XXX Salão de Piracicaba, SP),
trabalhou como free lancer para algumas agências publicitárias em Salvador como
ilustrador.
Atualmente trabalha como educador, além
de produzir ilustrações ocasionais. Faz parte da HQ Bahia, nova associação de
quadrinistas. Publicou HQs pela Editora Júpitor II (antiga SM) nas revistas
Boca do Inferno e Raio Negro, após um período afastado dos quadrinhos. Artista plástico.
Arte Educador. Ilustrador. Quadrinista. Artista múltiplo ele vai de quadrinhos,
música, cinema e artes plásticas. O Blog do Gutemberg conversou com ele sobre
sua trajetória.
Você é professor, músico,
videomaker, quadrinista, um artista múltiplo. O que levou a fazer quadrinhos ?
VO - Os quadrinhos fazem parte
da minha formação como pessoa. Praticamente eu comecei a me interessar por HQs
por conta de meus pais que me davam pra ler e passar o tempo, e ai comecei a
rabiscar já com 5 anos. Então, minha formação, e o que me levou a fazer HQs é
meu amor por essa expressão artística maravilhosa, aliada a meu gosto por
filmes e seriados.
Como foi seu começo?
VO - Comecei rabiscando os
livros de enfermagem de minha mãe, páginas em brancos de livros e
enciclopédias. Depois passei a rabiscar cadernos e folhas de oficio. Ai passei
a criar meus heróis, alguns eram cópias ou variações de heróis já existentes.
Cheguei a ter quase 200 personagens. Pegava as folhas de oficio e dobrava,
colava no meio e fazia meus formatinhos. Desenhava à caneta, pintava com lápis
de cor. Por conta disso, tenho facilidade em criar, sem precisar de esboços, já
eu pensava na cena toda na cabeça e já desenhava direto no papel usando bic de
tinta azul, e posteriormente a de cor preta. Muito tempo depois me disseram que
as artistas usavam nanquim e fui usar pena mosquito e foi quando passei a
desenhar primeiro a lápis para depois fazer a arte final. Ai já passei para
tentar fazer fanzines e projetos diferentes.
Quando estudava na Escola
de Belas Artes da UFBA teve contato com outros colegas que fazem quadrinhos. E
o professor Juarez Paraíso, apaixonado pelos quadrinhos...
VO - Tive contato com pouca
gente que fazia. A maioria apenas lia. Cheguei a participar de uma publicação,
um zine offset onde tinha material do Fernando Lopes e Naara Nako.
Quando foi publicada sua
primeira HQ?
VO - De forma profissional, foi
a Crau # 1 (Editora Impression, 1995). Antes eu fazia minhas próprias HQs e
fanzines. Posteriormente passei a fazer quadrinhos eróticos para editora paulista
e participar de coletâneas.
Você também faz
caricaturas, charges e cartuns?
VO - Caricaturas não faço, pois
as que fiz achei ruins e parei. Charges e cartuns já faço, embora não tenha
feito mais nada nesse sentido. Antes eu fazia mais para salões.
Quais são suas maiores
influências?
VO - Minha maiores influencias
são Jack Kirby, Frank Miller, Bené Nascimento, Jim Starlin, Mike Mignola, Brian
Bolland, Tanino Liberatore, Dali, Caravaggio, Bob Larkin, Earl Norem, Dave
Mckean, Simon Bisley, Sal e John Buscema, Frank Frazetta...
Qual a informação que
alimenta o seu trabalho?
VO - Bem, eu pessoalmente me
inspiro em filmes de terror e ficção científica. Procuro não me influenciar
pelas HQs que leio.
Você fez uma HQ, A
Conquista do Brasil em 2000. Fale um pouco desse trabalho?
VO - Essa HQ foi feita para uma
exposição sobre os 500 anos do Brasil. Teve maior polêmica, pois tudo era humor
e eu cheguei com um trabalho sério, critico. Quase não foi exposto e até hoje
me orgulho por ter um revisionismo histórico ali, mostrando chacinas,
extermínio e tudo de ruim que houve na colonização.
E a HQ Zombie Night, uma
homenagem ao mestre George Romero (1940-2017) ?
VO - Originalmente eu tinha
feito apenas para protestar contra os mortos velocistas que tem aparecido no
cinema, e homenageando o mestre Romero e as convenções que ele criou no gênero.
Acabou que ela foi incluída na segunda edição da revista Boca do Inferno,
juntamente com uma pintura minha com zumbis, uma releitura do quadro American
Gothic, do Grant Wood, que eu tinha feito nos tempos da UFBA. Acabei
participando de mais duas edições da publicação.
Tem também as novas
aventuras de Lord Jesus. Como foi o processo de criação desse personagem e foi
publicado em que ano?
VO - Essa HQ, infelizmente só
publiquei online em 2008. Pretendo até refazê-la e dar continuidade. Foi algo
que pensei na faculdade. Que do jeito que as coisas estão, as mensagens de paz
de Jesus não seriam ouvidas e ele precisaria sofrer um upgrade, se atualizar.
Foi algo feito de zoeira, mas rendeu boas risadas.
Você tem uma HQ feita em
parceria com Hector Salas, A Mulher de Minha Vida. Conte um pouco como foi
feita?
VO - Essa HQ foi feita para o Salão
de Quadrinhos do SESI de São Paulo (2006). Queríamos fazer algo de impacto, pintada
e com poucas cores. Na verdade, a grande maioria das HQs que eu fiz em
parceria, publicadas ou não, foi com o Hector, que é um grande amigo.
Você ilustrou a nona
edição de Raio Negro, de Gedeone Malagola para a Editora Júpiter II. Como foi
esse trabalho?
VO - Após a publicação da HQ
Zombie Night, o editor da Boca do Inferno, que também editava a revista do Raio
Negro, me contatou com roteiros originais do Gedeone, que ele tinha escrito
antes de falecer, e eu topei na hora. Fiz no meu estilo, mas respeitando a
simplicidade do material original. Tenho muito orgulho da HQ, mas olhando hoje,
eu não curto muito a capa que eu fiz.
Você também fez
ilustração para capa de diversas bandas. Poderia citá-las?
VO - Sim, fiz a capa de algumas
bandas, entre elas a Inside Hatred, de Ilhéus, Mercy Killing de Curitiba; e de Salvador
tem as capas para a Animus Necandi, Knightrider, RATTLE, Trepanator e para a
banda russa Hell´s Thrash Horsemen.
Como foi sua participação
no final dos anos 80 da AQB (Associação de Quadrinistas da Bahia), grupo de
fanzineiros...
VO - Conheci os caras por
acaso, e tenho amizade com a maioria até hoje.
Cheguei la conversando sobre HQ e fui mostrando o que eu fazia, ainda
com caneta. Ai os caras foram me mostrando outras formas de fazer quadrinhos.
Participei das reuniões e fiz alguns projetos, mas o grupo começou a dispersar
pouco depois.
Você publicou quadrinhos
na revista Crau, Impression, quadrinhos eróticos pela 2M (Brazil e HQ Brazil),
e no núcleo de pesquisa da UFBA. Conte essa trajetória
VO - A Crau foi conquista de
Hector Salas, e todos os contatos que ele fez. Após uma mini revista, fechamos
para a Crau, mas a experiência não foi boa, pois o editor refez paginas e
adulterou desenho e ainda censurou artes e adicionou material de uns caras de
São Paulo sem nos consultar. Posteriormente o editor foi para a 2M, que
publicava umas revistas de sacanagem e que saia nacionalmente. Ai eu e Hector
topamos a empreitada e mandamos alguns trabalhos que foram bem aceitos, sendo
que apenas um foi pedido para modificar o final. Foi um período bacana, eu
trabalhando, saia do trampo, ia pra casa do Hector desenhar tudo, para ele
pintar na mão com aquarela e guache, e mandar o mais rápido possível. Apenas a
ultima produção, uma HQ mais longa, tivemos um tempo mais flexível, e por isso
Hector pintou tudo no computador. O resultado foi muito bom. No núcleo de
pesquisa apenas um fanzine foi produzido. Infelizmente, rola muita politicagem
e gente querendo ver seu projeto naufragar, e muito indo contra você.
E a experiência de
participar de vários salões de humor nacionais e internacionais.
VO - Embora eu prefira fazer
historias em quadrinhos, participei de alguns salões. Não me acho tão bom e
criativo com cartuns e charges, mas foi gratificante participar e ter o
trabalho reconhecido.
Enquanto criador, o que
os quadrinhos são para você?
VO - Um meio de por idéias no
papel, dar vida a personagens e criar imagens impactantes.
O que você alcançou com
seus quadrinhos, e aonde você pretende chegar?
VO -Os quadrinhos me ajudaram
a escolher a profissão que exerço, como professor de arte e Historia da Arte, e
influencia minhas escolhas. Gostaria muito de viver deles, mas a realidade é
complicada, para não dizer injusta (risos).
Qual seria o caminho para
a produção brasileira conquistar o devido espaço e o merecido reconhecimento?
VO - Temos excelentes autores,
material de qualidade sendo publicado. O que falta mesmo é o interesse por
parte do público consumidor. Esmagadora maioria ainda acha que quadrinho
nacional não tem qualidade. Também falta incentivo, apoio, patrocínio e
divulgação.
Fale um pouco de você
como musico e videomaker.
VO - Eu sou vocal de uma banda.
Toco por diversão, embora leve a sério o que faço. Somando tudo que eu já
produzi com todas as bandas que montei, tenho duas demos, 1 split cd (dividido
com outra banda) lançado aqui e na Russia, uma participação em coletânea e um
cd lançado nacionalmente e vendido até fora do Brasil. Na parte de produção
visual, fiz alguns curtas, mas hoje em dia me dedico a produzir mostras de
filme, e sou o criador/curador da Mostra de Cinema Cine Horror, que já está
indo para a terceira edição anual, mas que tem exibições mensais. A mostra
anual tem foco na produção nacional de cinema de gênero fantástico (terror,
suspense, thrillers, ficção cientifica), e fora material brasileiro, já
exibimos material de produções portuguesas, Italianas, Espanhola e americanas.
Você utiliza muito a
ferramenta da internet no desenho digital?
VO - Única coisa que faço
digitalmente são correções e efeitos. Prefiro o desenho à mão livre. Já a
internet é um local onde tenho divulgado meus trabalhos. Sejam ilustrações ou
quadrinhos.
E seus projetos futuro?
VO - Estou planejando uma
exposição para maio de 2018, na galeria Pierre Verger, no subsolo da Biblioteca
Central dos Barris, com ilustrações minhas e de amigos, como Hector Salas,
Sidney Falcão, etc, homenageando os 20 anos da Turma do Xaxado, do saudoso
mestre Antonio Cedraz. E pretendo correr atrás para lançar a segunda edição da
revista em quadrinho Área 71. Fora isso ainda tem a Mostra de Cinema Cine
Horror.
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