O mapeamento cultural interno da Bahia
começou com os estudos de Nelson de Araújo, pioneiro na preocupação de entender
a cultura popular numa perspectiva antropológica. Entre 1986 a 1988 lançou Pequenos
Mundos. Um panorama da cultura popular da Bahia em três volumes. Entre os
anos de 1997 e 2003 a TV Educativa da Bahia produziu e lançou 18
vídeos-documentários e 8 CDs da série Singular e Plural. Registrou e mostrou a
diversidade do interior da Bahia do Recôncavo, do sertão, do litoral.
A série televisiva revela um conjunto de
expressões culturais como folguedos, festas e rituais religiosos populares. Desde
o folguedo Nego Fugido de Santo Amaro da Purificação, o toré dos índios Kiriri
de Mirandela, dos Tuxá de Rodelas, as comemorações distintas em louvor a São
Roque: a dos índios Pankararé que organizam uma romaria acompanhada de uma
banda de pífanos; a das prostitutas de Riachão de Jacuípe, que realizam um
cortejo acompanhado de uma banda de sopro; e as festas organizadas pelos fiéis
católicos e adeptos do candomblé de Salvador. E o folguedo também conhecido
como Chegança de Marujos.
Também nesse período, trabalhando como
coordenador de comunicação da UPB, viajei pelos municípios baianos para publicar
reportagens no Diário Oficial dos Municípios e do impresso da instituição.
Registrei a cultura e a identidade de cada localidade. Alguns desses registros
estão no livro Bahia, um estado d´alma, de 2009. No passeio pela Bahia,
mostro a identidade visual de muitos municípios como Porto Seguro, a cidade
monumento, Caravelas e o Arquipélago de Abrolhos, Ilhéus a terra dos romances
de Amado, Itacaré ótima para o surf, Canavieiras a capital do caranguejo,
Valença terra do camarão, Mucugê e o cemitério bizantino, Abaíra e sua boa
cachaça, Iraquara cidade das grutas, Lençóis a capital do diamante, Paulo
Afonso a terra dos esportes radicais, Juazeiro a capital da irrigação, Tucano e
suas águas minerais, Monte Santo a terra dos peregrinos, Barreiras a capital da
soja e Bom Jesus da Lapa a cidade santuário, da fé.
Também em 2009 o Governo do Estado,
através das secretarias do Planejamento e de Cultura (Secult), Fundação Pedro
Calmon (FPC) e da Empresa Gráfica da Bahia (Egba), lançaram a revista Bahia de
Todos os Cantos com objetivo a divulgação da riqueza e diversidade
sociocultural que caracterizam as diferentes regiões do nosso estado,
garantindo maior visibilidade à Bahia em todos os seus cantos, recantos e
encantos. Depois virou um programa da TVE.
Mais de 20 anos depois o antropólogo e
poeta Antonio Risério e o sociólogo e jornalista Gustavo Falcón lançam o livro Bahia
de Todos os Cantos - Uma Introdução à Cultura Baiana (Editora Solisluna). O livro apresenta uma reflexão sobre as
diversas regiões culturais da Bahia, examinando sua formação, seu
desenvolvimento e suas especificidades a partir de capítulos como pluralidade e
sincretismo, recôncavo afrobarroco, do açúcar ao cacau e “a face hegemônica da
Bahia”. A intenção é revelar essa Bahia, muito pouco conhecida, visitando
textos didáticos e instrutivos, para que os leitores conheçam mais o Recôncavo,
o Sertão, a Chapada Diamantina, o Oeste, o Sul da Bahia.
São múltiplas realidades culturais baianas.
“Bahia da barca e do aboio, das grutas do sertão e das praias cheias de sol, da
seca interiorana e dos aguaceiros litorais, da araponga e do beijupirá, da
caatinga e dos manguezais, da marujada e da chula, do saveiro e do carro de
boi...” (pag.25). Segundo os autores existe a terra mestiça e unida do litoral
mulato e a terra mestiça e seca do sertão mameluco, com os seus vaqueiros e os
seus jagunços. Uma Bahia sertaneja, que teria, no umbuzeiro, sua arvore
sagrada.
O passeio vai da forte presença africana
no Recôncavo (complexo cultural
jeje-nagô0 da formação étnica do Vale do São Francisco, basicamente lusitana e
ameríndia, passando pela base luso-africana da Chapada Diamantina, da cultura
grapiuna, nucleada no eixo Ilheus-Itabuna, da Bahia da pecuária e do pastoreio
com sua cultura do couro em Feira de Santana, do planalto de clima temperado de
Vitoria da Conquista, do vale sanfranciscano, do litoral norte (cujo isolamento
foi rompido com a abertura da Estrada do Coco e da Linha Verde), do Rio Real e
o céu do sertão até o oeste. A pluralidade cultural do Estado da Bahia é um
fato.
Uma pesquisa de fôlego fortalecida por uma
rica bibliografia. Mas como consta na capa, é apenas “uma introdução à cultura
baiana”. Os dados históricos de muitos municípios estão bem aprofundados, mas
faltou identificar as expressões populares das localidades. Como se sabe, cada
cidade tem sua marca. As Burrinhas da Bahia vão para as ruas em diferentes
épocas do ano e podem ser vistas no Recôncavo, Sertão e Litoral do baixo sul.
Já o Nego Fugido é exclusivo do povoado de Acupe, distrito de Santo Amaro. O
Mastro Sagrado e Profano tem em Olivença (Ilheus) seu ponto alto. O
trança-fitas ou pau de fitas está em Rio de Contas, Utinga e Andarai.
Zabiapunga no litoral baixo sul e Recôncavo. Já o Macatum Zê-zê em Mucugê. Tem
ainda a lamentação das almas, a festa de Nossa Senhora da Boa Morte, entre
muitas outras. Mas a obra de Antonio Risério e Gustavo Falcón é leitura
obrigatória para quem deseja conhecer a Bahia.
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