21 maio 2022

CURIOSIDADES BAIANAS (26) Julgado e condenado um santo

 


O município de Água Fria, a 148 km de Salvador, entre o Recôncavo e o Sertão, é o único lugar no mundo (pelo menos que se tem notícia) a ter julgado e condenado um santo. Isso mesmo, um santo, e dos mais venerados! Este fato para lá de inusitado ocorreu em meados do século XVIII. Famosa por sua justiça impiedosa, a cidade tinha senado, fórum civil e criminal, pelourinho e forca na praça central, e aplicava com rigor o Código Criminal do Império, cujo artigo 28 rezava que o proprietário era responsável pelos delitos praticados por seus escravos caso estes não fossem apresentados.

 

Santo Antônio era querido por toda a região, tanto que uma rica proprietária, de nome Isabel Maria Guedes, que guardava com extremo zelo na casa-sede de sua fazenda, uma imagem, tida por ela como milagrosa, resolveu deixar todos os seus bens para o santo casamenteiro, já que não tinha herdeiros. Em uma noite de louvor ao santo, um escravo da fazenda matou um homem branco, no adro da igreja e fugiu em seguida. Fiel ao que dispunha a lei, o juiz do município determinou a prisão do seu dono. Informado de que o assassino pertencia a Santo Antônio, ele não se fez de rogado. Mandou seus oficiais buscarem a imagem, que ficou presa e “incomunicável” por 30 dias até o julgamento, que transcorreu com pelo menos três audiências, júri, testemunhas e advogados de defesa e acusação.

 

Por interferência da Igreja, que protestava contra a heresia, Santo Antônio, apesar de condenado, escapou da forca, pena indicada para o crime. Mas perdeu todos os bens, que foram leiloados em praça pública. Depois da sentença, a imagem sumiu misteriosamente e nunca mais foi vista. Água Fria ganhou fama de cidade maldita. Virou motivo de praga. Antes disso, o lugarejo, que era muito próspero, se viu transformado em distrito do município de Irará, e somente em 1962 conseguiu sua emancipação e começou a se restabelecer. Ainda hoje, depois de 200 anos, o assunto é tabu entre os moradores, que preferem desconversar sobre o assunto, envergonhados e temerosos da “força da maldição de Santo Antônio”.

 

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