Seus poderes são
"meritórios" e a fonte deles se encontra no poder encantatório de
suas rezas.
Superando a ordem do universo terreno, as rezadeiras exercem um
papel iluminador e protetor como os anjos, anunciando uma boa nova para a alma.
Em algumas regiões do Brasil as rezadeiras, como as denominaram na Bahia, são
conhecidas também por “benzedeiras”. Chamadas de “curandeiras” entre os séculos
XVI e XVIII, eram vistas como uma espécie de "feiticeira", e
erroneamente foram perseguidas, oprimidas, punidas e muitas até condenadas ao
lançamento ainda vivas, nas “santas” fogueiras pela Inquisição da então Igreja
Católica.
Os pais e padrinhos dão a sua
benção a seus filhos e afilhados, os católicos se benzem antes de qualquer ação
importante ou ao passarem diante de uma capela ou igreja, os espíritas dão
“passes” aos que estão com negatividade fluídica, os evangélicos fazem orações
e cultos nas horas alegres e tristes de seus irmãos... Tudo é oração e a
rezadeira faz a sua “benzeção” em quem vai à sua procura no intuito de curar-se
de algum mal. As rezadeiras têm em comum na grande maioria das vezes duas
coisas: a pobreza e a fé. Em suas casas é fácil observar quadros de santos nas
paredes.
SANTOS - Elas invocam os santos
nas horas das dores dos doentes: dor de dente (Santa Apolônia),
olhos (Santa
Luzia), endividados (Santa Edvirges), na hora dos partos (Nossa Senhora do Bom
Parto), nos engasgos (São Brás), nas picadas de cobras (São Bento), para os
animais (São Francisco), para azia (Santa Sofia), e lá se vai. Para quem vai se
benzer, vão algumas dicas importantes: nunca cruze os pés ou as mãos quando
estiver sendo curado e ao final da cura não pergunte quanto é o preço da reza.
Passados os dias visite a rezadeira e deixe um agrado.
A atividade da rezadeira é
tradicionalmente feminina. São mulheres do povo que um dia descobrem o dom.
Existem centenas de orações, com algumas variações de região para região.
Algumas são parteiras e quase todas têm em seus quintais de suas casas as
plantas que curam os doentes: mastruz; romã; sabugueiro; capim santo; erva
cidreira; erva doce, etc. Em comum, rezadeiras têm alguns modos de orar,
benzendo os pacientes com as mãos ou com plantas, em uma linguagem própria, uma
espécie de cochicho ininteligível que mantêm com Deus ou com as entidades
enviadas por ele.
ORIGEM - Os historiadores não
conseguem identificar a origem exata das rezadeiras, nem se sabe ao certo há
quantos anos existe essa tradição. Tanto pode ser herança dos curandeiros dos
povos indígenas brasileiros quanto ter vindo com as crendices populares dos
portugueses que colonizaram o país. Mas, ao contrário do que se pensa, as
rezadeiras não são privilégios do Nordeste, estão espalhadas por todo o Brasil.
“As pessoas não ficam doentes só do corpo, mas também do espírito, por conta de
tristezas e desilusões”, diz o antropólogo José Jorge Carvalho, da Universidade
Federal de Brasília (UnB).
Para ele, a fé também pode curar.
Apesar do assunto ser polêmico, pesquisas já comprovaram que a
fé é um
componente importante na superação das doenças. No Brasil, a discussão ainda
engatinha, já nos Estados Unidos a maioria dos cursos de medicina já
disponibiliza disciplinas com temas como fé, cura, espiritualidade e a
abordagem desses assuntos entre os doentes. A origem de muitas rezas pode ser
puramente religiosa, ou fruto de um hibridismo de religiões, ou mesmo de um
misto entre conhecimento popular com práticas religiosas.
RESISTÊNCIA - As rezas resistem
ao tempo, mesmo em tempos atuais, com os avanços da tecnologia e com os mais
modernos recursos de que dispõe a medicina do século 21, a cultura das
rezadeiras ainda resiste. Se em número menor nas grandes cidades brasileiras,
no interior do país ainda há pessoas que rezam e acreditam na cura por meio da
palavra. Para a psicóloga Thereza Maria Galvão da Silva, as rezadeiras
desempenham, no imaginário popular, o papel de milagrosas, principalmente onde
a questão religiosa é muito forte. “As pessoas vão até essas mulheres em busca
de algo sobrenatural, acima delas, como se elas tivessem o poder mágico de
curar”. E daí a cura pela crença, pela fé.
Thereza acrescenta, “as pessoas
transferem para a rezadeira a fé que elas têm, reconhecendo que ele tem uma
força maior, mágica. No interior, onde o acesso a cuidados médicos costuma ser
precário, a rezadeira é aquela que socorre, aquela que acolhe”. Um interessante
registro dessa manifestação sociocultural é o realizado pelo Censo Cultural da
Bahia, por meio da Secretaria de Cultura e Turismo. O levantamento, feito no
período de 2002 a 2006 nos 417 municípios existentes no Estado, registrou cerca
de 700 rezadeiras. O curioso é que, desse total, apenas cinco rezadeiras eram
de Salvador - o que evidencia que essa cultura é mais difundida no interior.
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