Há 50 anos morria um dos criadores do
termo “indústria cultural”. Filósofo alemão de origem judaica, Theodor
Wiesengrund Adorno (11/setembro/1903-06/agosto/1969) é um dos nomes mais
conhecidos da chamada Escola de Frankfurt, que contribui para o renascimento
intelectual da Alemanha após a II Guerra Mundial. E projetou-se como um dos
críticos mais ácidos dos modernos meios de comunicação de massa. Ao exilar-se
nos Estados Unidos, entre 1938 e 1946, percebeu que a mídia não se voltava
apenas para suprir as horas de lazer ou dar informações aos seus ouvintes ou
espectadores, mas fazia parte do que ele chamou de indústria cultural. Um
imenso maquinismo composto por milhares de aparelhos de transmissão e difusão
que visava produzir e reproduzir um clima conformista e dócil na multidão
passiva.
Adorno era um dos
"apocalípticos" em quem Umberto Eco estava pensando quando escreveu
seu "Apocalípticos e Integrados". Uma obra central da trajetória de
Adorno, a "Dialética do Esclarecimento", foi escrita (em parceria com
Max Horkheimer) durante o auge do horror nazista, entre 1941 e 1944. Ter isso
em mente ajuda a entender e aceitar a radicalidade das ideias de Adorno, e
mesmo sua aparente sisudez.
Foi no seu exílio americano durante a
Segunda Guerra Mundial que, junto com Max Horkheimer, Theodor Adorno redigiu a
obra Dialética do Iluminismo (1947), uma aproximação crítica e ideológica aos
mecanismos de funcionamento da civilização moderna ocidental. Com esta obra,
Adorno fundou a Teoria Crítica da Sociedade (também identificada com a Escola
de Frankfurt, assim chamada por causa do Instituto de Investigação Social
daquela cidade, no qual Adorno e Horkheimer voltaram a fazer pesquisas e
lecionar, a partir de 1949). Sob a influência da teoria marxista e dos modernos
conhecimentos de psicologia social e cultural, o autor interroga-se por que
razão foi tão difícil o pensamento racional, que marcou o Iluminismo do século
18, contribuir para os objetivos de liberdade e autodeterminação do ser humano.
Adorno afirma que os dirigentes da economia e da sociedade podem corromper os
ideais libertadores da época do Iluminismo para manipularem ideologicamente as
pessoas e reprimi-las socialmente. Seria essa a causa, por exemplo, do
extermínio dos judeus praticado pelos nazistas. As suas obras do pós-guerra (A
Personalidade Autoritária, 1950, e Dialética Negativa, 1966) tiveram uma
influência decisiva na formulação teórica do movimento estudantil dos anos 60,
apesar de na época ser recente sua participação no ativismo político.
A sua polêmica teórico-científica com o
filósofo Karl Popper, revelando profundas implicações políticas, representou
uma dura prova para a sociologia alemã. Na história das ideias, tal polêmica
ficou conhecida como Discussão do Positivismo na Sociologia Alemã (1971). Para
recordar este importante pensador, que também foi músico, crítico musical e
compositor, sua cidade natal, Frankfurt, instituiu em 1977 o Prêmio Theodor W.
Adorno, concedido a personalidades que se destacam na filosofia e na arte.
INDÚSTRIA CULTURAL
Com o termo “indústria cultural”, o
filósofo alemão Theodor Adorno se propõe a explicar a arte consumida pelas
massas, uma mercadoria que não é mais produzida pelo trabalho artesanal, mas
conforme o modelo da manufatura e da grande indústria. Seu diagnóstico se
contrapõe ao do Walter Benjamin (1892-1940). Este confiava no potencial
criativo desencadeado pela cooperação e o defendia na expectativa da
“politização da arte”. Na perspectiva de Adorno, na indústria cultural, as
massas não são o elemento ativo, mas pura passividade. Têm-se assim não apenas
uma nova forma de despolitização da sociedade, mas um instrumento de domínio e
integração social.
Mas voltando ao ano de 1944, os filósofos
Max Horkheimer (1895-1973) e Theodor Adorno (1903-1969), da conhecida Escola de
Frankfurt, avançam com o conceito de “indústria cultural” para se referirem à
mercantilização da cultura, fruto do desenvolvimento dos media, da tecnologia e
da capacidade de reprodução e seriação. Pela primeira vez, a produção dos bens
culturais é estudada no contexto global da industrialização da cultura como
mercadoria. Esses teóricos partem de uma concepção de “cultura superior”, como
a pintura, o teatro ou a literatura, ligada ao sagrado – obras de arte únicas,
não reprodutíveis, com “aura” –, para afirmarem que a indústria cultural é o
símbolo do anti-iluminismo. Esta visão apocalíptica, que iria influenciar
radicalmente os estudos sobre comunicação e cultura de massas, foi descrita no
célebre livro “Dialéctica do Iluminismo”, publicado em 1947.
Foi a sociedade americana entre os anos 30
e 40, onde Adorno e Horkheimer estavam exilados, o objeto principal de estudo
que serviu de base à emergência do conceito de indústria cultural. Ambos tinham
uma vincada cultura clássica e encontraram nos Estados Unidos um ambiente
cultural muito diferente, onde o cinema e o jazz se encontravam no auge. É a
partir desta vivência que ambos começam a olhar para o cinema, a rádio, a
literatura e a música como um negócio e não uma arte, opondo-se ao tipo de conhecimento
emergente da investigação norte-americana.
Se a cultura de consumo segue uma
estratégia de venda com o objetivo de distrair um público massivo, menos
esclarecido, o nível de qualidade da oferta é reduzida, provocando apatia e
empobrecimento estético. E é este o ponto de viragem para Adorno e Horkheimer:
a verdadeira arte vai sendo substituída por uma série de efeitos e padrões de
forma a unificar os gostos: “desde o começo do filme já se sabe como ele
termina, quem é recompensado, e, ao escutar a música ligeira, o ouvido treinado
é perfeitamente capaz, desde os primeiros compassos, de adivinhar o
desenvolvimento do tema (…)”
As mercadorias culturais são valorizadas
pela perspectiva do lucro e não pelo seu próprio conteúdo. A “técnica” na
indústria cultural refere-se à organização da cultura em si, permanecendo
externa à técnica artística, ou seja, é um “parasita”. É desta técnica parasita
extra-artística que resulta o pastiche (Gemisch), uma cultura de imitação, em
que se conjuga a indústria com os resíduos individualistas. Adorno alude à
“aura” de Benjamin, referindo que ela não desaparece, mas é conservada como que
petrificada.
Em 1963, numa conferência radiofônica,
Adorno faz um resumo sobre os pensamentos expostos no livro “Dialéctica do Esclarecimento”,
escrito 20 anos antes. A razão pela qual Adorno e Horkheimer substituíram
“cultura de massas” por “indústria cultural” é explícita: este último conceito
diferencia-se de forma extrema do primeiro, pois “cultura de massas” pode ser
entendida por outros (erradamente) como “uma cultura que emerge espontaneamente
das próprias massas, de uma forma contemporânea de arte popular”. A indústria
cultural não é de todo espontânea, dado que “promove uma união forçada das
esferas de arte superior e inferior, que permaneceram separadas durante
milênios”.
Que valor representa a cultura de massa
para Adorno, já que a distingue de indústria cultural. A cultura de massa é, no
fundo, sinônimo de indústria cultural. O primeiro termo foi substituído apenas
para não ser interpretado de um ponto de vista positivo, como uma “verdadeira”
cultura popular. A expressão “indústria cultural” tem um propósito político,
quase para reforçar os argumentos destes.
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