Nos tempos do Império, antes da
promulgação da Lei Áurea, um escravo chamado Inácio era uma figura
popular: um
negro de dois metros de altura, barba, sempre elegante com suas finas roupas
pretas, de fraque, cartola, luvas, guarda-chuva, e bengala. O povo das ruas o
reverenciava como a um príncipe real africano. A nobreza, pelo contrário,
considerava um desequilibrado.
Seu proprietário era o um poderoso fazendeiro da região de
Lençóis, na Chapada Diamantina da Bahia.
Inácio era jovem, elegante, e andava sempre acompanhado de um guarda-chuva.
Cheio de manhas e bossa no andar, logo aquele negro com tal gabarito conquistou
o coração de Sinhá Dona, a filha do fazendeiro.
Começou com os olhares, depois o
sinal com as mãos e logo logo surgiu os primeiros contatos físicos e a explosão
do amor. A sinhazinha filha do fazendeiro e o escravo se apaixonaram e tiveram
um romance às escondidas por um certo tempo, e haja encontro furtivos, beijos
roubados, corações partidos, folhas sacudindo na mata de tanto agarramentos,
muitos ais e uis, até que alguém desconfiou e descobriu tudo, fazendo chegar
aos ouvidos do pai da sinhazinha toda história.
O tempo mudou para o casal. O
fazendeiro enfurecido com o fato, ordenou ao capataz que tirasse a limpo aquele
absurdo e caso fosse confirmado era para torturar e depois dar cabo da vida do
maldito escravo que estava abusando de sua filha. A sinhazinha, ao saber do
decisão do pai de punir o seu amado, correu ao seu escravo para contá-lo e impedir que lhe fosse
feito algum mal, pois ela o amava. Inácio no início resistiu, pois queria
enfrentar a
situação. Mas por insistência da sinhazinha aceitou fugir com a
promessa de que iriam se encontrar e ficar juntos para sempre. Esta lhe fez tal
promessa de amor eterno se jogando aos seus braços com lágrimas nos olhos e
pedindo desesperadamente que tomasse todo cuidado. Que fugisse por algum tempo
até as coisas esfriarem. Depois dariam algum jeito de se ver. Como prova de seu
amor deixou com Inácio, sua linda e querida sombrinha comprada na Europa, para
que ele sempre recordasse dela.
Depois desse festival de
promessas de amor, se despediram rapidamente antes que o capataz pudesse
surpreendê-los. O escravo Inácio deu início a sua fuga o mais rápido possível.
Quando o capataz chegou à senzala com uma tropa de capangas na busca do maldito
escravo, indagou a todos que não souberam informar o paradeiro de Inácio. Aí
então começou a tortura, mas não conseguiu nada. Voltou para a casa grande e
informou da fuga ao fazendeiro, que ficou furioso.
O fazendeiro interrogou a filha,
que sob pressão, confirmou a fuga do amante. Enfurecido, determinou ao capataz e aos capangas
pistoleiros que capturassem o fugitivo o mais depressa possível, para ser
torturado e morto na frente de todos para servir de exemplo. Os capangas sob o
comando do capataz da fazenda, sairam em disparada em busca do fugitivo. Inácio
que era muito esperto e conhecia bem a região ficou muito tempo escondido nas
matas fechadas da Chapada Diamantina, comia frutas, leguminosas, raízes,
pequenos animais, aves e peixes que conseguia capturar.
Passaram-se meses de um lugar
para o outro em grutas, cavernas, acampado na mata, sempre próximo de rios e
cachoeiras onde se banhava e se alimentava com facilidade. Mas sempre atento
para não ser capturado pois seria o seu fim. Pensava muito em sua amada
sinhazinha e isso era o que dava forças para continuar fugindo e se escondendo
na esperança de um dia viver em paz com sua amante querida. Ao mesmo tempo a
caçada ao fugitivo aumentava a cada dia, pois o fazendeiro passou a nutrir um
ódio cada vez maior pelo escravo, por
que passou a ser motivo de escárnio entre os fazendeiros locais e populares.
Todos os esconderijos possíveis
foram revistados e nada. Por fim, só faltava procurar no mais bonito monte da
região, o morro que ganharia seu nome. Tratava-se de um contraforte belíssimo
da serra do Sincorá, imenso paredão de rocha talhado a prumo, com uma única
trilha oculta que permite a subida e descida. Ao avistar o capataz com sua
tropa de pistoleiros, o escravo resolveu se esconder no topo do morro. Ágil e
destemido, grudado em sua sombrinha, o negro Inácio correu para a beira do
morro que ficava a uns trezentos metros de altura. E ao sentir que os capangas
se aproximavam atirando cada vez mais, deu um salto fantástico para o
precipício e que a sobrinha se abriu em sua mão sumindo de vista dos capangas
que o perseguiam.
Todos os pistoleiros ficaram
atordoados, pois nem sinal do escravo, ele simplesmente tinha sumido no ar.
Nenhum tinha a coragem de ficar tão próximo a borda da pedra do morro para
verificar a queda e o paradeiro do corpo do escravo, nem mesmo o capataz
conseguiu pois ventava muito e uma queda seria fatal. E como não encontraram o
corpo, decidiram voltar ao coronel e dizer que o escravo havia se jogado morro
abaixo e que ao bater nas pedras haveria morrido e o corpo ficara em pedaços
espalhados morro abaixo.
Como foi dado como morto o
escravo parou de ser perseguido pelo fazendeiro. Porém, o negro Inácio
continuou vivinho como havia planejado. No local onde ele fez o pulo
daquela borda saliente da pedra, há
alguns poucos metros abaixo, havia uma outra borda de pedra onde ele amorteceu
o salto e se encolheu encostado em um vão junto a parede do pedra do morro,
para evitar que fosse localizado pelos inimigos dando a eles a impressão que
teria se precipitado morro abaixo. O fazendeiro de início não acreditou muito
não e foi até lá no morro para
verificar, mas quando viu o local onde o escravo que havia pulado se convenceu
da morte do infeliz. Algum tempo depois a sinhazinha voltou a sair de casa e a
encontrar com seu amante numa grutinha junto ao morro. Tomava muito mais
cuidado para não serem descobertos. E viveram felizes pelo resto de suas vidas.
Quanto ao filho de Pai
Inácio...bem, isso é outra história...
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