“Zéfiro educou o brasileiro para o sexo. Pré Marta Suplicy, pré Sue Johanson, ele já avisava, sem retórica, apenas com sua caneta dura, direto ao ponto G, que entre quatro parede valia tudo. E que era bom, e que não era pecado, e que ninguém tinha nada a ver com isso. Cada um dava o que lhe aprouvesse. Sem julgamento moral e sem necessidade de casar depois”, escreve Joaquim.
Em texto publicado no livro A Arte
Sacana de Carlos Zéfiro, organizado pelo colecionador Joaquim Marinho em 1983, o antropólogo Roberto da
Matta chama atenção para a “sacanagem” dos quadrinhos de Zéfiro como uma
expressão legítima da nossa sociedade. “Do mesmo modo que a sociedade se
expressa pela arte, pela política e pelo esporte, ela também se manifesta pelas
formas padronizadas de sua sexualidade.
No caso brasileiro, a discussão do sexo
sempre ficou situada naquela esfera ambígua da alcova e das rodas dos grupos
formados por companheiros do mesmo sexo”,
escreve Roberto. “A enorme popularidade de Zéfiro, junto com sua
incrível penetração em todas as classes sociais, são dados reveladores de que
estamos diante de padrões sexuais dominantes”.
Segundo Matta, a atração que os
catecismos de Zéfiro exercem é dada pela capacidade de formular as
grandes
questões da paixão humana de forma reduzida. “Numa escala pequena e com uma
alta dose de irreverência e prazer. Dir-se-ia, brasileiramente, de forma
impagavelmente sacana e malandra. Creio que é por ter passado o sexo pela
sacanagem que Carlos Zéfiro virou uma espécie de Spartacus do mundo sexual
brasileiro. Pois quando a repressão grita desesperada: quem é afinal Zéfiro?.
Todos nós respondemos em coro, com aquela convicção formidável: Zéfiro somos
todos nós...”.
O cineasta Silvio Tendler estava
interessado em fazer um documentário sobre a vida e obra de Carlos Zéfiro. A
cantora Marisa Monte estampou na capa do disco Barulhinho Bom o desenho dileto
de Zéfiro. E o sociólogo Betinho pediu a familia para usar um desenho na
campanha contra a fome. Nos catecismos de Zéfiro o traço rude, linguagem crua e
orgasmo garantido. Os vilões não apelam para a violência, apenas brocham.
O jornalista Sérgio Augusto em artigo
publicado no livro A Arte Sacana de Carlos Zéfiro informou que os quadrinhos de
Zéfiro seriam olhados por outro viés se estivessem acomodados num museu sob a
rúbrica de erótica. Por conta do segredo em torno da identidade de Zéfiro,
Gilberto Freire, Aldemir Martins e alguns medalhões das letras e das artes
plásticas chegaram ser cotados como o
verdadeiro autor dos quadrinhos pornográficos que “educaram” esse imaginário
sexual do Brasil em meados do século XX.
À TONA
Quando o verdadeiro Zéfiro veio à tona,
ficou se sabendo que seu maior receio era uma lei que rege o funcionalismo
público e que prevê suspensão do pagamento da aposentadoria ao ex-funcionário
que foi objeto de escândalo. Mas Caminha não conviveu com esse fantasma por
muito tempo. Poucos meses depois da entrevista ao jornalista Juca Kfouri,
Zéfiro faleceu, em julho de 1994, aos 71 anos.
Apesar do burburinho que cercou a
entrevista publicada na revista Playboy por Juca Kfouri que fez o mito Carlos
Zéfiro sair do anonimato, a revelação não ajudou a resgatar do ostracismo os
“catecismos” de Zéfiro (nome que as revistinhas recebiam pelo seu formato de
bolso, semelhante ao das publicações de iniciação católica). Desde o final dos
anos 80, quando Zéfiro deu o ponto final à sua produção por conta de um
problema de vista, seus quadrinhos praticamente sumiram das bancas e passaram a
ser disputados por colecionadores.
Mesmo assim, os catecismos sobreviveram,
em menor escala, pois reimpressões piratas continuaram a circular. Até a década
de 80 (já quando houve a abertura política) era possível se conseguir comprar
as reedições piratas em feiras populares. Em meados da década de 80 houve um
revival de Carlos Zéfiro, que voltou à mídia quando sua obra foi dissecada em
livros como O Quadrinho Erótico de Carlos Zéfiro, escrito por Ota (assinando
com seu verdadeiro nome Otacílio d'Assunção) e publicado em 1984 pela Record,
que teve 4 edições, porém atualmente está fora de catálogo.
Além do livro escrito por Ota, outros
livros similares foram publicados (compilando histórias de Zéfiro e seus
congêneres) no mesmo período pela Editora Marco Zero, sob a coordenação do
colecionador Joaquim Marinho, bem como uma revista Zéfiro que durou uma única
edição, lançada pela Codecri.
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