01 dezembro 2016

Reverência ao samba



Compositor de alma, Riachão foi reverenciado como o sambista de maior expressão e longevidade da Bahia. Em 2007 ele foi personagem-símbolo da maior festa popular do Brasil, o Carnaval. A reverência ao samba como forma de folia momesca foi uma forma de resgate e a busca por uma maior valorização deste gênero. E foi justamente em 1917 (há 100 anos) que o conhecido samba carnavalesco, “Pelo Telefone” estourou no Carnaval. Gravado pela Casa Edison, na voz de Baiano, a composição assinada por Donga e Mauro de Almeida ainda tem muito do maxixe, ritmo hegemônico na época, e vira cantiga nordestina em um dos trechos. E a história do samba já começou marcada pelas misturas que sempre envolveram o gênero. Os puristas preferem o samba original, os apologistas das fusões querem misturar com o rock, frevo e pop.

Quando Noel Rosa compôs o samba “Feitio de Oração” e Vinícius de Moraes em “Samba da Bênção” afirma que “o bom samba é uma forma de oração”, estavam certos. A palavra samba veio do lamento “kusamba”, rezar, orar. “Quem se atreve a me dizer, do que é feito o samba?” pergunta Marcelo Camelo na composição “Samba a Dois”. E quem responde é Caetano Veloso em “Desde que o samba é samba” ao compor: “O samba é o pai do prazer/o samba é o filho da dor/o grande poder transformador”.

“É melhor ser alegre que ser triste/Alegria é a melhor coisa que existe/É assim como a luz no coração/Mas pra fazer um samba um samba com beleza/É preciso um bocado de tristeza/Senão não se faz um samba, não//Senão é como amar uma mulher só linda; e daí?/Uma mulher tem que ter qualquer coisa além da beleza/Qualquer coisa de triste, qualquer coisa que chora/Qualquer coisa que sente saudade/Um molejo de amor machucado,/Uma beleza que vem da tristeza de se saber mulher,/Feita apenas para amar, para sofrer pelo seu amor/E para ser só perdão//Fazer samba não é contar piada/Quem faz samba assim não é de nada/O bom samba é uma forma de oração/Porque o samba é a tristeza que balança/E a tristeza tem sempre uma esperança/De um dia não ser mais triste não...//Ponha um pouco de amor numa cadência/E vai ver que ninguém no mundo vence/A beleza que tem um samba não/Porque o samba nasceu lá na Bahia/E se hoje ele é branco na poesia/Se hoje ele é branco na poesia/Ele é negro demais no coração” (Samba da benção, de Vinícius de Moraes)

Fernanda Porto e Alba Carvalho falam que nunca foram numa roda de samba, mas seu sambar tem repique e batuque sampleando reco-reco e agogô. “Esse samba é meu groove da vez/com guitarras e drum´n´bass/só pra ver como é que fica/eletrônica e couro da cuíca//Samba assim assado/de hit acelerado, será que é samba assim?/samba assim assado/de hit acelerado, é samba, sim” canta em “Sambassim”. Em 2005 o baiano radicado em São Paulo, Péri lançou seu quarto CD dedicado inteiro ao samba. Mesclando a batida bossa-novista de João Gilberto, a elegância de Paulinho da Viola, e a suavidade da voz e violão ele canta: “o samba é como a vida. Só na maciota. Um samba pequenininho. Um samba diferente. Um samba passarinho. Que voa quando está contente” (Samba Passarinho).
 
Já o compositor Assis Valente teve nova leitura do seu “Brasil Pandeiro” na voz dos Novos Baianos: “Chegou a hora dessa gente bronzeada mostrar seu valor/eu fui na Penha, fui pedir ao Padroeiro para me ajudar/salve o Morro do Vintém, pendura a saia eu quero ver/eu quero ver o tio Sam tocar pandeiro para o mundo sambar/o Tio Sam está querendo conhecer a nossa batucada/anda dizendo que o molho da baiana melhorou seu prato/vai entrar no cuzcuz, acarajé e abará/na Casa Branca já dançou a batucada de ioiô, iaiá//Brasil, esquentai vossos pandeiros/iluminai os terreiros que nós queremos sambar/há quem sambe diferente noutras terras, noutra gente/num batuque de matar//Batucada, batucada, reunir nossos valores/pastorinhas e cantores/expressão que não tem par, ó meu Brasil/Brasil, esquentai vossos pandeiros/iluminai os terreiros que nós queremos sambar/Ô, ô, sambar, iêiê, sambar.../queremos sambar, ioiô, queremos sambar, iaiá”.

E Jadir de Castro e Luiz Bittencourt atacaram de “Samba do Ziriguidum” na voz de Jackson do Pandeiro: “Ziriguidun, ziriguidun/Meu coração num teleco-teco/Puxe e largue/Como no futebol/A onda vai, vai, vai/E, balança mas não cai/E o samba continua/Na base do ziriguidum/Abre a roda moçada/Pra entra mais um/Abre a roda moçada/Pra entra mais um”. Para encerrar só mesmo o “Samba e Amor” de Chico Buarque: “Eu faço samba e amor até mais tarde/E tenho muito sono de manhã/Escuto a correria da cidade que arde/E apressa o dia de amanhã/De madrugada a gente ainda se ama/E a fábrica começa a buzinar/O trânsito contorna a nossa cama – reclama/Do nosso eterno espreguiçar/No colo da benvinda companheira/No corpo do bendito violão/Eu faço samba e amor a noite inteira/Não tenho a quem prestar satisfação/Eu faço samba e amor até mais tarde/E tenho muito mais o que fazer/Escuto a correria da cidade - que alarde/Será que é tão difícil amanhecer?/Não sei se preguiçoso ou se covarde/Debaixo do meu cobertor de lã/Eu faço samba e amor até mais tarde/E tenho muito sono de manhã”.

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