Abraçar e agradecer é o
título do show que a intérprete Maria Bethânia percorre o país comemorando
50
anos de carreira. Ela celebra cinco décadas de caminhada vitoriosa, Bethânia é
dirigida por Bia Lessa — a mesma de espetáculos como Carta de amor, Festa e
devoção e Dentro de mar tem rio. Mas, tomou para si a construção do roteiro.
Nele, há a presença de clássicos, que ajudou a imortalizar, entre os quais
Dindi (Tom Jobim e Aloysio de Oliveira), Oração a Mãe Meninha (Dorival Caymmi),
Tatuagem (Chico Buarque), A tua presença (Caetano Veloso), Começaria tudo outra
vez (Gonzaguinha) e Brincar de viver (Guilherme Arantes), que canta ao vivo
pela primeira vez.
Ao longo de 50 anos de
carreira, Bethânia acumulou um rico e diversificado acervo de sucessos. São
autênticas pérolas do nosso cancioneiro, responsáveis por tornar marcantes
diferentes momentos da trajetória da grande diva da música popular brasileira.
Desde meados da década de 1960, quando surgiu na cena nacional, até os dias
atuais, a cantora, criteriosamente, assumiu total controle sobre o seu
repertório.
Em algum disco, ou
show, ela pode até ter incluído uma ou outra canção que, a princípio, não tenha
merecido a aprovação da crítica. Bastou, porém, ouvi-la interpretar, para que o
conceito se modificasse. Já os fãs — esses não —, de imediato, se deixaram
arrebatar, ouvindo-a soltar a voz poderosa, usada para cantar o romantismo, as
coisas do Brasil e temas de conteúdo político-social.
Nesta quinta, 18, a
cantora faz aniversário. Com tantas razões para celebrar, o Programa Aprovado
homenageou no último sábado a artista santo-amarense que há meio século se
reinventa e traz na voz a cara do povo brasileiro:
Em
27 de fevereiro de 2007 escrevi:
O
mar e o rio de Bethânia
O emocional e o intelectual, a água
salgada e a doce, o litoral e o interior. São experiências quando se ouve os
dois CDs de Maria Bethânia: Mar de Sophia, estruturado em torno do mar e suas
metáforas e da poeta portuguesa Sophia de Mello Breyer. O outro, Pirata, traz o
rio como inspiração, e Pessoa, Rosa, João Cabral e Vieira como referências.
Vale apenas ouvir os dois trabalhos, juntos seguidamente. Com água a cantora
cria um ambiente de purificação.
Entre as inéditas está Memórias do Mar,
de Vevé Calasans e Jorge Portugal:”A água do mar na beira do cais/vai e volta
volta e meia vem e vai//A água do mar na beira do cais/vai e volta volta e meia
vem e vai//Quem um dia foi marinheiro audaz/relembra histórias/que feito ondas
não voltam mais//Velhos marinheiros do mar da Bahia/o
mundo é o mar/maré de
lembranças/lembranças de tantas voltas que o mundo dá//Tempestades e
ventos/tufões violentos/e arrebatação/hoje é calmaria/que dorme dentro do
coração//Velhos marinheiros do mar da Bahia/o mundo é aqui/maré mansa e
morna/de Plataforma ou de Peri-Peri//Velhos marinheiros do mar da Bahia/o mundo
e o mar/maré de lembranças/lembranças de tantas voltas que o mundo dá”.
Tem uma gravação tocante do samba-enredo
“Das maravilhas do mar fez-se o esplendor de uma noite”, de David Corrêa e
Jorge Macedo. Diz a letra: “Deixa-me encantar/com tudo teu e revelar/o que vai
acontecer/nesta noite de esplendor/o mar subiu na linha do horizonte/desaguando
como fonte/ao vento a ilusão teceu/o mar/por onde andei mareou/rolou na dança
das ondas/no verso do cantador//Dança quem ta na roda/roda de brincar/prosa na
boca do vento/e vem marear//Eis o cortejo irreal/com as maravilhas do
mar/fazendo o meu
carnaval/é a brisa a brincar/a luz raiou pra clarear a
poesia/num sentimento que desperta na folia/amor amor/amor sorria ô ô ô/um novo
dia despertou//E lá vou eu/pela imensidão do mar/esse onda que borda a avenida
de espuma/me arrasta a sambar”.
Por meio das poesias de Sophia de Mello
Breyner, lidas ao longo do álbum Mar de Sophia, Bethânia revela: “O mar azul e
branco e as luzidias pedras (...)/Onde o que está lavado se relava/Para o rito
do espanto e do começo/Onde sou a mim mesma devolvida/Em sal, espuma e concha
regressada/A praia inicial da minha vida”.
E na faixa Memória das Águas, de Roberto
Mendes e Jorge Portugal, Bethânia resume o projeto quando canta: “Amores são águas doces/Paixões são águas
salgadas/Queria que a vida fosse/Essas águas misturadas// Eu que já fui afluente/Das
águas da fantasia/Hoje molho mansamente/As margens da poesia// Cachoeira da
Vitória/ Timbó das pedras de seixo/ Vocês são minha memória/Correm em mim desde
o começo//Quando o Subaé subia/Beijando o Sergimirim/Um amor de águas
limpas/Nascia dentro de mim//E foi assim pela vida/Navegando em tantas
águas/Que mesmo as minhas feridas/Viraram ondas ou vagas//Hoje eu lembro dos
meus
rios/Em mim mesma mergulhada Águas que movem moinhos/Nunca são águas
passadas//Eu sou memória das águas/Eu sou memória das águas”.
Na letra de Ana Carolina e Jorge Vercilo
ela confessa: “Garimpeira da beleza/te achei na beira de você me achar/me
agarra na cintura, me segura e jura que não vai me soltar/e vem me bebendo
toda, me deixando tonta de tanto prazer/navegando nos meus seios, mar partindo
ao meio/não vou esquecer//Eu que não sei quase nada do mar/descobri que não sei
nada de mim....” (Eu que não sei quase nada do mar).
A poesia de Drummond, musicada por Sueli
Costa: “O mundo é grande e cabe nessa janela sob o mar”. E de novo o Mar sonoro
de Sophia: “Mar sonoro, mar sem fundo, mar sem fim./A tua pureza aumenta quando
estamos sós/e tão fundo intimamente a tua vez/segue o mais secreto bailar do
meu sonho/que momentos há em que eu sozinho/seres um milagre criado só para
mim”. E em águas profundas e algumas vezes escuras Bethânia abre espaço para
uma criação coletiva dos Titãs, para as praias desertas de Jobim, uma inserção
rápida pela obra de Caymmi, Caetano, um canto de Toquinho e Vinícius numa
participação especial da percussão de Nana Vasconcellos. “Só na foz do rio é
que se ouvem os murmúrios de todas as fontes” (Guimarães Rosa).
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