07 novembro 2019

HQ brasileira hoje está mais autoral com variedade de estilos (03)


Desenhista de HQ na Bahia é mesmo um forte. Pode ser em tempo de crise, mercado restrito, falta de editora, sempre surge uma publicação que contraria a lei do contra. Em 1989 Lage, Nildão, Rezende, Valtério lançaram a revista Pau de Sebo. Sobreviveu apenas cinco números. Separado do grupo, em 1990, Rezende lançou sozinho a Vilões, revista só de quadrinhos com linguagem underground. Foram cinco mil exemplares rodado e vendeu cerca de dois mil em bancas, fora as vendas em shows, eventos e universidades. Apesar do esforço, o número um foi filho único. Apesar de iniciativas como estas, que geraram outros fanzines de vida curta, os quadrinhistas não voltaram a se unir. Cada um botou sua arte nas costas e seguiu um caminho.




Em 1993 o experimentalismo marcou a revista Des HQuê (leia Desagaquê) que mesclou histórias em quadrinhos com o experimentalismo que caracterizou as estratégias dos fanzinistas. Editado por Carlos Mattos, traz desenhos de Carlos Mattos, Fabio Abreu, Marco Aurélio, entre outros. O artista plástico Parlim, da cidade de Juazeiro, transpôs a saga de Antônio Conselheiro e seus seguidores para o mundo dos quadrinhos. A publicação foi de 1994.




Sufocado pelo mercado editorial, os novos quadrinistas respiraram através dos fanzines. E faziam de tudo um pouco para colocar suas ideias `no ar´. Mário Sérgio Moura, o Afoba, vocalista de Lisérgia, lançou o zine O Morrete. Augusto Mattos, preparou o zine de ficção Fobos. Hector Salas lançou Facção junto com Bruno Aziz que já rabiscava desde criança a tirinha Dilemas Infantis. Em 1997 saiu a Crau que teve participação de alguns desenhistas paulistas.




Em 2005 a prefeitura de Paulo Afonso juntamente com a Secretaria de Educação e Cultura e Secretaria de Serviços Urbanos deram apoio cultural a uma obra que atravessou fronteiras. Trata-se de Sertão Vermelho 2, do roteirista Haroldo Magno e do desenhista Edvan Bezerra. Através da arte sequencial eles contam a saga de Lampião, o rei do cangaço pelo sertão da Bahia.




Outro álbum, Lucas da Vila de Sant´Anna da Feira (lançado em 2010), patrocinada pelo Banco do Nordeste/Ministério da Cultura através do Edital de Microprojetos Culturais, é fruto de anos de pesquisa do roteirista Marcos Franco e de entrevistas realizadas em conjunto com o também roteirista Marcelo Lima, com pesquisadores e líderes de associações de bairros feirenses, resgata a história do escravo rebelde Lucas da Feira. Lucas da Feira foi um negro que na primeira metade do século 19 se rebelou contra a escravidão e passou a atacar tropeiros a caminho da Feira do Gado em Feira de Santana. Os diálogos coloquiais e os desenhos de Hélcio Rogério ajudam a ambientar a região. A começar pela capa que foge do padrão com muita criatividade. Há um recorte do rosto da personagem, impactante. O uso do tom, excelente. Os desenhos registram todo os aspectos, ambientes da época. O traço de Hélcio é forte, personalístico e dinâmico.



Lima adaptou o livro O bicho chegou a Feira, do escritor e jornalista Muniz Sodré para os quadrinhos em uma revista homônima que está pronta desde 2017 e deve ser lançada em breve. A obra foi financiada por um edital do selo literário João Ubaldo Ribeiro, projeto da FGM.



Vencedores do edital para artes visuais, o roteirista Igor de Albuquerque e a arquiteta e artista visual Amine Barbuda vão lançar o livro -13, -38: amanhã de novo. Trata-se de um romance gráfico ambientado na Salvador de 2049, que perdeu seu nome e é conhecida pelas suas coordenadas geográficas (-13, -38 ). A história toda se desenrola em um dia da vida de Clarissa Huang, uma sino-baiana que trabalha com a poesia de Gregório de Mattos. Os balões de diálogos do livro foram desenhados por Túlio Carapiá.




Salvador em algum ponto do futuro também é cenário para a história de ficção em que androides herdam a terra, ponto de partida para o HQ que Bruno Marcello, o Bua, deve lançar ainda este ano, projeto financiado pelo edital setorial de artes visuais da Fundação Cultural do Estado da Bahia (Funceb). Marcello também é coautor, juntamente de Camilo Fróes e Moreno Pacheco, de Cidade-motor, uma outra história ambientada numa Salvador do futuro. Nesse livro, o futuro da capital baiana é pincelado como um aglomerado de passarelas, viadutos e centros comerciais. A obra foi lançada em 2016 pela RV Cultura e Arte, um dos raros lugares em Salvador que vendem HQs.



O baiano Hugo Canuto publicou a HQ Conto dos Orixás em 2017, apostou no crowdfunding, e a campanha deu tão certo que ele já está partindo para a terceira tiragem. O estado onde ele mais conseguiu vender foi São Paulo, depois a Bahia e o Rio de Janeiro. Mas houve compradores no exterior também. O quadrinista se diz um apaixonado por mitos e o livro baseia-se em lendas yorubás e na cultura das religiões africanas, com divindades como Iemanjá, Xangô e Oxóssi.


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