O artista plástico Hector Julio
Paride Bernabó, um argentino que se tornou mundialmente famoso com o apelido de
Carybé, morreu no dia 01 de outubro de 1997, aos 86 anos, de problemas
respiratórios decorrentes de um enfisema pulmonar. Ele foi quem melhor retratou
a vida da Bahia. Suas figuras são inconfundíveis quer estejam num mural, numa
tela ou numa aquarela.
Nascido em Lanus (1911), nas
proximidades de Buenos Aires, o menino Hector passou a infância na Itália,
visitando o Brasil pela primeira vez ainda garoto, em 1920. Dez anos depois, a
família voltou à terra natal, onde ingressou na Escola de Artes Decorativas. Em
1938 travou o primeiro contato com a Bahia e apaixonou-se por Salvador.
Deslumbrado, quis ficar. Não foi possível. Mas o desejo de pintar a magia do
povo baiano, os rituais do candomblé e as belas paisagens da terra dos orixás
falavam alto em seu coração. Depois de ter viajado demoradamente pela América
do Sul, desenhando e expondo, voltou várias vezes na década de 40, até que
resolveu fixar-se definitivamente em 1950.
Chegou de vez à terra da
mestiçagem, do candomblé e das puxadas de rede que retratou em seus quadros.
Aceitou um, convite de Anísio Teixeira, no governo de Otávio Mangabeira, para
desenhar a Bahia. Adotando a natureza mística da terra, Carybé integrou-se
suavemente ao candomblé, fazendo-se filho de Oxossi, Oba de Xangô e presidente
do Conselho dos Obas no terreiro Axé Opô Afonjá. Retratista fiel das tradições,
crenças e costumes do povo baiano, projetou em sua arte os fundamentos da nação
brasileira, na qual se misturam o negro, o índio e o branco.
Das atividades que desempenhou no
Brasil, foi pandeirista do Bando da Lua, que acompanhou Carmem Miranda,
ilustrador das obras de Jorge Amado, do qual era fraterno no amigo desde que
passou a morar na Bahia. Foi parceiro de Paulo Vazzolini, autor de capas de
livros de Gabriel Garcia Marques, ilustrador de “Macunaíma”, de Mário de
Andrade, e autor do Memorial da América Latina, em São Paulo.
Carybé foi além das preocupações
sociais e estéticas dos muralistas, propondo relevos e incrustações na pintura.
Novas experiências são a tônica em seu trabalho, variando suportes e materiais.
Barro, relevos em pedra, madeira, cimento, inclusões de ferro, vidro, metais,
osso – Carybé multiplica-se como oleiro, carpinteiro, ferreiro, ourives.
Segundo Jorge Amado, ninguém, no Brasil, contribuiu de forma mais evidente e
verdadeiro para situar e exaltar essa contribuição do que mestre Carybé.
Através da arte – desenhos, aquarelas, aguadas, óleos, talhas, painéis, livros
– e através da ação pessoal numa participação cotidiana e criadora na vida
popular baiana, tornou-se um dos cidadãos mais eminentes da urbe. Em sua obra,
ele registrou de maneira expressiva os rituais do candomblé e valorizou as
tradições trazidas da África pelos negros.
Na Bahia, como em todo o Brasil e
muitos países do mundo, são marcantes os painéis de Carybé, em prédios
públicos, bancos e mesmo edifícios residenciais. Suas obras fazem parte do
acervo das mais respeitáveis instituições como o Museu de Arte Moderna de Nova
Iorque, Fundação Gulbenkian, de Lisboa, Museu de Arte Moderna de São Paulo,
Museu de Arte Moderna da Bahia e Fundação Raymundo de Castro Maya, Rio de
Janeiro.
Ele retratou a Bahia com uma
verdade afetuosa – as mulatas angulosas, os capoeiristas longilíneos, os
orixás, as vaquejadas. Seus desenhos têm um traço vigoroso e ao mesmo tempo
guardam a delicadeza da visão singular de um baiano de coração sobre sua terra.
Seus quadros a óleo transbordam luz e exuberância. Como os grandes mestres, o
artista fez da arte sua vida. Um artista completo: desenhista, gravurista,
escultor, escritor e pintor.
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