J.Carlos fazia parte dos três amigos da
época: Raul Pederneiras e K.Lixto, o trio de ouro da caricatura brasileira no
início do século 20. Ele foi o caricaturista mais importante de seu tempo. O
humor, a rapidez e clareza de seu traço registram as mudanças de costumes e
comportamento ocorridas no Rio de Janeiro, na virada do século XIX. Caricaturista,
chargista, ilustrador, publicitário e humorista, José Carlos de Brito e Cunha
(1884-1950), o J. Carlos, nasceu e viveu no Rio de Janeiro. Foi um dos maiores
cronistas visuais de seu tempo, retratou com beleza e elegância o cotidiano da
cidade e seus habitantes. Com seu traço art déco, criou edifícios, paisagens e
personagens, como as melindrosas, com seu figurino sofisticado e penteados
modernos, que ilustraram as principais publicações que circularam na primeira
metade do século XX.
Iniciou sua carreira em 1902, na revista
O Tagarela, dirigida por Raul Pederneiras (1874 - 1953) e K. Lixto (1877 -
1957). No ano seguinte, contribui com diversas publicações adultas e infantis
até que, em 1908, emprega-se na revista A Careta, fundada neste mesmo ano por
Jorge Schmidt, nela atuando até 1921. Paralelamente, colabora com diversas
publicações, entre elas as revistas Fon-Fon, A Cigarra e O Malho, sendo esta
última dirigida por ele a partir de 1918.
Ao longo de sua carreira J. Carlos, com
suas charges, faz a crônica do processo de urbanização da capital carioca e dos
seus efeitos sociais. Entre 1922 e 1930, exerce o cargo de diretor artístico
das empresas O Malho, onde inicia uma grande série de charges de caráter
político, satirizando fatos e personalidades nacionais e estrangeiras. A
vertente política é explorada pelo artista desde o início de sua carreira,
sendo ele o responsável pela execução de uma série de charges antibelicistas
executadas no período abrangido pelas duas grandes guerras e principalmente
durante os dois governos de Getúlio Vargas (1883 - 1954). Esses trabalhos são
publicados principalmente na revista A Careta.
O motivo por excelência das charges de
J. Carlos é o carioca, seus hábitos e seu entorno. Seus desenhos testemunham o
surgimento do telefone, da fotografia, do chope, do samba, do bonde elétrico,
do automóvel, do cinema, do rádio, do avião, da cultura do futebol, da praia e
do carnaval, e no campo político, a República Velha, a Revolução de 30, o
Estado Novo e as duas Guerras Mundiais. Sua crônica visual não deixa escapar a
modernização segregadora do projeto urbanístico de Pereira Passos e neste
sentido retrata tanto os hábitos afrancesados das classes mais favorecidas -
com seu footing e chás da tarde na Confeitaria Colombo - como o nascimento da
cultura do morro, a disseminação das favelas e a sobrevivência da cultura
carioca do Rio antigo no bairro da Lapa.
Um de seus tipos mais famosos é a figura
da Melindrosa, criada em 1920. Esta foi por ele imortalizada com sua silhueta
esguia, olhos redondos, o cabelo cortado a la garçonne, com o característico
pega-rapaz na testa e ao lado do rosto, a boca em forma de coração pintada com
batom forte. Essa mulher, misto de criança ingênua e garota refinada e sensual,
presente em toda produção de J. Carlos, quase sempre sendo cortejada ou
perseguida por um ou mais homens.
J. Carlos também cria no início dos anos
1920 os personagens infantis Jujuba, Lamparina, Goiabada e Carrapicho, numa
época em que quase ninguém se preocupava com o público infantil. Não à toa,
quando Walt Disney visita o Brasil por ocasião do lançamento de seu filme
Fantasia, tenta, sem êxito, levar o artista brasileiro para Hollywood. Há quem
diga que o personagem do criador americano Zé Carioca é baseado no personagem
Papagaio de J. Carlos, que Disney teria visto em sua passagem pelo país.
Ironicamente, ao deixar de desenhar seus personagens infantis em 1941, J.
Carlos afirma: "Fi-los durante mais de vinte anos, mas hoje, um esforço
tamanho para quê?...Por quê?... A remuneração é tão insignificante. Quem é que
pode concorrer com esses originais estereotipados estrangeiros?".
José Lins do Rego escreveu que J.Carlos
está para a caricatura brasileira como Villa Lobos para a Música e Machado de
Assis para a Literatura. Sua carreira na imprensa durou quase 50 anos e
concentrou-se em torno de sua colaboração com duas grandes empresas editoriais:
a Careta e O Malho.
Aproveitando-se da relativa flexibilidade
da censura imposta por Vargas em relação à política internacional, o artista
publica uma série de ilustrações cujo conteúdo tinha como foco crítico a
política imperialista norte-americana evidenciada após o término da Segunda
Grande Guerra (1939-1945). Trabalha incansavelmente até a data de sua morte,
ocorrida em 1950, na redação da revista A Careta.
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