O artista plástico Ângelo Roberto, se
vivo fosse, completaria 80 anos neste ano de 2018. Ele nasceu em 1938 na antiga
Palestina, atual Ibicaraí. Quando veio morar com a família em Salvador, participou
do programa do professor Adroaldo Ribeiro Costa, Hora da Criança. E descobriu a
vocação para desenho. No dia 28 de janeiro de 2018 ele morreu. O seu legado
artístico e humano certamente o torna um ser especial.
Simplicidade, sensibilidade, harmonia, força,
beleza, expressividade plástica, olhar da infância (puro). Tudo isso estão
contidos no desenho do mestre baiano Ângelo Roberto. Impossível não parar
diante de seus desenhos ternos de traço límpido e preciso.
No misterioso traçado quase invisível que
compõe o desenho de Ângelo Roberto, há às vezes a impressão de que o artista
tem um poder incomum de criar um nobre sentimento entre suas figuras humanas e
seus animais. Nos gestos mais sutis das figuras de Ângelo, o sentimento de amor
infinito pela liberdade compreende o direito das criaturas de conquistá-la e
deixá-la ir e vir, quando quiser. Como a tristeza feita em lágrimas nos olhos
das meninas, diante de pássaros engaiolados; ou feita em alegria incontida e
fluida no momento de ver outro pássaro alçar vôo e sumir pela janela. Em todos
os segmentos que extrai da vida, Ângelo é sublime e sua linguagem não é
meramente emocional – é hipnótica. Na avaliação de Ângelo, a marca da sua arte
é a linha precisa. “É ela que me fascina, é o ponto de partida de tudo, eu não
acredito num pintor que não é desenhista. Atualmente, eu ando querendo fazer
pintura, mas estou emaranhado pela linha, e é difícil sair dela“.
O desenho, para o artista, “é a
alfabetização”, a grande escola de pintores, caricaturistas, os mestres das
artes visuais. A peça mais importante do jogo, assim como “o escritor tem que
saber soletrar”, o pintor tem que saber desenhar, para ser perfeito em sua
arte. Por isso, Ângelo não pensa duas vezes para dizer que desenho é
fundamental, “porque sei que todo desenhista pode pintar, mas nem todo pintor
desenha”. Assim como nem todo caricaturista sabe desenhar, mas todo desenhista
pode ser um bom caricaturista. E Ângelo Roberto é bom em tudo o que se propõe a
fazer, porque de desenho ele entende.
Ele se dedicou, em vida, a desenhar
cavalos. Esses seres peraltas, encantados, quase mitológicos, ternos e cheios
de façanhas surgem do imaginário lúdico do artista. E como escreveu o escritor
Paulo Martins para o Caderno Cultural d´A Tarde, Paulo Martins, o tema
recorrente do conjunto de sua obra sempre foi a infância. “Assim, os desenhos
de Ângelo são mais do que meras recordações da infância: ele os concebe,
sempre, com os olhos da infância. São desenhos mnemônicos, mas é como se ele
enxergasse tudo não com os olhos de hoje, mas com os olhos da criança que foi
um dia”.
O bico de pena é uma característica
forte na arte de Ângelo Roberto, mas a caricatura é algo que “nunca saiu de
mim”. Ele já foi caricaturista de diversos jornais baianos como o Jornal da
Bahia, A Tarde, Diário da Bahia e Folha da Bahia. Segundo o professor e artista
plástico Juarez Paraíso, “Ângelo Roberto é, precipuamente, um artista da linha
e do tracejado, das impressionantes tramas de bico-de-pena. O contraste elegido
é simples, mas eficaz. O completo domínio artesanal do artista tece uma
incrível tessitura gráfica, um incrível trabeculado, estrutura linear composta
por traços pacientemente superpostos, com mais ou menos transparência, jamais
obstruindo a passagem da luz que emana do papel”.
“A volumetria – continua Juarez – é
reduzida e controlada com sutileza, e o segredo está no controle da
transparência e da natureza da textura visual, na dependência da acumulação e
posição espacial do tracejado retilíneo, sendo notável a passagem da luz entre
as figuras e o fundo. Mestre do bico-de-pena, Ângelo Roberto já produziu
centenas de desenhos de grande beleza plástica (gráfica). Com os atuais,
demonstra uma prodigiosa imaginação e memória visual no desafio de um só tema e
com o máximo de economia dos recursos materiais. Um sensível e intenso
sentimento de harmonia emana da conjugação de linhas, atraindo o movimento do
olhar, seduzido pela suavidade do ritmo criado pelo artista. A expressividade
plástica sobrepõe-se à simples configuração temática, graças ao desenho
despojado e contemplado pelo talento do artista, pela depurada percepção
seletiva e notável poder de síntese, próprio dos grandes desenhistas
figurativos”.
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