No mês de setembro estava de
férias, longe de tudo e de todos, mas perto dos livros, quadrinhos,
videos e
cds. Era o período que tinha para aprofundar meus conhecimentos. Foi quando
recebi uma ligação informando da morte do desenhista Antônio Cedraz. Ele
faleceu no dia 11 de setembro, às 05h50 da manhã, vitima de câncer. Fui ao seu
enterro e lá encontrei a família e todos os amigos de Cedraz para a última
despedida, mas ele continua entre nós através de sua obra, poderosa, positiva,
plural. Agrada crianças e adultos.
Naquele dia fez sol pela manhã e
choveu muito à tarde. A quarta feira do dia 11 parecia mais triste. Foi triste,
mas temos que ser forte e guardar dos que foram as boas lembranças. Foi assim
com Lage, que se foi em um mês de novembro, também vítima de câncer. E parece
que o câncer se alastra cada vez mais, tenho diversos amigos com essa doença.
Eu mesmo, tenho câncer de pele. Os médicos informam que ele foi embora, assim
espero.
“Aprender a lutar contra o câncer
é aprender a nutrir a vida dentro de nós. Mas não é obrigatoriamente uma luta contra
a morte. Ter êxito nesse aprendizado é chegar a tocar na essência da vida, encontrar
uma completude e uma paz que a tornam mais bela. Pode acontecer de a morte fazer
parte desse êxito. Há pessoas que vivem suas vidas sem apreciar seu verdadeiro valor.
Outras vivem a própria morte com uma plenitude, uma tal dignidade, que ela parece
ser a realização de uma obra extraordinária e dar um sentido a tudo que viveram.
Preparando-se para a morte, libera-se a energia às vezes necessária à vida. É preciso
começar desarmando o medo” ensina o médico David Servan-Schreiber.
Este ano Cedraz recebeu diversas
homenagens quando vivo. A Biblioteca Monteiro Lobato, no bairro
de Nazaré abriu
uma sala com seu nome. A RV Cultura e Arte montou uma exposição onde diversos
desenhistas homenagearam as personagens de Cedraz. Ele também recebeu a
honraria de uma universidade como mestre de quadrinhos. Em maio gravamos um
documentário em sua casa em Brotas sobre sua trajetória. No ano que vem a Flica
vai homenagear o quadrinista.
Cedraz vinha publicando
ininterruptamente no jornal A Tarde as tiras A Turma do Xaxado. “Tudo começou
em 1998, quando Sérgio Mattos editor do caderno Municípios, do jornal A Tarde
pediu-me para fazer algumas histórias com um personagem interiorano. Levei
algumas tiras de Xaxado, imediatamente aceitas e publicadas duas vezes por
semana. Logo depois, o personagem migrou para a seção de quadrinhos do jornal e
passou a ser publicado diariamente. Depois, vieram cartões telefônicos,
revistas em quadrinhos, revistas de atividades, exposições, seis troféus HQ Mix
e mais de duas dezenas de livros publicados. Muitas outras surpresas estão por
vir”, conta Cedraz na apresentação da obra.
“A Turma do Xaxado mergulha sobre
as lendas e sobre a dura realidade do sertão, sem descuidar da crítica social,
e produz um resultado tão eclético que às vezes é difícil precisar a que faixa
etária se destinam as histórias. Xaxado agrada igualmente a criança e o adulto.
Diverte, ensina e chama à reflexão. Num mercado editorial saturado de criaturas
super-qualquer-coisa, que só falam inglês, é um colírio encontrar uma
publicação que fale de nossas raízes e dá voz aos que passam por inaceitáveis
desamparo em pleno século XXI”, informa Cláudio Oliveira, mestre em Letras que
defendeu dissertação sobre A Turma do Xaxado. Nesse livro tem ainda uma
apresentação dos personagens em forma de cordel, feitas por Antonio Barreto.
A simplicidade e originalidade do
autor em muito se assemelha aos seus personagens, seja ele Xaxado (o líder da
turma, neto de cangaceiro), Zé Pequeno (o preguiçoso), Marieta (sabe-tudo da
turminha), Arturzinho (filho de fazendeiro abastado), Seu Enoque e Dona Fulo
(pais de Xaxado), entre outros. Eles dão vida, humor e significado também a
cultura baiana.
Num mercado restrito que é o do
grafismo no Brasil, onde há descrença que quadrinho nacional não
vende, na
Bahia pior ainda. Aqui não temos editoras para publicar as criações dos
artistas locais. Nos anos 70 fundei com alguns amigos o Clube da Editora
Juvenil, mais tarde conhecido como Centro de Pesquisa e Comunicação de Massa.
Na época publicávamos o fanzine Na Era dos Quadrinhos com estudos e pesquisas
sobre quadrinhos, charges, caricaturas, desenhos de humor. Mais tarde essas
pesquisas foram publicadas semanalmente na grande imprensa. Mas era pouco para
ajudar os artistas gráficos.
Resolvemos realizar exposições em
escolas, galerias de artes e shoppings seguindo de palestras para acentuar mais
os trabalhos de nossos artistas. E finalmente quando passei a editar os
cadernos de cultura da imprensa baiana resolvi abrir espaço para as tiras da
Bahia. Essa valorização foi seguida por outros jornais. Na época muitos jovens
só se interessavam em criar personagens super poderosos, voadores, super heróis
imitações dos norte americanos.
Mas havia um grupo que se
destacava para outras criatividades. Nildão, Setúbal, Lage, Cedraz, Dílson
Midlej, Aps entre outros estavam nessa leva de criadores. Com o tempo fui me
afastando dos quadrinhos (depois de publicar dois livros sobre o assunto) e fui
me dedicar em outras artes (cinema, literatura, poesia, música, artes
plásticas), mas sempre procurava me atualizar com os quadrinhos.
Cedraz seguiu no foco dos quadrinhos
infantis – era uma paixão que ele não deixaria nunca. Saindo do pequeno
município de Miguel Calmon, passando por Jacobina até chegar em Salvador ele
passou por diversos obstáculos, muitas barreiras, mas sempre com fé naquilo que
fazia. E isso é notável em sua trajetória. Um guerreiro, nada desanimava o
rapaz, por mais que as portas se fechavam para ele, outra se abria. Seus
quadrinhos começaram a ter maior visibilidade quando ele partiu para divulgar
no interior do estado, depois em outras localidades. Um de seus livros, Turma
do Xaxado – Volume 2, foi incluído no Programa Nacional Biblioteca na Escola
onde o governo federal distribui nas escolas dos ensinos fundamental e médio.
Novos livros estavam em pauta no
estúdio onde ele fundou e trabalha junto com uma equipe composta de
argumentista, desenhista, arte finalista e colorista. Sua filha se dedica na
parte administrativa. Tem um desenho animado, revista de circulação nacional e
muito mais. Toda esta fase vitoriosa passou por uma trajetória espinhosa que só
os artistas nordestinos sabem como é. O nordestino é antes de tudo um forte.
Para a exposição que estamos
preparando para 2015 fiz um texto sobre Cedraz que em maio deste ano ele leu e
aprovou na hora:
O criador da Turma do Xaxado, Zé Bola,
Joinha e tantos outros personagens é um desbravador de sonhos. Antônio Luis Ramos
Cedraz é o quadrinista mais conhecido da Bahia, é o nosso porto seguro, nossa identidade
deste mundo globalizado. Com ele nunca vamos perder nossas raízes, pois ele fala
a língua de sua gente simples e humilde. Ele está no mercado há mais de 40 anos,
sempre batalhando, lutando para abrir espaço para os quadrinhos nacionais, mas com
muita humildade. Nunca desistiu da luta, mesmo que batalhasse com dificuldades e
enfrentando o todo poderoso syndicate norte americano.
Da simplicidade do traço à criatividade
da narrativa, Xaxado retrata a vida rural com todas as suas lendas e mistérios.
São aventuras de um garoto, neto de um famoso cangaceiro que vivia com o bando de
Lampião, às voltas com problemas do dia a dia, junto com seus pais e amigos.
A Turma do Xaxado reúne personagens
tipicamente brasileiros e já recebeu diversos prêmios. Todo o trabalho tem um bom
acabamento visual das personagens, com precisão no traço e originalidade temática.
Através de um enredo fluente, falando de um cotidiano em que se misturam o real
e o simbólico, o objetivo e o subjetivo, o autor constrói uma atmosfera da qual
é difícil ficar alheio. Através de Xaxado penetramos no universo gráfico de Cedraz,
o imaginário infantil cria asas e viaja na mente de todos nós.
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um Estado D´Alma, sobre a cultura do nosso estado, a obra encontra-se à venda
nas livrarias LDM (Brotas), Galeria do Livro
(Espaço Cultural Itau Cinema Glauber Rocha na Praça Castro Alves), na Pérola
Negra (Barris em frente a Biblioteca Pública), na Midialouca (Rua das
Laranjeiras, 28, Pelourinho. Tel: 3321-1596) e Canabrava (Rua João de Deus, 22,
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Tel: 3347-4929.
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