Desenhista de HQ na Bahia é mesmo um
forte. Pode ser em tempo de crise, mercado restrito, falta de editora, sempre
surge uma publicação que contraria a lei do contra. Em 1989 Lage, Nildão,
Rezende, Valtério lançaram a revista Pau de Sebo. Sobreviveu apenas cinco
números. Separado do grupo, em 1990, Rezende lançou sozinho a Vilões, revista
só de quadrinhos com linguagem underground. Foram cinco mil exemplares rodado e
vendeu cerca de dois mil em bancas, fora as vendas em shows, eventos e
universidades. Apesar do esforço, o número um foi filho único. Apesar de iniciativas
como estas, que geraram outros fanzines de vida curta, os quadrinhistas não
voltaram a se unir. Cada um botou sua arte nas costas e seguiu um caminho.
Em 1993 o experimentalismo marcou a
revista Des HQuê (leia Desagaquê) que mesclou histórias em quadrinhos com o
experimentalismo que caracterizou as estratégias dos fanzinistas. Editado por
Carlos Mattos, traz desenhos de Carlos Mattos, Fabio Abreu, Marco Aurélio,
entre outros. O artista plástico Parlim, da cidade de Juazeiro, transpôs a saga
de Antônio Conselheiro e seus seguidores para o mundo dos quadrinhos. A
publicação foi de 1994.
Sufocado pelo mercado editorial, os novos
quadrinistas respiraram através dos fanzines. E faziam de tudo um pouco para
colocar suas ideias `no ar´. Mário Sérgio Moura, o Afoba, vocalista de
Lisérgia, lançou o zine O Morrete. Augusto Mattos, preparou o zine de ficção
Fobos. Hector Salas lançou Facção junto com Bruno Aziz que já rabiscava desde
criança a tirinha Dilemas Infantis. Em 1997 saiu a Crau que teve participação
de alguns desenhistas paulistas.
Em 2005 a prefeitura de Paulo Afonso
juntamente com a Secretaria de Educação e Cultura e Secretaria de Serviços
Urbanos deram apoio cultural a uma obra que atravessou fronteiras. Trata-se de
Sertão Vermelho 2, do roteirista Haroldo Magno e do desenhista Edvan Bezerra.
Através da arte sequencial eles contam a saga de Lampião, o rei do cangaço pelo
sertão da Bahia.
Outro álbum, Lucas da Vila de Sant´Anna da
Feira (lançado em 2010), patrocinada pelo Banco do Nordeste/Ministério da
Cultura através do Edital de Microprojetos Culturais, é fruto de anos de
pesquisa do roteirista Marcos Franco e de entrevistas realizadas em conjunto
com o também roteirista Marcelo Lima, com pesquisadores e líderes de
associações de bairros feirenses, resgata a história do escravo rebelde Lucas
da Feira. Lucas da Feira foi um negro que na primeira metade do século 19 se
rebelou contra a escravidão e passou a atacar tropeiros a caminho da Feira do
Gado em Feira de Santana. Os diálogos coloquiais e os desenhos de Hélcio
Rogério ajudam a ambientar a região. A começar pela capa que foge do padrão com
muita criatividade. Há um recorte do rosto da personagem, impactante. O uso do
tom, excelente. Os desenhos registram todo os aspectos, ambientes da época. O traço
de Hélcio é forte, personalístico e dinâmico.
Lima adaptou o livro O bicho chegou a
Feira, do escritor e jornalista Muniz Sodré para os quadrinhos em uma revista
homônima que está pronta desde 2017 e deve ser lançada em breve. A obra foi
financiada por um edital do selo literário João Ubaldo Ribeiro, projeto da FGM.
Vencedores do edital para artes visuais, o
roteirista Igor de Albuquerque e a arquiteta e artista visual Amine Barbuda vão
lançar o livro -13, -38: amanhã de novo. Trata-se de um romance gráfico
ambientado na Salvador de 2049, que perdeu seu nome e é conhecida pelas suas
coordenadas geográficas (-13, -38 ). A história toda se desenrola em um dia da
vida de Clarissa Huang, uma sino-baiana que trabalha com a poesia de Gregório
de Mattos. Os balões de diálogos do livro foram desenhados por Túlio Carapiá.
Salvador em algum ponto do futuro também é
cenário para a história de ficção em que androides herdam a terra, ponto de
partida para o HQ que Bruno Marcello, o Bua, deve lançar ainda este ano,
projeto financiado pelo edital setorial de artes visuais da Fundação Cultural
do Estado da Bahia (Funceb). Marcello também é coautor, juntamente de Camilo
Fróes e Moreno Pacheco, de Cidade-motor, uma outra história ambientada numa
Salvador do futuro. Nesse livro, o futuro da capital baiana é pincelado como um
aglomerado de passarelas, viadutos e centros comerciais. A obra foi lançada em
2016 pela RV Cultura e Arte, um dos raros lugares em Salvador que vendem HQs.
O baiano Hugo Canuto publicou a HQ Conto
dos Orixás em 2017, apostou no crowdfunding, e a campanha deu tão certo que ele
já está partindo para a terceira tiragem. O estado onde ele mais conseguiu
vender foi São Paulo, depois a Bahia e o Rio de Janeiro. Mas houve compradores
no exterior também. O quadrinista se diz um apaixonado por mitos e o livro
baseia-se em lendas yorubás e na cultura das religiões africanas, com
divindades como Iemanjá, Xangô e Oxóssi.
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