11 abril 2012

Monteiro Lobato e o mundo infantil (2)

A obra mais importante de Monteiro Lobato, porém, foi a série de histórias que escreveu para crianças, iniciada com a publicação de “Reinações de Narizinho”, em 1921. Antes dessa publicação, não existiam nos livros para crianças, escritos no Brasil, características da obra literária. Pioneiro do abrasileiramento da linguagem, criticava abertamente as traduções portuguesas então correntes no Brasil. Além de tornar a linguagem mais coloquial e, portanto, mais acessível às crianças, ousou criar neologismos, fazer inúmeros jogos de palavras, sem duvidar da capacidade de reflexão de seus pequenos leitores.


Ele foi o primeiro escritor a tratar a literatura infanto-juvenil com seriedade. Seus livros não são apenas divertidos. Eles procuram informar e educar os jovens leitores. Outra novidade foi a discussão de temas políticos e sociais que empolgavam o mundo naquele tempo e a valorização da cultura popular, uma das vertentes do modernismo a qual ele antecipou.


Ao lado dessas inovações, está o fato de que Monteiro Lobato criou um mundo mágico. Nele, reina o faz-de-conta, através do qual convivem personagens do mundo real, ou seja, os habitantes do Sítio do Picapau Amarelo, e todos os heróis do mundo das maravilhas, renovados por seu talento. Seus personagens apresentados em Reinações de Narizinho e protagonistas alternados de todos os 23 títulos que compõe sua obra são marcos na literatura brasileira.


Tia Nastácia é a ama negra comum nas fazendas brasileiras do princípio do século. Inculta e boníssima, dá vida com suas mãos aos dois mais originais personagens da obra lobatiana, Emília e Visconde. Boneca que se transforma aos poucos em gente, Emília é a própria juventude de espírito e é através dela que o autor manifesta suas ideias mais polêmicas. Visconde, um sabugo de milho de cartola, é uma crítica viva à nobreza e ao saber “bolorento”.


Dona Benta é a avó ideal. Culta como poucas, é aberta a todas as novidades vividas pelos netos. É quem forma e informa, dando lições de coisas e de comportamento. Lúcia, a menina do narizinho arrebitado, e Pedrinho, seu primo e companheiro de aventuras, são bons exemplos da infância sadia de todos os tempos. Alegres, criativos, honestos, corajosos e amigos, têm as virtudes das crianças felizes. Ávidas de conhecimento e de aventuras, descobrem o mundo através da palavra de Dona Benta, do afeto da tia Nastácia e principalmente de sua própria experiência, que re-elabora as informações recebidas nesse universo idealizado.


Monteiro Lobato foi um homem comprometido com o seu tempo, absolutamente consciente do momento histórico em que viveu. Jogando com personagens tão predominantemente o mundo da fantasia, questiona todo o tempo a realidade. Usa o maravilhoso para romper as estruturas estratificadas do real e levar a criança, em que via a única esperança da humanidade, à busca de novas soluções.


Com Lobato, os pequenos leitores adquirem consciência crítica e conhecimento de inúmeros problemas concretos do País e da humanidade em geral. Ele desmistifica a moral tradicional e prega a verdade individual: instaura portanto a liberdade. “O segredo é um só, liberdade”. Tornou-se o escritor de literatura infantil mais lido em português e espanhol. A saga termina com Os 12 Trabalhos de Hércules: 39 histórias (sendo 32 originais e sete adaptações), cerca de 500 páginas, um milhão de exemplares vendidos.


Criou o universo do Picapau Amarelo em que milhões de crianças passaram a viver na imaginação. Comprometido com o homem brasileiro, amado pelas crianças, incompreendido por muitos, foi uma consciência dividida entre as exigências de seu povo e a atualização dos modelos literários.

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