No
Brasil, houve um tempo em que uma língua se sobressaía entre as
demais. Sua influência foi tão marcante que, mesmo quando a Europa
pensava ter encontrado aqui uma Atlântida selvagem e Portugal
acreditava serem essas suas terras, o tupi continuava firme e mais
falada que a própria língua portuguesa.
Até os
dias atuais, quando as comunidades indígenas lutam para não perder
o que sobrou de suas identidades, o tupi continua sendo a base
lingüística responsável pelas significativas mudanças entre a
língua falada em terras lusitanas e brasileiras. Para se ter uma
idéia do que isso significa, basta lembrar que na língua
oficialmente falada no Brasil, existem dez mil vocabulários em tupi,
sendo, segundo o professor da USP, Eduardo Navarro – a língua que
mais designa nomes de localidades no país, depois do português. O
especialista em letras clássicas pontua que existem cerca de 180
línguas de origem indígenas faladas no Brasil.
Dados
levantados pelo engenheiro José Antônio Caldas, informou que a
população indígena aldeada na Bahia, em meados do século XVIII,
era de cerca de 12 mil, que mal seriam 6% da população residente no
estado na época. Segundo a antropóloga e historiadora Maria Hilda
Paraíso, todos os grupos indígenas da Bahia perderam suas línguas
originais. “Exceto o tupi, o que se tem hoje das línguas das
tribos jê (também conhecidos como tapuias) e kiriri são registros
estáticos de um ou outro vocábulo, desprovido da gramática que dá
o dinamismo da língua. Então é muito fácil chegar em determinadas
comunidades indígenas hoje que utilizam algumas palavras recuperadas
com a estrutura gramatical da língua portuguesa”, completa a
especialista.
O estudo
do tupi continua sendo uma exceção na academia e nas escolas
brasileiras. Na UFBa, o tupi deixou de ser estudado como disciplina
em 1993, com a aposentadoria da especialista no assunto, a tupinóloga
baiana e discípulo de Frederico Edelweiss (maior especialista no
assunto e fundador da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da
UFBa) até a sua morte, a historiadora Consuelo Ponde de Senna.
De acordo
com Consuelo Ponde, o tupi era falado em todo o litoral brasileiro e
nas regiões Norte e Nordeste. “Chamada pelos portugueses de língua
brasílica, o tupi – de acordo com a tribo – sofria algumas
variantes dialetais, mas se mantinha como a língua mais falada no
território nacional”, esclarece a especialista. A palavra tupi, na
verdade, era a designação da própria nação que deu origem a
vários troncos como os tupinambás, tupiniquim, tabajaras, tuxás,
entre outros.
Para se
fazer entender e conseguir desempenhar o papel de educadores, os
jesuítas foram obrigados a aprender o tupi, falando e escrevendo a
língua nativa. Dessa forma a língua brasílica cresceu nas terras
da Santa Cruz, tornando-se mais falada que o próprio português. As
disputas políticas entre o poderoso ministro Sebastião José de
Carvalho e Melo, o Marquês de Pombal, e os jesuítas serviram de
justificativa para que Pombal decretasse em 17 de agosto de 1758, a
proibição do uso do tupi. A finalidade era enfraquecer o poder da
Igreja Católica sobre a colônia. E espalhou-se na colônia uma
regra comportamental que pregava que falar a língua gentílica era
sinônimo de inferioridade. E a velha tendência de cultuar os
costumes estrangeiros começava a fincar raízes.
Apesar
das proibições de Pombal, o tupi continuou resistindo,
principalmente no norte do país, onde a morosidade da colonização
terminou por preservar a língua mãe do Brasil. E o tupi foi sendo
paulatinamente esquecido até o final do século XIX quando um
intelectual baiano, o estudioso Theodoro Sampaio trouxe o tupi de
volta à visibilidade, através do Instituto Histórico de São
Paulo. O personagem de Lima Barreto, Policarpo Quaresma, em plena
ditadura republicana, sonhou restabelecer o tupi como língua
nacional, e foi ironizado por Oswald de Andrade na sua afirmação
modernista “tupy or not tupy, that is the question!”. Gonçalves
Dias quis recuperar com suas obras como I Juca Pirama (que significa
o que vai ser morto), assim como José de Alencar que, ao escrever
Ubirajara, Iracema entre outros livros, buscava encontrar o rosto do
Brasil.
Para a
diretora do Instituto de Letras da UFBa, Evelina Hoisel, o “ensino
do tupi nas escolas da universidade facilitaria a compreensão da
formação histórica do país. O que não podemos imaginar é que a
partir desse projeto, o tupi volte a ser uma língua falada”. Mais
de duzentos anos depois da agressiva política de Pombal, o Brasil
deixou de ser um país bilíngüe: o tupi é falado por não mais do
que 30 mil índios – 10% da população indígena do Brasil,
calculada em cerca de 300 mil pessoas.
Há
milhares de expressões, como ficar de nhenhenhen (quer dizer falando
sem parar), chorar as pitangas (pitanga é vermelho em tupi, ou seja,
chorar lágrimas de sangue), cair um toró (toró é jorro d´água
em tupi), ir para a cucuia (entrar em decadência). Grande parte dos
verbos é tupi: socar (bater com a mão fechada), petec (bater com a
mão aberta, daí vem peteca, espetar é cutuc (daí cutucar). O
significado de grande parte de nomes de lugares só se sabe com o
tupi: Itapoan, Itaparica, Itacaré, Guaratinga, Pindobaçu e
Itajuípe. Na nossa fauna e flora, o tupi aparece massivamente: tatu,
tamanduá, jacaré.
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