O músico e compositor paulista Zé Miguel Wisnik lançou em 2011 o álbum duplo Indivisível. Ele é um dos mais importantes teóricos brasileiros da canção, doutor em Literatura pela USP. Nesse novo trabalho ele apresenta poemas musicados Tenha Dó das Estrelas (Fernando Pessoa), Anoitecer (Carlos Drummond de Andrade), Os Ilheus (Antonio Cícero), Mortal Loucura (Gregório de Matos).
O cantor e compositor baiano Lui Muritiba lançou o CD Romance e Canções onde ele apresenta. Em 14 faixas a relação da música e da literatura: O Grande Mentecapto, de Fernando Sabino (letra dele e Edmundo Caroso), Gabriela, Cravo e Canela, de Jorge Amado (Alegre Menino,de Dori Caymmi e Jorge Amado), Capitães de Areia, de Jorge Amado (letra dele e Edmundo Caroso), Buriti, e Grande Serão: Veredas, de Guimarães Rosa, Viva o Povo Brasileiro, de João Ubaldo Ribeiro, Vidas Secas, de Graciliano Ramos, entre outros. E o grupo baiano Pirigulino Babilake em seu trabalho intitulado Rosa Fubá mistura música e poesia em alta voltagem.
A música brasileira teve com a poesia, a literatura de um modo geral, uma relação muito grande, basta ouvir os trabalhos de nomes como Vinícius de Moraes (1913-1980), Cacaso (1944-1987), Torquato Neto (1944-1972) e Waly Salomão (1943-2003), grandes poetas e letristas atuantes da MPB. E como escreveu Patricia Palumbo n'0 Estado de S.Paulo: “Leia Manuel Bandeira em Villa-Lobos, Cassiano Ricardo em Secos e Molhados, Ferreira Gullar em Adriana Calcanhoto, Drummond em Milton Nascimento, Oswald de Andrade em Caetano Veloso. Há poesia na canção e em todo lugar” (20/09/2011, p.011).
A literatura de cordel tem uma longa tradição no Nordeste, onde mistura música e poesia. O cordel e o repente são um eco dessa cultura trovadoresca que se desenvolveu na França (século 11) e depois chegou à Península Ibérica por onde passou por outras influências e modificou. O grupo Cordel de Fogo Encantado faz um trabalho inventivo sobre o tema. Para muitos o rap descende também do repente.
E o Brasil conseguiu imprimir uma marca de qualidade de letra e música. Os EUA têm uma tradição melódica superior à poética. Por melhor que sejam as músicas de Cole Porter, George Gershwin, Irving Berlin, suas letras ficam aquém das composições. Na música francesa, o estilo de “chanson” prima pela poesia das palavras, numa língua rica como o francês, mas cujas músicas não eram tão marcantes.
A partir dos anos 1990 com o afundamento da indústria do disco, o foco único passou a concentrar-se nos chamados produtos descartáveis, de fôlego curto, vendas altas e imediatas. A conhecida MPB cuja linha evolutiva após a era de ouro tinha tomado rumos cada vez mais inovadores após a bossa nova (era dos festivais, tropicalismo, clube de esquina, neo nordestinos, vanguarda paulista), foi progressivamente alijado dos meios de difusão de massa, movidos, muitos deles, a jabá (explicar o tema). Muitos artistas passaram a viver mais de shows do que de discos. Outros saíram para selos independentes. Apareceram novos valores: Adriana Calcanhoto, Vanessa da Matta, Ana Carolina, Luscas Santtana, Moreno Veloso, Céu, Mariana Aydar, Tulipa Ruiz etc etc. A internet e suas redes sociais possibilitam ao artista um acesso direto ao fã, estamos nesse momento de transição.
O poeta sueco Tomas Transtromer, ganhador do Nobel de 2011 disse em uma entrevista “a música é uma parte importante da minha vida. Isto se expressa, naturalmente, na minha escritura de poemas. A música significa, se não tudo, uma imensidão de coisas. Não tenho ouvido absoluto e muito menos uma boa memória musical, mas a música me emociona de maneira muito intensa. No início da minha adolescência, acreditei que a música seria a minha profissão. Comecei a tocar piano aos 16 anos, e fiz a passagem pela minha primeira crise existencial martelando sobre ele. Mais tarde na adolescência, a escritura de poemas predominou, mas a música tem sido sempre o meu refúgio durante toda a minha vida” (O Estado de S.Paulo. Caderno 2, 16/10/2011. D9).
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