25 maio 2011

Tempero da vida (3)

Onívoro, o homem come de tudo: de formigas a baleias, de alimentos vivos a apodrecidos. Pode-se pensar que comer algo "vivo ou podre" seja algo inadmissível, existente apenas em lugares distantes, "exóticos" e/ou em povos ditos "primitivos". Porém, é bom lembrar que as ostras são comidas vivas (com limão, para o ácido dissolvê-las) assim como alguns queijos muito apreciados, tais como o gorgonzola e o roquefort, são consumidos já embolorados.


Porém, se o homem come de tudo, ele não come tudo. Há uma escolha, uma seleção do que é considerado "comida" e, dentro desta grande classificação, quais as permitidas e as proibidas e em que situação isto se aplica. Para o antropólogo Claude Fischler "a variedade de escolhas alimentares humanas procede, sem dúvida, em grande parte da variedade de sistemas culturais: se nós não consumimos tudo o que é biologicamente ingerível, é por que tudo o que é biologicamente ingerível não é culturalmente comestível".


Assim, o que é "comida" em uma cultura, não o é em outra, fato derivado não de seu valor (ou não) nutritivo ou perigo a saúde. Alguns exemplos são muito conhecidos: o cachorro não é, entre nós, comida, ou seja, não é considerado "comestível". Porém, entre alguns grupos orientais, é considerado uma iguaria fina. Da mesma forma com que os caracóis são consumidos sem problemas na França, as formigas o são em certas tribos amazônicas.


E, se o haggis escocês (prato onde são cozidos, dentro de um estômago de carneiro, pulmões de vaca, seus intestinos, pâncreas, fígado e coração, com cebolas, gordura, rim de boi e aveia cozida) pode ser repugnante para alguns, podemos lembrar a "buchada de bode", o "rabo de jacaré" e os "ovos de touro", consumidos no interior de diversas regiões do Brasil.


Mais que alimentar-se conforme o meio a que pertence, o homem se alimenta de acordo com a sociedade a que pertence e, ainda mais precisamente, ao grupo, estabelecendo distinções e marcando fronteiras precisas. Não apenas é escolhido o que se come, mas também o como (vivo, cru, assado, cozido, apodrecido, etc), e qual a técnica utilizada (cozido, assado, etc.), assim como as técnicas de preservação do alimento (defumado, salgado, congelado).


Outro aspecto envolve o quando se come e o quê. Tanto na alimentação do cotidiano (cada cultura define o que é considerado adequado para cada uma das refeições do dia, assim como quantas e quais são estas refeições e como se distribuem ao longo do dia) como nas que marcam momentos especiais, prescrevendo o que, em determinada situação, pode ou não ser consumido.


BALANCEADA - “Somos aquilo que comemos”. A frase, espécie de sentença moral recorrente na fala de médicos e nutricionistas é reveladora da vinculação cada vez maior entre alimentação e saúde presente na nossa sociedade. A preocupação com o corpo, o esforço para se evitar doenças através daquilo que seria uma “alimentação balanceada” ou mesmo o prazer à mesa sendo posto em segundo plano em nome de uma suposta “qualidade de vida”. Tudo isso descreve a forma como atualmente se configura a nossa relação com a comida: o aspecto nutricional tem preponderado na nossa alimentação. O comportamento em relação à comida revela a cultura em que cada um está inserido.

Todas as sociedades proíbem certas classes de alimentos e recomendam outras. A criação de regras, de prescrições e proibições, seja para a comida, mas também em relação a outras atividades – ao casamento, ao parentesco, à política, etc – faz parte da chamada natureza humana. Por conta disso é que muitos antropólogos têm se dedicado à antropologia da comida ou da alimentação.


Se a ciência, através dos tabus e proibições criados pela nutrição, é que tem, predominantemente, ditado as regras e os valores em relação à comida na nossa sociedade, não se pode esquecer das barreiras de outras ordens (religiosas, ideológicas, folclóricas) presentes à mesa. Há interdição da carne de porco entre os judeus.

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