Ele inovou a estética do Carnaval baiano
com seus instrumentos percussivos. Foi o primeiro negro a protagonizar uma
propaganda comercial ao vivo na TV Itapoan. Um agitador cultural Há 110 anos
nascia Nelson Maleiro.
Músico, carnavalesco, precursor dos
instrumentos de percussão, artesão, desportista, animador cultural e
compositor. Nascido em 20 de janeiro de 1909, em Saubara, então distrito de
Santo Amaro da Purificação, Nélson Cruz, aos dez anos de idade foi trazido a
Salvador por uma família amiga de seus pais para trabalhar como embalador na
loja Bahia Elétrica, na Baixa dos Sapateiros. Mais tarde, tendo grande
habilidade, dedicou-se a fabricar malas. O sucesso foi tanto nessa atividade
que toda a Bahia passou a reverenciá-lo como Nélson Maleiro. A partir daí o
artista passou a ser mais conhecido e participou com mais afinco dos eventos
culturais da comunidade.
A arte sempre foi uma força que se
apoderou daquele homem robusto que certamente ultrapassava a 100 quilos. Depois
do fabrico de malas que lhe valeu o cognome, colocou a sua inteligência a
serviço das alegorias que tanto marcaram o carnaval da Bahia. Os carnavais
baianos sofreram grande influência de Nélson Maleiro, pois era integrante do
bloco Mercadores de Bagdá e depois, em 1959, com uma ala dissidente dos
Mercadores, fundou o bloco Cavalheiros de Bagdá, que em 1960 saiu às ruas pela
primeira vez no carnaval, sendo vencedor com sua criação de O Gigante de Bagdá.
Dentro dos Cavalheiros de Bagdá fez várias
criações que se tornaram inesquecíveis como a baleia jogando água no povo,
dragão que expelia fogo, tubarão, King-Kong, e tantas outras. O sucesso do
gigante nos Cavalheiros de Bagdá foi tanto que, durante 20 anos, foi destaque
no carnaval. Como artista, foi ainda convocado a emprestar o seu talento ao
clube carnavalesco Os Internacionais. Durante nove anos, confeccionou os carros
alegóricos do referido bloco tais como pandeiro cigano, barco, lâmpada
maravilhosa de Aladim, pirâmides do Egito e outros.
Nélson Maleiro foi o precursor dos
instrumentos de percussão na Bahia. Ele fabricava, consertava e tocava
instrumentos de percussão como tamborim com e sem ferragem, bongô, timbau,
atabaque, tumbadora, bateria completa, pandeiro, agogô entre outros. Como percussionista
e inovador, apresentava-se tocando bumbo com duas baquetas. Emprestou esse
talento artístico a inúmeros blocos carnavalescos de sua época como Vai
Levando, Barroquinha Zero Hora, Ritmistas do Samba, Nega Maluca, com
abastecimento dos instrumentos de percussão. O Carnaval da Bahia ficou mais
percussivo com os instrumentos do artista. Graças a ele, não era mais
necessário comprar o atabaque ou o timbau fora, Maleiro fazia aqui mesmo. O
grande sucesso alcançado pelos grupos de percussão atualmente tem muito a ver
com Maleiro, pelo grande artista que foi, levando alta dose de criatividade e
tudo de que participava com suas invenções. Na medida em que confeccionava os
instrumentos, sabia tocá-los muito bem. Assim, ao se falar do carnaval e da musicalidade
baiana, não se pode esquecer Nélson Maleiro, o gigante de Bagdá. Sua
participação na vida cultural não foi só no carnaval. Criou na década de 40 a
Orquestra de Jazz Vera Cruz que abrilhantava os bailes da época, onde tocava
sax tenor e barítono. Fundou o Clube de Regatas Vera Cruz, participou de várias
competições no Dique do Tororó, com um barco de sua própria fabricação.
No projeto A Hora da Criança, do
professor Adroaldo Ribeiro Costa, tece participação nas peças de teatro
Narizinho e Monetinho, realizadas no teatro do antigo Instituto Normal da
Bahia, integrando a orquestra quer acompanhava peças, tocando maracas. Na
tradicional Festa dos Santos Reis, Maleiro se fez presente por vários anos,
como integrante dos ternos Arigofe, Estrela do Oriente e Terno do Sol, onde
sagrou-se campeão por diversas vezes, tocando sax e barítono. Nesses festejos
ele se preparava com extremo rigor e se entregava de corpo e alma. Era um
apaixonado pelas tradições da terra. Na Lavagem do Bonfim, tradicional festa
religiosa do verão baiano, sua presença era sempre esperada por todos que lá
compareciam, pois sempre criativo trazia sia bicicleta sui generis de seis
lugares, sobre a qual levava alguma alegoria como pote ou caixa d´água,
enriquecida de algumas inscrições pertencentes à festa, tipo “a água que lava o
bem lava o mal”, “a água que lava tudo só não lava a língua dessa gente”. Foi
também homem de televisão, participando do programa Escada para o Sucesso,
produzido pela TV Itapuã, canal 5 onde o Gigante, "gongava" os
calouros que desafinavam. Como compositor fez a música Pescaria de Tubarão para
os Cavalheiros de Bagdá.
Nélson Maleiro teve cinco filhos, 14
netos e dois bisnetos. Sendo católico, frequentava a Igreja do Bonfim no dia do
seu aniversário e, nos outros dias. Visitava o Mosteiro de São Bento. Era a
forma de demonstrar a sua fé. Homem altruísta. Sempre atendia a todos que o
procurava, ajudava aos necessitados, seja de uma forma material ou espiritual.
Costumava, às sextas-feiras distribuir esmolas ao imenso número de pedintes que
se portavam em frente à sua lojinha, que era a sua morada e o seu local de
trabalho – Rua Dr. J.J.Seabra, loja 28. Ele faleceu em 1982 e deixou uma imensa
saudade em todos os cantos da Bahia.
Admiradores e vizinhos do artista, na rua
da Barroquinha,. Ivan Lima e Ivete Lima iniciaram há anos, um movimento visando
o reconhecimento público dessa importante figura. Com o apoio do professor e
ex-vereador Germano Tabacoff, aprovaram a Lei nº9.215/96 que denominou de
Nélson Maleiro, uma rua situada no Jardim São Cristóvão, na Liberdade. Trata-se
da Associação dos Amigos de Nélson Maleiro (de caráter social e beneficente)
para preservar a memória desse irrequieto artista popular, um dos difusores da
moderna linguagem percussiva, que hoje lança nomes baianos no cenário mundial,
como Carlinhos Brown. Em 1996 o Ilê Ayê saiu às ruas com o tema Pérolas Negras
do Saber, fazendo uma homenagem ao carnavalesco. E em dezembro do mesmo ano,
uma rua no Parque São Cristóvão passou a se chamar Rua Nélson Maleiro. É a
lembrança do povo baiano a um de seus filhos querido. (Fonte: Gente da Bahia, volume 2, escrito por Gutemberg Cruz e
publicado pela Editora P&A em 1998)
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