Desde tempos remotos que existe uma conexão entre o desejo e a tragédia. Basta lembrar Édipo e Antigonas nas tragédias gregas entrelaçando o desejo e a morte. O mesmo para Paola e Francesco na romântica e cruelmente encarcerados no Inferno de Dante. E o desejo devastado entre Romeu e Julieta? Essa dupla temática básica – desejo e morte – são questões humanas fundamentais e muito antes da formalização do conceito (com Freud) já nasceu com a origem do homem, marcado pelo pecado bíblico e sua punição maior, a perda do paraíso.
Enquanto a tragédia (que permeava a cultura grega) lida com o destino inevitável, o drama surge a partir do Renascimento e caminhou junto à Revolução Industrial e aos ideais iluministas. A tragédia obedece a um destino fatalista, teocentrista, o drama enfoca a vida real onde o sujeito é um ser racional, senhor de si e do mundo. Nasce o herói que busca escapar do sofrimento, desafia o desígnio dos deuses ou enfrenta o peso da tradição e da moral vigente.
A civilização ocidental (o oposto da oriental) tem como um de seus pressupostos o controle de fluxos primais e estimuladores da potência do corpo. Esse mecanismo de controle utiliza-se da moral e da ética como forma de manipular as relações entre os corpos. Tenta-se esse controle também através dos artifícios da racionalidade e do conhecimento, que por vezes, estão a reboque de determinados interesses humanos. Apolo, em sua figura mítica, é o senhor da aparência, da forma e do equilíbrio. Dionísio, por sua vez, lhe opõe o movimento, é a transformação, a ruptura, o caos das sensações e das paixões. Energia, matéria, tensões e formas são os termos dessa equação existencial.
Na tentativa de se proteger e minimizar essa finitude, o homem monta para si, estratégias de permanência e controle desse caos iminente (nascer, amadurecer e morrer). Estende no espaço sua teia existencial: sua cultura, sua tecnologia, seus conhecimentos, os complexos organizativos e administrativos dessa condição finita.
A arte não tem tido dificuldade em ligar o desejo erótico ao desejo de morte e aniquilação. O próprio amor é uma espécie de morte – o amante é penetrado ou atacado. Nesta tradição, os delírios do amor, especialmente o orgasmo (em francês une petite mort, “uma pequena morte”), são símbolos da morte real. Argumenta-se que as mortes em Tristão e Isolda ou em Romeu e Julieta indicam o desejo oculto dos amantes de extinção conjunta. Na arte é extraordinariamente perigoso ser uma mulher apaixonada, como nos lembra a interminável procissão de Ofélias, Violetas, Toscas e Mimis.
Até mesmo Eros (desejo) é contaminado por Thanatos (morte). Preste bastante atenção em algumas obras de arte e observe que o desejo erótico tem a morte no seu centro. Cada um de nós pergunta se a vida tem sentido. Depende. A vida é uma corrente de acontecimentos vividos no interior da qual há frequentemente bastante sentido para nós próprios e os que nos rodeiam. O sorriso do filho significa tudo para a mãe, a carícia significa beatitude para o amante, a mudança de frase significa felicidade para o escritor. O sentido vem da entrega e do prazer, da corrente de pormenores que são importantes para nós.
Se a vida humana algumas vezes é dor, outras vezes pode ser delícia. Experienciar o mundo, para qualquer criança, é pura maravilha. Descobrir e vivenciar o amor é descobrir o sentido religioso da vida, é viver momentos de entrega. A amizade pode ser a revelação e o aprendizado do outro, do diferente. O trabalho, a luta pelos ideiais, a realização de alguns de nossos objetivos (mesmo que não exatamente como os sonhamos) é pura transcendência. A velhice pode ser o momento de sabedoria. A vida humnana passa, a todo instante, pela beleza e pela epifania.
Como viver é muito misturado (dor e alegria, tragédia e comédia) é razoável supor que a melhor representação da vida humana na arte é aquela que mostra os dois pólos desta experiência: a dor, mas também a felicidade de existir. Mostrar a afirmação na tragédia e a tragédia na afirmação, eis a receita da grande arte de todos os tempos.
Sem os opostos não há progresso. Atração e repulsão, razão e energia, amor e ódio são necessários para a existência humana. O detalhe é a ênfase. O cinema do diretor Pedro Almodóvar, por exemplo, transita da tragédia à comédia, sem regras nem amarras. Nessa mescla de gêneros cinematográficos, Almodóvar nada mais faz do que uma atualização de um fenômeno verificado no teatro e na literatura e no qual se ilustraram Aristóteles (A Poética), Victor Hugo e Pierre Corneille (El Cid).
Enquanto a tragédia (que permeava a cultura grega) lida com o destino inevitável, o drama surge a partir do Renascimento e caminhou junto à Revolução Industrial e aos ideais iluministas. A tragédia obedece a um destino fatalista, teocentrista, o drama enfoca a vida real onde o sujeito é um ser racional, senhor de si e do mundo. Nasce o herói que busca escapar do sofrimento, desafia o desígnio dos deuses ou enfrenta o peso da tradição e da moral vigente.
A civilização ocidental (o oposto da oriental) tem como um de seus pressupostos o controle de fluxos primais e estimuladores da potência do corpo. Esse mecanismo de controle utiliza-se da moral e da ética como forma de manipular as relações entre os corpos. Tenta-se esse controle também através dos artifícios da racionalidade e do conhecimento, que por vezes, estão a reboque de determinados interesses humanos. Apolo, em sua figura mítica, é o senhor da aparência, da forma e do equilíbrio. Dionísio, por sua vez, lhe opõe o movimento, é a transformação, a ruptura, o caos das sensações e das paixões. Energia, matéria, tensões e formas são os termos dessa equação existencial.
Na tentativa de se proteger e minimizar essa finitude, o homem monta para si, estratégias de permanência e controle desse caos iminente (nascer, amadurecer e morrer). Estende no espaço sua teia existencial: sua cultura, sua tecnologia, seus conhecimentos, os complexos organizativos e administrativos dessa condição finita.
A arte não tem tido dificuldade em ligar o desejo erótico ao desejo de morte e aniquilação. O próprio amor é uma espécie de morte – o amante é penetrado ou atacado. Nesta tradição, os delírios do amor, especialmente o orgasmo (em francês une petite mort, “uma pequena morte”), são símbolos da morte real. Argumenta-se que as mortes em Tristão e Isolda ou em Romeu e Julieta indicam o desejo oculto dos amantes de extinção conjunta. Na arte é extraordinariamente perigoso ser uma mulher apaixonada, como nos lembra a interminável procissão de Ofélias, Violetas, Toscas e Mimis.
Até mesmo Eros (desejo) é contaminado por Thanatos (morte). Preste bastante atenção em algumas obras de arte e observe que o desejo erótico tem a morte no seu centro. Cada um de nós pergunta se a vida tem sentido. Depende. A vida é uma corrente de acontecimentos vividos no interior da qual há frequentemente bastante sentido para nós próprios e os que nos rodeiam. O sorriso do filho significa tudo para a mãe, a carícia significa beatitude para o amante, a mudança de frase significa felicidade para o escritor. O sentido vem da entrega e do prazer, da corrente de pormenores que são importantes para nós.
Se a vida humana algumas vezes é dor, outras vezes pode ser delícia. Experienciar o mundo, para qualquer criança, é pura maravilha. Descobrir e vivenciar o amor é descobrir o sentido religioso da vida, é viver momentos de entrega. A amizade pode ser a revelação e o aprendizado do outro, do diferente. O trabalho, a luta pelos ideiais, a realização de alguns de nossos objetivos (mesmo que não exatamente como os sonhamos) é pura transcendência. A velhice pode ser o momento de sabedoria. A vida humnana passa, a todo instante, pela beleza e pela epifania.
Como viver é muito misturado (dor e alegria, tragédia e comédia) é razoável supor que a melhor representação da vida humana na arte é aquela que mostra os dois pólos desta experiência: a dor, mas também a felicidade de existir. Mostrar a afirmação na tragédia e a tragédia na afirmação, eis a receita da grande arte de todos os tempos.
Sem os opostos não há progresso. Atração e repulsão, razão e energia, amor e ódio são necessários para a existência humana. O detalhe é a ênfase. O cinema do diretor Pedro Almodóvar, por exemplo, transita da tragédia à comédia, sem regras nem amarras. Nessa mescla de gêneros cinematográficos, Almodóvar nada mais faz do que uma atualização de um fenômeno verificado no teatro e na literatura e no qual se ilustraram Aristóteles (A Poética), Victor Hugo e Pierre Corneille (El Cid).
2 comentários:
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Não vivo tão intensamente estas emoções, gostaria até de experimentar, viver intensamente um amor a ponto de chegar ao limite de uma tragédia, deve ser uma experiência única. Não sei, sinceramente, se seria uma experiência boa, sei que não viver estas experiências me deixa com muita vontade de experimentar. Talvez falte coragem, e ai esta ao meu ver um dos piores sentimentos opostos do homem, coragem e medo.
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